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Processo n.º 505/2011
3ª Secção
Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A. reclamou para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), da Decisão Sumária n.º 366/2011, na qual se entendeu não poder o Tribunal Constitucional conhecer do objecto do recurso de constitucionalidade interposto, por falta de verificação de um dos pressupostos de admissibilidade do mesmo – o de falta de suscitação prévia, de modo processualmente adequado, de qualquer questão de constitucionalidade normativa perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, tal com é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.º da LTC.
Através do Acórdão n.º 469/2011, proferido em 12.10.2011, o Tribunal decidiu indeferir a reclamação apresentada, confirmando o fundamento oferecido na decisão sumária reclamada para a não admissão do recurso de constitucionalidade interposto.
Notificado desse Acórdão, veio A. dizer o seguinte:
A., arguido recorrente nos autos acima identificados, notificado do Acórdão 469/2011 que, indeferindo a reclamação deduzida confirma a decisão sumária e não admite o recurso vem requerer
ESCLARECIMENTO
desse douto Acórdão nos termos que segue:
I. Da “reclamação” agora improcedente:
1. O recorrente reclamou da decisão sumária que não lhe admitiu o recurso por considerar que este padecia de um lapso formal de admissibilidade – falta de alegação de uma questão de constitucionalidade normativa tempestivamente suscitada –;
2. Expendeu o recorrente na reclamação que, estando em causa um recurso para o Tribunal Constitucional, esse recurso é de NORMAS – não de decisões judiciais – mas que impugnava simplesmente uma certa interpretação de determinada norma ou, o que é igual, esta última enquanto interpretada num certo sentido ou com uma certa dimensão.
3. Ainda assim, defendeu o recorrente, não está a questionar a constitucionalidade da decisão judicial mas ainda e verdadeiramente o seu suporte normativo, a norma que aplicou.
4. Nesta conformidade, e porque o fez exaustivamente nas referidas conclusões 22 e 23 (pelo menos) do seu recurso entendeu ter cumprido o requisito da suscitação temática da constitucionalidade.
II. Do Douto Acórdão:
5. O problema em análise, e isso este Venerando Tribunal Constitucional delimitou na perfeição, centrar-se-ia na discussão sobre se o recorrente suscitou tempestivamente a questão da constitucionalidade ou não.
6. Na redacção primitiva do nº 2 do artº 72º da L.T.C., e salvo sempre melhor opinião, parece ao recorrente que o problema não se poria pois, melhor ou pior, é aceite que tal questão foi levantada expressamente (em duas das conclusões do recurso).
7. Mas a redacção actual do dito nº 2 acrescentou ao texto inicial um qualificativo abstracto e de preenchimento casuístico que dificulta perigosamente a possibilidade dos recursos para este Tribunal serem, de facto, apreciados;
III. Do “de modo processualmente adequado” do nº 2 do artº 72º da L.T.C.:
8. Qualquer conceito genérico e abstracto traz sempre associado no seu preenchimento com recurso a critérios de oportunidade e de “caso concreto” o aumento da incerteza jurídica.
9. Ao adjectivar a necessária invocação/alegação de questão de constitucionalidade com o qualificativo “DE MODO PROCESSUALMENTE ADEQUADO” veio abrir-se aleatoriamente as possibilidades do Tribunal, preenchendo esse requisito, decidir que o modo usado foi INADEQUADO.
10. É claro que pelos princípios da independência, inamovibilidade e irresponsabilidade dos Juízes por um lado, e por todos os princípios quer do processo civil (cooperação, direcção e boa fé) e constitucionais (Juiz natural, duplo grau de jurisdição e “in dubio pro reu”) o cidadão que recorre a Tribunal espera sempre que este (seja qual for o grau hierárquico) assegure efectivamente a sua acessibilidade e tendo sempre presente que:
“(...)todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo” (nº 4 do artº 20º da C.R.P.).
11. É esta presunção que torna o sistema aceitável e justo aos olhos do cidadão que, inconformado recorre num plano hierárquico.
12. Claro que o direito a ver as questões apreciadas – e reapreciadas – tem de sofrer limitações de âmbito processual mas sempre numa perspectiva permissiva da reapreciação das questões sob pena dos arvorados princípios constitucionais do acesso ao direito não passarem de “bandeiras propagandísticas” sem fundo nem efectivo preenchimento.
13. Ora, o recorrente, e sempre com o devido respeito aos Meritíssimos Conselheiros, que é muito, fica com a ideia que, ao invocar o conceito indeterminado “modo processualmente adequado” o Tribunal Constitucional vem a escusar-se de apreciar o fundo e mérito de uma questão que, aos olhos do recorrente, foi SUFICIENTEMENTE invocada e explicitada.
14. Criando-lhe uma indelével e marcante sensação de injustiça como sempre é ver qualquer questão de justiça ficar por apreciar por motivos processuais de direito adjectivo.
IV. Do esclarecimento:
15. Sem prejuízo de se ter a noção do eventual risco deste Douto Tribunal Constitucional pensar que este pedido reveste um carácter dilatório, importa ao recorrente que fique claro que o faz, insistentemente, por entender que processualmente não se lhe apresentava diversa forma de suscitar a questão da constitucionalidade, isto é;
16. Devendo as decisões judiciais não apenas impor mas sobretudo convencer – principio da fundamentação – entende o recorrente, por uma questão de justiça, solicitar a este Douto Tribunal que esclareça qual o modo processualmente adequado para suscitar a questão da constitucionalidade no âmbito do que foi feito – dimensão da interpretação inconstitucional que o Tribunal “a quo” faz da norma – face às referidas conclusões 22 e 23 (para além do corpo do recurso) das alegações do recorrente.
O Exmo. Magistrado do Ministério Público no Tribunal Constitucional, notificado do requerimento apresentado, veio pugnar pelo seu indeferimento.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
2. Atendendo ao teor do requerimento apresentado e ao pedido concretamente formulado, importa, desde logo, observar que se não trata de um pedido de aclaração do acórdão n.º 469/2011 enquanto tal, i. é de um pedido de esclarecimento que tivesse por objecto passagens desse aresto que, por hipótese, por obscuridade ou ambiguidade, suscitassem dúvidas.
Aquilo sobre que o requerente afirma pretender ser esclarecido tem que ver com a aplicação ao caso concreto do conceito legal de “modo processualmente adequado”, tal como consta do n.º 2 do artigo 72.º da LTC.
Ao assim formular o seu pedido, pretende o requerente que seja o Tribunal a dizer como haveria o próprio de ter correctamente suscitado a questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Ora, o Tribunal Constitucional não funciona como órgão consultivo das partes sobre como devam estas cumprir os pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade.
Tanto basta para indeferir o requerimento apresentado.
III – Decisão
3. Nestes termos, o Tribunal decide indeferir o requerimento de fls. 487 ss.
Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 20 de Dezembro de 2011.- Maria Lúcia Amaral – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão.