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Processo n.º 371/12
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. reclama, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC) do despacho de 14 de dezembro de 2011 que não admitiu o recurso que interpôs do acórdão de 19 de outubro de 2011, do acórdão do Tribunal da Relação do Porto.
Em síntese, sustenta que, contrariamente ao decidido não pretende interpor recurso de uma decisão mas sim da norma jurídica quando interpretada da forma como foi na decisão recorrida, questão que já havia sido suscitada na anterior motivação do recurso apresentado da decisão de 1ª Instância.
2. O Ministério Público pronuncia-se no sentido da improcedência da reclamação, salientando que, na motivação do recurso interposto para a Relação, o recorrente não enunciou uma questão de inconstitucionalidade normativa, única que poderia constituir objeto idóneo do recurso de constitucionalidade, faltando, pois, esse requisito de admissibilidade exigido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70.ºda LTC.
Cumpre decidir.
3. O despacho reclamado é do seguinte teor:
“O arguido A. veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artº 70º nº 1 al. b) da LTC.
A interposição do referido recurso tem como pressuposto específico a suscitação prévia e de forma adequada da questão de inconstitucionalidade normativa cuja apreciação se requer ao Tribunal Constitucional.
Ora, durante o processo não foi suscitada uma qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, limitando-se o recorrente, na conclusão IV do seu recurso (v. fls. 349), a invocar a violação dos “princípios constitucionais da adequação, da necessidade e da razoabilidade”.
O que o recorrente pretende com o presente recurso para o TC é que esse Tribunal aprecie a inconstitucionalidade da decisão proferida na 1ª instância e confirmada por este Tribunal de recurso, ou seja, pretende a apreciação da conformidade constitucional da decisão condenatória e não de uma qualquer norma.
Contudo, o recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC é interposto de decisões dos tribunais, mas ao Tribunal Constitucional cabe apenas apreciar a conformidade constitucional de normas e não de decisões judiciais.
Não se mostrando cumprido o ónus que assistia ao recorrente de suscitar, de forma clara e precisa, a questão de inconstitucionalidade normativa, não se admite o recurso interposto a fls. 323 e ss., por manifestamente infundado – artºs. 70.º nº 1 al. b) e 76º nºs. 1 e 2 da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional.”
Como neste despacho se refere, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC cabe recurso para o Tribunal Constitucional para a apreciação de constitucionalidade de normas cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada, de modo processualmente adequado, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida e que este haja aplicado.
Ora, percorrida a motivação do recurso interposto da decisão do tribunal de 1ª Instância para o Tribunal da Relação do Porto, não se mostra que tenha sido suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. O que o recorrente aí refere, relativamente à questão com a que se relaciona a alegada violação de princípios constitucionais – cumprimento da pena de prisão aplicada na sentença, por incumprimento da pena de prisão substitutiva – é que “no caso em apreço, a proibição imposta ao arguido, de poder efetuar o pagamento voluntário da pena de multa substitutiva, é gritante e, viola os mais elementares princípios constitucionais da adequação, da necessidade, da razoabilidade e bem assim todo o espírito que envolve o nosso sistema Jurídico-Penal. Assim e, na modesta opinião do recorrente, o douto despacho de fls. 175, indeferindo a passagem das respetivas guias para imediato pagamento da multa, alegando, para tal, extemporaneidade, é ilegal, porque viola os princípios constitucionais acima mencionados e alem do mais encontra-se absolutamente desenquadrado com lógica intrínseca que rege o nosso sistema Jurídico-Penal”. Não há, nesta alegação, a convocação do Tribunal a que o recurso era dirigido a recusar aplicação a uma dada norma no uso dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 204.º da Constituição da República. Apenas se critica o despacho judicial então impugnado por violação das normas legais e princípios constitucionais.
Assim, é exato o fundamento do despacho reclamado de que falta o requisito de admissibilidade do recurso interposto exigido pelas disposições conjugadas da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º e do n.º 2 do artigo 72.º da LTC.
4. Acresce que, o recorrente não identificou, de modo claro e preciso, o sentido normativo cuja inconstitucionalidade pretende ver apreciada.
Não o fez no requerimento de interposição de recurso em que se limitou a dizer que “a norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie é a norma fixada no n.º 2 do artigo 43.º do Código Penal, com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida. Transcreve, seguidamente, partes da fundamentação do acórdão relativamente à questão do cumprimento de multa substitutiva, mas nunca enuncia um critério suscetível de generalização que traduza a interpretação adotada.
E também não o fez na presente reclamação, onde continua a referir-se à “norma fixada no n.º 2 do artigo 43.º do Código Penal, com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida” e a transcrever extensas passagens do discurso fundamentador desta.
Ora, fazendo a decisão do tribunal que revogue o despacho de indeferimento caso julgado quanto à admissibilidade do recurso (n.º 4 do artigo 77.º da LTC), incumbe ao reclamante que tenha dado deficiente cumprimento aos requisitos da interposição de recurso acautelar o seu suprimento na reclamação, em ordem a permitir ao Tribunal a apreciação definitiva da admissibilidade do recurso
5. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o reclamante nas custas com 20 Ucs. de taxa de justiça.
Lisboa, 12 de junho de 2012.- Vítor Gomes – Ana Guerra Martins – Gil Galvão.
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