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Processo n.º 470/09
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. A. apresentou reclamação para a conferência, ao
abrigo do n.º 3 do artigo 78.º‑A da Lei de Organização, Funcionamento e
Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro
(LTC), contra a decisão sumária do relator, de 22 de Junho de 2009, que
decidiu, no uso da faculdade conferida pelo n.º 1 desse preceito, não
conhecer do objecto de recurso por ela interposto para o Tribunal
Constitucional.
1.1. A referida decisão sumária tem a seguinte
fundamentação:
“1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo
das alíneas b) e f) (esta por referência à alínea c)) do n.º 1 do artigo 70.º da
[LTC], contra o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19 de Fevereiro de
2009, que negou provimento a recurso por ela deduzido contra o despacho do 3.º
Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Paredes, de 19 de Maio de 2008,
que rejeitou liminarmente o incidente de prestação de caução por ela deduzido
por apenso à execução para entrega de coisa certa contra ela movida por B. e C..
De acordo com o complemento ao requerimento de interposição de
recurso, a recorrente pretende que se aprecie «a violação dos artigos 3.º e 13.º
da Constituição da República Portuguesa, 28.º e 35.º do Decreto‑Lei n.º 385/88,
de 25 de Outubro, e 668.º do Código de Processo Civil, questão de
inconstitucionalidade e legalidade levantada pela recorrente no recurso de
indeferimento de incidente de caução na oposição à execução».
O recurso foi admitido pelo Desembargador Relator do Tribunal da
Relação do Porto, decisão que, como é sabido, não vincula o Tribunal
Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da LTC) e, de facto, entende‑se que o
recurso em causa é inadmissível, o que possibilita a prolação de decisão
sumária de não conhecimento, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º‑A da
LTC.
2. A admissibilidade de recurso interposto – como o presente – ao
abrigo das alínea b) e f) (esta por referência à alínea c)) do n.º 1 do artigo
70.º da LTC depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de
inconstitucionalidade e de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado
haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado
perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar
obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão
recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões
normativas arguidas de inconstitucionais ou ilegais (por violação de lei com
valor reforçado) pelo recorrente.
2.1. Ora, nenhuma questão dessa natureza foi suscitada pela
recorrente nas alegações do recurso interposto para o Tribunal da Relação do
Porto, do seguinte teor:
«1. A agravante nos presentes autos intentou acção de preferência
nos termos do artigo 28.º do Decreto‑Lei n.º 385/88, de 25 de Outubro, acção
que foi julgada e provada procedente, pelo que, nos termos da mesma e em 3 de
Março de 2004, procedeu ao depósito do valor de 49 380,99 € (Doc. 1), relativo
ao valor dos bens sobre que exerceu a preferência, em cumprimento do previsto no
artigo 28.º do regime do arrendamento urbano, sob pena de caducidade do direito
e do arrendamento.
2. Posteriormente, vieram os agora agravados intentar a acção
contra a agravante, baseando o seu pedido na sanção prevista na lei para o
preferente abstencionista.
3. Nos termos da douta sentença, foi retirada a preferência.
4. A agravante deduziu oposição.
5. E deduziu também incidente de caução.
6. O requerimento de suspensão de execução mediante prestação de
caução pode ocorrer em qualquer altura da fase de oposição à execução,
7. não carecendo de ser deduzido no próprio articulado da oposição.
8. A suspensão da execução pode obter‑se por duas vias,
9. mediante a prestação espontânea de caução:
10. a) Na própria execução, a todo o tempo,
11. ou
12. b) No recurso da decisão proferida em 1.ª instância quanto à
oposição.
13. A prestação de caução espontânea da caução não prejudica o
exequente.
14. A não prestação de caução, em consequência da interposição do
recurso, não preclude o direito do executado, por se estar no domínio do agravo
e lhe aproveitar o regime geral consignado no artigo 47.º, n.º 4, do CPC.
15. A interpretação dos factos e da lei acolhida em Tribunal violou
os princípios legais aplicáveis.
16. O aliás douto despacho violou o disposto nos artigos 47.º, n.º
4, 818.º e 988.º do CPC.
17. O que interessa, portanto, é que fique assegurada ao exequente,
através da caução, a realização efectiva do seu crédito.
18. Desde que essa garantia seja dada, através de qualquer meio
idóneo (artigo 623.º, n.º 1, do CC), o seguimento da execução deixa de
justificar‑se.
19. Considerando esse papel funcional da caução, o tempo para a sua
efectivação, como garantia especial da obrigação do opoente, não tem qualquer
limite, desde que não ultrapasse a vida da própria oposição.
20. O requerimento de suspensão da execução, mediante prestação de
caução, pode, assim, ocorrer em qualquer altura da fase da oposição à
execução, não carecendo de ser deduzido no próprio articulado de oposição.
21. É este o entendimento generalizado da doutrina e da
jurisprudência – v. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol.
3.º, pág. 327; Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 3.ª edição, pág.
137; acórdão da Relação de Lisboa, de 20 de Abril de 1999, Colectânea de
Jurisprudência, ano XXIV, tomo II, pág. 117; e acórdão do STJ, de 16 de
Dezembro de 1987, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 372, pág. 408.
22. Assim, enquanto não estiver definitivamente decidida a
oposição, o executado/opoente poderá requerer a suspensão da execução.
23. É que, a final, a opoente deduziu incidente de prestação de
caução, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 818.º, n.º 1, isto é,
para obter a suspensão da execução.
24. E a oposição respeita a todo o objecto da execução.
Conclusões:
– A meritíssima Juiz a quo abstém‑se de conhecer do pedido
incidental;
– Por outro lado, retira da lei pensamento legislativo que não tem
na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, pois a caução pode ser
requerida em qualquer estado da oposição;
– Por fim, resulta claro que a Meritíssima Juiz a quo não
fundamenta o seu douto despacho nos termos legais;
– Usa da arbitrariedade e não confere à sua decisão um mínimo de
certeza jurídica e clara definição dos princípios jurídicos que a regem:
– O incidente da caução aplica‑se à execução para entrega de coisa
certa.»
Como é patente, nesta peça processual a recorrente não suscitou
nenhuma questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade (por violação de lei
com valor reforçado) normativas, limitando‑se a imputar directamente à decisão
judicial então recorrida a violação de normas de direito ordinário.
2.2. E, consequentemente, o acórdão ora recorrido não se pronunciou
– nem tinha que se pronunciar, por falta de adequada suscitação – sobre qualquer
questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade por violação de lei com
valor reforçado, tendo a decisão de improvimento do recurso sido sustentada nas
seguintes considerações:
«II. Das certidões juntas aos autos resultam os seguintes
elementos:
A execução para entrega de coisa certa de que os presentes autos são
dependência fundou‑se em sentença já transitada em julgado à data da
instauração da execução.
A requerente deduziu oposição à execução, que foi indeferida
liminarmente por despacho proferido na mesma data do despacho recorrido.
Do despacho de indeferimento liminar da oposição à execução foi
interposto recurso para este Tribunal.
III. As questões a decidir – delimitadas pelas conclusões da
alegação da agravante (artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do CPC) – são as
seguintes:
– Se a decisão recorrida carece de fundamentação;
– Se o incidente de prestação de caução com vista à suspensão da
execução deve prosseguir os seus termos apesar de a oposição à execução ter
sido liminarmente indeferida por despacho ainda não transitado em julgado.
1. Falta de fundamentação da decisão recorrida.
A recorrente veio dizer que a decisão recorrida não se encontra
fundamentada nos termos legais (embora sem explicar porquê), pelo que se mostra
arguida a nulidade da decisão.
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão são as que
vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do artigo 668.º do CPC – diploma a que
pertencem todas as normas adiante citadas sem menção de origem.
Nos termos daquele normativo, é nula a sentença quando: a) não
contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de
direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a
decisão; d) o juiz deixe de pronunciar‑se sobre questões que devesse apreciar ou
conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) condene em
quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos
de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre
a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou
ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da
razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer
porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado
(contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder
jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia
conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria
conhecer (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor
que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte
afectada.
A nulidade da falta de fundamentação prevista na alínea b) do n.º 1
do citado artigo 668.º está relacionada com o comando do artigo 659.º, n.º 2,
que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e
indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Como é entendimento pacífico da doutrina, só a falta absoluta de
fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de
direito, gera aquela nulidade. A fundamentação deficiente, medíocre ou errada
afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita‑a ao risco de ser revogada ou
alterada em recurso, mas não produz nulidade. Pese embora alguns autores
duvidem da constitucionalidade da norma do artigo 668.º, n.º 1, quando
interpretada naquele sentido.
No caso, a M.ma Juíza a quo explicou, com apoio em jurisprudência,
que a rejeição do incidente de prestação de caução se ficou a dever ao facto de
a oposição ter sido liminarmente indeferida, não podendo, assim, a requerente
obter a suspensão da execução, ainda que viesse a ser interposto recurso da
decisão de indeferimento liminar.
A fundamentação da decisão recorrida é sucinta, mas existe, pelo
que, face ao que acima expusemos, não enferma a decisão da nulidade a que se
reporta a alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º.
2. Prestação de caução e suspensão da execução.
A redacção do artigo 818.º introduzida pelo Decreto‑Lei n.º
199/2003, de 10 de Setembro, inovou em relação ao regime anterior no que
respeita ao efeito do recebimento da oposição à execução, dispensando a
prestação de caução para efeitos de suspender a execução nos casos em que não
há citação prévia do executado (cf. n.º 2).
A diversidade de regimes justifica‑se porque nos casos em que não há
lugar à citação prévia do executado já foi efectuada a penhora (cf. artigo
812.º‑A, n.º 1) e, portanto, o crédito exequendo já está garantido por essa
penhora que ainda pode ser reforçada ou substituída (artigo 818.º, n.º 2), não
carecendo de ser ‘duplamente’ garantido pela caução.
Em consonância com tal solução, passou a haver sempre citação prévia
do executado nas execuções que não têm por finalidade o pagamento de uma
quantia certa e em que, portanto, não há, ab initio, que penhorar bens ao
executado, ou seja, nas execuções para entrega de coisa certa (artigo 928.º,
n.º 1) e para prestação de facto (artigos 933.º, n.º 2, 939.º, n.º 1, e 940.º,
n.º 2).
Foi, por isso, eliminado o n.º 2 do artigo 928.º, que permitia que a
execução para entrega de coisa certa fundada em sentença se iniciasse com a
entrega judicial da coisa, sem citação prévia do executado, por remissão
expressa para o formalismo previsto nos artigos 924.º e seguintes.
Nos termos do n.º 1 do actual artigo 928.º, a execução para entrega
de coisa certa inicia‑se com a citação do executado para, no prazo de 20 dias,
fazer a entrega ou opor‑se à execução.
Sendo assim, na execução para entrega de coisa certa fundada em
sentença, o recebimento da oposição apenas suspende a execução se: a) o
executado prestar caução (artigo 818.º, n.º 1); b) a oposição tiver por
fundamento benfeitorias a que o executado tenha direito (artigo 929.º, n.ºs 1, 2
e 3).
Aplica‑se ainda à execução para entrega de coisa certa a norma do
n.º 4 do artigo 47.º: ainda que o executado não tenha deduzido oposição, pode
sempre prestar caução com vista à suspensão da execução se esta se tiver
fundado em sentença ainda não transitada em julgado, isto é, em sentença da qual
tenha sido interposto recurso com efeito meramente devolutivo (cf. o n.º 1 do
mesmo preceito).
Já ressalta do que acima dissemos que a caução é uma garantia
(artigo 623.º do Código Civil) que se destina a pôr o exequente a coberto dos
riscos da demora no prosseguimento da acção executiva, no caso de ser deduzida
oposição à execução, garantindo‑lhe a satisfação do seu direito caso a oposição
venha a improceder.
Como se diz no acórdão da Relação de Lisboa, de 17 de Abril de 2008,
com a prestação de caução pelo executado procurou‑se obter um justo equilíbrio
entre, por um lado, os interesses do exequente, que pretende a satisfação
coerciva, em prazo razoável, do direito de crédito, e, por outro, os interesses
do devedor, a quem assiste o direito de se opor, designadamente, à execução do
património, garantindo‑se a eficiência do processo executivo.
Sendo aquela a função da caução, a sua prestação só tem como efeito
a suspensão da execução após o recebimento da oposição – como resulta da letra
do n.º 1 do artigo 818.º e da inserção sistemática do preceito na sequência do
artigo 817.º, onde estão previstos os termos da rejeição e do recebimento da
oposição.
Se a oposição à execução não chega a ser recebida, sendo
liminarmente rejeitada por qualquer um dos fundamentos previstos no n.º 1 do
artigo 817.º, não há que suspender a execução, e, consequentemente, não tem
qualquer utilidade a prestação de caução, que, caso já tenha sido requerida,
não deve ser admitida.
Tem razão a requerente quando diz que a prestação de caução com
vista à suspensão da execução pode ser requerida em qualquer estado da oposição
até à decisão definitiva desta; mas tal pressupõe que a oposição foi recebida e
se encontra a seguir os termos subsequentes (cf. n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 817.º).
A solução não é diferente pelo facto de ter sido interposto recurso
do despacho que indeferiu liminarmente a oposição.
Embora esse recurso (de agravo – artigos 234.º‑A, n.º 2, e 923.º)
tenha efeito suspensivo (artigo 740.º, n.º 1), suspende apenas a marcha dos
autos de oposição até que seja decidido, não se estendendo o alcance desse
efeito ao processo de execução. Por via da admissão do recurso com efeito
suspensivo, a oposição à execução continua a ser oposição não recebida.
Por isso, mesmo que recorra do despacho de indeferimento liminar da
oposição, o executado não pode obter a suspensão da execução prestando caução.
Nos presentes autos, não é manifestamente caso de aplicação do n.º 4
do artigo 47.º, já que a execução se fundou em sentença transitada em julgado.
A oposição deduzida pela requerente também não se fundou em
benfeitorias, pois que não foi pedida qualquer quantia a esse título (cf. n.º 2
do artigo 929.º).
A requerente só poderia, assim, suspender os termos da execução se,
deduzindo oposição, prestasse caução ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo
818.º – o que requereu.
Porém, como a oposição à execução foi liminarmente indeferida nos
termos do n.º 1 do artigo 817.º, não pode a requerente ser admitida a prestar
caução a fim de obter a suspensão da execução, apesar de ter interposto recurso
do despacho de indeferimento liminar da oposição.
Como se disse, o efeito suspensivo de tal recurso teve apenas a
virtualidade de suspender os termos da oposição à execução, que continua a ser
oposição não recebida, não abrangendo a execução.
Bem andou, pois, a M.ma Juíza a quo em rejeitar o incidente de
prestação de caução.
Improcedem, assim, as conclusões da agravante, pelo que há que negar
provimento ao agravo e confirmar a decisão recorrida.»
3. Como inequivocamente resulta do precedentemente exposto, no
presente processo, a recorrente nunca suscitou, perante o tribunal recorrido,
em termos processualmente adequados, uma questão de inconstitucionalidade ou de
ilegalidade (por violação de lei com valor reforçado) normativas, isto é, nunca
imputou a uma norma de direito ordinário (ou a uma interpretação normativa
extraída desse direito e identificada com o mínimo de precisão) a violação de
normas ou princípios constitucionais ou a violação de uma lei com valor
reforçado (que a recorrente jamais indicou qual fosse).
E, consequentemente, o acórdão recorrido não fez aplicação de
qualquer norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade (por violação de lei
com valor reforçado) tivesse sido arguida pela recorrente, pelo que o presente
recurso surge como inadmissível, o que determina o não conhecimento do seu
objecto.
4. Em face do exposto, decide‑se, ao abrigo do disposto no artigo
78.º‑A, n.º 1, da LTC, não conhecer do objecto do presente recurso.”
1.2. Os fundamentos da reclamação apresentada pela
recorrente foram por ela sintetizados nas seguintes conclusões:
“O entendimento vertido no douto despacho recorrido da Lei do
Arrendamento Rural – artigo 28.º – é inconstitucional, violando os artigos 3.º
e 13.º da CRP.
Efectivamente, viola os princípios da igualdade e legalidade na
aplicação que faz do artigo 28.º do regime do arrendamento rural.
Por outro lado, viola os princípios legais consagrados na lei,
artigos 8.º, 9.º, 10.º e 11.º do Código Civil.
Abstém‑se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei,
conferindo aos agravados direitos que não resultam da letra da lei e que
manifestamente prejudicam a agravada.
Não procurando interpretar a lei e o porquê do estabelecimento do
prazo de 30 dias para depósito do preço estabelecido no artigo 28.º do regime do
arrendamento rural.
Por outro lado, retira da lei pensamento legislativo que não tem na
letra da lei um mínimo de correspondência verbal quando exige que a agravante
notifique os agravados para depositarem o preço e só o façam quando a agravante
lhe entregue os bens, esquecendo que o arrendamento se mantém em vigor e que
podem existir razões para a agravante exercer o direito de retenção.
Resulta, pois, claro que o direito dos agravados caducou por falta
do cumprimento da lei.
Os agravados deveriam ter depositado o preço 30 dias após o trânsito
em julgado da sentença de 22 de Junho de 2007.
Por fim, resulta claro que a Meritíssima Juiz a quo não fundamenta o
seu douto despacho nos termos legais.
Usa da arbitrariedade e não confere à sua decisão um mínimo de
certeza jurídica e clara definição dos princípios jurídicos que a regem.
A agravante usa nos fundamentos alegados na oposição as condições
previstas no artigo 814.º do CPC.
O que acontece é que a Meritíssima Juiz a quo decide de mérito, sem
dar oportunidade à agravante de utilizar todos os procedimentos normais de um
processo para fazer jus aos fundamentos que invoca e colocá‑los perante o
contraditório de uma audiência de julgamento.
A Meritíssima Juiz a quo não indefere liminarmente a oposição.
Ela toma sobre ela uma posição a que chama indeferimento liminar.
Não existe título executivo.
A sentença dada à execução não tem a virtualidade de «despejar» a
agravante dos prédios constantes do arrendamento de que é titular.
O título é inexequível.
Existe causa prejudicial.
A denúncia do contrato de arrendamento feito pelos agravados para
exploração directa é objecto de acção já intentada pela agravante.
A sua procedência tem eficácia ex tunc.
O despejo põe em causa a subsistência da agravante, diminuindo
totalmente os seus proventos e essa diminuição não pode ser compensada com novo
arrendamento.
Atente‑se à provecta idade da agravante e o arrendamento ser o seu
único meio de subsistência.
Título executivo é a sentença ou o seu translado, o que não se
verifica in casu – artigo 47.º do CPC.
E superveniente verifica‑se a caducidade do direito dos agravados
pelo não depósito do valor dos prédios em que a agravante preferiu.
A Meritíssima Juiz a quo viola o dever de julgar e o dever de
obediência à lei.
A inconstitucionalidade foi devidamente alegada nas peças
processuais e durante o processo.
Viola a douta decisão do Exmo. Juiz Conselheiro Relator os artigos
20.º e 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa, 660.º, n.º 2,
664.º, 668.º, n.º 1, alíneas b) e d), e 669.º, n.º 2, do Código de Processo
Civil.
Nestes termos, nos de direito e com o sempre mui douto suprimento de
V. Ex.as, deve a douta decisão do Ex.mo Juiz Conselheiro que não conhece do
presente recurso ser revogada e substituída por outra que conheça do mesmo,
seguindo-se os ulteriores termos legais até final.”
1.3. Os recorridos não apresentaram resposta.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. A decisão ora reclamada considerou o recurso
interposto para o Tribunal Constitucional inadmissível (o que determinou o não
conhecimento do seu objecto) face à constatação de a recorrente nunca ter
suscitado, perante o tribunal recorrido, em termos processualmente adequados,
uma questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade (por violação de lei com
valor reforçado) normativas, isto é, nunca ter imputado a uma norma de direito
ordinário (ou a uma interpretação normativa extraída desse direito e
identificada com o mínimo de precisão) a violação de normas ou princípios
constitucionais ou a violação de uma lei com valor reforçado (que a recorrente
jamais indicou qual fosse).
O fundamento da decisão de não conhecimento do recurso
não é, em rigor, atacado pela reclamante, que jamais indicou os locais onde
teria suscitado, perante o tribunal recorrido, em termos processualmente
adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa ou qualquer
questão de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, nunca tendo
identificado qual seria esta lei como valor reforçado.
Na presente reclamação, a reclamante continua a imputar
directamente às decisões judiciais das instâncias, em si mesmas consideradas, a
errada interpretação e aplicação de normas de direito ordinário, fazendo
assentar neste “erro” a violação dos princípios da igualdade e legalidade na
aplicação da lei, para além de as considerar desprovidas de fundamentação, tudo
questões inidóneas para integrar o objecto do recurso para o Tribunal
Constitucional, pelo que, sem necessidade de considerações complementares, se
impõe o indeferimento da reclamação.
3. Termos em que acordam em indeferir a presente
reclamação, confirmando a decisão sumária reclamada.
Custas pela recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em
20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 30 de Julho de 2009.
Mário José de Araújo Torres
João Cura Mariano
Rui Manuel Moura Ramos