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Processo n.º 392/11
1ª Secção
Relator: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Notificado do Acórdão n.º 295/2011, pelo qual este Tribunal decidiu indeferir reclamação do despacho que não admitiu o recurso de constitucionalidade interposto, vem agora o reclamante A., atento o disposto nos artigos 666.º, 667.º e 669.º do Código de Processo Civil, requerer a aclaração do acórdão, com os seguintes fundamentos:
«1.º
Refere o douto acórdão que o Recurso é extemporâneo, porquanto, o acórdão do Tribunal da Relação foi comunicado ao arguido em 1 de Setembro de 2010.
2.º
E que o Recurso para esse Tribunal apenas foi intentado em 28 de Janeiro de 2011.
3.º
Admite no entanto que foram praticados actos processuais, muito embora insusceptíveis de interromper o prazo fixado para que se intente o Recurso.
4.º
Desde logo, urge que se esclareça se é entendimento desse Tribunal se o pedido de aclaração de um acórdão é susceptível de interromper o prazo de interposição de Recurso?
5.º
Por outro lado, recebido o Recurso no Tribunal da Relação, e considerando-se o mesmo manifestamente improcedente, ou que não deve ser rejeitado – como foi o caso - deverá ser proferido despacho de indeferimento liminar, nos termos do disposto no art.º 417º n.º 6 do CPP.
5º
Sendo que, de tal decisão cabe Reclamação para a conferência, nos termos do disposto no n.º 8 do mesmo dispositivo.
6.º
Pelo que, ao ser proferido, logo numa primeira fase, acórdão em conferência rejeitando o Recurso, suprime-se o direito do arguido a um segundo grau de jurisdição, pois, na prática, impediria de, antes de recorrer para um Tribunal superior, reclamar para a conferência.
7.º
Pelo que se requer aclaração sobre o entendimento de que, com uma primeira decisão, sobre a forma de acórdão, quanto à rejeição do Recurso, não se estaria a suprimir ao arguido o direito a um segundo grau de jurisdição?».
2. Notificados os reclamados, respondeu apenas o Ministério Público, o que fez nos termos seguintes:
«1º
O ora reclamante, A., aparenta não ter compreendido a argumentação aduzida, pela Ilustre Conselheira Relatora deste Tribunal Constitucional, na apreciação – e ulterior rejeição - do seu recurso.
Isto, apesar de a referida argumentação ter sido sucessivamente sustentada pelo Tribunal da Relação do Porto e por este Tribunal Constitucional.
2º
O requerente continua, porém, apesar disso, a não concordar com opinião diversa da sua e a clamar pelo reconhecimento da sua tese.
Está no seu direito, mas isso não significa que a sua persistência lhe alcance maior solidez argumentativa. Muito pelo contrário!
Na realidade, a coberto de um pretenso pedido de aclaração de acórdão, o requerente volta a esgrimir argumentação que já foi devidamente analisada – e rejeitada – em sucessivas apreciações de recursos seus.
3º
Seja como for, havendo, pelos vistos, necessidade de voltar a expor as razões pelas quais se entende que o interessado não tem razão na sua pretensão, vejamos os argumentos por ele invocados na motivação da presente reclamação.
O primeiro deles respeita à pergunta “se é entendimento desse Tribunal se o pedido de aclaração de um acórdão é susceptível de interromper o prazo de interposição de Recurso?” (cfr. fls. 58 dos autos).
4º
Ora, a este propósito, transcreve-se, abaixo, o que este Ministério Público anteriormente disse, na sua resposta à reclamação do interessado (cfr. fls. 39 dos autos):
“5.º - Quanto à tempestividade do recurso, aceitando-se a tramitação do processo que é referida no despacho reclamado e que o reclamante não coloca minimamente em causa na presente reclamação, só pode concordar-se com o sentido daquele despacho.
6.º - Na verdade, tendo o reclamante reclamado para a conferência de um acórdão proferido em conferência, este constitui meio anómalo e inexistente no nosso ordenamento processual.
7.º - Assim sendo, tal comportamento processual não pode ter a virtualidade de interromper ou suspender o prazo de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional (vd. v.g. o Acórdão n.º 195/2009).
8.º - Desta forma, quando foi interposto recurso para este Tribunal Constitucional do Acórdão da Relação que rejeitou o recurso, o prazo legal de dez dias (artigo 75.º da LTC) encontrava-se ultrapassado.”
5º
Tal questão foi igualmente abordada e resolvida, de forma clara e concisa, no Acórdão 295/11, agora objecto de pedido de aclaração:
“Resultando dos presentes autos que aquele acórdão foi notificado em 1 de Setembro de 2010 e que o recurso de constitucionalidade foi requerido em 28 de Janeiro de 2011, é manifesta a intempestividade do mesmo. É certo que entre as duas datas foram praticados vários actos, mas sem qualquer virtualidade para interromper ou suspender aquele prazo de 10 dias. Estes actos assentaram num incidente pós-decisório anómalo, processualmente inadmissível – reclamação para a conferência de acórdão proferido em conferência – sendo, por isso, irrelevantes.
“Como é entendimento jurisprudencial corrente, designadamente deste Tribunal Constitucional (cf., entre outros, os Acórdãos n.ºs 511/93, 641/97, 459/98, 1/2004, 278/2005, 64/2007, 173/2007, 279/2007, 463/2007, 80/2008, 210/2008 e 178/2009), a dedução de incidentes processuais anómalos, designadamente pós-decisórios, não previstos no ordenamento jurídico, não tem a virtualidade de suspender ou interromper o prazo de impugnação de decisões judiciais” (Acórdão n.º 195/2009, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Justifica-se, por conseguinte, confirmar a decisão de não admissão do recurso de constitucionalidade interposto.”
6º
Em seguida, o reclamante argumenta que, “recebido o Recurso no Tribunal da Relação, e considerando-se o mesmo manifestamente improcedente, ou que não deve ser rejeitado - como foi o caso – deverá ser proferido despacho de indeferimento liminar, nos termos do disposto no art. 417º, nº 6 do CPP” (cfr. fls. 58 dos autos).
Não foi este, porém, o entendimento do Tribunal da Relação do Porto, que escolheu, antes, proferir Acórdão, em 14 de Julho de 2010 (cfr. fls. 13-21 dos autos).
Ora, seria em face deste Acórdão, que o ora reclamante deveria ter reagido de forma processualmente adequada. O que não fez!
Em vez disso, lançou mão de um meio processual inadmissível, que não tinha a virtualidade de interromper o prazo fixado para a interposição de recurso dessa mesma decisão.
7º
Finalmente, é, no mínimo, original, pretender que “ao ser proferido, logo numa primeira fase, acórdão em conferência rejeitando o Recurso, suprime-se o direito do arguido a um segundo grau de jurisdição, pois, na prática, impediria de, antes de recorrer para um Tribunal superior, reclamar para a conferência” (cfr. fls. 58 dos autos).
Ora, é bem de ver, que o próprio acesso, do ora reclamante, ao Tribunal da Relação do Porto constitui, já, a concretização do seu direito a um segundo grau de jurisdição, em relação à decisão de 1ª instância.
8º
Só pode, assim, concluir-se que a presente reclamação não poderá deixar de ser desatendida, uma vez que o Acórdão 295/11, deste Tribunal Constitucional, é suficientemente compreensível, não carecendo, por isso, de qualquer aclaração».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Decorre do disposto nos artigos 669.º, n.º 1, alínea a), e 716.º do Código de Processo Civil e 69.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC) que, proferida decisão, o recorrente pode pedir o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que a mesma contenha.
Atendendo ao teor do acórdão aclarando e ao que devemos entender por obscuridade ou ambiguidade da decisão – “a decisão judicial é obscura quando, em algum passo, o seu sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações distintas” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 533/2004, disponível em www.tribunalconstitucional.pt) – é de concluir que pelo indeferimento do requerido. Com efeito, lê-se no acórdão aclarando que:
«(…) entre as duas datas [a da notificação do acórdão recorrido e a da interposição do recurso de constitucionalidade] foram praticados vários actos, mas sem qualquer virtualidade para interromper ou suspender aquele prazo de 10 dias. Estes actos assentaram num incidente pós-decisório anómalo, processualmente inadmissível – reclamação para a conferência de acórdão proferido em conferência – sendo, por isso, irrelevantes».
Em bom rigor, o reclamante não chega sequer a imputar ao acórdão em causa qualquer vício de obscuridade ou ambiguidade, sendo antes expressão da sua discordância quanto ao definitivamente decidido por este Tribunal.
Não há, pois, qualquer razão para aclarar o Acórdão n.º 295/2011.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir o requerido.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa, 19 de Outubro de 2011.- Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira – Gil Galvão.