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Processo n.º 627/2007
3ª Secção
Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Notificado do acórdão n.º 351/2011, datado de 12.07.2011, através do qual o Tribunal Constitucional decidiu negar provimento ao recurso por si interposto, veio A. dizer o seguinte:
A., recorrente no processo com o número indicado, notificado, no dia de hoje, do acórdão que decidiu o recurso, proferido no passado dia 12, vem arguir nulidades, fazendo-o nos termos seguintes:
Por requerimento que deu entrada a 20-09-2010, o recorrente suscitou a questão da prescrição do procedimento disciplinar, pelos fundamentos no mesmo aduzidos, aqui dados por integralmente reproduzidos, e requereu que os autos baixassem (só podendo ser a título devolutivo) ao STA, para a questão ali ser apreciada e decidida.
A 21-04-11, requereu que fosse apreciado e despachado o referido requerimento, uma vez que nada sabia do mesmo.
A 3 de Maio seguinte, foi proferido despacho, no qual se declarou que o pedido formulado “seria apreciado oportunamente”.
A oportunidade de apreciação, em princípio, seria em qualquer altura antes de o recurso ser decidido, nunca depois de ser proferido o acórdão, uma vez que este e o acórdão recorrido transitam em julgado, ao mesmo tempo que se torna definitiva a decisão punitiva.
A partir desta definitividade, começa a correr o prazo de prescrição da pena, já não sendo possível discutir a prescrição do procedimento.
E o certo é que existe o dever de apreciar a prescrição, tanto mais que até se trata de questão de conhecimento oficioso, sendo que o interesse em não punir uma infracção que se encontra prescrita (ou amnistiada) é bem mais alto do que o interesse que a norma sancionatória visa tutelar com a punição.
Com a notificação do acórdão, o recorrente tomou conhecimento de que o requerimento em causa não havia sido apreciado e despachado, no sentido de os autos serem remetidos ao STA.
Dado que se trata da omissão de um acto que podia influir na decisão do recurso, tanto mais que a apreciação desta ficaria prejudicada no caso de a prescrição do procedimento ser declarada, cometeu-se a nulidade processual prevista no art. 201º, nº 1, do CPC, aplicável “ex vi” do art. 69º da LTC.
Como determina o nº 2 deste normativo, verifica-se uma nulidade consequencial, do que resulta que o acórdão também enferma do mesmo vício, sendo, por isso, nulo.
Mas não é tudo. Com efeito, não o tendo sido antes, o requerimento podia e devia ser apreciado, como questão prévia, no acórdão. Seria assim, mesmo que a questão não tivesse sido suscitada, já que é de conhecimento oficioso, como determina o art. 660º, nºs 1 e 2, do CPC.
Assim, verificando-se que o Tribunal deixou de se pronunciar sobre uma questão que devia apreciar, o acórdão enferma da nulidade, por omissão de pronúncia, prevista no art. 668º, nº 1. al. d), do citado Código.
Nestes termos, deve:
a) declarar-se verificada a nulidade prevista no art. 201º do CPC e, em consequência, declarar-se nulo o acórdão;
b) subsidiariamente, declarar-se verificada a nulidade por omissão de pronúncia, prevista no citado art. 668º, nº 1, al. d), e declarar-se nulo o acórdão; e
c) em qualquer dos referidos casos, apreciar-se o requerimento em causa e ordenar-se a remessa dos autos ao STA, a título devolutivo, para apreciação da suscitada questão da prescrição.
2. Já em momento anterior, através de requerimento que deu entrada neste Tribunal a 21.04.2011, o recorrente tinha solicitado ao Tribunal que fosse apreciado e despachado o requerimento que dera entrada neste Tribunal a 20.09.2010, em que o recorrente suscitara a questão da prescrição do procedimento disciplinar e requerera que os autos baixassem ao Tribunal a quo para a questão ali ser apreciada e decidida.
Em resposta a este último requerimento, a relatora no Tribunal Constitucional proferiu despacho, datado de 03.05.2011, aí dizendo que o pedido em questão seria apreciado oportunamente, dado que os autos se encontravam no Tribunal Constitucional, onda haviam sido produzidas as alegações e contra-alegações, aguardando a prolação do respectivo acórdão.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. Na sua reclamação, entende o reclamante verificar-se nulidades de natureza diferente.
Em primeiro lugar, a circunstância de ter sido proferido o acórdão sobre o recurso de constitucionalidade por si interposto sem que previamente tivesse sido apreciado e despachado o requerimento em que suscitara a questão da prescrição do procedimento disciplinar configuraria, no entender do reclamante, nulidade processual, a que alude o artigo 201.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, nulidade processual essa que conduziria à nulidade consequencial do próprio acórdão, nos termos do n.º 2 dessa disposição legal.
Em segundo lugar, o acórdão seria nulo por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, porquanto, sendo a questão da prescrição do procedimento disciplinar de conhecimento oficioso e imperativo, ao deixar de sobre tal questão tomar posição, o Tribunal deixou de se pronunciar sobre uma questão que devia apreciar.
Não tem razão o reclamante relativamente a qualquer das nulidades invocadas.
3.1. No que à primeira diz respeito, importa observar que, por despacho datado de 03.05.2011, a relatora no Tribunal Constitucional decidiu que o requerimento em questão não seria imediatamente apreciado, dado que os autos se encontravam no Tribunal Constitucional, onda haviam sido produzidas as alegações e contra-alegações, aguardando a prolação do respectivo acórdão, pelo que, nos termos desse despacho, o mesmo apenas seria apreciado oportunamente.
Inexiste, todavia, qualquer nulidade processual, pois o recorrente não é irremediavelmente prejudicado pela prolação do acórdão sobre o recurso de constitucionalidade sem prévia apreciação da questão da prescrição do procedimento disciplinar.
Com efeito, baixando os autos ao Tribunal a quo para apreciação da questão da prescrição do procedimento disciplinar suscitada na pendência de recurso de constitucionalidade, e caso a mesma questão venha a ser julgada procedente, não é o acórdão do Tribunal Constitucional a negar provimento ao recurso de constitucionalidade que vai impedir a produção do efeito extintivo do procedimento disciplinar em virtude da prescrição do mesmo.
Porque nada obsta à oportuna apreciação do requerimento em questão, não se tem por verificada a nulidade processual, carecendo, por conseguinte, de fundamento a nulidade consequencial do próprio acórdão.
3.2. Carece igualmente de fundamento a arguição de nulidade do acórdão por omissão de pronúncia.
Desde logo, e ao contrário do que afirma o reclamante na sua reclamação, extravasa da competência do Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, tomar posição sobre qualquer questão que seja estranha ao objecto específico do recurso no Tribunal Constitucional, o qual, como se sabe, se cinge tão-somente a questões de constitucionalidade normativa.
O próprio recorrente, ora reclamante, está perfeitamente ciente da incompetência do Tribunal Constitucional para apreciar matéria relacionada com a prescrição do procedimento disciplinar, porquanto no requerimento que deu entrada neste Tribunal a 20.09.2010 – em que o recorrente suscitara a questão da prescrição do procedimento disciplinar – é solicitado que, para o efeito, os autos baixem ao Tribunal a quo.
Sendo para a sua apreciação incompetente, ao não tomar posição sobre a questão da eventual prescrição do procedimento disciplinar, o Tribunal Constitucional não deixou de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar, não se verificando, portanto, o pressuposto legal – previsto na alínea d), do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil – para que ocorra omissão de pronúncia.
E não se diga que o que está em causa é, não propriamente a omissão de pronúncia sobre a questão da prescrição do procedimento disciplinar em si mesma considerada, mas antes a apreciação do requerimento de 20.09.2010 a solicitar a baixa dos autos para esse efeito, pois, nos termos do despacho proferido pela relatora no Tribunal Constitucional, datado de 03.05.2011, o Tribunal Constitucional, ao relegar expressamente a apreciação do mesmo para momento oportuno, não deixou de tomar posição sobre o mesmo. Aliás, ainda que assim não fosse, inexistiria igualmente omissão de pronúncia, pois nada obriga à prévia apreciação de tal requerimento antes da prolação do acórdão sobre o recurso de constitucionalidade.
III – Decisão
Nestes termos, o Tribunal decide indeferir a arguição de nulidades:
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 12 de Outubro de 2011.- Maria Lúcia Amaral - Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão.