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Processo n.º 920/2009
1ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que figuram
como recorrente A. e como recorrido o Ministério Público, foi proferida decisão
que negou provimento ao recurso que o ora recorrente havia interposto de uma
anterior decisão do 1º Juízo do Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, que,
por sua vez, lhe não tinha concedido a liberdade condicional.
2. Do referido acórdão foi interposto, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional - LTC, recurso, através do seguinte
requerimento:
“[...] tendo sido notificado do Acórdão de fls.., e não se conformando com o
mesmo, vem interpor RECURSO para o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ao abrigo do art.
70º, 1, b) da Lei do Tribunal Constitucional.
O recurso tem em vista ver declarada a inconstitucionalidade do art. 61 do
Código Penal por violação dos arts. 40 CP, 374 e 379 CPP, 688 CPC, 1º, 32º e
205º da Lei Fundamental, quando entendidos como o foram na Decisão recorrida, na
Questão 4ª in antepenúltima página, que secunda a decisão da 1ª instância.
A inconstitucionalidade foi arguida nas Conclusões 12ª e 13ª do Recurso
interposto do TEP para o TRL”.
3. Na sequência, foi proferida pelo relator neste Tribunal, ao abrigo do
disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na
redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão
sumária de não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na parte agora
relevante, o seu teor:
“3. Admitido o recurso no Tribunal da Relação de Lisboa, cumpre, antes de mais,
decidir se se pode conhecer do seu objecto, uma vez que a decisão que o admitiu
não vincula este Tribunal (cf., artigo 76º, n.º 3, da LTC). Vejamos.
Nos termos do artigo 72º, nº 2, da LTC, o recurso previsto na alínea b) do nº 1
do artigo 70º do mesmo diploma respeita à constitucionalidade de normas
jurídicas e só pode ser interposto “pela parte que haja suscitado a questão de
inconstitucionalidade […] de modo processualmente adequado perante o tribunal
que proferiu a decisão recorrida […]”. Quer isto dizer, em síntese, que a
admissibilidade deste recurso depende, designadamente, de vir adequadamente
colocada pelo recorrente uma questão de constitucionalidade normativa e de o
mesmo ter confrontado o tribunal a quo, antes de proferida a decisão recorrida,
com a questão da inconstitucionalidade da norma – ou da interpretação normativa
– que, nos termos do requerimento de interposição do recurso de
constitucionalidade, pretende ver apreciada. Ora, nos presentes autos, é
manifesto que nada disso se verifica, como sumariamente se demonstrará já de
seguida.
3.1. É desde logo evidente que a forma como o recorrente delimita o objecto do
recurso no respectivo requerimento de interposição não corresponde à formulação
de uma qualquer questão de constitucionalidade normativa. Com efeito, o que
questiona do ponto de vista da sua constitucionalidade não é, manifestamente,
uma norma, mas sim os termos em que, no seu caso, foram aplicados diversos
preceitos que cita. Isso mesmo resulta evidente da forma como concretiza,
naquele requerimento, a alegada inconstitucionalidade que pretende ver
apreciada: “entendidos [tais preceitos] ”como o foram na Decisão recorrida”. Mas
assim sendo, é manifesto que se não pode conhecer do recurso, já que é
jurisprudência pacífica e sucessivamente reiterada que, estando em causa a
própria decisão em si mesma considerada, não há lugar ao recurso de fiscalização
concreta de constitucionalidade vigente em Portugal. Assim resulta do disposto
no artigo 280º da Constituição e no artigo 70º da Lei n.º 28/82, e assim tem
sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em inúmeras ocasiões.
3.2. Acresce que, como refere expressamente o artigo 72º, n.º 2, da LTC, o
recurso previsto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70º, “só pode ser interposto
pela parte que haja suscitado a questão de constitucionalidade [...] de modo
processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida”.
Ora, no caso, verifica-se, ao contrário do que o recorrente sustenta, que o
mesmo não suscitou qualquer questão de constitucionalidade normativa susceptível
de integrar o recurso que interpôs. Para o confirmar, basta ler o que afirmou
nas “Conclusões 12ª e 13ª do Recurso interposto do TEP para o TRL”, onde afirma
que a “inconstitucionalidade foi arguida:
“12- A Decisão viola a Medida da Culpa: arts. 40, 61 e 62 do Código Penal,
impede a RESSOCIALIZAÇAO do arguido com a família e viola ostensivamente os
arts. 61 e 40 do Código Penal, arts. 374, 379 CPP, art. 668-1-C) do C.P. Civil e
arts. 1, 32 e 205 da Lei Fundamental, [...].
13- A regra é a LIBERDADE: a PENA visa a RESSOCIALIZAÇÂO não devendo ser
excessiva nem exercida como o ergástolo antes devendo atender à pessoa e ao
Princípio da Humanidade das penas - art. 1° da Lei Fundamental. [...]”
4. Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, inteiramente
descabidas no presente contexto, torna-se evidente que se não pode conhecer do
recurso, por manifesta falta dos seus pressupostos legais de admissibilidade.
4. Inconformado, o recorrente reclama para a Conferência, dizendo o seguinte:
“[...] notificado da Decisão Sumária vem:
1 - Recorrer para a Conferência pois entende que suscitou a
inconstitucionalidade das normas nas Conclusões 12º e 13ª.
2 - Requerer. esclarecimento sobre a condenação em 7 UCs pois não está
fundamentada.
3 - Requerer a junção aos autos de cópia do Pedido de Apoio Judiciário.[...]”
5. Notificado para responder, querendo, disse o Ministério Público, ora
reclamado:
1º A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2º Na verdade, o reclamante, na reclamação apresentada, não adianta qualquer
argumento no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do recurso.
3º Quanto à condenação em custas, o seu valor situa-se perfeitamente dentro dos
limites legais e está em plena consonância com os critérios jurisprudenciais que
este Tribunal Constitucional vem reiteradamente seguindo, em situações idênticas
à dos autos.
4º Quanto à junção aos autos de cópia do pedido de apoio judiciário, não resulta
sequer, da cópia apresentada, qual a data do pedido.
Cumpre decidir.
II – Fundamentação.
6. Na decisão sumária reclamada decidiu-se não conhecer do objecto do recurso
com um duplo fundamento: não estar colocada qualquer questão de
constitucionalidade normativa, nem ter sido suscitada, em caso algum, de modo
processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida,
qualquer questão de constitucionalidade susceptível de integrar o recurso que
interpôs.
Vem agora o ora reclamante afirmar que suscitou a questão de
constitucionalidade, nada dizendo sobre a não colocação de qualquer questão de
constitucionalidade normativa. Tanto basta para que a reclamação improceda.
Sendo ainda certo que lendo o que consta nas “Conclusões 12ª e 13ª” se confirma,
inequivocamente, que nunca o recorrente suscitou, como se demonstrou na decisão
ora reclamada e ao contrário do que afirma na reclamação, qualquer questão de
constitucionalidade normativa.
7. Pretende ainda o ora reclamante esclarecimentos sobre a sua condenação em
custas. Ora, a condenação em custas constante da decisão sumária reclamada foi
efectuada de acordo com os parâmetros legais e a jurisprudência constante e
uniforme deste Tribunal, pelo que nada há a esclarecer, sendo certo que, para
este efeito – condenação em custas -, em nada releva a junção do pedido de apoio
judiciário.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 3 de Dezembro de 2009
Gil Galvão
José Borges Soeiro
Rui Manuel Moura Ramos
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