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Processo n.º 430/2013
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., melhor identificado nos autos, reclama para a conferência ao abrigo do disposto no n.º 3, do artigo 78.º-A, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), da decisão sumária proferida pelo Relator que decidiu não conhecer do objeto do recurso de constitucionalidade interposto.
2. A reclamação apresentada assume o seguinte teor:
«(...)
A., inconformado com a rejeição liminar do recurso de constitucionalidade que interpôs do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/03/2013, aresto que o condenou na pena unitária de dois anos de prisão efetiva, por prática do crime de coação sexual em acumulação com crime (separado) de detenção de arma proibida, requer acórdão, nos termos e com os fundamentos seguintes:
1.
Este arguido clama por Justiça: “recorrente de 60 anos, completamente surdo, apenas com amparo no magro vencimento de calceteiro da Junta de Freguesia de São Vicente de Fora, em Lisboa, onde é querido de todos, ou beneficiário da solicitude da mulher, não obstante se terem divorciado, mas continuado a viver juntos ... a condenação a dois anos de prisão efetiva, genética da perda definitiva do emprego (portanto, condenação à miséria de não ter rendimento futuro, nem para ele nem para casa), não pode, de modo algum, ser-lhe aceitável[1]”.
2.
Posto isto: o despacho de não recebimento do recurso de constitucionalidade propõe-nos três argumentos de justificação: (i) o vício normativo não foi arguido na fase própria do processo; (ii) de qualquer modo, a argumentação é manifestamente improcedente; (iii) mas, antes de mais, nem sequer o douto acórdão recorrido do TRL utilizou como ratio decidendi a visão normativa que o recorrente ataca de contrária à Constituição.
3.
O primeiro argumento é fácil de pôr de lado: se o douto acórdão da Relação tiver usado o argumento central de confirmar o julgamento da matéria de facto por motivo de ser insindicável, baseado no princípio legal da livre convicção do julgador, então, foi aí e não noutra fase do processo que a inconstitucionalidade se manifestou, sem dúvida, pela primeira vez ao recorrente.
4.
Por conseguinte, ao suscitar esta inconstitucionalidade no requerimento de arguição de nulidade do douto acórdão do TRL, o recorrente está de manifesto a fazê-lo no momento próprio processual, com vista a garantir o recurso para o Tribunal Constitucional: a arguição de nulidade do acórdão é um passo comum na marcha do processo; só nesse passo é que o recorrente já poderia ter suscitado a questão da inconstitucionalidade.
5.
Temos, portanto, que este ponto do despacho de não recebimento tabelar é de pôr de parte, acaso se verifique, na verdade, que a inconstitucionalidade alegada o foi com viabilidade.
6.
O mesmo se diga do segundo argumento: ser manifestamente improcedente o ponto de vista do recorrente.
7.
É que também o argumento precedente tem a ver com a congruência da arguição de inconstitucionalidade, neste feito.
8.
Será, portanto, necessário ao recorrente enfrentar o único e decisivo argumento do despacho de não recebimento, sobre o qual requer, agora, seja tirado acórdão do Tribunal Constitucional.
9.
Diz o Venerando Conselheiro Relator que o Tribunal da Relação de Lisboa não considerou julgada definitivamente a matéria de facto sob a tutela do art.º 127.º CPP, isto é, com fundamento nos poderes de livre apreciação do juiz, e que, por isso, nunca seria tematizavel a infração, neste domínio, ao princípio constitucional do duplo grau de apreciação pretoriana da causa.
10.
Ora bem, para contrariar esta opinião vertida no despacho de não recebimento tabelar, basta citar do douto acórdão do TRL o seguinte: “... acontece que a impugnação feita pelo recorrente ... ao indicar as provas que na sua perspetiva impunham uma decisão diversa ... assenta [est]a sua discordância na apreciação da prova feita pelo tribunal, diversa daquela que por si foi alcançada [,] só que nada pode infirmar a livre convicção do tribunal a quo, se criada em conformidade com o disposto no art.º 127.º do C.P.Penal [-] o princípio da livre apreciação da prova constitui … regra de apreciação ... indissociável da oralidade e imediação com que decorre o julgamento em 1ª instância”.
11.
Parece, pois, claro que o Tribunal da Relação, no douto acórdão posto em crise pelo recorrente, decidiu, com efeito, não criticar o julgamento da matéria de facto, e sobretudo não o criticar no confronto com o ponto de vista diverso que lhe foi apresentado na minuta do recurso, porque o art.º 127.º C.P.Penal — no entendimento do aresto — elide o duplo grau de apreciação, acaso se não verifiquem inconsistências do discurso da sentença, isto é, desde que a motivação in ínterim, ou seja, se nos seus próprios termos nos apresente uma narrativa coerente.
12.
Foi a este ponto de vista que o recorrente opôs a proibição constitucional de uma tal limitação do duplo grau, fundada no empreendimento jurídico nacional, sob o art.º 1.º da CRP, de uma sociedade justa, que não é qualquer em que a ordem jurídica penal permita, na égide do princípio da livre apreciação do juiz, um erro que seja mínimo de julgamento[2].
13.
Mas este foi o raciocínio condutor do douto acórdão do TRL, tanto quanto foi também a chave do indeferimento da arguição de nulidades.
14.
É certo que muito declamatoriamente, sobretudo no indeferimento da arguição de nulidades, foi dito que não houve entrave algum à crítica do julgamento da matéria de facto, por parte do tribunal de recurso.
15.
Mas, o que é verdade, é que o TRL assumiu o julgamento da matéria de facto feito na 1a instância, por ter entendido que não podia nem devia exceder a margem crítica da discursividade da sentença e para se manter estritamente no campo da narrativa passada a papel pelos julgadores.
16.
A aplicação pelo Tribunal de 2.ª Instância, a partir de uma leitura inconstitucional do âmbito e alcance do disposto no art.º 127.º C.P.Penal, da fórmula reitora do resultado do julgamento, quanto a ter o recorrente cometimento o crime de coação sexual, é aspeto que o recorrente focou com determinação.
17.
Basta para que o recurso seja admissível: saber-se-á se tem ou não razão.
(...)»
3. Notificado para o efeito, o Ministério Público pugnou pelo indeferimento da reclamação apresentada.
II. Fundamentação
4. A decisão sumária objeto de reclamação tem o seguinte teor:
«(...)
1. A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20 de março de 2013, que indeferiu o requerimento de arguição de nulidades apresentado pelo recorrente.
2. No seu requerimento de recurso, este esclarece que pretende ver apreciada “a inconstitucionalidade normativa de solução jurídica do caso concreto, ocorrida quando o Tribunal da Relação, por motivo de ter considerado irrecorrível o julgamento da matéria de facto (por parte do tribunal de 1.ª instância, e no seguimento apenas dos elementos de prova eleitos pelos julgadores) recusou ter em conta as críticas do recorrente centrada noutros, do mesmo modo emergentes da Audiência, e estimou dever interpretar-se o art.º 127.º CPP (livre apreciação da prova) como prescrevendo um julgamento final relativístico, com base no valor unilateral de certos depoimentos selecionados, isto é, elidindo o critério da verdade material e preferindo-lhe o da mera racionalidade do discurso, afinal, sob a inaplicabilidade ao caso do princípio do duplo grau de jurisdição penal. Este o princípio constitucional infringido por uma tal consequência interpretativa do referido art.º 127.º CPP.”
3. Nestes autos, foi o recorrente (arguido) condenado, em primeira instância, em concurso efetivo, como autor material e na forma consumada, pela prática de um crime de coação agravada, na pena de um ano e nove meses de prisão, e de um crime de detenção de arma proibida, na pena de oito meses de prisão. Daí resultou uma pena única de dois anos de prisão efetiva. Inconformado, o recorrente interpôs recurso de tal sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, concluindo na sua motivação que:
«(...)
I – A matéria dada como provada, se bem lida e entendida, não integra a prática do crime de coação e, muito menos, de coação agravada, mas apenas a prática do crime pp. no art.º 153.º/1 C. Penal.
II – Por isso mesmo, terá de merecer uma condenação na moldura penal mais benévola da ameaça que, cumulada com um abrandamento da pena de prisão aplicada, no caso do recorrente, por prática do crime de detenção de arma proibida, dará lugar a uma pena unitária não superior a um ano de prisão.
III – Pena de prisão de um ano, suspensa, por ser inconveniente do ponto de vista criminológico como remédio penal, aqui e agora, sobretudo por se conjugar com uma manifesta eficiência da ameaça do cumprimento da pena, no domínio da regularização harmónica e no tecido sociológico dos acontecimentos.
IV – Acontecimentos nos quais não deve ser investido o chamado, no acórdão recorrido, “passado criminal” do recorrente, por uma vez, não terem sido comprovados os pressupostos da reincidência, por outra vez e com mais importância, por não haver uma qualquer continuidade entre as condenações anteriores do arguido e o episódio anódino e sentimental que deu causa ao Julgamento.
V – Por conseguinte, argui o recorrente o acórdão recorrido de erro na aplicação da lei penal, desde logo, quando se louvou na prática do crime dos art.ºs 154.º/1-155.º/1/a, quando apenas no caso cabe a qualificação de ameaças, pp. art.º 153º/1, todos do C. Penal.
VI – Depois, porque graduou em excesso as penas de prisão, infringindo o art.º 71.º C. Penal: menor ilicitude do facto; dolo e ação vulgares, por motivos previsíveis e sociológicos; atores, ambos da mesma condição sócio-económica básica; conduta anterior e posterior irrelevante.
VII – Em todo o caso, e se porventura for conferida uma leitura de “constrangimento” à circunstância dada como provada, a saber: “conhecedora da personalidade violenta do arguido, perante as insistências e as afirmações deste, acabou por permitir a sua aproximação, descansada em que a situação fosse passageira e em que o recorrente não persistisse e cessasse perseguições constantes”, deve o Julgamento da matéria de facto, neste ponto, ser reformado, no sentido da eliminação do fragmento citado.
IX – Na verdade, o posto mostra-se contraditório, tendo em conta a redação do acórdão em que foi aceite pelos Julgadores, (i) por um lado, o bom testemunho de Elisabete, no sentido de uma relação sentimental, do recorrente com Helena, consentida e pública; (ii) por outro, a versão desta, pudicamente virada para ter tido origem na violência verbal do arguido.
X – E ao arrepio das normas da experiência comum que nos dizem ser contrário à natureza das coisas sociais um namoro de “Bairro” (sequer, mais ou menos) não-consentido entre um homem de 57 anos e uma mulher adulta e madura com, pelo menos, um filho de 27 anos.
XI – Tudo, que melhor fica esclarecido no cotejo com as transcrições dos depoimentos das testemunhas ouvidas em Audiência, que aqui se dão por reproduzidas, e constam dos pontos 62., 63.. e 64 da minuta, com indicação dos passos precisos das gravações, donde foram tiradas.
(...)»
O Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 30 de janeiro de 2013, julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida na sua globalidade. O recorrente apresentou, então, requerimento de arguição de nulidades, alegando, no que releva para o presente recurso de constitucionalidade, o seguinte:
«(...)
20. Para além desta nulidade, o acórdão da 2.ª instância apresentasse-nos [sic] com outro vício, quando afirmou, preto no branco, que o julgamento motivado da 1.ª instância sobre a matéria de facto não é suscetível de recurso, por se inscrever nos poderes de livre apreciação do juiz.
21. Assim, apenas o erro de julgamento palmar, revelado, tanto no texto da sentença, como eventualmente nas justificações do julgamento, é que, segundo o acórdão de 2.ª instância, fornece a base de uma impugnação, por via de recurso.
22. Ora, o Tribunal Constitucional que o duplo grau de recurso em matéria de julgamento de facto é um princípio constitucional incontornável.
23. Poderá, porventura, ter as restrições para que aponta o art.º 18.º/3 CRP.
24. Assim, teria, em primeiro lugar, de ser imposto apenas um grau de jurisdição para o acerto da matéria de facto penal se e só se esta solução legal não diminuísse a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
25. Mas é a própria Constituição, no seu art.º 1.º que se refere ao empenho do ordenamento jurídico nacional na construção de uma sociedade justa.
26. E não é com certeza uma sociedade justa qualquer uma em que a ordem jurídica penal permita, sob a égide do princípio da livre apreciação do juiz, um erro que seja mínimo de julgamento.
27. É com toda a evidência para evitar esse erro mínimo quanto ao julgamento de facto que o princípio constitucional da dupla jurisdição se anuncia na Lei Fundamental.
28. Logo, a crítica que o acórdão de 2.ª instância, neste caso, não faz ao erro de julgamento alegado nas conclusões de recurso, porque caberia a matéria de ponderação aos depoimentos transcritos na minuta nessa livre convicção dos juízes, que a motivaram dando simplesmente preferência a outros depoimentos, tão de acordo com a experiência de vida comum, como os depoimentos mobilizados pelo recorrente, vai contra a diretiva constitucional.
29. Deveria ter o Tribunal da Relação desenvolvido o tema do acerto da decisão da 1.a Instância naquela preferência e não ter dito de rajada que estava muito bem assim, sem se referir e refutar os argumentos contrários do recorrente.
30. Estamos aqui perante uma dupla nulidade: nulidade por omissão de pronúncia, quando o acórdão não justifica a si próprio, senão pelo diktat de ser assim porque lhe parece ser assim e nada mais; e nulidade decorrente da conjugação dos art.º 18.º/1/3 CRP, por ter considerado que o ordenamento não consagra o duplo grau de jurisdição, sem restrições, no julgamento da matéria de facto penal.
31. Este último foco de nulidades põe ao mesmo tempo o problema de uma inconstitucionalidade normativa, quando o Tribunal da Relação, por motivo de considerar irrecorrível o julgamento da matéria de facto pelo tribunal de 1.ª instância, nas circunstâncias acima referidas, considera dever interpretar-se o art.º 127.º CPP (livre apreciação da prova) como prescrevendo a estimativa final e relativística a do valor dos depoimentos prestados em julgamento, isto é, elidindo o critério da verdade material e preferindo-lhe o da mera racionalidade do discurso, sob a inaplicabilidade ao caso do princípio do duplo grau de jurisdição penal.
32. Vai portanto esta inconstitucionalidade alegada, aqui pela primeira vez, por ter sido de surpresa que o recorrente foi confrontado com este motivo de decisão da causa, já no acórdão de que agora reclama, para efeito de prevenir o recurso para o Tribunal Constitucional.
(...)»
Proferiu então o Tribunal da Relação de Lisboa a decisão recorrida – o acórdão de 20 de março de 2013 – pela qual indeferiu o requerimento de arguição de nulidades.
4. O recurso foi admitido pelo Tribunal recorrido. Contudo, em face do disposto no artigo 76.º, n.º 3, da LTC, e porque o presente caso se enquadra na hipótese normativa delimitada pelo artigo 78.º-A, n.º 1, do mesmo diploma, passa a decidir-se nos seguintes termos.
5. Sendo o presente recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, necessário se mostra que se achem preenchidos um conjunto de pressupostos processuais. A par do esgotamento dos recursos ordinários tolerados pela decisão recorrida, exige-se que o recorrente tenha suscitado, durante o processo e de forma adequada, uma questão de constitucionalidade, questão essa que deverá incidir sobre normas jurídicas que hajam sido ratio decidendi daquela decisão.
Ora, dúvidas não soçobram de que a questão formulada pelo recorrente quer no requerimento de recurso para este Tribunal, quer no requerimento de arguição de nulidades, não consubstancia uma questão de constitucionalidade normativa. Apesar da identificação do preceito de direito infraconstitucional que se reputa desconforme com a Constituição – o artigo 127.º, do Código de Processo Penal (CPP), que consagra o princípio da livre apreciação da prova – é patente que o recorrente pretende tão-só controverter a apreciação da prova produzida levada a cabo pelo tribunal recorrido. Com efeito, porque discorda de tal apreciação, o recorrente invoca que a Relação de Lisboa terá interpretado o artigo 127.º do CPP no sentido de recusar a aplicação, in casu, do duplo grau de jurisdição em matéria penal. Porém, facilmente se deteta que este é um expediente mobilizado com o exclusivo intuito de atacar a decisão recorrida, estando pois fora dos poderes de cognição do Tribunal Constitucional.
Aliás, mesmo que se vislumbrasse natureza normativa na questão enunciada – o que não se concede - sempre seria de recusar a admissão do presente recurso, visto que tal “interpretação” não tem nos autos qualquer respaldo, não se assumindo, nessa medida, como ratio decidendi da decisão recorrida. Vale por dizer que nem do acórdão recorrido, nem tampouco do acórdão de 30 de janeiro de 2013, decorre que a Relação de Lisboa haja interpretado o artigo 127.º do CPP no sentido de a partir dele afirmar ou rejeitar o princípio constitucional do duplo grau de jurisdição em matéria de facto. Sublinhe-se, finalmente, que o recorrente não suscitou tempestivamente – isto é, durante o processo – a questão de constitucionalidade que ambicionava ver apreciada pelo tribunal recorrido, improcedendo totalmente a argumentação relativa ao caráter surpreendente ou insólito da decisão proferida pela Relação naquela primeiro acórdão.
Destarte, somos levados a concluir pelo não preenchimento dos pressupostos processuais de que se acha dependente o presente recurso de constitucionalidade.
6. Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso.
(...)»
5. A reclamação apresentada pelo reclamante não coloca minimamente em crise a decisão sumária proferida. Com efeito, o juízo de não conhecimento agora objeto de reclamação fundou-se no não preenchimento, pelo recurso de constitucionalidade interposto, dos pressupostos processuais inferidos a partir da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, concretamente, na circunstância de a questão de constitucionalidade enunciada não revestir caráter normativo, não ter sido tempestivamente suscitada, e não constituir ratio decidendi da decisão recorrida - o Acórdão do Tribunal da Relação, de 20 de março de 2013.
Ora, argumenta o reclamante, em primeiro lugar, que o requerimento de arguição de nulidades, peça processual em que suscitou – pela primeira vez - a questão de constitucionalidade que integra o objeto do presente recurso, “é um passo comum na marcha processo” e que só nesse passo é que poderia ter procedido a tal levantamento. Sucede, porém, que talqualmente sustentado pela jurisprudência constante deste Tribunal (cfr., entre outros, os Acórdãos n.ºs 352/94 e 618/98, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt), e atenta a teleologia ínsita ao processo de fiscalização concreta, a questão de constitucionalidade deve ser arguida durante o processo, isto é, antes da prolação da decisão recorrida, não estando presentes – nem o reclamante os invoca, sublinhe-se – os pressupostos que poderiam consubstanciar algum dos desvios taxativamente tolerados ao critério supra identificado.
Depois, no que concerne a circunstância de a questão de constitucionalidade enunciada não ter constituído fundamento determinante do acórdão recorrido, invoca o reclamante que o Tribunal da Relação de Lisboa “decidiu, com efeito, não criticar o julgamento da matéria de facto, e sobretudo não o criticar no confronto com o ponto de vista diverso que lhe foi apresentado na minuta do recurso, porque o art.º 127.º C.P.Penal - no entendimento do aresto - elide o duplo grau de apreciação, acaso se não verifiquem inconsistências do discurso da sentença”. Contudo, uma vez mais se reitera que, para além de tal questão – pelas razões já avançadas na decisão sumária, e que o reclamante não ensaia controverter – não assumir recorte normativo, facto que sempre obstaria à admissibilidade do recurso, é evidente que o tribunal recorrido não adotou o entendimento nela respaldado, não afirmando nem infirmando um qualquer princípio constitucional do duplo grau de jurisdição em matéria de facto.
Confirmam-se, pois, os fundamentos que estiveram subjacentes à decisão sumária de não conhecimento do objeto do presente recurso de constitucionalidade.
III. Decisão
6. Termos em que, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação apresentada, e, por conseguinte, confirmar a decisão sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 (vinte) UCs., sem prejuízo da existência de apoio judiciário concedido nos autos.
Lisboa, 15 de julho de 2013. – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Joaquim de Sousa Ribeiro
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[1] - Reprodução dos pontos 3 e 4 do requerimento através do qual foi arguida a nulidade do douto acórdão do TRL de 30/01/2013
[2] Vide pontos 25 e 26 do requerimento através do qual foi arguida a nulidade do douto acórdão do TRL, de 30/01/2013.
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