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  Decreto de 10 de Abril de 1976
    CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

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SUMÁRIO
Aprova a Constituição da República Portuguesa
_____________________

Decreto de aprovação da Constituição
de 10 de Abril
A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista.
Libertar Portugal da ditadura, da opressão e do colonialismo representou uma transformação revolucionária e o início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa.
A Revolução restituiu aos Portugueses os direitos e liberdades fundamentais. No exercício destes direitos e liberdades, os legítimos representantes do povo reúnem-se para elaborar uma Constituição que corresponde às aspirações do País.
A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.
A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 2 de Abril de 1976, aprova e decreta a seguinte Constituição da República Portuguesa:
Princípios fundamentais
  ARTIGO 1.º
(República Portuguesa)
Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes.

  ARTIGO 2.º
(Estado democrático e transição para o socialismo)
A República Portuguesa é um Estado democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas, que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras.

  ARTIGO 3.º
(Soberania e legalidade)
1. A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na Constituição.
2. O Movimento das Forças Armadas, como garante das conquistas democráticas e do processo revolucionário, participa, em aliança com o povo, no exercício da soberania, nos termos da Constituição.
3. Os partidos políticos concorrem para a organização e para a expressão da vontade popular, no respeito pelos princípios da independência nacional e da democracia política.
4. O Estado está submetido à Constituição e funda-se na legalidade democrática.

  ARTIGO 4.º
(Cidadania portuguesa)
São cidadãos portugueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional.

  ARTIGO 5.º
(Território)
1. Portugal abrange o território historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e da Madeira.
2. O Estado não aliena qualquer parte do território português ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo de rectificação de fronteiras.
3. A lei define a extensão e o limite das águas territoriais e os direitos de Portugal aos fundos marinhos contíguos.
4. O território de Macau, sob administração portuguesa, rege-se por estatuto adequado à sua situação especial.

  ARTIGO 6.º
(Estado unitário)
1. O Estado é unitário e respeita na sua organização os princípios da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da administração pública.
2. Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos próprios.

  ARTIGO 7.º
(Relações internacionais)
1. Portugal rege-se nas relações internacionais pelos princípios da independência nacional, do direito dos povos à autodeterminação e à independência, da igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação e o progresso da Humanidade.
2. Portugal preconiza a abolição de todas as formas de imperialismo, colonialismo e agressão, o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos.
3. Portugal reconhece o direito dos povos à insurreição contra todas as formas de opressão, nomeadamente contra o colonialismo e o imperialismo, e manterá laços especiais de amizade e cooperação com os países de língua portuguesa.

  ARTIGO 8.º
(Direito internacional)
1. As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português.
2. As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português.

  ARTIGO 9.º
(Tarefas fundamentais do Estado)
São tarefas fundamentais do Estado:
a) Garantir a independência nacional e criar as condições políticas, económicas, sociais e culturais que a promovam;
b) Assegurar a participação organizada do povo na resolução dos problemas nacionais, defender a democracia política e fazer respeitar a legalidade democrática;
c) Socializar os meios de produção e a riqueza, através de formas adequadas às características do presente período histórico, criar as condições que permitam promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo, especialmente das classes trabalhadoras, e abolir a exploração e a opressão do homem pelo homem.

  ARTIGO 10.º
(Processo revolucionário)
1. A aliança entre o Movimento das Forças Armadas e os partidos e organizações democráticos assegura o desenvolvimento pacífico do processo revolucionário.
2. O desenvolvimento do processo revolucionário impõe, no plano económico, a apropriação colectiva dos principais meios de produção.

  ARTIGO 11.º
(Símbolos nacionais)
1. A Bandeira Nacional é a adoptada pela República instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910.
2. O Hino Nacional é A Portuguesa.

PARTE I
Direitos e deveres fundamentais
TÍTULO I
Princípios gerais
  ARTIGO 12.º
(Princípio da universalidade)
1. Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição.
2. As pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza.

  ARTIGO 13.º
(Princípio da igualdade)
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

  ARTIGO 14.º
(Portugueses no estrangeiro)
Os cidadãos portugueses que se encontrem ou residam no estrangeiro gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência do país.

  ARTIGO 15.º
(Estrangeiros e apátridas)
1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses.
3. Aos cidadãos dos países de língua portuguesa podem ser atribuídos, mediante convenção internacional e em condições de reciprocidade, direitos não conferidos a estrangeiros, salvo o acesso à titularidade dos órgãos de soberania e das regiões autónomas, o serviço nas forças armadas e a carreira diplomática.

  ARTIGO 16.º
(Extensão dos direitos)
1. Os direitos fundamentais consagrados na Constituição não excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional.
2. Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

  ARTIGO 17.º
(Regime dos direitos, liberdades e garantias)
O regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos direitos enunciados no título II, aos direitos fundamentais dos trabalhadores, às demais liberdades e ainda a direitos de natureza análoga, previstos na Constituição e na lei.

  ARTIGO 18.º
(Força jurídica)
1. Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição.
3. As leis restritivas dos direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.

  ARTIGO 19.º
(Suspensão)
1. Os órgãos de soberania não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de sítio ou de estado de emergência, declarados na forma prevista na Constituição.
2. A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência deve ser suficientemente fundamentada conter a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso.
3. A declaração do estado de sítio em nenhum caso pode afectar o direito à vida e à integridade pessoal.
4. A declaração do estado de emergência apenas pode determinar a suspensão parcial dos direitos, liberdades e garantias.
5. A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência confere às autoridades competência para tomarem as providências necessárias e adequadas ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.

  ARTIGO 20.º
(Defesa dos direitos)
1. A todos é assegurado o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.

  ARTIGO 21.º
(Responsabilidade civil do Estado)
1. O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
2. Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos.

  ARTIGO 22.º
(Direito de asilo)
1. É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos em consequência da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.
2. A lei define o estatuto do refugiado político.

  ARTIGO 23.º
(Extradição e expulsão)
1. Não são admitidas a extradição e a expulsão de cidadãos portugueses do território nacional.
2. Não é admitida a extradição por motivos políticos.
3. Não há extradição por crimes a que corresponda pena de morte segundo o direito do Estado requisitante.
4. A extradição e a expulsão só podem ser decididas por autoridade judicial.

  ARTIGO 24.º
(Provedor de Justiça)
1. Os cidadãos podem apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos ao Provedor de Justiça, que as apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças.
2. A actividade do Provedor de Justiça é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis.
3. O Provedor de Justiça é designado pela Assembleia da República.

TÍTULO II
Direitos, liberdades e garantias
  ARTIGO 25.º
(Direito à vida)
1. A vida humana é inviolával.
2. Em caso algum haverá pena de morte.

  ARTIGO 26.º
(Direito à integridade pessoal)
1. A integridade moral e física dos cidadãos é inviolável.
2. Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas cruéis, degradantes ou desumanos.

  ARTIGO 27.º
(Direito à liberdade e à segurança)
1. Todos têm direito à liberdade e à segurança.
2. Ninguém pode ser privado da liberdade a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.
3. Exceptua-se deste princípio a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos seguintes:
a) Prisão preventiva em flagrante delito ou por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena maior;
b) Prisão ou detenção de pessoa que tenha penetrado irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou expulsão.
4. Toda a pessoa privada da liberdade deve ser informada, no mais curto prazo, das razões da sua prisão ou detenção.

  ARTIGO 28.º
(Prisão preventiva)
1. A prisão sem culpa formada será submetida, no prazo máximo de quarenta e oito horas, a decisão judicial de validação ou manutenção, devendo o juiz conhecer das causas; da detenção e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa.
2. A prisão preventiva não se mantém sempre que possa ser substituída por caução ou por medida de liberdade provisória prevista na lei.
3. A decisão judicial que ordene ou mantenha uma medida de privação da liberdade deve ser logo comunicada a parente ou pessoa da confiança do detido.

4. A prisão preventiva, antes e depois da formação da culpa, está sujeita aos prazos estabelecidos na lei.

  ARTIGO 29.º
(Aplicação da lei criminal)
1. Ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou a omissão, nem sofrer medida de segurança privativa da liberdade cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior.
2. O disposto no número anterior não impede a punição, nos limites da lei interna, por acção ou omissão que no momento da sua prática seja considerada criminosa segundo os princípios gerais de direito internacional comummente reconhecidos.
3. Não podem ser aplicadas penas ou medidas de segurança privativas da liberdade que não estejam expressamente cominadas em lei anterior.
4. Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança privativa da liberdade mais grave do que as previstas no momento da conduta, aplicando-se retroactivamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido.
5. Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime.

  ARTIGO 30.º
(Limites das penas e das medidas de segurança)
1. Não poderá haver penas ou medidas de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, nem de duração ilimitada ou indefinida.
2. Em caso de perigosidade baseada em grave anomalia psíquica e na impossibilidade de terapêutica em meio aberto, poderão as medidas de segurança privativas da liberdade prorrogar-se sucessivamente enquanto tal estado se mantiver, mas sempre mediante decisão judicial.
3. As penas são insusceptíveis de transmissão.
4. Ninguém pode ser privado, por motivos políticos, da cidadania portuguesa, da capacidade civil ou do nome.

  ARTIGO 31.º
('Habeas corpus')
1. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a interpor perante o tribunal judicial ou militar, consoante os casos.
2. A providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.
3. O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.

  ARTIGO 32.º
(Garantias de processo criminal)
1. O processo criminal assegurará todas as garantias de defesa.
2. Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação.
3. O arguido tem direito à assistência de defensor em todos os actos do processo, especificando a lei os casos e as fases em que ela é obrigatória.
4. Toda a instrução será da competência de um juiz, indicando a lei os casos em que ela deve assumir forma contraditória.
5. O processo criminal terá estrutura acusatória, ficando a audiência de julgamento subordinada ao princípio do contraditório.
6. São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
7. Nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior.

  ARTIGO 33.º
(Direito à identidade, ao bom nome e à intimidade)
1. A todos é reconhecido o direito à identidade pessoal, ao bom nome e reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar.
2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a utilização abusiva, ou contrária à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.

  ARTIGO 34.º
(Inviolabilidade do domicílio e da correspondência)
1. O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis.
2. A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei.
3. Ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento.
4. É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas telecomunicações, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.

  ARTIGO 35.º
(Utilização da informática)
1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento do que constar de registos mecanográficos a seu respeito e do fim a que se destinam as informações, podendo exigir a rectificação dos dados e a sua actualização.
2. A informática não pode ser usada para tratamento de dados referentes a convicções políticas, fé religiosa ou vida privada, salvo quando se trate do processamento de dados não identificáveis para fins estatísticos.
3. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos.

  ARTIGO 36.º
(Família, casamento e filiação)
1. Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.
2. A lei regula os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração.
3. Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos.
4. Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objecto de qualquer discriminação e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações discriminatórias relativas à filiação.
5. Os pais têm o direito e o dever de educação dos filhos.
6. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial.

  ARTIGO 37.º
(Liberdade de expressão e informação)
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de se informar, sem impedimentos nem discriminações.
2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
3. As infracções cometidas no exercício destes direitos ficarão submetidas ao regime de punição da lei geral, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais.
4. A todas as pessoas, singulares ou colectivas, é assegurado, em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta.

  ARTIGO 38.º
(Liberdade de imprensa)
1. É garantida a liberdade de imprensa.
2. A liberdade de imprensa implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orientação ideológica dos órgãos de informação não pertencentes ao Estado ou a partidos políticos, sem que nenhum outro sector ou grupo de trabalhadores possa censurar ou impedir a sua livre criatividade.
3. A liberdade de imprensa implica o direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independentemente de autorização administrativa, caução ou habilitação prévias.
4. As publicações periódicas e não periódicas podem ser propriedade de quaisquer pessoas colectivas sem fins lucrativos e de empresas jornalísticas e editoriais sob forma societária ou de pessoas singulares de nacionalidade portuguesa.
5. Nenhum regime administrativo ou fiscal, nem política de crédito ou comércio externo, pode afectar directa ou indirectamente a liberdade de imprensa, devendo a lei assegurar os meios necessários à salvaguarda da independência da imprensa perante os poderes político e económico.
6. A televisão não pode ser objecto de propriedade privada.
7. A lei estabelece o regime dos meios de comunicação social, designadamente dos pertencentes ao Estado, mediante um estatuto da informação.

  ARTIGO 39.º
(Meios de comunicação social do Estado)
1. Os meios de comunicação social pertencentes ao Estado, ou a entidades directa ou indirectamente sujeitas ao seu controlo económico, serão utilizados de modo a salvaguardar a sua independência perante o Governo e a Administração Pública.
2. Será assegurada a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião nos meios de comunicação social referidos no número anterior.
3. Nos meios de comunicação social previstos neste artigo serão criados conselhos de informação, a integrar, proporcionalmente, por representantes indicados pelos partidos políticos com assento na Assembleia da República.
4. Aos conselhos de informação serão conferidos poderes para assegurar uma orientação geral que respeite o pluralismo ideológico.

  ARTIGO 40.º
(Direito de antena)
1. Os partidos políticos e as organizações sindicais e profissionais terão direito a tempos de antena na rádio e na televisão, de acordo com a sua representatividade e segundo critérios a definir no estatuto da informação.
2. Nos períodos eleitorais os partidos políticos concorrentes têm direito a tempos de antena regulares e equitativos.

  ARTIGO 41.º
(Liberdade de consciência, religião o culto)
1. A liberdade de consciência, religião e culto é inviolável.
2. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa.
3. As igrejas e comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto.
4. É garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão, bem como a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades.
5. É reconhecido o direito à objecção de consciência, ficando os objectores obrigados à prestação de serviço não armado com duração idêntica à do serviço militar obrigatório.

  ARTIGO 42.º
(Liberdade de criação cultural)
1. É livre a criação intelectual, artística e científica.
2. Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a protecção legal dos direitos de autor.

  ARTIGO 43.º
(Liberdade de aprender e ensinar)
1. É garantida a liberdade de aprender e ensinar.
2. O Estado não pode atribuir-se o direito de programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
3. O ensino público não será confessional.

  ARTIGO 44.º
(Direito de deslocação e de emigração)
1. A todos os cidadãos é garantido o direito de se deslocarem e fixarem livremente em qualquer parte do território nacional.
2. A todos é garantido o direito de emigrar ou de sair do território nacional e o direito de regressar.

  ARTIGO 45.º
(Direito de reunião e de manifestação)
1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.

  ARTIGO 46.º
(Liberdade de associação)
1. Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.
2. As associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial.
3. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela.
4. Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares fora do Estado ou das Forças Armadas, nem organizações que perfilhem a ideologia fascista.

  ARTIGO 47.º
(Associações e partidos políticos)
1. A liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político.
2. Ninguém pode estar inscrito simultaneamente em mais de um partido político nem ser privado do exercício de qualquer direito por estar ou deixar de estar inscrito em algum partido legalmente constituído.
3. Os partidos políticos não podem, sem prejuízo da filosofia ou ideologia inspiradora do seu programa, usar denominação que contenha expressões directamente relacionadas com quaisquer religiões ou igrejas, bem como emblemas confundíveis com símbolos nacionais ou religiosos.

  ARTIGO 48.º
(Participação na vida pública)
1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direcção dos assuntos públicos do país, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos.
2. O sufrágio é universal, igual e secreto e reconhecido a todos os cidadãos maiores de 18 anos, ressalvadas as incapacidades da lei geral, e o seu exercício é pessoal e constitui um dever cívico.
3. Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos.
4. Todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, às funções públicas.

  ARTIGO 49.º
(Direito de petição e acção popular)
1. Todos os cidadãos podem apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição e das leis ou do interesse geral.
2. É reconhecido o direito de acção popular, nos casos e nos termos previstos na lei.

TÍTULO III
Direitos e deveres económicos, sociais e culturais
CAPÍTULO I
Princípio geral
  ARTIGO 50.º
(Garantias e condições de efectivação)
A apropriação colectiva dos principais meios de produção, a planificação do desenvolvimento económico e a democratização das instituições são garantias e condições para a efectivação dos direitos e deveres económicos, sociais e culturais.

CAPÍTULO II
Direitos o deveres económicos
  ARTIGO 51.º
(Direito ao trabalho)
1. Todos têm direito ao trabalho.
2. O dever de trabalhar é inseparável do direito ao trabalho, excepto para aqueles que sofram diminuição de capacidade por razões de idade, doença ou invalidez.
3. Todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade.

  ARTIGO 52.º
(Obrigações do Estado quanto ao direito ao trabalho)
Incumbe ao Estado, através da aplicação de planos de política económica e social, garantir o direito ao trabalho, assegurando:
a) A execução de políticas de pleno emprego e o direito a assistência material dos que involuntariamente se encontrem em situação de desemprego;
b) A segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos;
c) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais;
d) A formação cultural, técnica e profissional dos trabalhadores, conjugando o trabalho manual e o trabalho intelectual.

  ARTIGO 53.º
(Direitos dos trabalhadores)
Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, nacionalidade, religião ou ideologia, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
b) À organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal;
c) À prestação do trabalho em condições de higiene e segurança;
d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas.

  ARTIGO 54.º
(Obrigações do Estado quanto aos direitos dos trabalhadores)
Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:
a) O estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, bem como do salário máximo, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento;
b) A fixação de um horário nacional de trabalho;
c) A especial protecção do trabalho das mulheres durante a gravidez e após o parto, bem como do trabalho dos menores, dos diminuídos e dos que desempenhem actividades particularmente violentas ou em condições insalubres, tóxicas ou perigosas;
d) O desenvolvimento sistemático de uma rede de centros de repouso e de férias, em cooperação com organizações sociais.

  ARTIGO 55.º
(Comissões de trabalhadores)
1. É direito dos trabalhadores criarem comissões de trabalhadores para defesa dos seus interesses e intervenção democrática na vida da empresa, visando o reforço da unidade das classes trabalhadoras e a sua mobilização para o processo revolucionário de construção do poder democrático dos trabalhadores.
2. As comissões são eleitas em plenários de trabalhadores por voto directo e secreto.
3. O estatuto das comissões deve ser aprovado em plenário de trabalhadores.
4. Os membros das comissões gozam da protecção legal reconhecida aos delegados sindicais.
5. Podem ser criadas comissões coordenadoras para melhor intervenção na reestruturação económica e por forma a garantir os interesses dos trabalhadores.

  ARTIGO 56.º
(Direitos das comissões de trabalhadores)
Constituem direitos das comissões de trabalhadores:
a) Receber todas as informações necessárias ao exercício da sua actividade;
b) Exercer o controlo de gestão nas empresas;
c) Intervir na reorganização das unidades produtivas;
d) Participar na elaboração da legislação do trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector.

  ARTIGO 57.º
(Liberdade sindical)
1. É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses.
2. No exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, designadamente:
a) A liberdade de constituição de associações sindicais a todos os níveis;
b) A liberdade de inscrição, não podendo nenhum trabalhador ser obrigado a pagar quotizações para sindicato em que não esteja inscrito;
c) A liberdade de organização e regulamentação interna das associações sindicais;
d) O direito de exercício de actividade sindical na empresa.
3. As associações sindicais devem reger-se pelos princípios da organização e da gestão democráticas, baseados na eleição periódica e por escrutínio secreto dos órgãos dirigentes, sem sujeição a qualquer autorização ou homologação, e assentes na participação activa dos trabalhadores em todos os aspectos da actividade sindical.

4. As associações sindicais são independentes do patronato, do Estado, das confissões religiosas, dos partidos e outras associações políticas, devendo a lei estabelecer as garantias adequadas dessa independência, fundamento da unidade das classes trabalhadoras.
5. A fim de assegurar a unidade e o diálogo das diversas correntes sindicais eventualmente existentes, é garantido aos trabalhadores o exercício do direito de tendência dentro dos sindicatos, nos casos e nas formas em que tal direito for estatutariamente estabelecido.
6. As associações sindicais têm o direito de estabelecer relações ou filiar-se em organizações sindicais internacionais.

  ARTIGO 58.º
(Direitos das associações sindicais o contratação colectiva)
1. Compete às associações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem.
2. Constituem direitos das associações sindicais:
a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;
b) Participar na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses das classes trabalhadoras;
c) Participar no controlo de execução dos planos económico-sociais.
3. Compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva.

4. A lei estabelece as regras respeitantes à competência para a celebração das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas.

  ARTIGO 59.º
(Direito à greve)
1. É garantido o direito à greve.
2. Compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito.

  ARTIGO 60.º
(Proibição do 'lock-out')
É proibido o lock-out.

  ARTIGO 61.º
(Cooperativas e autogestão)
1. Todos têm o direito de constituir cooperativas, devendo o Estado, de acordo com o Plano, estimular e apoiar as iniciativas nesse sentido.
2. Serão apoiadas pelo Estado as experiências de autogestão.

  ARTIGO 62.º
(Direito de propriedade privada)
1. A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição.
2. Fora dos casos previstos na Constituição, a expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada mediante pagamento de justa indemnização.

CAPÍTULO III
Direitos e deveres sociais
  ARTIGO 63.º
(Segurança social)
1. Todos têm direito à segurança social.
2. Incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado, de acordo e com a participação das associações sindicais e outras organizações das classes trabalhadoras.
3. A organização do sistema de segurança social não prejudicará a existência de instituições privadas de solidariedade social não lucrativas, que serão permitidas, regulamentadas por lei e sujeitas à fiscalização do Estado.
4. O sistema de segurança social protegerá os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.

  ARTIGO 64.º
(Saúde)
1. Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.
2. O direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, pela criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude e da velhice e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo.
3. Para assegurar o direito à protecção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado:
a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;
b) Garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o país;
c) Orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos;
d) Disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o serviço nacional de saúde;
e) Disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso dos produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico.

  ARTIGO 65.º
(Habitação)
1. Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.
2. Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado:
a) Programar e executar uma política de habitação inserida em planos de reordenamento geral do território e apoiada em planos de urbanização que garantam a existência de uma rede adequada de transportes e de equipamento social;
b) Incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações tendentes a resolver os respectivos problemas habitacionais e fomentar a autoconstrução e a criação de cooperativas de habitação;
c) Estimular a construção privada, com subordinação aos interesses gerais.
3. O Estado adoptará uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria.
4. O Estado e as autarquias locais exercerão efectivo controlo do parque imobiliário, procederão à necessária nacionalização ou municipalização dos solos urbanos e definirão o respectivo direito de utilização.

  ARTIGO 66.º
(Ambiente e qualidade de vida)
1. Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender.
2. Incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e por apelo a iniciativas populares:
a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão;
b) Ordenar o espaço territorial de forma a construir paisagens biologicamente equilibradas;
c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico;
d) Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica.
3. O cidadão ameaçado ou lesado no direito previsto no n.º 1 pode pedir, nos termos da lei, a cessação das causas de violação e a respectiva indemnização.
4. O Estado deve promover a melhoria progressiva e acelerada da qualidade de vida de todos os portugueses.

  ARTIGO 67.º
(Família)
O Estado reconhece a constituição da família e assegura a sua protecção, incumbindo-lhe, designadamente:
a) Promover a independência social e económica dos agregados familiares;
b) Desenvolver uma rede nacional de assistência materno-infantil e realizar uma política de terceira idade;
c) Cooperar com os país na educação dos filhos;
d) Promover, pelos meios necessários, a divulgação dos métodos de planeamento familiar e organizar as estruturas jurídicas e técnicas que permitam o exercício de uma paternidade consciente;
e) Regular os impostos e os benefícios sociais, de harmonia com os encargos familiares.

  ARTIGO 68.º
(Maternidade)
1. O Estado reconhece a maternidade como valor social eminente, protegendo a mãe nas exigências específicas da sua insubstituível acção quanto à educação dos filhos e garantindo a sua realização profissional e a sua participação na vida cívica do país.
2. As mulheres trabalhadoras têm direito a um período de dispensa do trabalho, antes e depois do parto, sem perda da retribuição e de quaisquer regalias.

  ARTIGO 69.º
(Infância)
1. As crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral.
2. As crianças, particularmente os órfãos e os abandonados, têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, contra todas as formas de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo de autoridade na família e nas demais instituições.

  ARTIGO 70.º
(Juventude)
1. Os jovens, sobretudo os jovens trabalhadores, gozam de protecção especial para efectivação dos seus direitos económicos, sociais e culturais, nomeadamente:
a) Acesso ao ensino, à cultura e ao trabalho;
b) Formação e promoção profissional;
c) Educação física, desporto e aproveitamento dos tempos livres.
2. A política de juventude devera ter como objectivos prioritários o desenvolvimento da personalidade dos jovens, o gosto pela criação livre e o sentido de serviço à comunidade.
3. O Estado, em colaboração com as escolas, as empresas, as organizações populares de base e as colectividades de cultura e recreio, fomentará e auxiliará as organizações juvenis na prossecução daqueles objectivos, bem como todas as formas de intercâmbio internacional da juventude.

  ARTIGO 71.º
(Deficientes)
1. Os cidadãos física ou mentalmente deficientes gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição, com ressalva do exercício ou do cumprimento daqueles para os quais se encontrem incapacitados.
2. O Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos deficientes, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efectiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores.

  ARTIGO 72.º
(Terceira idade)
1. O Estado promoverá uma política da terceira idade que garanta a segurança económica das pessoas idosas.
2. A política da terceira idade deverá ainda proporcionar condições de habitação e convívio familiar e comunitário que evitem e superem o isolamento ou marginalização social das pessoas idosas e lhes ofereçam as oportunidades de criarem e desenvolverem formas de realização pessoal através de uma participação activa na vida da comunidade.

  ARTIGO 73.º
(Educação e cultura)
1. Todos têm direito à educação e à cultura.
2. O Estado promoverá a democratização da educação e as condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para o desenvolvimento da personalidade e para o progresso da sociedade democrática e socialista.
3. O Estado promoverá a democratização da cultura, incentivando e assegurando o acesso de todos os cidadãos, em especial dos trabalhadores, à fruição e criação cultural, através de organizações populares de base, colectividades de cultura e recreio, meios de comunicação social e outros meios adequados.

  ARTIGO 74.º
(Ensino)
1. O Estado reconhece e garante a todos os cidadãos o direito ao ensino e à igualdade de oportunidades na formação escolar.
2. O Estado deve modificar o ensino de modo a superar a sua função conservadora da divisão social do trabalho.
3. Na realização da política de ensino incumbe ao Estado:
a) Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito;
b) Criar um sistema público de educação pré-escolar;
c) Garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo;
d) Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística;
e) Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino;
f) Estabelecer a ligação do ensino com as actividades produtivas e sociais;
g) Estimular a formação de quadros científicos e técnicos originários das classes trabalhadoras.

  ARTIGO 75.º
(Ensino público o particular)
1. O Estado criará uma rede de estabelecimentos oficiais de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O Estado fiscaliza o ensino particular supletivo do ensino público.

  ARTIGO 76.º
(Acesso à Universidade)
O acesso à Universidade deve ter em conta as necessidades do país em quadros qualificados e estimular e favorecer a entrada dos trabalhadores e dos filhos das classes trabalhadoras.

  ARTIGO 77.º
(Criação e investigação científicas)
1. A criação e a investigação científicas são incentivadas e protegidas pelo Estado.
2. A política científica e tecnológica tem por finalidade o fomento da investigação fundamental e da investigação aplicada, com preferência pelos domínios que interessem ao desenvolvimento do país, tendo em vista a progressiva libertação de dependências externas, no âmbito da cooperação e do intercâmbio com todos os povos.

  ARTIGO 78.º
(Património cultural)
O Estado tem a obrigação de preservar, defender e valorizar o património cultural do povo português.

  ARTIGO 79.º
(Cultura física e desporto)
O Estado reconhece o direito dos cidadãos à cultura física e ao desporto, como meios de valorização humana, incumbindo-lhe promover, estimular e orientar a sua prática e difusão.

PARTE II
Organização económica
TÍTULO I
Princípios gerais
  ARTIGO 80.º
(Fundamento da organização económico-social)
A organização económico-social da República Portuguesa assenta no desenvolvimento das relações de produção socialistas, mediante a apropriação colectiva dos principais meios de produção e solos, bem como dos recursos naturais, e o exercício do poder democrático das classes trabalhadoras.

  ARTIGO 81.º
(Incumbências prioritárias do Estado)
Incumbe prioritariamente ao Estado:
a) Promover o aumento do bem-estar social e económico do povo, em especial das classes mais desfavorecidas;
b) Estabilizar a conjuntura e assegurar a plena utilização das forças produtivas;
c) Promover a igualdade entre os cidadãos, através da transformação das estruturas económico-sociais;
d) Operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento;
e) Orientar o desenvolvimento económico e social no sentido de um crescimento equilibrado de todos os sectores e regiões:
f) Desenvolver as relações económicas com todos os povos, salvaguardando sempre a independência nacional e os interesses dos portugueses e da economia do país;
g) Eliminar e impedir a formação de monopólios privados, através de nacionalizações ou de outras formas, bem como reprimir os abusos do poder económico e todas as práticas lesivas do interesse geral;
h) Realizar a reforma agrária;
i) Eliminar progressivamente as diferenças sociais e económicas entre a cidade e o campo;
j) Assegurar a equilibrada concorrência entre as empresas, fixando a lei a protecção às pequenas e médias empresas económica e socialmente viáveis;
l) Criar as estruturas jurídicas e técnicas necessárias à instauração de um sistema de planeamento democrático da economia;
m) Proteger o consumidor, designadamente através do apoio à criação de cooperativas e de associações de consumidores;
n) Impulsionar o desenvolvimento das relações de produção socialistas;
o) Estimular a participação das classes trabalhadoras e das suas organizações na definição, controlo e execução de todas as grandes medidas económicas e sociais.

  ARTIGO 82.º
(Intervenção, nacionalização e socialização)
1. A lei determinará os meios e as formas de intervenção e de nacionalização e socialização dos meios de produção, bem como os critérios de fixação de indemnizações.
2. A lei pode determinar que as expropriações de latifundiários e de grandes proprietários e empresários ou accionistas não dêem lugar a qualquer indemnização.

  ARTIGO 83.º
(Nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril de 1974)
1. Todas as nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril de 1974 são conquistas irreversíveis das classes trabalhadoras.
2. As pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas, fora dos sectores básicos da economia, poderão, a título excepcional, ser integradas no sector privado, desde que os trabalhadores não optem pelo regime de autogestão ou de cooperativa.

  ARTIGO 84.º
(Cooperativismo)
1. O Estado deve fomentar a criação e a actividade de cooperativas, designadamente de produção, de comercialização e de consumo.
2. Sem prejuízo do seu enquadramento no Plano, e desde que observados os princípios cooperativos, não haverá restrições à constituição de cooperativas, as quais podem livremente agrupar-se em uniões, federações e confederações.
3. A constituição e o funcionamento das cooperativas não dependem de qualquer autorização.
4. A lei definirá os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico.

  ARTIGO 85.º
(Iniciativa privada)
1. Nos quadros definidos pela Constituição, pela lei e pelo Plano pode exercer-se livremente a iniciativa económica privada enquanto instrumento do progresso colectivo.
2. A lei definirá os sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza.
3. O Estado fiscalizará o respeito da Constituição, da lei e do Plano pelas empresas privadas, podendo intervir na sua gestão para assegurar o interesse geral e os direitos dos trabalhadores, em termos a definir pela lei.

  ARTIGO 86.º
(Actividade económica e investimentos estrangeiros)
A lei disciplinará a actividade económica e os investimentos por parte de pessoas singulares ou colectivas estrangeiras, a fim de garantir a sua contribuição para o desenvolvimento do país, de acordo com o Plano, e defender a independência nacional e os interesses dos trabalhadores.

  ARTIGO 87.º
(Meios de produção em abandono)
1. Os meios de produção em abandono podem ser expropriados em condições a fixar pela lei, que terá em devida conta a situação específica da propriedade dos trabalhadores emigrantes.
2. No caso de abandono injustificado, a expropriação não confere direito a indemnização.

  ARTIGO 88.º
(Actividades delituosas contra a economia nacional)
1. As actividades delituosas contra a economia nacional serão definidas por lei e objecto de sanções adequadas à sua gravidade.
2. As sanções poderão incluir, como efeito da pena, a perda dos bens, directa ou indirectamente obtidos com a actividade criminosa, e sem que ao infractor caiba qualquer indemnização.

TÍTULO II
Estruturas da propriedade dos meios de produção
  ARTIGO 89.º
(Sectores de propriedade dos meios de produção)
1. Na fase de transição para o socialismo, haverá três sectores de propriedade dos meios de produção, dos solos e dos recursos naturais, definidos em função da sua titularidade e do modo social de gestão.
2. O sector público é constituído pelos bens e unidades de produção colectivizados sob os seguintes modos sociais de gestão:
a) Bens e unidades de produção geridos pelo Estado e por outras pessoas colectivas públicas;
b) Bens e unidades de produção com posse útil e gestão dos colectivos de trabalhadores;
c) Bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais.
3. O sector cooperativo é constituído pelos bens e unidades de produção possuídos e geridos pelos cooperadores, em obediência aos princípios cooperativos.
4. O sector privado é constituído pelos bens e unidades de produção não compreendidos nos números anteriores.

  ARTIGO 90.º
(Desenvolvimento da propriedade social)
1. Constituem a base do desenvolvimento da propriedade social, que tenderá a ser predominante, os bens e unidades de produção com posse útil e gestão dos colectivos de trabalhadores, os bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais e o sector cooperativo.
2. São condições do desenvolvimento da propriedade social as nacionalizações, o plano democrático, o controlo de gestão e o poder democrático dos trabalhadores.
3. As unidades de produção geridas pelo Estado e outras pessoas colectivas públicas devem evoluir, na medida do possível, para formas autogestionárias.

TÍTULO III
Plano
  ARTIGO 91.º
(Objectivos do Plano)
1. Para a construção de uma economia socialista, através da transformação das relações de produção e de acumulação capitalistas, a organização económica e social do país deve ser orientada, coordenada e disciplinada pelo Plano.
2. O Plano deve garantir o desenvolvimento harmonioso dos sectores e regiões, a eficiente utilização das forças produtivas, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com a política social, educacional e cultural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português.

  ARTIGO 92.º
(Força jurídica)
1. O Plano tem carácter imperativo para o sector público estadual e é obrigatório, por força de contratos-programa, para outras actividades de interesse público.
2. O Plano define ainda o enquadramento a que hão-de submeter-se as empresas dos outros sectores.

  ARTIGO 93.º
(Estrutura)
A estrutura do Plano compreende, nomeadamente:
a) Plano a longo prazo, que define os grandes objectivos da economia portuguesa e os meios para os atingir;
b) Plano a médio prazo, cujo período de vigência deve ser o da legislatura e que contém os programas de acção globais, sectoriais e regionais para esse período;
c) Plano anual, que constitui a base fundamental da actividade do Governo e deve integrar o orçamento do Estado para esse período.

  ARTIGO 94.º
(Elaboração e execução)
1. Compete à Assembleia da República aprovar as grandes opções correspondentes a cada Plano e apreciar os respectivos relatórios de execução.
2. A elaboração do Plano é coordenada por um Conselho Nacional do Plano e nela devem participar as populações, através das autarquias e comunidades locais, as organizações das classes trabalhadoras e entidades representativas de actividades económicas.
3. O implemento do Plano deve ser descentralizado, regional e sectorialmente, sem prejuízo da coordenação central, que compete, em última instância, ao Governo.

  ARTIGO 95.º
(Regiões Plano)
1. O país será dividido em regiões Plano com base nas potencialidades e nas características geográficas, naturais, sociais e humanas do território nacional, com vista ao seu equilibrado desenvolvimento e tendo em conta as carências e os interesses das populações.
2. A lei determina as regiões Plano e define o esquema dos órgãos de planificação regional que as integram.

TÍTULO IV
Reforma agrária
  ARTIGO 96.º
(Objectivos da reforma agrária)
A reforma agrária é um dos instrumentos fundamentais para a construção da sociedade socialista e tem como objectivos:
a) Promover a melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores pela transformação das estruturas fundiárias e pela transferência progressiva da posse útil da terra e dos meios de produção directamente utilizados na sua exploração para aqueles que a trabalham, como primeiro passo para a criação de novas relações de produção na agricultura;
b) Aumentar a produção e a produtividade da agricultura, dotando-a das infra-estruturas e dos meios humanos, técnicos e financeiros adequados, tendentes a assegurar o melhor abastecimento do país, bem como o incremento da exportação;
c) Criar as condições necessárias para atingir a igualdade efectiva dos que trabalham na agricultura com os demais trabalhadores e evitar que o sector agrícola seja desfavorecido nas relações de troca com os outros sectores.

  ARTIGO 97.º
(Eliminação dos latifúndios)
1. A transferência da posse útil da terra e dos meios de produção directamente utilizados na sua exploração para aqueles que a trabalham será obtida através da expropriação dos latifúndios e das grandes explorações capitalistas.
2. As propriedades expropriadas serão entregues, para exploração, a pequenos agricultores, a cooperativas de trabalhadores rurais ou de pequenos agricultores ou a outras unidades de exploração colectiva por trabalhadores.
3. As operações previstas neste artigo efectuam-se nos termos que a lei da reforma agrária definir e segundo o esquema de acção do Plano.

  ARTIGO 98.º
(Minifúndios)
Sem prejuízo do direito de propriedade, a reforma agrária procurará nas regiões minifundiárias obter um adequado redimensionamento das explorações, mediante recurso preferencial à integração cooperativa das diversas unidades ou ainda, sempre que necessário, ao seu emparcelamento ou arrendamento por mediação do organismo coordenador da reforma agraria.

  ARTIGO 99.º
(Pequenos e médios agricultores)
1. A reforma agrária efectua-se com garantia da propriedade da terra dos pequenos e médios agricultores enquanto instrumento ou resultado do seu trabalho e salvaguardando os interesses dos emigrantes e dos que não tenham outro modo de subsistência.
2. A lei determina os critérios de fixação dos limites máximos das unidades de exploração agrícola privada.

  ARTIGO 100.º
(Cooperativas e outras formas de exploração colectiva)
A realização dos objectivos da reforma agrária implica a constituição por parte dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores, com o apoio do Estado, de cooperativas de produção, de compra, de venda, de transformação e de serviços e ainda de outras formas de exploração colectiva por trabalhadores.

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