O tribunal da condenação decide sobre a transmissão ou não da sentença condenatória, neste caso do arguido já condenado em pena de prisão, e em caso positivo, o Ministério Público dentro dos poderes que lhe são conferidos, procede à transmissão da mesma acompanhada da respectiva certidão, cuja extracção tem de ser ordenada por um juiz, para todos os devidos efeitos legais dai decorrentes.
Proc. 5/13.2SWLSB 9ª Secção
Desembargadores: Filipa Costa Lourenço - Margarida Vieira de Almeida - -
Sumário elaborado por Ana Paula Vitorino
_______
Processo 5/13.1 SWLSB-G.L1
ACORDAM EM CONFERÊNCIA, NA 9a SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
RELATÓRIO
O M°P°, não se conformando com a decisão/despacho datada de 1 de Julho de 2016, a qual indeferiu o pedido, para que fosse proferida decisão ordenando a transmissão para Itália da sentença condenatória do arguido (…) - cidadão Italiano( acompanhada da certidão referida no art° 8°, n° 1 da Lei 158/2015, de 17 de Setembro), veio interpor recurso do mesmo.
O arguido condenado em pena de prisão de 7 anos, veio requerer a sua transferência para o país de onde é nacional, por ali contar com o apoio familiar, que é nulo em Portugal, para ali cumprir o remanescente da sua pena, a qual foi liquidada a folhas 2595.
O arguido encontra-se recluso no Estabelecimento Prisional (…).
Nos termos do disposto no art° 10° n° 1 da Lei 158/2015, de 17 de Setembro, o arguido prestou o seu consentimento (vide fls 11/ tendo sido gravado o seu depoimento), junto do Tribunal da sua condenação.
Apresentou o M°P°, entre o mais as seguintes conclusões: CONCLUSÕES:
1. A lei 158/2015 de 17 de Setembro, exige que seja proferida decisão de transmissão da sentença condenatória;
2. Essa lei confia, em exclusivo, ao Tribunal da condenação a competência para recolher o consentimento da pessoa condenada;
3. Fá-lo para assegurar, naquele contexto, a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos da pessoa condenada (tarefa que incumbe, por força da Constituição da República Portuguesa, aos Tribunais-art° 202° da Constituição da República Portuguesa) e, também, para assegurar à pessoa condenada as devidas garantias, nomeadamente o direito ao processo, a um Tribunal e ao recurso, e os direitos a defensor, interpretação e tradução;
4. Se pelas assinaladas razões, a Lei (158/2015) atribui ao Tribunal da condenação a competência para recolher o consentimento do condenado (requerente da transmissão) impõe-se, cremos - pelas mesmas razões, fazer intervir o Tribunal na decisão de transmissão (ou não) da sentença;
5. Tanto mais que essa decisão pode até ter repercussões mais gravosas naquilo que são os direitos e interesses do condenado (legalmente protegidos).
6. Pelos assinalados motivos, associados a razões de coerência interna do ordenamento jurídico, impõe-se concluir que a lei 158/2015 confere aos Tribunais da condenação a competência para proferir a decisão de transmissão de sentença, nos termos e para os efeitos previstos no art° 8 daquele diploma.
Normas jurídicas violadas pela decisão recorrida:
1.artigo 202°, n° 2 da Constituição da república Portuguesa, que confere aos Tribunais a tarefa de defender direitos e interesses legalmente protegidos de cidadãos.
2.art° 47° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (aplicável por força do artigo 6° do tratado da união europeia) que estabelece que toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um Tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei.
Artigo 9° n° 1 do Código Civil que obriga a que, na interpretação da lei, se tenha em conta a unidade do sistema jurídico.
Temos que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a decisão de indeferir o pedido formulado pelo M°P°, para que fosse proferida a assinalada decisão (de transmissão de sentença), substituindo-a por outra que determine a sua prolação e determine também:
-a emissão da certidão a que se refere o art° 8°, n°1, Lei 158/2015, de 17 de Setembro (preenchimento do modelo/ formulário que consta como anexo à referida Lei);
- que se proceda à respectiva tradução ( art° 8°, n° 5, Lei 158/2015 de 17 de Setembro);
- a notificação de (…) da decisão de transmitir a sentença (com recurso ao formulário indicado no ar° 10°, n° 9 da Lei 15/2015).
Contudo V.Exas., decidindo, farão como sempre.
O recurso foi admitido a folhas 2773 dos autos principais e 15 destes, tendo sido fixado o seu efeito e regime de subida.
Não foi observado pelo Tribunal a quo o disposto no n° 4 do art° 414° do C.P.P., nem em rigor o disposto no n° 5 do mesmo artigo, uma vez que o arguido está preso em cumprimento de pena.
Os autos foram remetidos para o Tribunal da Relação.
O Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, tendo sido cumprido o art° 417° n° 2 do C.P.P., tendo o arguido apresentado resposta, para a qual se remete (fls 30) dando-se a mesma por reproduzida, concluindo certeiramente em pretender uma decisão célere e justa.
Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o presente recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.°, n.° 3, alínea c) do mesmo diploma, cumprindo agora apreciar e decidir.
Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso.
FUNDAMENTAÇÃO
De acordo com o disposto no artigo 412° do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.° 7/95, de 19 de Outubro de 1995, o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no n.° 2 do artigo 410° do Código de Processo Penal, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no n.° 1 do artigo 379° do mesmo diploma legal.
Por outro lado, e como é sobejamente conhecido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação (art. 412.°, n.° 1 do CPP).
O objecto do recurso interposto pelo Ministério Público, o qual é delimitado pelo teor das suas, conclusões, suscita o conhecimento da seguinte questão:
1.Não deter o M°P°, competência ao abrigo da lei 158/2015, para decidir, após a audição do condenado, da transmissão ou não da sentença, sendo competentes para tal os Tribunais da condenação do (s) arguido (s), logo o Tribunal a quo, devendo assim ser revogado o despacho recorrido e substituindo-se este por outra que determine a sua prolacção, bem como:
-a emissão da certidão a que se refere o art° 8°, n°1, Lei 158/2015, de 17 de Setembro (preenchimento do modelo/ formulário que consta como anexo à referida Lei);
- que se proceda à respectiva tradução ( art° 8°, n° 5, Lei 158/2015 de 17 de Setembro);
- a notificação de (…) da decisão de transmitir a sentença (com recurso ao formulário indicado no ar° 10°, n° 9 da Lei 15/2015).
Vejamos então:
O despacho sob censura (manuscrito/ e datado de 1-07-2016) tem o seguinte teor, nos segmentos que ora nos interessam:
(...)
Mediante requerimento de fls. 2756, o digno magistrado do M°P° veio requerer a transmissão da sentença condenatória do arguido (…) para a emissão da certidão prevista no art° 8° da Lei 158/2015 de 17.09, que se proceda à respectiva tradução e que se proceda à notificação da decisão de transmitir a sentença.
Salvo o devido respeito por opinião contrária não compete ao Tribunal da condenação proceder á realização de tais diligências indicadas a fls.2756, mas antes (...) ao ministério público, enquanto autoridade nacional a quem foi confiada pelo próprio legislador tal incumbência.
Enquanto no art° 10°, n° 2 da Lei 158/2016 se atribui ao Tribunal da condenação a competência para a audição da pessoa condenada, a fim de verificar se dá o seu consentimento para o cumprimento da pena privativa de liberdade no Estado da execução, a lei é bem clara, em nossa opinião, ao atribuir ao M.P. a competência para proceder a transmissão da decisão.
Na realidade estabelece o art° 7° do citado diploma legal que é competente para transmitir a sentença, acompanhada da certidão, para efeitos do reconhecimento e execução de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas de liberdade, o ministério público, junto do Tribunal da condenação (sublinhado nosso).
Esta norma está em conformidade com o art° 2° n° 1 da decisão quadro 2008/909/JAI do Conselho, no qual se estabelece que cada estado membro informa o secretário-geral do Conselho sobre a ou as autoridades que, segundo a sua legislação nacional (...) são competentes (...).
E parece que o legislador nacional atribuiu ao ministério público, no âmbito da ordem jurídica interna, a competência para proceder à transmissão das sentenças condenatórias competindo unicamente ao Tribunal da condenação proceder à audição do condenado, a fim de recolher o seu consentimento.
Aliás, conforme se deixou escrito no parecer do Conselho superior da magistratura de 9.10.2014 (...) mantém-se nesta matéria a atribuição da competência do M°P° para transmitir a sentença e, se for caso disso, a decisão sobre a liberdade condicional (...)
Em face do exposto:
-determina-se a extracção de certidão do acórdão condenatório e da acta da audição do condenado a fim de serem entregues ao digno magistrado do M.P.;
-declara-se este Tribunal incompetente para a realização das demais diligências indicadas a folhas 2756, muito em particular para proceder à transmissão da sentença condenatória proferida a Itália, a fim de ser transferido o condenado (…).
(...)
Posto isto, avancemos.
Cumpre assim apreciar e decidir:
Fazendo uma leitura da Lei 158/15 de 17.09, facilmente se chega à conclusão de que o Tribunal a quo, não terá feito uma interpretação curial da mesma.
Para tal nada mais simples do que reproduzirmos aqui numa primeira linha o texto legal, ou seja a Lei 158/15 de 17.09, nos segmentos que nos interessam, para a resolução do objecto recurso interposto pelo M.P.
Vejamos então:
TÍTULO 1
Disposições gerais
Artigo 1.°
Objeto
1 - A presente lei estabelece o regime jurídico da transmissão, pelas autoridades judiciárias portuguesas, das sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas da liberdade, tendo em vista o seu reconhecimento e a sua execução em outro Estado membro da União Europeia, bem como do reconhecimento e da execução, em Portugal, das sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas da liberdade tomadas pelas autoridades competentes dos outros Estados membros da União Europeia, com o objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada, transpondo a Decisão-Quadro 2008/909/JAI, do Conselho, de 27 de novembro de 2008, alterada pela Decisão-Quadro 2009/299/JAI, do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009.
2 - A presente lei estabelece também o regime jurídico da transmissão, pelas autoridades judiciárias portuguesas, de sentenças ou de decisões que apliquem sanções alternativas à pena de prisão e de sentenças e de decisões relativas à liberdade condicional, para efeitos da fiscalização das sanções alternativas e das medidas de vigilância, tendo em vista o seu reconhecimento e a sua execução noutro Estado membro da União Europeia, bem como o regime jurídico do reconhecimento e da execução em Portugal dessas mesmas sentenças e decisões, com o objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada, transpondo a Decisão-Quadro 2008/947/JAI, do Conselho, de 27 de novembro de 2008, alterada pela Decisão-Quadro 2009/299/JAI, do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009.
3 - Não constitui impedimento de transmissão da sentença o facto de, para além da condenação, também ter sido imposta uma multa que ainda não tenha sido paga, e ou uma decisão de perda, estando a execução de tais multas e decisões de perda abrangidas pelo âmbito de aplicação das Leis n. os 93/2009, de 1 de setembro, e 88/2009, de 31 de agosto.
Está aqui definido o objecto da presente lei, e definido este, iremos atentar na forma estabelecida pelo legislador para efectivar a realização deste desiderato. Nestes termos estabelecem os seguintes artigos:
TÍTULO II
Transmissão, reconhecimento e execução de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas de liberdade
CAPÍTULO 1
Transmissão, por parte das autoridades portuguesas, de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas de liberdade
Artigo 7.°
Autoridades nacionais competentes para a transmissão
É competente para transmitir a sentença, acompanhada da certidão, para efeito de reconhecimento e execução de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas de liberdade, o Ministério Público junto do tribunal da condenação.
Artigo 8.°
Transmissão da sentença e da certidão
1 - Desde que a pessoa condenada se encontre em Portugal ou no Estado de execução e tenha dado o seu consentimento, nos termos da legislação nacional, a sentença, ou uma cópia autenticada da mesma, acompanhada da certidão cujo modelo consta do anexo 1 à presente lei e da qual faz parte integrante, pode ser transmitida, através de qualquer meio que proporcione um registo escrito, por forma a permitir o estabelecimento da sua autenticidade, a um dos seguintes Estados membros:
a) O Estado membro de que a pessoa condenada é nacional e no qual tem residência legal e habitual;
b) O Estado membro do qual a pessoa condenada é nacional e para o qual, não sendo embora o Estado membro onde ela tem residência legal e habitual, será reconduzida uma vez cumprida a pena, na sequência de uma medida de expulsão ou de recondução à fronteira, incluída numa sentença ou decisão judicial ou administrativa, ou de qualquer outra medida decorrente da sentença; ou
c) Qualquer Estado membro, que não os Estados referidos nas alíneas a) ou b), cuja autoridade competente consinta na transmissão da sentença e da certidão.
2 - Não é necessário o consentimento prévio previsto na alínea c) do número anterior, sob condição de reciprocidade, se:
a) A pessoa condenada residir de modo legal e ininterrupto há, pelo menos, cinco anos no Estado de execução. e nele mantiver um direito de residência permanente; e ou
b) Nos casos que não os referidos nas alíneas a) e b) do número anterior, a pessoa condenada tiver a nacionalidade do Estado de execução.
3 - Nos casos referidos na alínea a) do número anterior, o direito de residência permanente da pessoa em causa implica que esta tenha o direito de residir em permanência no Estado membro, ao abrigo da legislação nacional de execução da legislação comunitária aprovada com base nos artigos 18.°, 40. 0, 44.° e 52.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia, ou possua um título de residência válido, enquanto residente permanente ou de longa duração, ao abrigo da legislação nacional desse Estado de execução da legislação comunitária aprovada com base no artigo 63 ° do Tratado que institui a Comunidade Europeia.
4 - A certidão deve ser assinada pela autoridade emitente, que certifica a exatidão do seu conteúdo.
5 - A certidão deve ser traduzida numa das línguas oficiais do Estado de execução ou noutra língua oficial das instituições da União Europeia aceite por aquele Estado mediante declaração depositada junto do Secretariado-Geral do Conselho, não sendo obrigatório traduzir a sentença, exceto nos casos em que tal seja solicitado pelo Estado de execução
6 - A transmissão da sentença tem que ser acompanhada da certidão e só pode ser efetuada a um Estado de execução de cada vez.
7 - No caso de a autoridade emitente não conhecer a autoridade competente do Estado de execução, solicita essa informação a este último por todos os meios, incluindo através dos pontos de contacto da Rede Judiciária Europeia.
Artigo 9.°
Consulta entre autoridades competentes
1 - A transmissão da sentença e da certidão pode efetuar-se quando a autoridade nacional competente tiver verificado, se for caso disso, após consultas com a autoridade competente do Estado de execução, que a execução da condenação pelo Estado de execução contribuirá para atingir o objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada.
2 - Antes de transmitir a sentença e a certidão, a autoridade nacional competente pode consultar, por quaisquer meios adequados, a autoridade competente do Estado de execução, devendo proceder obrigatoriamente a esta consulta nos casos referidos na alínea c) do n.° 1 do artigo anterior.
3 - Durante as consultas, a autoridade competente do Estado de execução pode apresentar um parecer fundamentado que demonstre que a execução da condenação no Estado de execução não contribuirá para atingir o objetivo de facilitar a reinserção social da pessoa condenada.
4 - Nos casos em que não tenha havido lugar a consultas, o Estado de execução pode apresentar, sem demora, após a transmissão da sentença e da certidão, o parecer referido no número anterior, devendo em consequência a autoridade portuguesa competente, após análise, decidir se retira ou não a certidão.
5 - O pedido de transmissão da sentença e da certidão pode ser formulado pelo Estado de execução, bem como pela pessoa condenada
Artigo 10.°
Notificação e audição da pessoa condenada
1 - Para efeitos do reconhecimento e da execução da condenação imposta, a sentença, acompanhada da certidão, só pode ser transmitida ao Estado de execução como consentimento da pessoa condenada.
2 - O consentimento do condenado deve ser prestado perante o tribunal da condenação, salvo se aquele se encontrar no estrangeiro, caso em que pode ser prestado perante uma autoridade judiciária estrangeira.
3 - Sempre que a pessoa condenada se encontre ainda em Portugal, o consentimento referido no n.° 2 deve ser registado e redigido por forma a demonstrar que a pessoa o deu voluntariamente e com plena consciência das suas consequências, devendo ser prestado com a assistência de um defensor.
4 - Para efeitos do disposto na parte final do n.° 2, é expedida carta rogatória à autoridade estrangeira, fixando-se prazo para o seu cumprimento.
5 - Não é necessário o consentimento da pessoa condenada se a sentença, acompanhada da certidão, for enviada:
a) Ao Estado membro de que a pessoa condenada é nacional e no qual vive;
b) Ao Estado membro para o qual a pessoa condenada será reconduzida uma vez cumprida a pena, na sequência de uma medida de expulsão ou de recondução à fronteira, incluída numa sentença ou decisão judicial ou administrativa, ou de qualquer outra medida decorrente da sentença; ou
c) Ao Estado membro no qual a pessoa condenada se tenha refugiado ou a que tenha regressado, devido a um processo penal no qual é arguida e que corra termos no Estado de emissão ou na sequência da condenação imposta neste Estado.
6 - O disposto na alínea a) do número anterior não se aplica quando o Estado de execução for a Polónia, caso a sentença tenha sido proferida antes de decorrido um período de cinco anos a contar de 5 de dezembro de 2011, exceto se esta notificar o Secretariado-geral do Conselho da intenção de deixar de aplicar esta derrogação.
7 - Nos casos previstos no n.° 5, sempre que a pessoa condenada se encontre ainda em Portugal, pode ser-lhe dada a possibilidade de apresentar a sua opinião oralmente ou por escrito, no prazo de 10 dias, na sequência de notificação a efetuar nos termos previstos no Código de Processo Penal, podendo essa possibilidade ser dada ao seu representante legal, em função da idade da pessoa condenada ou do seu estado físico ou mental.
8 - A opinião da pessoa condenada é tida em conta na decisão de transmissão da sentença e é transmitida noo Estado de execução, através de registo escrito, tendo especialmente em vista a aplicação do disposto no n.° 3 do artigo 9. °.
9 - A pessoa condenada deve ser informada da decisão de transmissão da sentença através do formulário tipo que consta do anexo II à presente lei e da qual faz parte integrante, numa língua que aquela compreenda, sendo o formulário transmitido ao Estado de execução, para esse efeito, quando a pessoa condenada nele se encontrar.
Artigo 11.°
Dever de informar o Estado de execução
A autoridade emitente deve informar imediatamente a autoridade competente do Estado de execução de qualquer decisão ou medida que tenha por efeito anular o caráter executório da sentença ou retirar ao Estado de execução, por qualquer outro motivo, a responsabilidade por essa execução.
Artigo 12.°
Consequências da transferência da pessoa condenada
1 - Sob reserva do disposto no número seguinte, o Estado de emissão não pode prosseguir a execução da condenação se esta já tiver sido iniciada no Estado de execução.
2 - A autoridade emitente recupera o direito de execução da condenação após ser informada pelas autoridades competentes do Estado de execução da não execução parcial da condenação, no caso de evasão da pessoa condenada.
3 - Enquanto a execução da condenação não tiver sido iniciada no Estado de execução, o Estado de emissão pode retirar a certidão junto daquele Estado, devendo apresentar uma justificação.
A tal, ainda acrescentamos, e em abono do que atrás aduzimos, o seguinte, fazendo apelo ao disposto no código civil, mormente no disposto nos artigos 9° e 11°.
Artigo 9.°
(Interpretação da lei)
1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir de textos o pensamento legislativo, tendo, sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
Artigo 11.°
(Normas excepcionais)
As normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem interpretação extensiva.
Julga-se aqui, que sobretudo emerge um problema de interpretação, da lei sentida pelo Tribunal a quo, sejamos claros.
Segundo Manuel Cavaleiro de Ferreira, in Direito Penal Português parte geral vol.1 , folhas 97 e seguintes, este refere o seguinte, Os resultados da interpretação são considerados sob a perspectiva da conformidade de uma interpretação gramatical com a interpretação teleológica, porquanto a interpretação é verdadeiramente uma só e única: é a determinação do sentido, do conteúdo da lei.
A interpretação é declarativa quando o sentido objectivo da lei corresponde ao sentido gramatical do preceito, de forma que há correspondência entre o texto e o sentido da lei.
A interpretação é restritiva quando se chega à conclusão de que o legislador disse mais do que queria dizer, isto é, de que as palavras da lei vão além do seu espírito; é o que já os Romanos expressavam com o aforismo: plus dixit quam voluit.
Ora como o que interessa na interpretação da lei é a determinação do seu sentido, convém então restringir o significado literal das palavras por ele empregadas, que nem por isso deixa de se aplicar inteiramente a lei;_aplica-se justamente o seu imperativo, que não se deve relacionar com a forma defeituosa que reveste, mas com o conteúdo que encerra.
A interpretação é extensiva quando o intérprete conclui que se deve alargar o texto legal para que este corresponda ao seu verdadeiro espírito. O legislador disse menos do que queria dizer: minus dixit quam voluit.
Aplicar a lei a casos não compreendidos na sua letra mas abrangidos no seu espírito não é aplicá-la a casos diferentes daqueles para que o legislador legislou; é apenas aplicá-la em todo o seu pensamento.
E como é esse o fim da interpretação, mesmo que se trate de uma lei excepcional, é possível chegar a um resultado extensivo na interpretação.
Todos estes resultados da interpretação - declarativa, restritiva ou extensiva - são genuínos resultados da interpretação.
A lei deve ser, em princípio, aplicada em toda a sua extensão delimitada pela interpretação objectiva e teleológica.
E isso independentemente da natureza das leis sobre que recai a interpretação; tanto a interpretação extensiva como a declarativa ou restritiva podem ter lugar inclusive quanto às leis excepcionais, como consta do Código Civil (art. 11° do C.C.).
Ora foi isto claramente que o tribunal a quo não fez, não interpretou de forma clara a letra da lei, não a aplicou em toda a sua extensão delimitada pela interpretação objectiva e teleológica daquela, e tendo ainda descurado os princípios básicos de um Estado de Direito, os quais estão contidos na Constituição da República Portuguesa.
Atente-se então:
Ora dito isto e relendo a Lei 158/15 de 17.09, nos segmentos atrás transcritos, parece-nos que, através do despacho a quo, foi completamente obliterado, o seu sentido, a sua ratio, tendo sido feita uma interpretação da mesma, mormente do seu art° 7°, completamente anoréctica e em clara violação com os princípios ínsitos na boa pratica da interpretação das normas, e que neste caso também e em acumulação colide frontalmente com os princípios do Estado de Direito, encontrando estes o seu assento na Constituição da República Portuguesa (como já se enfatizou), nomeadamente nos artigos 32° n° 1 e 202 n° 1 e 2, estabelecendo estes o seguinte:
Artigo 32.º
(Garantias de processo criminal)
1.0 processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.
TÍTULO V
Tribunais
CAPÍTULO 1
Princípios gerais
Artigo 202.°
(Função jurisdicional)
1. Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.
2. Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.
3. No exercício das suas funções os tribunais têm direito à coadjuvação das outras autoridades.
4. A lei poderá institucionalizar instrumentos e formas de composição não jurisdicional de conflitos.
Contém as alterações dos seguintes diplomas:
- Lei n.° 1/82, de 30/09
- Lei n.° - 1/89, de 08/07
- Lei n.° 1/97, de 20/09
Consultar versões anteriores deste artigo:
- Iª versão: Decreto de 10/04 de 1976
- 2ª versão: Lei n. ° 1/82, de 30/09
- 3a versão: Lei n.° 1/89, de 08/07
Colateralmente, haverá que ter ainda em conta o disposto nos artigos que infra se transcrevem, a saber:
Artigo 203.° (Independência)
Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei.
Contém as alterações dos seguintes diplomas:
- Lei n.° 1/82, de 30/09
- Lei n.° 1/89, de 08/07
Lei n.° 1/97, de 20/09
Consultar versões anteriores deste artigo:
-1ª versão: Decreto de 10/04 de 1976
-2ª versão: Lei n.° 1/82, de 30/09
-3ª versão: Lei n.° 1/89, de 08/07
Artigo 204.°
(Apreciação da inconstitucionalidade)
Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.
Contém as alterações dos seguintes diplomas:
- Lei n. ° 1/82, de 30/09
- Lei n. ° 1/97, de 20/09
Consultar versões anteriores deste artigo:
-Iª versão: Decreto de 10/04 de 1976
-2ª versão: Lei n.° 1/82, de 30/09
Artigo 205.°
(Decisões dos tribunais)
1. As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
2. As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades.
3. A lei regula os termos da execução das decisões dos tribunais relativamente a qualquer autoridade e determina as sanções a aplicar aos responsáveis pela sua inexecução.
Contém as alterações dos seguintes diplomas:
- Lei n.° 1/82, de 30/09
- Lei n. ° 1/89, de 08/07
- Lei n.°1/97, de 20/09
Consultar versões anteriores deste artigo:
-1ª versão: Decreto de 10/04 de 1976
-2ª versão: Lei n.° 1/82, de 30/09
-3ª versão: Lei n.° 1/89, de 08/07
De facto, não temos qualquer dúvida em afirmar que a interpretação operada pelo Tribunal a quo, no caso sub judice se quedou de forma simplista, não tendo feito urna leitura abrangente desta Lei e ignorando ou esquecendo os princípios básicos de um Estado de Direito.
Explicitando, diremos que, de facto, o art° 7° atribui de forma clara ao M.P. competência para proceder á transmissão da sentença, acompanhada da respectiva certidão.
No entanto não temos qualquer dúvida em afirmar que, precedendo tal competência ínsita neste normativo, se encontra. como não podia deixar de ser, a prolação da decisão propriamente dita de transmissão de uma sentença, a qual compete aos Tribunais, sendo espelho disso o contido nos n° 8 e 9 do art° 10 da Lei 158/ 15 de 17.09, e repetimo-la, clarificando a situação:
8 - A opinião da pessoa condenada é tida em conta na decisão de transmissão da sentença e é transmitida ao Estado de execução, através de registo escrito, tendo especialmente em vista a aplicação do disposto no n.° 3 do artigo 9. °
9 -A pessoa e condenada deve ser informada da decisão de transmissão da sentença através do formulário tipo que consta do anexo II à presente lei e da qual faz parte integrante, numa língua que aquela compreenda, sendo o formulário transmitido ao Estado de execução, para esse efeito, quando a pessoa condenada nele se encontrar.
Ou seja, nos termos do art° 7° daquela lei, o M.P. é competente para transmitir a sentença acompanhada da certidão, mas não é, certamente competente para proferir a decisão de transmissão de uma sentença, que pertence, única e exclusivamente ao poder judicial, atento o disposto nos n° 8 e 9 do art° 10° da m.m. Lei.
O parecer emanado do C.S.M. de 9.10.2014 e citado no despacho recorrido, não vai sob qualquer prisma de encontro com a posição tomada pelo Tribunal a quo.
De facto e ao invés, este mais não realça o que já anteriormente existia na Ordem Jurídica Portuguesa, relativamente ao M°P° nesta matéria, que é, digamos o poder que detém para informar as entidades competentes, não decorrendo dele que o M.P. possa decidir ou não sobre a transmissão da sentença, após a audição ou não do arguido/ condenado, senão leia-se, e citando:
(..) A respeito do Titulo sobre a «Emissão e Execução de Sentenças em Matéria Penal que imponham penas [rectius, penas de prisão, caso seja acolhida a sugestão supra mencionada] ou outras medidas privativas de liberdade» importa sublinhar a atribuição de competência ao Ministério Público para a emissão do pedido de reconhecimento e execução ((cfr. artigo 7. 0, n.° 1 da proposta de lei), a qual, se coaduna com a natural área de intervenção desta magistratura(...)
O que aqui se diz, neste douto parecer, é que o M.P. fica imbuído tão só da competência para emitir o pedido de reconhecimento e execução ao País de destino, procedendo às diligências necessárias já na esteira de legislação anterior, mas nunca ali se refere, que o M°P° passa a ter competência para decidir sobre a transmissão ou não de uma sentença.
Em suma, os Tribunais decidem sobre a transmissão ou não da sentença, neste caso do arguido já condenado em pena de prisão, e em caso positivo, então o M.P. dentro dos poderes que lhe são conferidos, procederá então á transmissão da mesma acompanhada da respectiva certidão, cuja extracção tem de ser ordenada por um juiz, para todos os devidos efeitos legais dai decorrentes.
Faltou aqui fazer ao Tribunal a quo uma interpretação ou leitura abrangente e completa desta lei, nos segmentos atrás referidos.
Quedou-se pura e simplesmente, numa espartilhada interpretação muito literal e descontextualizada do art° 7°, não vislumbrando o disposto no artigo 10° , números 8 e 9 (que o impelia a proferir uma decisão sobre a transmissão ou não da sentença) e o disposto nos artigos 32° e 202° da CRP, e por via disso demitiu-se de decidir como lhe competia, e como a Constituição estabelece e lhe impõe, sobre a oportunidade ou não, da transmissão da sentença do condenado (…).
Tal falta acarretaria uma diminuição de direitos (como por exemplo ver ser-lhe negada a possibilidade de recorrer dessa decisão, como aliás bem refere o Sr. Procurador Geral Ajunto/ por exemplo e hipoteticamente o arguido não dar o seu consentimento para cumprir o remanescente da pena no seu País de origem e o M°P° proceder mesmo assim à transmissão da sentença com esse fim) para o arguido, colidindo com o estatuído no art° 32° n° 1 e 2 e no art° 202 n° 1 e 2 da CRP, não tendo sido feita uma curial interpretação abrangente do diploma legal em apreço, pois enfatizamos, os juízes, sendo os únicos detentores do poder jurisdicional, só a eles lhes compete proferir decisões no âmbito das suas competências, e, o caso sub judice, é, claramente uma delas.
Nestes termos julga-se provido o recurso e revoga-se o despacho recorrido, nos precisos termos exarados na parte final das conclusões apresentadas pelo recorrente.
DISPOSITIVO
Em face do exposto acordam as juízas que compõem a 9 secção criminal do Tribunal da Relação de Lisboa. em:
1.Julgar provido o recurso apresentado pelo Ministério Público, revogando-se consequentemente o despacho recorrido, determinando-se a transmissão da sentença do condenado (…), bem como a emissão da certidão a que se refere o art° 8°, n° 1, Lei 158/2015, de 17 de Setembro (preenchimento do modelo/ formulário que consta como anexo à referida Lei), a sua tradução nos termos do art° 8°, n° 5, da Lei 158/2015 de 17 de Setembro e a notificação de (…) desta decisão, com recurso ao formulário indicado no art° 10°, n° 9 da Lei 15/2015, diligências estas a efectuar e após trânsito, pelo Tribunal recorrido.
2.Notifique e D.N.
3.Não é devida tributação.
Lisboa, 29 de Setembro de 2016
(Processado integralmente em computador e revisto pela relatora, artigo 94° n° 2 do Código de Processo Penal/ versos em branco)
Filipa Costa Lourenço
Margarida Vieira de Almeida