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Processo n.º 155/09
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, a Relatora proferiu a seguinte decisão sumária:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público,
foi interposto recurso, ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea b), da CRP e do
artigo 70º, n.º 1, alínea b) da LTC, do acórdão proferido, em conferência, pela
Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça, em 21 de Janeiro de 2009 (fls.
3437 a 3439), bem como do despacho proferido pelo Relator, em 09 de Fevereiro de
2009 (fls. 3447), que julgou legalmente inadmissível a reclamação para a
conferência daquele acórdão.
Do requerimento de interposição de recurso não consta a identificação específica
de qual ou quais a(s) norma(s) reputada(s) de inconstitucional(ais), nem tão
pouco a identificação da peça processual na qual teria sido suscitada qualquer
inconstitucionalidade normativa, alegando o recorrente que as decisões
recorridas constituíram decisões-surpresa.
Cumpre, então, apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do Relator junto do tribunal
“a quo” (cfr. fls. 3453), com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa
decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do
mesmo preceito legal, pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos
todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A
e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator constatar que não foram preenchidos os pressupostos de interposição
de recurso, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta
do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
3. A título introdutório, importa notar que a ausência de indicação de quais as
normas reputadas de inconstitucionais e da peça processual na qual se invocou a
inconstitucionalidade das mesmas permitiria, em tese, a formulação de convite
para aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso, nos termos do
n.º 6 do artigo 75º-A da LTC. Sucede, porém, que no caso concreto em apreço nos
autos, constata-se que mesmo que o recorrente indicasse tais normas, não seria
possível conhecer-se do objecto de tal recurso, em função de outros pressupostos
que se encontram por preencher.
Assim, o eventual convite ao aperfeiçoamento revelar-se-ia sempre como
processualmente inútil, na medida em que jamais seria apto a afastar a proibição
legal de conhecimento do recurso interposto. Como tal, a Relatora absteve-se de
tal convite ao aperfeiçoamento, em homenagem ao princípio da celeridade
processual, ao qual este Tribunal se encontra particularmente vinculado.
Vejamos, então, a razão decisiva que obsta ao conhecimento do objecto do
presente recurso.
4. Através do presente recurso, interposto em 12 de Fevereiro de 2009, pretende
o recorrente impugnar o acórdão proferido pelo tribunal “a quo”, em 21 de
Janeiro de 2009, que, por sua vez, se lhe presume notificado em 26 de Janeiro de
2009, por força do artigo 254º, n.º 3, do CPC, aplicável “ex vi” artigo 4º do
CPP. Simultaneamente, pretende o recorrente que o recurso interposto abranja
igualmente o despacho proferido pelo Relator junto do tribunal recorrido, em 09
de Fevereiro de 2009, que se lhe presume notificado em 09 de Fevereiro de 2009.
Deste modo, aparenta ter entendido o recorrente que ambas decisões formam um
bloco decisório homogéneo, passível de recurso para o Tribunal Constitucional.
Porém, tal assim não é, efectivamente.
Conforme decorre da jurisprudência constante deste Tribunal, a apresentação de
peças processuais legalmente inadmissíveis não é apta a fazer suspender ou
interromper o prazo para interposição de recurso com fundamento na
inconstitucionalidade de normas (a mero título de exemplo, ver Acórdãos n.º
1/2004, de 07 de Janeiro de 2004, n.º 173/2007, de 30 de Março de 2007, e n.º
437/2007, de 03 de Agosto de 2007, n.º 72/08, de 11 de Fevereiro de 2008, todos
disponíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/).
Ora, o despacho do Relator junto do tribunal recorrido é inequívoco ao afirmar a
inadmissibilidade legal da alegada “reclamação para a conferência” de acórdão
proferido por essa mesma conferência (cfr. fls. 3447). Assim, torna-se evidente
que o prazo de 10 dias (artigo 75º, n.º 1, da LTC) para interposição de recurso
do acórdão presumidamente notificado ao recorrente, em 26 de Janeiro de 2009, já
se encontrava expirado em 05 de Fevereiro de 2009, só podendo ser praticado
sujeito ao pagamento de multa até 09 de Fevereiro de 2009, nos termos do artigo
145º, n.º 5, do CPC, aplicável “ex vi” artigo 69º da LTC. A assim apelidada
“reclamação” (fls. 3442 a 3445) não é apta a suspender ou interromper o prazo de
interposição de recurso do acórdão proferido em 21 de Janeiro de 2009.
Tendo o recurso sido interposto, em 12 de Fevereiro de 2009, torna-se
inultrapassável a sua intempestividade, por violação do prazo fixado pelo n.º 1
do artigo 75º da LTC.
5. Por último, mesmo que se equacionasse apenas a possibilidade de recurso do
despacho de fls. 3447, sempre se diria que, tendo sido interposto recurso ao
abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, seria forçoso que o
recorrente tivesse cumprido o ónus de suscitação prévia e adequada da questão de
inconstitucionalidade normativa que pretendia agora ver apreciada, conforme
impõe o n.º 2 do artigo 72º da LTC.
Independentemente de o recorrente não ter identificado quais as normas que
reputa de inconstitucionais – tal como aplicadas pelo despacho ora em apreço –,
conclui-se, sem qualquer margem para dúvidas, que a decisão em causa não se
reveste de qualquer carácter surpreendente, insólito ou objectivamente
imprevisível. Decorre directamente da letra da lei processual penal (cfr. artigo
417º, n.ºs 6 e 7, do CPP) que apenas as decisões do Relator são susceptíveis de
reclamação para a conferência, pelo que era evidente e objectivamente
antecipável o sentido da decisão de fls. 3447.
Como tal, sem sequer ser necessário convidar o recorrente a especificar qual a
concreta dimensão normativa que reputa inconstitucional, torna-se imperioso
concluir pela impossibilidade legal de conhecimento do objecto do presente
recurso, seja quanto ao acórdão proferido em 21 de Janeiro de 2009, por
intempestividade do mesmo face ao prazo previsto no n.º 1 do artigo 75º da LTC,
seja quanto ao despacho proferido pelo Relator em 04 de Fevereiro de 2009, por
não ter sido previamente suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa, conforme imposto pelo n.º 2 do artigo 72º da LTC.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A
da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º
13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se não conhecer do objecto do presente
recurso.
Custas devidas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 7
UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de
Outubro.»
2. Inconformado com esta decisão, vem o recorrente reclamar, para a conferência,
contra a não admissão do recurso, nos seguintes termos:
«Salvo o devido e muito respeito o recorrente não pode concordar com a
fundamentação da decisão sumária ora sob censura .
Pois, analisando a motivação do recurso, afigura-se-lhe ter cumpri[do] todos os
requ[i]sitos de interposição de recurso para o TC, indicando as normas que
reputou inconstitucionais .
Senão vejamos :
“Como nota prévia convirá referir que a questão da constitucionalidade normativa
objecto do presente recurso, não foi anteriormente suscitada, na medida em que
tanto a presente decisão como a resposta à arguição de nulidades foram decisões
“surpresa” relativamente às quais não era possível a arguição prévia, por falta
de oportunidade processual (cfr., entre muitos outros, os Acs. N.º 136/85 – DR,
II Série de 21/01/1986; 391/89 – DR, II Série, de 10 de Setembro de 1989; 47/90
– DR, II Série, de 6 de Julho de 1990; 51/90 – DR, II Série, de 12 de Julho de
1990).
Pelo que Vª. Exa. devem julgar inconstitucional, por violação do art.º 32º, n.º1
da CRP interpretação das normas supra feita pelo Tribunal “a quo”.
Em face do exposto não se enxerga o motivo pelo qual consta da decisão sumária
ora sob reclamação … “ que a decisão em causa não se reveste de qualquer
carácter surpreendente, insólito ou objectivamente imprevisível”» (fls. 3483 e
3484).
3. Notificado da reclamação, para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 77º da
LTC, a recorrida veio pronunciar-se no seguinte sentido:
«1º
A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2°
Na verdade, tal reclamação apenas consubstancia uma discordância genérica em
relação ao decidido, não sendo invocados quaisquer argumentos que possam abalar
os fundamentos de decisão reclamada, quer no que toca à intempestividade do
recurso, quer quanto à evidente inverificação dos pressupostos desse mesmo
recurso.» (fls. 3489)
Cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. É flagrante a ausência de argumentos empregues pelo ora reclamante para
colocar em crise a bondade da decisão reclamada.
Por um lado, o reclamante não ataca – de modo algum – o fundamento da
intempestividade na interposição do recurso, o que, só por si, já justificaria a
subsistência da decisão reclamada.
Por outro lado, mesmo quanto à falta de suscitação das questões normativas
objecto de recurso, o ora reclamante persiste em afirmar que a decisão do
tribunal “a quo” constituiu uma decisão-surpresa – ao contrário do que
fundamentadamente foi decidido na decisão reclamada –, sem que venha acrescentar
qualquer argumento nesse sentido.
É assim flagrante a total inexistência de argumentos passíveis de conduzir a uma
reforma da decisão alvo de reclamação, razão pela qual mais não se faz que
confirmá-la.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo
78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei
n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s, nos
termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 12 de Maio de 2009
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão