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Processo n.º 853/10
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
A. e mulher B. recorrem para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (doravante, LTC), do acórdão proferido na Relação do Porto em 21 de Outubro de 2010.
Alegam os recorrentes que, «ao julgar improcedente o recurso de agravo que se interpusera contra a decisão do tribunal de primeira instância que indeferira a reclamação apresentada contra a conta de custas, aplicou as normas dos artigos 13.º, e tabela anexa, 16.º e 18.º do Código das Custas Judiciais (na redacção em vigor a partir de 2003), na interpretação segundo a qual o montante da taxa de justiça é definido, cega e abstractamente, em função do valor da acção, sem a previsão de qualquer limite máximo ao montante das custas», a decisão fez aplicação de normas «inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da CRP, do princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da CRP, e do princípio da igualdade, consagrado no art. 13.º da CRP.»
O recurso foi admitido. Os recorrentes apresentaram alegação a concluir:
As normas dos arts. 13.º/1, e tabela anexa, 16.º e 18.º do CCJ (na redacção em vigor a partir de 2003), aplicadas no acto de liquidação das custas, bem como pelo acórdão recorrido que o confirma, na interpretação segundo a qual o montante da taxa de justiça é definido, cega e abstractamente, em função do valor da acção, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo ao montante da taxa, são inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da CRP e do princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da CRP.
Eis, assim, Senhores Juízes Conselheiros pelas quais se deve julgar procedente o presente recurso, declarando-se inconstitucionais as normas dos art. 13.º, e tabela anexa, 16.º e 18.º do CCJ (na redacção em vigor a partir de 2003) e determinando-se a baixa dos autos às instâncias de modo a que se promova a anulação de conta de custas reclamadas e a elaboração de uma outra, conforme às normas e princípios constitucionais que ora se acham ofendidos.
Não foi apresentada contra-alegação, cumprindo decidir.
Sustentam os recorrentes que das disposições legais referidas na sua alegação – artigos 13.º, e tabela anexa, 16.º e 18.º do Código das Custas Judiciais (na redacção em vigor a partir de 2003) – o tribunal recorrido retirou uma norma, que aplicou ao caso, segundo a qual «o montante da taxa de justiça é definido, cega e abstractamente, em função do valor da acção, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo ao montante da taxa». Nesta alegação não é, todavia, especificado quais foram os segmentos normativos dos diversos preceitos em questão que tiveram verdadeiramente aplicação ao caso concreto, e em que medida tais normas influenciaram o resultado final, limitando-se os recorrentes a fazer globalmente uma acusação genérica de inconstitucionalidade ao resultado desconforme, sem enunciação concreta da norma cuja aplicação determinara tal resultado.
Os invocados preceitos têm a seguinte redacção:
Artigo 13.º
Base de cálculo da taxa de justiça
1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, a taxa de justiça é, para cada parte, a constante da tabela do anexo I, sendo calculada sobre o valor das acções, incidentes com a estrutura de acções, procedimentos cautelares ou recursos.
2 – ...
Artigo 16.º
Taxa de justiça noutras questões incidentais
1 – Nas ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributadas segundo os princípios que regem a condenação em custas e na incompetência relativa, nos impedimentos, nas suspeições, na habilitação, na falsidade, na produção antecipada de prova, no desentranhamento de documentos, bem como noutras questões incidentais não referidas no artigo 14.º, a taxa de justiça é fixada pelo juiz em função da sua complexidade, do valor da causa, do processado a que deu causa ou da sua natureza manifestamente dilatória, entre 1 UC e 20 UC.
2 – Nos casos previstos no número anterior, se a especificidade da situação o justificar, pode o juiz, de forma fundamentada, dispensar do pagamento de taxa de justiça.
3 – Sem prejuízo do disposto relativamente à litigância de má fé, se, até à elaboração da conta, o juiz não fixar o valor da taxa de justiça ou não dispensar do seu pagamento, o montante daquela será automaticamente fixado em metade do valor da taxa de justiça do processo, não podendo, no entanto, exceder o valor de 2 UC.
Artigo 18.º
Taxa de justiça nos tribunais superiores
1 – Nas causas directamente intentadas perante os tribunais superiores e nos recursos dirigidos ao Supremo Tribunal de Justiça, a taxa de justiça é calculada nos termos do artigo 13.º
2 – Nos recursos dirigidos aos tribunais da Relação a taxa de justiça é metade da constante da tabela do anexo I, não sendo devida taxa de justiça subsequente e não havendo lugar a quaisquer reduções.
3 – Nas reclamações para a conferência, nas reclamações do despacho que retiver ou rejeitar o recurso, nos recursos de decisões proferidas em incidentes e nos agravos de decisões interlocutórias que subam juntamente com outro recurso aplica-se o disposto no artigo 16.º
Diz o acórdão recorrido, na parte relevante ao presente recurso:
[...] Ora, na conta de custas de fls. 546 foi tomada em conta a decisão de condenação em custas referente ao incidente de reclamação para a conferência em última instância, de 29.09.2009, que fixou, em concreto, em 3 UC a taxa de justiça, de acordo com o disposto no artº 16º, nº 1 do CCJ e não qualquer tabela de custas pré-fixada.
Quanto à custas da acção e dos recursos, de apelação e de revista, foi levado em conta para a liquidação o valor da acção, atribuído pelos autores e as regras dos artºs 13º a 15º, 18º, nºs 1 e 2 e 27º CCJ, na redacção do D.L. 324/2003, de 27 de Dezembro (e não a versão de 1996).
Como é sabido a Justiça em Portugal não é gratuita, em regra e os autores bem sabiam ou deviam saber que a improcedência da acção que intentaram, com o valor que lhe atribuíram de 625.000,00, bem como dos recursos que interpuseram nas duas instâncias superiores e a reclamação para a conferência relativa ao recurso de revista, acarretavam custas elevadas previamente estabelecidas na lei e que não beneficiavam de apoio judiciário.
As alterações introduzidas pelo recente Regulamento das Custas Processuais, não se aplicam à contabilização de custas neste processo, por não se encontrarem abrangidas pelo regime transitório estabelecido no art. 27º do D.L. 34/2008, de 26 de Fevereiro.
III-Decisão:
Nestes termos, acordam os juízes nesta Relação em negar provimento ao agravo e manter o despacho recorrido.[...]
Face ao teor da norma impugnada, cujo sentido se reporta indubitavelmente a um resultado desproporcionado do montante das custas e, por isso, violador do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição e do princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º n.º 2, segunda parte, da Constituição, cumpre desde logo reconhecer que nada permite afirmar que aos recorrentes foram aplicadas custas de montante claramente desproporcionado.
Se a prestação exigida, a título de custas, atingiu valores elevados, a natureza ordinária da acção, que percorreu várias instâncias, e a desconformidade entre o peticionado e o reconhecido, fazem concluir que a correspectividade material entre as duas prestações não se mostra manifestamente desvirtuada, pelo que não se evidencia que os limites de taxação resultantes da estrutura bilateral das taxas tenham sido desrespeitados.
Por outro lado, analisada a questão numa perspectiva de avaliação do critério normativo prefigurado nas disposições legais imputadas de desconformidade segundo parâmetros retirados directamente da Constituição, deve ter-se em consideração o bloco legal onde sistematicamente se inserem tais disposições para poder determinar se o resultado final efectivamente enferma do vício alegado. Acontece, que nos artigos 14º e 15º do citado Código das Custas Judicias, estão claramente previstos mecanismos especiais de redução do montante da taxa de justiça que impõem a intervenção do juiz na sua fixação. Não é, assim, possível afirmar que tais normas determinam a fixação de uma taxa de justiça «sem o estabelecimento de qualquer limite máximo», alegação que pretende significar a desrazoabilidade do montante encontrado.
Não é, assim, possível afirmar que o critério legal conduz a uma taxa excessiva, desrespeitadora de um limite de admissibilidade.
Em face do que fica dito o Tribunal julga totalmente improcedente a alegação dos recorrentes.
Em consequência, cumpre negar provimento ao recurso.
Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça em 25 (vinte e cinco) unidades de conta.
Lisboa, 15 de Novembro de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – José Borges Soeiro – Gil Galvão – Maria João Antunes – Rui Manuel Moura Ramos. Com a declaração de que não conheceria do objecto do recurso por a norma não ter sido aplicada com a dimensão indicada no requerimento de interposição do recurso.