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Processo n.º 256/09
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. No processo de execução fiscal que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, A. e B. deduziram oposição à execução, tendo sido proferida sentença a “julgar a oposição procedente e, em consequência, extinguir a execução fiscal que contra as mesmas foi [instaurada]”; considerou-se que a norma do artigo 7.º-A constante do RJIFNA – que prevê a responsabilidade subsidiária dos gerentes ou outras pessoas que tenham exercido a administração das pessoas colectivas originariamente devedoras – é inconstitucional por contrariar o princípio da necessidade das penas e violar o “princípio nuclear da restrição dos direitos fundamentais”, bem como por ser violadora dos princípios da presunção da inocência e da intransmissibilidade das coimas, todos consagrados no texto da Constituição, o que conduziu à sua desaplicação no caso concreto.
2. O Ministério Público, em face da decisão proferida, recorreu ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC) para o Tribunal Constitucional com fundamento na recusa de aplicação, pela sentença recorrida, da norma contida no artigo 7.º-A do RJIFNA por a ter considerado materialmente inconstitucional “na medida em que a mesma implica a transmissibilidade das sanções – in casu coimas – e viola o princípio da presunção da inocência”. A convite do relator, o Ministério Público esclareceu que a norma impugnada é a do artigo 7º-A do RJIFNA, quando interpretada no sentido de, em processo contra-ordenacional por matéria relativa a coimas fiscais ser possível a responsabilidade subsidiária dos gerentes ou outras pessoas que tenham exercido a administração das pessoas colectivas originariamente devedoras.
Prosseguindo o recurso, o Ministério Público alegou e concluiu não ser inconstitucional “a norma do artigo 7º-A do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA), quando interpretada no sentido de, em processo contra-ordenacional, por matéria relativa a coimas fiscais, ser possível a responsabilidade subsidiária dos gerentes e outras pessoas que tenham exercido a administração das pessoas colectivas originariamente devedoras”.
II. Fundamentação
3. Constitui objecto do presente recurso a norma do artigo 7º-A do RJIFNA que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga declarou desaplicar na sentença proferida em 25 de Novembro de 2008, com fundamento em inconstitucionalidade. O Ministério Público esclareceu, posteriormente, que o objecto do recurso é a norma que se extrai do teor literal do aludido preceito, que apresenta a seguinte redacção:
“1 – Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam funções de administração em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis, em caso de insuficiência do património destas, por si culposamente causada, nas relações de crédito emergentes da aplicação de multas ou coimas àquelas entidades referentes às infracções praticadas no decurso do seu mandato.
2 – Se forem várias as pessoas responsáveis nos termos do número anterior, é solidária a sua responsabilidade.”
Ao 'desaplicar' esta norma, o tribunal recorrido não fez qualquer referência acerca do elemento culpa do qual, nos termos do teor literal do preceito em causa, decorre a responsabilidade subsidiária do administrador. Poderia assim admitir-se que a norma desaplicada não foi, efectivamente, a que consta como objecto do presente recurso.
Todavia, independentemente da razoabilidade das ponderações do tribunal recorrido quanto ao verdadeiro âmbito preceptivo da aplicação da norma, o certo é que não é desajustado pensar que o julgamento do tribunal se ancorou num juízo prévio de desconformidade constitucional da norma e que foi essa – mal ou bem interpretada a norma – a ratio decidendi da solução encontrada.
Nada impede, por isso, que o Tribunal conheça do objecto do recurso.
4. Foram recentemente tirados no Plenário deste Tribunal, face a divergências de entendimento ocorridas nas Secções, dois acórdãos cujo sentido é fundamental para decidir a questão. São eles:
– Acórdão n.º 437/11 que, confirmando o Acórdão n.º 35/11, não julgou inconstitucional o artigo 8.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), quando interpretado no sentido de que consagra uma responsabilidade pelas coimas que se efectiva pelo mecanismo da reversão da execução fiscal, contra gerentes ou administradores da sociedade devedora; e
– Acórdão n.º 561/11 que não julgou inconstitucional a norma do artigo 7.º-A do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes pelos montantes correspondentes às coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação fiscal.
Ambos os arestos se filiam no entendimento de que a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes, efectivada pelo mecanismo da reversão da execução fiscal, não está constitucionalmente proibida. Face a esta jurisprudência, não pode manter-se o julgamento de inconstitucionalidade proferido nos presentes autos.
III. Decisão
5. Em consequência, decide-se conceder provimento ao recurso e revogar, na parte impugnada, a decisão recorrida que deverá ser reformada de acordo com o precedente juízo de não inconstitucionalidade.
Sem custas.
Lisboa, 19 de Dezembro de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – Gil Galvão – Maria João Antunes – Rui Manuel Moura Ramos.