DL n.º 220/95, de 31 de Agosto
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SUMÁRIO
Altera o Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (institui o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais)
_____________________

Decreto-Lei n.º 220/95, de 31 de Agosto
O Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, introduziu no ordenamento jurídico português o regime da fiscalização judicial das cláusulas contratuais gerais. Foi um diploma em regra bem aceite, merecendo, inclusive, o destaque da doutrina estrangeira. Também a sua eficácia prática tem crescido, como se comprova pela própria jurisprudência.
Entretanto, surgiram as orientações comunitárias da Directiva n.º 93/13/CEE, do Conselho, de 5 de Abril, que impôs a adaptação das leis nacionais aos seus princípios. É o objectivo básico deste diploma.
Não se encontrou motivo para grandes alterações da disciplina entre nós consagrada, que, em muitos aspectos, se mostra mais exigente e rigorosa. Apenas se operaram, a bem dizer, ajustamentos ou explicitações.
Todavia, aproveitou-se o ensejo para efectuar, independentemente da directiva, vários retoques que pareceram oportunos. Foram ditados pelos quase 10 anos de vigência do diploma, pela modificação dos condicionalismos económico-sociais e até pela evolução normativa.
Nesta perspectiva, eliminou-se a alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º, que excluía da fiscalização judicial as «cláusulas impostas ou expressamente aprovadas por entidades públicas com competência para limitar a autonomia privada». Não parece que a excepção faça hoje sentido. Na verdade, assiste-se, não só à equiparação tendencial da Administração Pública, enquanto fornecedora de prestações e produtora de bens, aos profissionais da esfera privada, mas também à progressiva desregulamentação dos mercados onde intervêm as empresas abrangidas pelo condicionamento previsto na antiga alínea c). Em consonância, suprimiu-se o n.º 2 do mesmo artigo 3.º, onde se atenuava aquele preceito.
A propósito das cláusulas contratuais gerais proibidas (capítulo V), entendeu-se preferível autonomizar, numa secção introdutória, os anteriores artigos 16.º e 17.º
Efectivamente, trata-se de preceitos comuns, por natureza, às relações entre empresários ou entidades equiparadas e às relações que se estabeleçam com os consumidores finais, ao passo que os previstos para as primeiras são aplicáveis às segundas apenas mercê de remissão do legislador (artigo 20.º).
Além disso, suprimiu-se a alínea h) do artigo 19.º, por se encontrar tacitamente revogada desde a entrada em vigor, para o nosso país, da Convenção sobre a Lei Aplicável às Obrigações Contratuais, assinada em Roma a 16 de Junho de 1980, a que Portugal aderiu através da Convenção do Funchal de 18 de Maio de 1992.
Ficou expresso que a acção inibitória abrange tanto as proibições exemplificadas nos artigos 18.º, 19.º, 21.º e 22.º como quaisquer outras que contrariem o princípio geral da boa-fé, a que se referem os artigos 15.º e 16.º Tal interpretação do artigo 24.º decorria do espírito da lei.
O valor máximo da sanção pecuniária compulsória, fixado pelo artigo 32.º, foi elevado para o dobro da alçada da Relação. Confere-se maior amplitude de decisão ao tribunal e assegura-se, ao longo do tempo, uma actualização automática desse quantitativo.
Desaparece a norma que se ocupava do âmbito de aplicação do diploma no espaço, por se tornar desnecessária à luz das regras de conflitos introduzidas pela aludida Convenção de Roma. Com efeito, perante os dados legislativos actuais, a protecção do adquirente pode alcançar-se mediante uma norma limitadora da escolha da lei (artigo 23.º).
Institui-se o registo das decisões judiciais que tenham proibido o uso ou a recomendação de cláusulas contratuais gerais, assim como das que tenham declarado a nulidade de cláusulas inseridas em contratos singulares. É um meio que assegura conhecimento fidedigno e acessível.
A revisão empreendida reflecte a devida transposição da directiva comunitária que a suscitou, mas sem desconsideração da realidade portuguesa, já contemplada no texto legislativo que a precedeu. Aliás, ao fim e ao cabo, operou-se apenas uma remodelação de parte dos preceitos nele contidos. A técnica correcta da transposição de uma directiva não se reconduz à sua mera reprodução, visto que se impõe integrá-la adequadamente no ordenamento jurídico de cada Estado membro.
Procede-se, em anexo, à publicação integral da versão actualizada do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro. Com isto se pretende tornar mais fácil a consulta do novo texto.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
  Artigo 1.º
Os artigos 1.º, 3.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, passam a ter a seguinte redacção:
Artigo 1.º
Cláusulas contratuais gerais
1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.
2 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.
Artigo 3.º
Excepções
O presente diploma não se aplica:
a) ...
b) ...
c) [Anterior alínea d).]
d) [Anterior alínea e).]
e) [Anterior alínea f).]
Artigo 5.º
Comunicação
1 - ...
2 - ...
3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.

  Artigo 2.º
Os capítulo V, VI e VII do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, passam a ter a seguinte redacção:
CAPÍTULO V
Cláusulas contratuais gerais proibidas
SECÇÃO I
Disposições comuns por natureza
Artigo 15.º
Princípio geral
(Anterior artigo 16.º)
Artigo 16.º
Concretização
(Anterior artigo 17.º)
SECÇÃO II
Relações entre empresários ou entidades equiparadas
Artigo 17.º
Âmbito das proibições
(Anterior artigo 15.º)
Artigo 18.º
Cláusulas absolutamente proibidas
...
Artigo 19.º
Cláusulas relativamente proibidas
São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
e) ...
f) ...
g) ...
h) [Anterior alínea i).]
i) [Anterior alínea j).]
SECÇÃO III
Relações com os consumidores finais
Artigo 20.º
Âmbito das proibições
Nas relações com os consumidores finais e, genericamente, em todas as não abrangidas pelo artigo 17.º aplicam-se as proibições das secções anteriores e as constantes desta secção.
Artigo 21.º
Cláusulas absolutamente proibidas
São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) ...
b) ...
c) ...
d) Excluam os deveres que recaem sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação, ou estabeleçam, nesse âmbito, reparações ou indemnizações pecuniárias predeterminadas;
e) [Anterior alínea d).]
f) [Anterior alínea e).]
g) Modifiquem os critérios de repartição do ónus da prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos;
h) Excluam ou limitem de antemão a possibilidade de requerer tutela judicial para situações litigiosas que surjam entre os contratantes ou prevejam modalidades de arbitragem que não assegurem as garantias de procedimento estabelecidas na lei.
Artigo 22.º
Cláusulas relativamente proibidas
1 - São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) ...
b) ...
c) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado;
d) Estipulem a fixação do preço de bens na data da entrega, sem que se dê à contra parte o direito de resolver o contrato, se o preço final for excessivamente elevado em relação ao valor subjacente às negociações;
e) [Anterior alínea d).]
f) [Anterior alínea e).]
g) Afastem, injustificadamente, as regras relativas ao cumprimento defeituoso ou aos prazos para o exercício de direitos emergentes dos vícios da prestação;
h) Imponham a renovação automática de contratos através do silêncio da contraparte, sempre que a data limite fixada para a manifestação de vontade contrária a essa renovação se encontre excessivamente distante do termo do contrato;
i) Confiram a uma das partes o direito de pôr termo a um contrato de duração indeterminada, sem pré-aviso razoável, excepto nos casos em que estejam presentes razões sérias capazes de justificar semelhante atitude;
j) (Anterior alínea g).]
l) [Anterior alínea h).]
m) [Anterior alínea i).]
n) [Anterior alínea j).]
o) [Anterior alínea l).]
2 - O disposto na alínea c) do número anterior não determina a proibição de cláusulas contratuais gerais que:
a) Concedam ao fornecedor de serviços financeiros o direito de alterar a taxa de juro ou o montante de quaisquer outros encargos aplicáveis, desde que correspondam a variações do mercado e sejam comunicadas de imediato, por escrito, à contraparte, podendo esta resolver o contrato com fundamento na mencionada alteração;
b) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente o conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de resolver o contrato;
3 - As proibições constantes das alíneas c) e d) do n.º 1 não se aplicam:
a) Às transacções referentes a valores mobiliários ou a produtos e serviços cujo preço dependa da flutuação de taxas formadas no mercado financeiro;
b) Aos contratos de compra e venda de divisas, de cheques de viagem ou de vales postais internacionais expressos em divisas.
4 - As alíneas c) e d) do n.º 1 não implicam a proibição das cláusulas de indexação, quando o seu emprego se mostre compatível com o tipo contratual onde se encontram inseridas e o mecanismo de variação do preço esteja explicitamente descrito.
Artigo 23.º
Limitação do efeito da escolha da lei
Independentemente da lei que as partes hajam escolhido para reger o contrato, as normas desta secção aplicam-se sempre que o mesmo apresente ligação estreita ao território dos Estados membros da União Europeia.
CAPÍTULO VI
Disposições processuais
Artigo 24.º
Declaração de nulidade
(Anterior artigo 23.º)
Artigo 25.º
Acção inibidora
As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando contrariem o disposto nos artigos 15.º, 16.º, 18.º, 19.º, 21.º e 22.º podem ser proibidas por decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares.
Artigo 26.º
Legitimidade activa
1 - A acção destinada a obter a condenação na abstenção do uso ou da recomendação de cláusulas contratuais gerais só pode ser intentada:
a) ...
b) ...
c) Pelo Ministério Público, oficiosamente, por indicação do Provedor de Justiça ou quando entenda fundamentada a solicitação de qualquer interessado;
2 - (N.º 2 do anterior artigo 25.º)
Artigo 27.º
Legitimidade passiva
1 - (N.º 1 do anterior artigo 26.º)
2 - A acção pode ser intentada, em conjunto, contra várias entidades que predisponham e utilizem ou recomendem as mesmas cláusulas contratuais gerais, ou cláusulas substancialmente idênticas, ainda que a coligação importe ofensa do disposto no artigo seguinte.
Artigo 28.º
Tribunal competente
(Anterior artigo 27.º)
Artigo 29.º
Forma de processo e isenções
(Anterior artigo 28.º)
Artigo 30.º
Parte decisória da sentença
(Anterior artigo 29.º)
Artigo 31.º
Proibição provisória
1 - Quando haja receio fundado de virem a ser incluídas em contratos singulares cláusulas gerais incompatíveis com o disposto no presente diploma, podem as entidades referidas no artigo 26.º requerer provisoriamente a sua proibição.
2 - (N.º 2 do anterior artigo 30.º)
Artigo 32.º
Consequências da proibição definitiva
(Anterior artigo 31.º)
Artigo 33.º
Sanção pecuniária compulsória
1 - Se o demandado, vencido na acção inibitória, infringir a obrigação de se abster de utilizar ou de recomendar cláusulas contratuais gerais que foram objecto de proibição definitiva por decisão transitada em julgado, incorre numa sanção pecuniária compulsória que não pode ultrapassar o dobro do valor da alçada da Relação por cada infracção.
2 - (N.º 2 do anterior artigo 32.º)
3 - (N.º 3 do anterior artigo 32.º)
Artigo 34.º
Comunicação das decisões judiciais para efeito de registo
Os tribunais devem remeter, no prazo de 30 dias, ao serviço previsto no artigo seguinte, cópia das decisões transitadas em julgado que, por aplicação dos princípios e das normas constantes do presente diploma, tenham proibido o uso ou a recomendação de cláusulas contratuais gerais ou declarem a nulidade de cláusulas inseridas em contratos singulares.
CAPÍTULO VII
Disposições finais e transitórias
Artigo 35.º
Serviço de registo
1 - Mediante portaria do Ministério da Justiça, a publicar dentro dos seis meses subsequentes à entrada em vigor do presente diploma, será designado o serviço que fica incumbido de organizar e manter actualizado o registo das cláusulas contratuais abusivas que lhe sejam comunicadas, nos termos do artigo anterior.
2 - O serviço referido no número precedente deve criar condições que facilitem o conhecimento das cláusulas consideradas abusivas por decisão judicial e prestar os esclarecimentos que lhe sejam solicitados dentro do âmbito das respectivas atribuições.
Artigo 36.º
Aplicação no tempo
(Anterior artigo 34.º)
Artigo 37.º
Direito ressalvado
(Anterior artigo 35.º)

Consultar o Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (actualizado face ao diploma em epígrafe)
  Contém as alterações dos seguintes diplomas:
   - Rect. n.º 114-B/95, de 31/08
  Consultar versões anteriores deste artigo:
   -1ª versão: DL n.º 220/95, de 31/08

  Artigo 3.º
É eliminado o capítulo VIII.

  Artigo 4.º
O Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo presente diploma, é republicado em anexo.

  Artigo 5.º
O presente diploma entra em vigor no dia 15 de Setembro de 1995.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Julho de 1995. - Aníbal António Cavaco Silva - Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio - Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Promulgado em 8 de Agosto de 1995.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 10 de Agosto de 1995.
Pelo Primeiro-Ministro, Manuel Dias Loureiro, Ministro da Administração Interna.

  ANEXO
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Cláusulas contratuais gerais
1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.
2 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.
Artigo 2.º
Forma, extensão, conteúdo e autoria
O artigo anterior abrange, salvo disposição em contrário, todas as cláusulas contratuais gerais, independentemente da forma da sua comunicação ao público, da extensão que assumam ou que venham a apresentar nos contratos a que se destinem, do conteúdo que as informe ou de terem sido elaboradas pelo proponente, pelo destinatário ou por terceiros.
Artigo 3.º
Excepções
O presente diploma não se aplica:
a) A cláusulas típicas aprovadas pelo legislador;
b) A cláusulas que resultem de tratados ou convenções internacionais vigentes em Portugal;
c) A contratos submetidos a normas de direito público;
d) A actos do direito da família ou do direito das sucessões;
e) A cláusulas de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
CAPÍTULO II
Inclusão de cláusulas contratuais gerais em contratos singulares
Artigo 4.º
Inclusão em contratos singulares
As cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos singulares incluem-se nos mesmos, para todos os efeitos, pela aceitação, com observância do disposto neste capítulo.
Artigo 5.º
Comunicação
1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.
2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem de comum diligência.
3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.
Artigo 6.º
Dever de informação
1 - O contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados.
Artigo 7.º
Cláusulas prevalentes
As cláusulas especificamente acordadas prevalecem sobre quaisquer cláusulas contratuais gerais, mesmo quando constantes de formulários assinados pelas partes.
Artigo 8.º
Cláusulas excluídas dos contratos singulares
Consideram-se excluídas dos contratos singulares:
a) As cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5.º;
b) As cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo;
c) As cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real;
d) As cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contratantes.
Artigo 9.º
Subsistência dos contratos singulares
1 - Nos casos previstos no artigo anterior os contratos singulares mantêm-se, vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos.
2 - Os referidos contratos são, todavia, nulos quando, não obstante a utilização dos elementos indicados no número anterior, ocorra uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé.
CAPÍTULO III
Interpretação e integração das cláusulas contratuais gerais
Artigo 10.º
Princípio geral
As cláusulas contratuais gerais são interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam.
Artigo 11.º
Cláusulas ambíguas
1 - As cláusulas contratuais gerais ambíguas têm o sentido que lhes daria o contratante indeterminado normal que se limitasse a subscrevê-las ou a aceitá-las, quando colocado na posição de aderente real.
2 - Na dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente.
CAPÍTULO IV
Nulidade das cláusulas contratuais gerais
Artigo 12.º
Cláusulas proibidas
As cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição deste diploma são nulas nos termos nele previstos.
Artigo 13.º
Subsistência dos contratos singulares
1 - O aderente que subscreva ou aceite cláusulas contratuais gerais pode optar pela manutenção dos contratos singulares, quando algumas dessas cláusulas sejam nulas.
2 - A manutenção de tais contratos implica a vigência, na parte afectada, das normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos.
Artigo 14.º
Redução
Se a faculdade prevista no artigo anterior não for exercida ou, sendo-o, conduzir a um desequilíbrio de prestações gravemente atentatório da boa fé, vigora o regime da redução dos negócios jurídicos.
CAPÍTULO V
Cláusulas contratuais gerais proibidas
SECÇÃO I
Disposições comuns por natureza
Artigo 15.º
Princípio geral
São proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé.
Artigo 16.º
Concretização
Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado.
SECÇÃO II
Relações entre empresários ou entidades equiparadas
Artigo 17.º
Âmbito das proibições
Nas relações entre empresários ou os que exerçam profissões liberais, singulares ou colectivos, ou entre uns e outros, quando intervenham apenas nessa qualidade e no âmbito da sua actividade específica, aplicam-se as proibições constantes desta secção e da anterior.
Artigo 18.º
Cláusulas absolutamente proibidas
São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos causados à vida, à integridade moral ou física ou à saúde das pessoas;
b) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos patrimoniais extracontratuais, causados na esfera da contraparte ou de terceiros;
c) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave;
d) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por actos de representantes ou auxiliares, em caso de dolo ou de culpa grave;
e) Confiram, de modo directo ou indirecto, a quem as predisponha, a faculdade exclusiva de interpretar qualquer cláusula do contrato;
f) Excluam a excepção de não cumprimento do contrato ou a resolução por incumprimento;
g) Excluam ou limitem o direito de retenção;
h) Excluam a faculdade de compensação, quando admitida na lei;
i) Limitem, a qualquer título, a faculdade de consignação em depósito, nos casos e condições legalmente previstos;
j) Estabeleçam obrigações duradouras perpétuas ou cujo tempo de vigência dependa apenas da vontade de quem as predisponha;
l) Consagrem, a favor de quem as predisponha, a possibilidade de cessão da posição contratual, de transmissão de dívidas ou de subcontratar, sem o acordo da contraparte, salvo se a identidade do terceiro constar do contrato inicial.
Artigo 19.º
Cláusulas relativamente proibidas
São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Estabeleçam, a favor de quem as predisponha, prazos excessivos para a aceitação ou rejeição de propostas;
b) Estabeleçam, a favor de quem as predisponha, prazos excessivos para o cumprimento, sem mora, das obrigações assumidas;
c) Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir;
d) Imponham ficções de recepção, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos para tal insuficientes;
e) Façam depender a garantia das qualidades da coisa cedida ou dos serviços prestados, injustificadamente, do não recurso a terceiros;
f) Coloquem na disponibilidade de uma das partes a possibilidade de denúncia, imediata ou com pré-aviso insuficiente, sem compensação adequada, do contrato, quando este tenha exigido à contraparte investimentos ou outros dispêndios consideráveis;
g) Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem;
h) Consagrem, a favor de quem as predisponha, a faculdade de modificar as prestações, sem compensação correspondente às alterações de valor verificadas;
i) Limitem, sem justificação, a faculdade de interpelar.
SECÇÃO III
Relações com os consumidores finais
Artigo 20.º
Âmbito das proibições
Nas relações com os consumidores finais e, genericamente, em todas as não abrangidas pelo artigo 17.º, aplicam-se as proibições das secções anteriores e as constantes desta secção.
Artigo 21.º
Cláusulas absolutamente proibidas
São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Limitem ou de qualquer modo alterem obrigações assumidas, na contratação, directamente por quem as predisponha ou pelo seu representante;
b) Confiram, de modo directo ou indirecto, a quem as predisponha, a faculdade exclusiva de verificar e estabelecer a qualidade das coisas ou serviços fornecidos;
c) Permitam a não correspondência entre as prestações a efectuar e as indicações, especificações ou amostras feitas ou exibidas na contratação;
d) Excluam os deveres que recaem sobre o predisponente, em resultado de vícios da prestação, ou estabeleçam, nesse âmbito, reparações ou indemnizações pecuniárias predeterminadas;
e) Atestem conhecimentos das partes relativos ao contrato, quer em aspectos jurídicos, quer em questões materiais;
f) Alterem as regras respeitantes à distribuição do risco;
g) Modifiquem os critérios de repartição do ónus da prova ou restrinjam a utilização de meios probatórios legalmente admitidos;
h) Excluam ou limitem de antemão a possibilidade de requerer tutela judicial para situações litigiosas que surjam entre os contratantes ou prevejam modalidades de arbitragem que não assegurem as garantias de procedimento estabelecidas na lei.
Artigo 22.º
Cláusulas relativamente proibidas
1 - São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Prevejam prazos excessivos para a vigência do contrato ou para a sua denúncia;
b) Permitam, a quem as predisponha, denunciar livremente o contrato, sem pré-aviso adequado, ou resolvê-lo sem motivo justificativo, fundado na lei ou em convenção;
c) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado;
d) Estipulem a fixação do preço de bens na data da entrega, sem que se dê à contraparte o direito de resolver o contrato, se o preço final for excessivamente elevado em relação ao valor subjacente às negociações;
e) Permitam elevações de preços, em contratos de prestações sucessivas, dentro de prazos manifestamente curtos, ou, para além desse limite, elevações exageradas, sem prejuízo do que dispõe o artigo 437.º do Código Civil;
f) Impeçam a denúncia imediata do contrato quando as elevações dos preços a justifiquem;
g) Afastem, injustificadamente, as regras relativas ao cumprimento defeituoso ou aos prazos para o exercício de direitos emergentes dos vícios da prestação;
h) Imponham a renovação automática de contratos através do silêncio da contraparte, sempre que a data limite fixada para a manifestação de vontade contrária a essa renovação se encontre excessivamente distante do termo do contrato;
i) Confiram a uma das partes o direito de pôr termo a um contrato de duração indeterminada, sem pré-aviso razoável, excepto nos casos em que estejam presentes razões sérias capazes de justificar semelhante atitude;
j) Impeçam, injustificadamente, reparações ou fornecimentos por terceiros;
l) Imponham antecipações de cumprimento exageradas;
m) Estabeleçam garantias demasiado elevadas ou excessivamente onerosas em face do valor a assegurar;
n) Fixem locais, horários ou modos de cumprimento despropositados ou inconvenientes;
o) Exijam, para a prática de actos na vigência do contrato, formalidades que a lei não prevê ou vinculem as partes a comportamentos supérfluos, para o exercício dos seus direitos contratuais.
2 - O disposto na alínea c) do número anterior não determina a proibição de cláusulas contratuais gerais que:
a) Concedam ao fornecedor de serviços financeiros o direito de alterar a taxa de juro ou o montante de quaisquer outros encargos aplicáveis, desde que correspondam a variações do mercado e sejam comunicadas de imediato, por escrito, à contraparte, podendo esta resolver o contrato com fundamento na mencionada alteração;
b) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente o conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de resolver o contrato.
3 - As proibições constantes das alíneas c) e d) do n.º 1 não se aplicam:
a) Às transacções referentes a valores mobiliários ou a produtos e serviços cujo preço dependa da flutuação de taxas formadas no mercado financeiro;
b) Aos contratos de compra e venda de divisas, de cheques de viagem ou de vales postais internacionais expressos em divisas.
4 - As alíneas c) e d) do n.º 1 não implicam a proibição das cláusulas de indexação, quando o seu emprego se mostre compatível com o tipo contratual onde se encontram inseridas e o mecanismo de variação do preço esteja explicitamente descrito.
Artigo 23.º
Limitação do efeito da escolha da lei
Independentemente da lei que as partes hajam escolhido para reger o contrato, as normas desta secção aplicam-se sempre que o mesmo apresente ligação estreita ao território dos Estados membros da União Europeia.
CAPÍTULO VI
Disposições processuais
Artigo 24.º
Declaração de nulidade
As nulidades previstas neste diploma são invocáveis nos termos gerais.
Artigo 25.º
Acção inibitória
As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando contrariem o disposto nos artigos 15.º, 16.º, 18.º, 19.º, 21.º e 22.º podem ser proibidas por decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares.
Artigo 26.º
Legitimidade activa
1 - A acção destinada a obter a condenação na abstenção do uso ou da recomendação de cláusulas contratuais gerais só pode ser intentada:
a) Por associações de defesa do consumidor dotadas de representatividade, no âmbito previsto na legislação respectiva;
b) Por associações sindicais, profissionais ou de interesses económicos legalmente constituídas, actuando no âmbito das suas atribuições;
c) Pelo Ministério Público, oficiosamente, por indicação do Provedor de Justiça ou quando entenda fundamentada a solicitação de qualquer interessado.
2 - As entidades referidas no número anterior actuam no processo em nome próprio, embora façam valer um direito alheio pertencente, em conjunto, aos consumidores susceptíveis de virem a ser atingidos pelas cláusulas cuja proibição é solicitada.
Artigo 27.º
Legitimidade passiva
1 - A acção referida no artigo anterior pode ser intentada:
a) Contra quem, predispondo cláusulas contratuais gerais, proponha contratos que as incluam ou aceite propostas feitas nos seus termos;
b) Contra quem, independentemente da sua predisposição e utilização em concreto, as recomende a terceiros.
2 - A acção pode ser intentada, em conjunto, contra várias entidades que predisponham e utilizem ou recomendem as mesmas cláusulas contratuais gerais, ou cláusulas substancialmente idênticas, ainda que a coligação importe ofensa do disposto no artigo seguinte.
Artigo 28.º
Tribunal competente
Para a acção inibitória é competente o tribunal da comarca onde se localiza o centro da actividade principal do demandado ou, não se situando ele em território nacional, o da comarca da sua residência ou sede; se estas se localizarem no estrangeiro, será competente o tribunal do lugar em que as cláusulas contratuais gerais foram propostas ou recomendadas.
Artigo 29.º
Forma de processo e isenções
1 - A acção destinada a proibir o uso ou a recomendação de cláusulas contratuais gerais que se considerem abusivas segue os termos do processo sumário de declaração e está isenta de custas.
2 - O valor das acções referidas no número anterior excede l$00 ao fixado para a alçada da Relação.
Artigo 30.º
Parte decisória da sentença
1 - A decisão que proíba as cláusulas contratuais gerais especificará o âmbito da proibição, designadamente através da referência concreta do seu teor e a indicação do tipo de contratos a que a proibição se reporta.
2 - A pedido do autor, pode ainda o vencido ser condenado a dar publicidade à proibição, pelo modo e durante o tempo que o tribunal determine.
Artigo 31.º
Proibição provisória
1 - Quando haja receio fundado de virem a ser incluídas em contratos singulares cláusulas gerais incompatíveis com o disposto no presente diploma, podem as entidades referidas no artigo 26.º requerer provisoriamente a sua proibição.
2 - A proibição provisória segue, com as devidas adaptações, os termos fixados na lei processual para os procedimentos cautelares não especificados.
Artigo 32.º
Consequências da proibição definitiva
1 - As cláusulas contratuais gerais objecto de proibição definitiva por decisão transitada em julgado, ou outras cláusulas que se lhes equiparem substancialmente, não podem ser incluídas em contratos que o demandado venha a celebrar, nem continuar a ser recomendadas.
2 - Aquele que seja parte, juntamente com o demandado vencido na acção inibitória, em contratos onde se incluam cláusulas gerais proibidas, nos termos referidos no número anterior, pode invocar a todo o tempo, em seu benefício, a declaração incidental de nulidade contida na decisão inibitória.
3 - A inobservância do preceituado no n.º 1 tem como consequência a aplicação do artigo 9.º
Artigo 33.º
Sanção pecuniária compulsória
1 - Se o demandado, vencido na acção inibitória, infringir a obrigação de se abster de utilizar ou de recomendar cláusulas contratuais gerais que foram objecto de proibição definitiva por decisão transitada em julgado, incorre numa sanção pecuniária compulsória que não pode ultrapassar o dobro do valor da alçada da Relação por cada infracção.
2 - A sanção prevista no número anterior é aplicada pelo tribunal que apreciar a causa em 1.ª instância, a requerimento de quem possa prevalecer-se da decisão proferida, devendo facultar-se ao infractor a oportunidade de ser previamente ouvido.
3 - O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao requerente e ao Estado.
Artigo 34.º
Comunicação das decisões judiciais para efeito de registo
Os tribunais devem remeter, no prazo de 30 dias, ao serviço previsto no artigo seguinte, cópia das decisões transitadas em julgado que, por aplicação dos princípios e das normas constantes do presente diploma, tenham proibido o uso ou a recomendação de cláusulas contratuais gerais ou declarem a nulidade de cláusulas inseridas em contratos singulares.
CAPÍTULO VII
Disposições finais e transitórias
Artigo 35.º
Serviço de registo
1 - Mediante portaria do Ministério da Justiça, a publicar dentro dos seis meses subsequentes à entrada em vigor do presente diploma, será designado o serviço que fica incumbido de organizar e manter actualizado o registo das cláusulas contratuais abusivas que lhe sejam comunicadas, nos termos do artigo anterior.
2 - O serviço referido no número precedente deve criar condições que facilitem o conhecimento das cláusulas consideradas abusivas por decisão judicial e prestar os esclarecimentos que lhe sejam solicitados dentro do âmbito das respectivas atribuições.
Artigo 36.º
Aplicação no tempo
O presente diploma aplica-se também às cláusulas contratuais gerais existentes à data da sua entrada em vigor, exceptuando-se, todavia, os contratos singulares já celebrados com base nelas.
Artigo 37.º
Direito ressalvado
Ficam ressalvadas todas as disposições legais que, em concreto, se mostrem mais favoráveis ao aderente que subscreva ou aceite propostas que contenham cláusulas não negociadas individualmente.
  Contém as alterações dos seguintes diplomas:
   - Rect. n.º 114-B/95, de 31/08
  Consultar versões anteriores deste artigo:
   -1ª versão: DL n.º 220/95, de 31/08

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