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Procº nº 366/91 2ª sec. Cons. Rel. Alves Correia Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional: I- Relatório. 1. A. requereu, ao abrigo do disposto no artigo 263º, nº 3, do Código das Sociedades Comerciais, no Tribunal Judicial da Comarca de Santa Cruz, a convocação judicial de assembleia geral da Sociedade Comercial B., de que a requerente e C. são os únicos sócios, com quotas iguais, a fim de serem aprovadas as contas sociais respeitantes aos anos de 1979 a 1985, as quais, tendo sido apresentadas em assembleias gerais da referida sociedade, não foram aprovados por se ter verificado empate na respectiva votação. O Mtmº Juiz designou dia e hora para a requerida assembleia e designou um revisor oficial de contas para a ela presidir, atribuindo-lhe o poder de desempatar. Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o outro sócio da mencionada sociedade, C., para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por Acórdão de 4 de Outubro de 1990, lhe concedeu provimento. 2. Deste aresto interpôs a requerente recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, mas o Desembargador Relator, por despacho de 5 de Novembro de 1990, não o admitiu, com o fundamento de que, estando-se perante um processo de jurisdição voluntária, o artigo 1411º, nº 2, do Código de Processo Civil veda o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça das resoluções nele tomadas. Do mencionado despacho reclamou a requerente para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, sustentando, além do mais, a inconstitucionalidade desse despacho. Sem êxito, porém, dado que, mantido, por Acórdão de 7 de Fevereiro de 1991 do Tribunal de Lisboa, o despacho reclamado, veio o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por despacho de 19 de Março de 1991, a indeferir a reclamação, alicerçando-se, por um lado, na jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça, segundo a qual 'não é admissível recurso dos Acórdãos da Relação proferidos em processos de jurisdição voluntária, sendo tal inadmissibilidade extensiva a todas e quaisquer decisões ou providências neles tomadas' e, por outro lado, na consideração de que o despacho reclamado não viola qualquer preceito constitucional. 3. Em requerimento dirigido ao Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa, veio então a requerente interpor, em 22 de Abril de 1991, ao abrigo da alínea b) do nº1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, recurso para o Tribunal Constitucional da decisão que, a convite do mesmo Desembargador Relator, identificou como sendo o despacho de não admissão do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, apontando-lhe, tal como o tinha feito na reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, um vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, condensado no artigo 13º da Constituição. Este recurso não veio a ser admitido, por despacho do Desembargador Relator, de 7 de Junho de 1991, com um duplo fundamento: a irrecorribilidade do despacho recorrido, por não ser uma verdadeira decisão jurisdicional, e só desta se poder recorrer, mesmo para o Tribunal Constitucional; e a extemporaneidade na interposição do recurso. 4. Contra aquele despacho deduziu a requerente a presente reclamação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 4 de Julho de 1991, mantido o despacho reclamado. 5. O Exmº Procurador-Geral Adjunto em funções no Tribunal Constitucional emitiu parecer no sentido do indeferimento da presente reclamação. Cumpre decidir. II - Fundamentos. 6. O relato apresentado deixa imediatamente antever a improcedência da presente reclamação. Dois tipos de fundamentos, pelo menos, contribuem para aquele desenlace. O primeiro é a irrecorribilidade para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, do despacho do Desembargador Relator que não admitiu o recurso interposto pela ora reclamante para o Supremo Tribunal de Justiça. Com efeito, os recursos a interpor de decisões dos tribunais para o Tribunal Constitucional, nos termos da alínea b) do nº1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, estão sujeitos ao princípio da exaustão dos recursos ordinários, como decorre do nº 2 do artigo 70º daquela Lei - preceito que determina que aqueles recursos 'apenas cabem de decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados os que no caso cabiam'. Ora, estando sujeito o despacho de Desembargador Relator que não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a reclamação para o Presidente deste Tribunal, nos termos do artigo 688º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil, e configurando-se aquela reclamação, para o feito de se poder recorrer para o Tribunal Constitucional, como 'recurso ordinário', só do despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Março de 1991, que indeferiu a reclamação, é que a reclamante podia recorrer para o Tribunal Constitucional, e não do despacho do Desembargador Relator, de 5 de Novembro de 1990, que não admitiu o recurso ou do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 4 de Julho de 1991, que confirmou aquele despacho de inadmissão. Na verdade, vem este Tribunal decidindo em múltiplos arestos que, por um lado, a reclamação para os presidentes dos tribunais ad quem dos despachos de não recebimento dos recursos interpostos nos tribunais a quo deve ser qualificada como 'recurso ordinário', para efeitos do disposto no artigo 70º, nº 2, da Lei nº 28/82 - dado que tal reclamação desempenha função idêntica à de um recurso - ,e que, por outro lado, são os despachos dos presidentes dos tribunais ad quem que representam, na verdade, a última palavra dentro da ordem judiciária a que pertence o tribunal que a tomou (cfr. os Acórdãos nºs. 65/85, 97/85, 14/86, 2/87, 273/89 e 159/90, publicados no Diário da República, II Série, de 31 de Maio de 1985, 25 de Julho de 1985, 23 de Abril de 1986, 23 de Março de 1987, 8 de Junho de 1989 e 11 de Setembro de 1990, respectivamente). O segundo é a ausência, in casu, de um pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade. De facto, ainda que, ao contrário do que sucedeu efectivamente, o recurso de constitucionalidade tivesse sido interposto contra o despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Março de 1991, e não contra o despacho do Desembargador Relator, de 5 de Novembro de 1990, não poderia, de igual modo, julgar-se admissível o recurso para o Tribunal Constitucional. Na verdade, nunca a reclamante suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma durante o processo, antes imputou sempre a inconstitucionalidade ao próprio despacho do Desembargador Relator, de 5 de Novembro de 1990, como resulta do requerimento de reclamação dirigido ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e do requerimento de interposição do recurso para este Tribunal. Ora, como é sabido, e tem sido afirmado por este Tribunal, em jurisprudência uniforme e constante, objecto do controlo da constitucionalidade são apenas normas jurídicas e não quaisquer outros actos do poder público, designadamente as decisões judiciais elas mesmas [cfr., inter alia, os Acórdãos nºs 123/89 (publicado no Diário da República, II Série, de 29 de Abril de 1989), 391/89 (publicado no Diário da República, II Série, de 14 de Setembro de 1989) e 442/91 (ainda inédito)]. O que vem de expor-se é quanto basta para ter de concluir-se, como já foi anunciado, pela improcedência da reclamação. Não suscita, por isso, reparo o despacho objecto da presente reclamação. III - Decisão. 7. Nos termos e pelos fundamentos expostos, indefere-se a presente reclamação, condenando-se a reclamante em custas, para o que se fixa a taxa de justiça em 4 unidades de conta. Lisboa, 1 de Abril de 1992 Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Bravo Serra Messias Bento Mário de Brito Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa [ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19920125.html ]
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