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Processo n.º 590/09
2ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
A., foi condenado no processo comum colectivo n.º 1923/99, do 1.º Juízo Criminal
do Tribunal de Matosinhos, pela prática de um crime de ofensa à integridade
física grave, agravado pelo resultado, p.p. pelos artigos 144.º, d), 145.º, n.º
1, b), e 146.º, com referência aos artigo 132.º, n.º 1 e 2, b), d) e g), todos
do Código Penal, na pena de 8 anos de prisão, por acórdão proferido em 28-2-2003.
Recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 8-7-2004, negou
provimento ao recurso
Desta decisão recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão
proferido em 16-11-2005, anulou o acórdão do Tribunal da Relação por falta de
fundamentação.
O Tribunal da Relação do Porto proferiu então novo acórdão, em 29/3/2006, em que
voltou a negar provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão da 1.ª
instância.
O arguido voltou a recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão
proferido em 20-11-2008, concedeu provimento parcial ao recurso, condenando o
arguido numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão.
Interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional por requerimento
apresentado em 26-3-2009, nos seguintes termos:
I. Questão prévia ? justo impedimento.
1º No passado dia 2 de Fevereiro de 2009, foi a mandatária do recorrente, ora
signatária, notificada do douto acórdão de aclaração ao acórdão anteriormente
prolatado.
2º Nos termos do disposto no art.º 75º da Lei 28/82 de 15 de Novembro, o prazo
para a interposição de recurso é de 10 dias.
3º Prazo esse que terminou, no passado dia 17 de Fevereiro, isto tendo em conta
a dilação referida no art. 145º n.º 5 do Código do Processo Civil.
4º Pelo que, em condições normais, estaria já expirado o prazo para a
interposição do presente recurso.
5º Contudo, prevê o n.º 4 do artº 145º e o artº 146º, que o acto processual
possa ser praticado fora do prazo, em caso de justo impedimento.
6º É precisamente o caso, uma vez que a signatária, desde o passado dia 9 de
Fevereiro de 2009 e até ao dia 20 de Fevereiro, inclusive, se encontrou
totalmente impedida, por motivos de saúde, de trabalhar, fruto de uma patologia
grave de que padece ? cfr. atestado médico, em anexo.
7º Assim, só agora se encontra minimamente em condições de regressar ao trabalho
e assim interpor o presente recurso.
Pelo que se requer, seja considerado verificado o justo impedimento e nessa
conformidade seja a exponente admitida a praticar o acto nesta altura, como
tendo sido efectivamente praticado dentro do prazo legal.
II Dos factos
8º Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma ínsita no art.º 50º n.º
1 do Código Penal, na interpretação acolhida na decisão recorrida, porquanto,
atendendo a que, de acordo com a nova versão dada pela Lei 59/07 de 4 de
Setembro, que admite a suspensão da execução da pena de prisão, reunidos os
demais pressupostos, em penas inferiores a cinco anos de prisão, decidindo o
Supremo Tribunal de Justiça directamente pela aplicação da lei mais favorável, (como
é o caso da nova lei, e como impõe o art.º 29º n.º 4 da CRP e o art.º 2º n.º 4
do CP), estar-se ia a impedir um grau de recurso o que contraria o direito reconhecido
em sede constitucional desde a Lei n.º 1/1997, com a inclusão na parte final ?incluindo
o recurso? no n.º 1 do artº 32º da CRP.
9º O Supremo Tribunal de Justiça, deveria ter ordenado a remessa dos autos a um
Tribunal inferior para que este fizesse a aplicação da lei mais favorável, um
pouco à imagem da situação prevista no art.º 371 al. a) do CPP, facultando assim
ao arguido a possibilidade de recurso, tal como prevê o n.º 1 do art.º 32 da CRP.
10º É que, desta aplicação da lei mais favorável, tendo sido efectuada pelo
Supremo Tribunal de justiça, não poderá caber qualquer recurso, dado tratar-se
do Tribunal hierarquicamente superior, em termos de recurso.
11º Pretende o arguido ver apreciada a inconstitucionalidade da referida norma
ínsita no art.º 50º n.º 1 do Código Penal, desta feita tendo em conta a
interpretação que lhe é dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que dispondo
o referido artigo que, para além do requisito formal de a pena aplicada não ser
superior a cinco anos de prisão, exige que, atendendo à personalidade do agente,
às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às
circunstâncias deste, se possa fazer um juízo de prognose favorável no sentido
de se concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de
forma adequada e suficiente as finalidades de punição, que são, como se sabe a
tutela dos bens jurídicos e a reinserção social do condenado.
12º Ora, tendo em conta que o crime ocorreu há cerca de 10 anos.
13º Que o recurso para o tribunal de Justiça foi interposto muito antes da
entrada em vigor da lei 59/07 de 4 de Setembro.
14º Logo este Colendo Tribunal não possuía elementos suficientes acerca da
personalidade dos arguidos, das suas vidas posteriores à prática do crime, nem
das suas condições de vida, que poderiam ser, eventualmente, objecto de um
relatório social.
15º Por outro lado, o momento para atender à ponderação da possibilidade de
suspender ou não a execução da pena é o momento da decisão e não o da prática do
crime ? Figueiredo Dias, Direito Penal Português, as consequências jurídicas do
crime ? pelo que mais premente se imporão as informações actualizadas.
16ºPelo que deveria o Supremo Tribunal de Justiça ordenar ao Tribunal de
primeira Instância que, em cumprimento do disposto no art.º 371º-A do CPP,
reabrisse a audiência e ordenasse a produção de prova e decisão sobre a
possibilidade de suspensão da pena de prisão aplicada.
17º Ao não decidir desta forma, violou o Supremo Tribunal de Justiça, além da
denegação do direito ao recurso, já acima elencado, o disposto no art.º 32º n.º
1, da CRP, porquanto não foram asseguradas todas as garantias de defesa ao
arguido, muito menos o direito ao recurso, tendo ainda sido violado o vertido no
art.º 18º da CRP, porquanto, com esta decisão, foram violados direitos liberdades
e garantias do arguido.
18º Face ao exposto, deverá ser ordenada a remessa dos autos ao Tribunal de
primeira instância para que seja realizada produção de prova quanto às condições
dos arguidos, nomeadamente relatórios sociais actualizados, podendo-se então
ponderar devidamente a suspensão, ou não, da pena de prisão aplicada aos
arguidos.
19º Com base em informação actualizada.
20º E desta forma, atendendo a que se procede à aplicação de lei mais favorável
por parte de um Tribunal inferior, conferir aos arguidos o direito constitucionalmente
consagrado, ao recurso.
21º Bem como às demais garantias de defesa.
22º A norma consagrada no art.º 50º n.º 1 do CP, da forma que o foi, é violadora
do disposto no art.º 32º n.º 1 da CRP.
23º A questão da inconstitucionalidade não foi antes suscitada, porquanto, na
data em que foi intentado o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, não
tinha ainda entrado em vigor a Lei 59/07 de 4 de Setembro, não se colocando
nessa altura a questão da aplicação de uma Lei mais favorável.
24º Nem sendo de prever que o Tribunal Recorrido faria a interpretação e
aplicação da lei da forma que o fez.
25º Ora, os Tribunais não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na
Constituição, nem os princípios nela consignados ? art.º 204º da CRP.
O presente recurso sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito
suspensivo de todo o processado.?
O Conselheiro Relator proferiu despacho de não admissão do recurso com os
seguintes fundamentos:
1. O recurso foi interposto fora de prazo e quando já havia transitado em
julgado a decisão recorrida.
É certo que a Ex.ma mandatária do arguido alega justo impedimento para praticar
o acto fora de prazo. Esse impedimento consistiu em a referida mandatária se ter
encontrado doente entre o dia 9/02/2009 e o dia 20/02/2009, referindo o atestado
médico junto, datado daquele último dia, que a mesma «não pode comparecer de 09.02.09
a 09.02.20 inclusive», estando «totalmente impossibilitada por ter patologia
grave lombar em fase aguda informada por TAC» e outros exames.
Ora, como diz o Ministério Público junto deste Tribunal, ouvido sobre o alegado
justo impedimento, a requerente «entre o dia 9 e o dia 13 de Fevereiro, data em
que transitou o acórdão, teve 4 dias, mais 3 dias úteis (a que se refere o art.
145.º, n.º 6 do Código de Processo Civil e 107.º, n.º 5 do Código de Processo
Penal) para providenciar pela prática do acto, nomeadamente substabelecendo
noutro advogado.» No entanto, não o fez.
O atestado médico certifica que a Ex.ma mandatária estava «impossibilitada de
comparecer». Porém, para interpor recurso não se tomava necessário comparecer em
tribunal. Bastava efectuar um requerimento e expedi-lo por fax para o tribunal,
podendo tal acto ser praticado mesmo em casa pelo próprio advogado ou por outra
pessoa (mesmo não advogada ou jurista) a quem fosse ditado o teor do
requerimento, aliás, muito simples. Em último caso, podia a Ex.ma mandatária ter
substabelecido noutro advogado, que é para isso que serve o substabelecimento.
Este circunstancialismo não configura, pois, justo impedimento.
2. Independentemente do alegado justo impedimento, o recurso para o Tribunal
Constitucional não é de admitir.
Com efeito, não foi suscitada durante o processo a inconstitucionalidade arguida.
Alega o arguido recorrente que, quando interpôs o recurso, ainda não estava em
vigor a nova redacção do art. 50.º do Código Penal, que só foi introduzida com o
DL 59/07, de 4 de Setembro e que não era de prever que este Tribunal faria a
interpretação e aplicação da lei da forma que o fez.
Ora, nada impedia que, quando a lei entrou em vigor, o recorrente viesse
requerer a aplicação do novo art. 50.º do CP, tanto mais que a sua posição no
recurso foi sempre a de a factualidade provada não enquadrar o crime de ofensa à
integridade física qualificada de que resulta a morte (arts. 146º al. d), 145º n.º
1 al. b) e 146º com referência ao art. 132º n.º 1 e 2 als. b), d) e g), -
actualmente 144.º, alínea d), 145.º, n.ºs 1 b) e 2, com referência ao art. 132,
n.ºs 1 e 2, alíneas c), e) e h) e art. 147, n.º 1, todos do CP), mas sim o crime
de ofensa à integridade física simples, do art. 143º n.º 1. E como já passava
muito tempo sobre a data do crime, prevendo a necessidade de actualização dos
dados relativos à sua personalidade, podia até requerer a remessa do processo à
1ª instância, nos termos por si defendidos, para reabertura da audiência em
conformidade com o preceituado no art. 371.º do CPP, com o intuito de se
complementar a prova com vista à aplicação da suspensão da execução da pena
previsivelmente aplicável (esta nunca seria superior a 5 anos, na perspectiva do
recorrente), sustentando logo a inconstitucionalidade de interpretação contrária.
3. Acresce que a não aplicação do art. 50.º (suspensão da execução da pena) não
tem nada de imprevisto, pois essa aplicação depende da verificação de
pressupostos ? um de ordem formal e outro, de ordem material ? segundo a
interpretação que o tribunal fizer, de acordo, fundamentalmente, com a satisfação,
que julgue ou não assegurada, das finalidades da punição. Sempre assim foi,
tanto na nova como na velha redacção desse normativo.
4. Por último, o recorrente não enuncia o sentido em que o tribunal interpretou
a referida norma pressupostamente em violação do direito constitucional de
defesa, limitando-se a pedir ao Tribunal Constitucional um reexame do decidido,
em termos de um vulgar recurso ordinário. Ou seja, o que ele pretende é que se
sindique a decisão, em termos de uma revogação do decidido, o que está
manifestamente fora dos poderes daquele Tribunal?.
Após ter requerido a aclaração desta decisão, o que lhe foi indeferido, reclamou
da mesma, apresentando as seguintes razões:
1º O Recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão
prolatado pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça.
2º Tal recurso, tem por base um crime pelo qual foi condenado e que foi
praticado em 9 de Junho de 1999, ou seja, há cerca de 10 anos.
3º Ao longo destes dez anos, tendo o processo sido iniciado com uma acusação de
homicídio qualificado, p. p. pelos artºs 131º e 132º al. b), d), e g), todos do
CP, foi a qualificação jurídica alterada para o crime de ofensa à integridade
física grave, agravado pelo resultado e pelas circunstâncias p. p. pelos art.ºs
144º al. d) 145º al. b) e 146º com referência ao art.º 132º n.º 1 e 2 al. b), d)
e g), todos do CP, tendo sido condenados na pena de 8 anos de prisão.
4º Esta qualificação jurídica e pena foram mantidas pelo Venerando Tribunal da
Relação do Porto;
5º Interposto Recurso para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça, veio o mesmo
anular o douto acórdão, com base na manifesta falta de fundamentação do mesmo.
6º Tendo os autos descido novamente ao Tribunal da Relação do Porto, onde teriam
sido corrigidos os vícios apontados, foi mantida quer a qualificação jurídica,
quer a pena aplicada, os 8 anos de prisão.
7º Uma vez mais, inconformados com a douta decisão, em 3 de Maio de 2006, vieram
os arguidos interpor novo recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, ou seja,
muito antes da entrada em vigor da Lei 49/2007 de 4 de Setembro.
8º Relativamente a este recurso, veio o Supremo Tribunal de Justiça proceder a
uma alteração da qualificação jurídica, diminuindo ainda, de forma substancial,
a pena aplicada aos arguidos, condenando-os, desta feita, numa pena de 4 anos e
seis meses de prisão.
9º Tendo um dos Juízes Conselheiros, Ex.mo Senhor Dr. Jorge Soares Ramos,
lavrado voto de vencido, em sentido mais favorável aos arguidos, defendendo em
suma o seguinte:
?Parece-me, então, nas circunstâncias concretas do caso ? particularmente na
consideração de que tanto ocorreu há cerca de 9 anos de 5 meses, sendo aqueles,
para mais, arguidos primários, de resto nunca sequer preventivamente presos, e
encontrando-se, além disso, integrados muito favoravelmente, nos planos social,
laboral e familiar -, que as finalidades de punição seriam ainda observadas ?
direi, mesmo, melhor observadas ? se se procedesse à aplicação de penas
privativas de liberdade menos expressivas (em torno dos 3 anos de prisão); e,
alem disso, no exercício até de um ?poder-dever?, se se declarasse a suspensão
da pertinente execução, subordinadamente, nos termos dos art.ºs 50º n.º 1, 2 e 3
e 51º n.º 1 als. a) e c) e 4 do CP, ao cumprimento da obrigação ressarcitória (em
prazo não superior a 2 meses) à entrega a instituição privada de segurança
social vocacionada para o apoio a cidadãos pobres e socialmente desenraizados,
anualmente, de uma outra quantia em dinheiro (porventura em torno dos 1.000,00?)
e à livre afectação das suas disponibilidades laborais comuns, durante metade do
normal período de férias, em beneficio da mesma instituição, ao jeito de
trabalho comunitário, ficando a imposição dos dois últimos deveres submetida a
fiscalização dos serviços de reinserção social.?
10º Como se vê, este processo, já com cerca de 10 anos é extremamente complexo e
tem sido marcado por diversos avanços e recuos.
11º O que levou a que por diversas vezes tivessem sido alteradas decisões
anteriormente tomadas e mesmo assim não exista unanimidade quanto às mesmas.
12º Acontece que foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, tendo
por base os seguintes fundamentos:
??
II Dos factos
8º Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma ínsita no art.º 50º n.º
1 do Código Penal, na interpretação acolhida na decisão recorrida, porquanto,
atendendo a que, de acordo com a nova versão dada pela Lei 59/07 de 4 de
Setembro, que admite a suspensão da execução da pena de prisão, reunidos os
demais pressupostos, em penas inferiores a cinco anos de prisão, decidindo o
Supremo Tribunal de Justiça directamente pela aplicação da lei mais favorável, (como
é o caso da nova lei, e como impõe o art.º 29º n.º 4 da CRP e o art.º 2º n.º 4
do CP), estar-se ia a impedir um grau de recurso o que contraria o direito reconhecido
em sede constitucional desde a Lei n.º 1/1997, com a inclusão na parte final ?incluindo
o recurso? no n.º 1 do artº 32º da CRP.
9º O Supremo Tribunal de Justiça, deveria ter ordenado a remessa dos autos a um
Tribunal inferior para que este fizesse a aplicação da lei mais favorável, um
pouco à imagem da situação prevista no art.º 371 al. a) do CPP, facultando assim
ao arguido a possibilidade de recurso, tal como prevê o n.º 1 do art.º 32 da CRP.
10º É que, desta aplicação da lei mais favorável, tendo sido efectuada pelo
Supremo Tribunal de justiça, não poderá caber qualquer recurso, dado tratar-se
do Tribunal hierarquicamente superior, em termos de recurso.
11º Pretende o arguido ver apreciada a inconstitucionalidade da referida norma
ínsita no art.º 50º n.º 1 do Código Penal, desta feita tendo em conta a
interpretação que lhe é dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que dispondo
o referido artigo que, para além do requisito formal de a pena aplicada não ser
superior a cinco anos de prisão, exige que, atendendo à personalidade do agente,
às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às
circunstâncias deste, se possa fazer um juízo de prognose favorável no sentido
de se concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de
forma adequada e suficiente as finalidades de punição, que são, como se sabe a
tutela dos bens jurídicos e a reinserção social do condenado.
12º Ora, tendo em conta que o crime ocorreu há cerca de 10 anos.
13º Que o recurso para o tribunal de Justiça foi interposto muito antes da
entrada em vigor da lei 59/07 de 4 de Setembro.
14º Logo este Colendo Tribunal não possuía elementos suficientes acerca da
personalidade dos arguidos, das suas vidas posteriores à prática do crime, nem
das suas condições de vida, que poderiam ser, eventualmente, objecto de um
relatório social.
15º Por outro lado, o momento para atender à ponderação da possibilidade de
suspender ou não a execução da pena é o momento da decisão e não o da prática do
crime ? Figueiredo Dias, Direito Penal Português, as consequências jurídicas do
crime ? pelo que mais premente se imporão as informações actualizadas.
16º Pelo que deveria o Supremo Tribunal de Justiça ordenar ao Tribunal de
primeira Instância que, em cumprimento do disposto no art.º 371º-A do CPP,
reabrisse a audiência e ordenasse a produção de prova e decisão sobre a
possibilidade de suspensão da pena de prisão aplicada.
17º Ao não decidir desta forma, violou o Supremo Tribunal de Justiça, além da
denegação do direito ao recurso, já acima elencado, o disposto no art.º 32º n.º
1, da CRP, porquanto não foram asseguradas todas as garantias de defesa ao
arguido, muito menos o direito ao recurso, tendo ainda sido violado o vertido no
art.º 18º da CRP, porquanto, com esta decisão, foram violados direitos liberdades
e garantias do arguido.
18º Face ao exposto, deverá ser ordenada a remessa dos autos ao Tribunal de
primeira instância para que seja realizada produção de prova quanto às condições
dos arguidos, nomeadamente relatórios sociais actualizados, podendo-se então
ponderar devidamente a suspensão, ou não, da pena de prisão aplicada aos
arguidos.
19º Com base em informação actualizada.
20º E desta forma, atendendo a que se procede à aplicação de lei mais favorável
por parte de um Tribunal inferior, conferir aos arguidos o direito constitucionalmente
consagrado, ao recurso.
21º Bem como às demais garantias de defesa.
22º A norma consagrada no art.º 50º n.º 1 do CP, da forma que o foi, é violadora
do disposto no art.º 32º n.º 1 da CRP.
23º A questão da inconstitucionalidade não foi antes suscitada, porquanto, na
data em que foi intentado o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, não
tinha ainda entrado em vigor a Lei 59/07 de 4 de Setembro, não se colocando
nessa altura a questão da aplicação de uma Lei mais favorável.
24º Nem sendo de prever que o Tribunal Recorrido faria a interpretação e
aplicação da lei da forma que o fez.
25º Ora, os Tribunais não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na
Constituição, nem os princípios nela consignados ? art.º 204º da CRP.
O Ministério Público pronunciou-se sobre esta reclamação nos seguintes termos:
Quanto ao recurso para este Tribunal ter sido interposto fora de prazo,
concordamos inteiramente com o que consta do despacho de não admissão
complementado pelo de fls. 57 a 60.
Na verdade, quer as razões invocadas pelo reclamante, quer a prova apresentada
não permitem concluir que tenha havido justo impedimento no cumprimento do prazo.
2. Quanto a não ter sido interiormente suscitada a questão de inconstitucionalidade,
dizemos o seguinte:
Tendo a Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro, entrado em vigor já após ter sido
interposto e motivado o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, parece-nos
duvidoso que seja exigível que o recorrente tivesse de utilizar um requerimento
autónomo para suscitar a questão de inconstitucionalidade.
No entanto, se ele tivesse utilizado essa via e, nesse requerimento não
suscitasse a questão, então teria perdido a oportunidade para o fazer (cfr.
nesse sentido o recente Acórdão nº 352/2009).
De qualquer forma, se não ante, pelo menos depois do Acórdão ele poderia e
deveria ter confrontado o Supremo com tal questão, uma vez que hoje, mesmo após
o trânsito, pode-se pugnar pela aplicação da lei penal mais favorável (artigo
371º-A do CPP).
3. A reclamante, no requerimento de interposição do recurso para este Tribunal,
sustenta que, após a nova redacção dada ao artigo 50º do Código Penal pela Lei
nº 59/2007, o Supremo Tribunal de Justiça deveria ter remetido o processo à 1ª
instância para aí ser apreciada a eventual suspensão de execução da pena.
No entanto, apesar de referida a Constituição, o reclamante não dá à questão um
carácter normativo, acabando mesmo por dizer que ?ao não decidir desta forma,
violou o Supremo Tribunal de Justiça, além da denegação do direito ao recurso
(?), o disposto no artigo 32º, nº 1, do CPP (?) tendo ainda sido violado o
sentido no artigo 18º do CPP (?)? (fls. 35).
4. Por tudo o exposto, deve a reclamação ser indeferida.
O recorrente respondeu, alegando o seguinte:
1º Em nosso modesto entendimento encontra-se perfeitamente verificado o justo
impedimento, tal qual este é previsto pelo art. 146º do CPC, pelo que se
discorda do doutamente promovido pelo Ministério Publico, bem como pela decisão
reclamada.
2º A sujeição, por parte da mandatária do reclamante, a uma delicada cirurgia à
coluna lombar, com o consequente período de reconvalescença, durante o qual a
mesma ficou absolutamente impedida de trabalhar e mesma de se deslocar ao seu
escritório constitui, em nosso modesto, uma das mais evidentes razões para
justificar o justo impedimento.
3º Aliás, mesmo para quem não tem grandes conhecimentos médicos e apenas com
recurso ao senso comum, não podem restar grandes dúvidas acerca da delicadeza de
tal intervenção cirúrgica, bem como das gravosas consequências de um deficiente
pós operatório, as quais podem inclusivamente passar por uma paralisia, total ou
parcial.
4º Pelo que exigir que no imediato pós-operatório a mandatária realiza-se
qualquer esforço físico, ainda que diminuto, no sentido de desenvolver a sua
actividade profissional, seria quase desumano, mesmo tendo em conta a gravidade
dos factos constantes dos presentes autos.
5º Perguntar-se-á assim, se não é para este tipo de situações, então qual o
fundamento da norma que admite o justo impedimento.
6º Será apenas aplicável aos casos de morte?
7º Finalmente, e no que respeita à questão da inconstitucionalidade suscitada, a
qual apenas surge com a alteração legislativa posterior à interposição e
fundamentação do recurso.
8º Mais, com a prolação do acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, e em sede
de pedido de aclaração do mesmo foi precisamente suscitada a questão da
aplicação da lei mais favorável, o que não foi atendido por aquele Colendo
Tribunal, por considerar que a questão já deveria ter sido suscitada, o que nos
parece que não era exigível.
9º A questão colocada a esse Tribunal Constitucional, foi a questão da violação
do direito ao duplo grau de jurisdição, uma vez que, sendo o Supremo Tribunal,
um Tribunal de ultima instancia, uma sua decisão não admite recurso.
10º A questão, parece-nos que foi de forma inequívoca colocada a esse Tribunal
Constitucional, tendo sido suficientemente enquadrada em termos dos normativos
legais aplicáveis.
11º Pelo que, entendemos que deve a reclamação ser atendida e nessa conformidade
ser admitido o recurso interposto.
12º Tanto mais que a gravidade da situação, tratando-se de toda uma família com
um percurso cívico exemplar, que está em vias de ver confirmada uma pesada pena
de prisão, assim o exige.
13º Não podem meras questões de carácter formal perfeitamente discutíveis,
sobrepor-se à mais importante das razões, a justiça material.
Nestes termos, deve a presente reclamação ser deferida, e nessa conformidade ser
ordenada a admissão do recurso para esse Colendo Tribunal.?
*
Fundamentação
O recorrente apresentou recurso de acórdão do Supremo Tribunal de Justiça para o
Tribunal Constitucional, para além do prazo previsto na lei (o prazo havia
terminado no dia 12-2-2009 e o requerimento foi apresentado no dia 26-2-2009),
invocando que a sua mandatária foi acometida de doença que a impediu de, no
decurso do prazo legal, apresentar o requerimento de recurso.
Juntou atestado onde um médico atesta que aquela mandatária ?não pode comparecer
de 9-2-2009 a 20-2-2009 inclusive por estar totalmente impossibilitada por ter
patologia grave lombar em fase aguda.?
Os actos processuais podem ser praticados pelas partes fora do prazo em caso de
justo impedimento (artigo 145º, n.º 4, do C.P.C.).
Nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do C.P.C., considera-se justo impedimento o
evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que
obste à prática atempada do acto.
O atestado médico apresentado como prova da situação alegada apenas demonstra
que a mandatária do arguido esteve impossibilitada de se deslocar e não de
elaborar o requerimento de interposição de recurso.
Ora, o facto da doença que acometeu a mandatária do arguido, no decurso do prazo
para este interpor recurso, a ter impossibilitado de comparecer no tribunal para
apresentar o respectivo requerimento, não obsta à prática do respectivo acto,
uma vez que essa apresentação pode ser feita por diversos meios que não exigem a
deslocação pessoal ao tribunal recorrido.
Não estando demonstrada uma situação de justo impedimento, o recurso não podia
ser admitido, por ter sido apresentado fora de prazo, pelo que deve ser
indeferida a reclamação apresentada, estando prejudicada a apreciação da questão
da falta de suscitação da questão de constitucionalidade colocada no recurso
apresentado.
*
Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada por A. do despacho que não
admitiu o recurso por ele interposto para o Tribunal Constitucional.
*
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta,
ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 303/98,
de 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
Lisboa, 28 de Setembro de 2009
João Cura Mariano
Joaquim de Sousa Ribeiro
Rui Manuel Moura Ramos