Imprimir acórdão
Processo n.º 397/11
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I- Relatório
1. Notificado do Acórdão deste Tribunal que indeferiu a reclamação para a conferência da decisão sumária de não conhecimento do recurso, veio A. arguir a nulidade daquele Acórdão por omissão de pronúncia, bem como requerer a respectiva aclaração, o que fez nos termos seguintes:
1. A reclamação apresentada teve por objecto a decisão sumária proferida que não tomou conhecimento do objecto do recurso interposto.
2. Em síntese, o Recorrente, na reclamação apresentada, invocou que o poder jurisdicional do Tribunal da Relação de Lisboa apenas se esgotou momento subsequente prolação da decisão, permitindo ao julgador, através da alteração do decidido, a realização da justiça material, ainda que com o sacrifício do princípio da imutabilidade das decisões.
3. E que o Tribunal da Relação de Lisboa, ainda no exercício do seu poder jurisdicional, ao decidir que “a insolvência do Recorrente não punha em causa a subsistência do dever que lhe foi imposto como condição da suspensão, não havendo qualquer inconstitucionalidade nessa subsistência.”, aplicou implicitamente a norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo.
4. Ora, a decisão objecto da presente arguição de nulidade, não se pronunciou sobre a aplicação pelo Tribunal da Relação de Lisboa — ainda que implícita - da norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada.
5. Com efeito, tendo sido suscitada tal questão pelo Recorrente e sendo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional que para a admissibilidade do recurso de constitucionalidade ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional basta a aplicação, ainda que implícita, da norma cuja inconstitucionalidade o recorrente invoca, impunha-se que a decisão proferida se tivesse pronunciado quanto a tal matéria.
6. Omitindo pronúncia relativamente a questão que tinha de conhecer — aplicação implícita da norma — a decisão padece da nulidade prevista no art. 668.º n.º 1 d) do C.P.C.
7. A decisão padece ainda de obscuridade ao considerar que o reclamante ‘‘não tem razão quando refere que o Tribunal a quo apenas esgotou o seu poder jurisdicional na matéria com a prolação do acórdão que conheceu do pedido de nulidade”.
8. Com efeito, perante a fundamentação utilizada — “nesta última decisão não tendo procedido o pedido e não tendo havido lugar a aplicação como ratio decidendi, de outras normas que não as relativas à própria nulidade” - não se afigura claro se:
a) a razão de ser da decisão de inadmissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional reside no facto de se entender que o Tribunal da Relação, quando apreciou a nulidade e inconstitucionalidade suscitada, já tinha esgotado o seu poder jurisdicional. ou se
b) Ou se tal inadmissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional se deve ao facto do Tribunal da Relação, apesar de ter entendido que “a insolvência do Recorrente não punha em causa a subsistência do dever que lhe foi imposto como condição da suspensão, não havendo qualquer inconstitucionalidade nessa subsistência.”, não ter sido tal entendimento que determinou a decisão de indeferimento do pedido.
Ou ainda se
c) Qualquer que fosse a razão de decidir do Tribunal da Relação, pelo facto de se tratar de uma decisão proferida na sequência de um pedido de aclaração, nulidade ou arguição de inconstitucionalidades, já tal decisão não admitiria recurso para o Tribunal Constitucional.
2. Respondeu o Ministério Público, pugnando pelo indeferimento da arguição de nulidade bem como da pretendida aclaração.
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II – Fundamentação.
3. Afirma o requerente que o Tribunal Constitucional omitiu pronúncia ao não conhecer de questão a que estava obrigado a conhecer, designadamente a alegada “aplicação implícita [pelo Tribunal da Relação] de uma norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada no processo”. Não tem qualquer razão.
O acórdão sindicado confirmou a decisão sumária que rejeitara conhecer do recurso, por ser evidente o não preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do mesmo. Logo, não podendo ser admitido, estava vedado ao Tribunal Constitucional o conhecimento do mérito do recurso, designadamente da constitucionalidade de qualquer norma alegadamente aplicada, implícita ou explicitamente. Nenhuma omissão de pronúncia se verificou, pois, pelo que nenhuma nulidade foi cometida.
4. Quanto à pretendida aclaração, impõe-se notar que o requerente truncou o próprio trecho que pretende ver esclarecido, já que, ao referir que “nesta última decisão, não tendo procedido o pedido e não tendo havido lugar a aplicação, como ratio decidendi, de outras normas que não as relativas à própria nulidade”, o acórdão sindicado acrescentou, concluindo, que “o objecto decisório [se resume] ao conhecimento dessa arguição da nulidade” e que, “sendo assim, como indubitavelmente o é, não pode esse incidente pós?decisório (ou qualquer outro, como seja o pedido de aclaração ou de reforma) ser considerado momento adequado para suscitar, pela primeira vez, qualquer questão de constitucionalidade respeitante à matéria da causa e às normas aplicadas na sua decisão”. Resulta, assim, do texto da decisão reclamada (como já resultava claramente da decisão sumária que o acórdão mantém), que o arguido não suscitou em tempo oportuno a questão de constitucionalidade, nada havendo a aclarar por o texto decisório ser claro na fundamentação das razões que impediram o conhecimento do mérito do recurso.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a arguição de nulidade e o pedido de aclaração.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa, 15 de Novembro de 2011.- Gil Galvão – José Borges Soeiro – Rui Manuel Moura Ramos.