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Processo n.º 374/12
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos da 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 323/2012:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, em 13 de abril de 2012 (fls. 227), do acórdão proferido, em conferência, pela 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra, em 21 de março de 2012 (fls. 201 a 222), sem que se procedesse, designadamente, à indicação da “norma cuja inconstitucionalidade (…) se pretende que o Tribunal aprecie”, conforme determina o n.º 1 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
2. Por isso mesmo, foi proferido, pela Relatora, nos termos do n.º 6 do artigo 75º-A da LTC, despacho de convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso, em 04 de junho de 2012 (fls. 235), ao qual o recorrente respondeu nos seguintes termos:
«1 – O recurso e interposto ao abrigo da alínea b) e nº 2 do artigo 70 da LTC.
2 – Os preceitos violados são o artigo 20 nº4, artigo 127 do CPP e o principio “in dúbio pró réu” referidos nas alegações de recurso do recorrente
3 – Estas arguições vieram a ser consideradas e julgadas improcedentes por acórdão da Relação de Coimbra de 21.03.12.» (fls. 237)
Posto isto, cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. O recurso foi admitido por despacho do Relator junto do tribunal “a quo”, proferido em 16 de maio de 2012 (fls. 230). Porém, por força do n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que deve começar-se por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator verificar que algum, ou alguns deles, não foram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
4. Apesar de expressamente convidado para o efeito, o recorrente persistiu em não indicar qual a “norma cuja inconstitucionalidade (…) se pretende que o Tribunal aprecie”. Com efeito, a mera referência a “Os preceitos violados são o artigo 20 n.º 4, artigo 127 do CPP (…)” (fls. 237) não se apresenta como bastante para uma adequada identificação da norma que constitui objeto do recurso interposto. Por um lado, mesmo que a referência ao “artigo 20 n.º 4” (sic) – sem identificação do ato legislativo no qual aquele se insere – se reportasse à Constituição da República Portuguesa, então seria forçoso concluir que uma norma constitucional não pode ser inconstitucional, sob pena de contradição intrassistémica. Por outro lado, o recorrente nunca identifica expressamente o artigo 127º do Código de Processo Penal (CPP) como norma padecedora de inconstitucionalidade, antes tendo afirmado que o mesmo teria sido violado. Ora, como é evidente, afirmar-se o desrespeito de uma norma legal não é o mesmo que apontar-se a sua inconstitucionalidade. Ao afirmar que tal norma foi violada, o próprio recorrente está a assumir, implícita e consequentemente, que a mesma é conforme à Constituição.
Assim sendo, ao abrigo do n.º 7 do artigo 75º-A da LTC, mais não resta do que concluir pela impossibilidade de conhecimento do objeto do recurso, na medida em que o recorrente não deu cumprimento ao despacho de convite ao aperfeiçoamento, mediante identificação da norma legal alegadamente inconstitucional.
III – DECISÃO
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, decide-se não conhecer do objeto do presente recurso.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.»
2. Inconformado com a decisão proferida, o recorrente veio deduzir a seguinte reclamação:
«1- Em 13 de abril de 2012 interpôs recurso do Acórdão proferido em conferência pela 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra
2- Nos termos do n° 6 do artigo 75 A da LTC foi o recorrente notificado para aperfeiçoar o requerimento de interposição que havia feito em 18.04.12
Assim,
3- Dever-se-ia indicar os elementos constantes do artigo 75 A n° 1 e 2 da LTC
4- O recorrente indicou que o recurso era interposto ao abrigo do artigo 70 nº 2 b) da LTC.
5- Referiu entre outros que o preceito violado era o artigo 127 do CPP.
6- Com esta referência queria significar que o referido preceito legal se interpretado no sentido de que a prova é apreciada segundo a livre convicção sem ter em conta que nos termos do n° 2 do artigo 32 da CRP “todo o arguido se presume inocente ate ao trânsito em julgado da sentença de condenação” e o consequente princípio constitucional “in dubio pró reo” e inconstitucional.
7- Nos termos do artigo 75 nº 1 da LTC, deve indicar-se a alínea do n° 1 do artigo 70 ao abrigo- da qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie.
E,
8- Nos termos do mesmo artigo agora o seu n° 2 sendo o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do Artigo 70 deve ainda constar a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considera violado bem como a peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade
Ora,
9- O arguido cumpriu o preceituado: indicou ao abrigo de que alínea do Artigo 70, era o recurso interposto; indicou a norma jurídica violada no caso o artigo 127 da CPP e indicou as peças processuais nas quais a dita inconstitucionalidade era arguido.
Em consequência deve a presente reclamação ser atendida prosseguindo o recurso os ulteriores termos.»
3. Notificado para o efeito, o Ministério Público veio pugnar pelo indeferimento da reclamação.
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – Fundamentação
4. Conforme resulta por demais evidente da reclamação deduzida, o reclamante vem agora assumir que nunca chegou a definir a concreta dimensão normativa do artigo 127º do CPP cuja inconstitucionalidade pretendia ver apreciada, seja em sede de requerimento de interposição de recurso, seja em sede de requerimento de aperfeiçoamento. Só agora, em sede de reclamação, veio o reclamante precisar qual seria essa dimensão normativa.
Fê-lo tarde, porém, pois cabia-lhe tê-lo feito anteriormente, pelo que a decisão reclamada só podia ter concluído pela impossibilidade de conhecimento do objeto do recurso, por falta de indicação da específica dimensão normativa em causa, mesmo após o convite para aperfeiçoamento que lhe foi dirigido.
III - Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 26 de setembro de 2012. – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Rui Manuel Moura Ramos.
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