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Processo n.º 295/2011
Plenário
Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
1. A. interpôs recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 79.º-D da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), do acórdão n.º 357/2011 em que, apreciando reclamação de decisão sumária proferida pela relatora, o Tribunal decidiu indeferir a reclamação e confirmar a decisão sumária reclamada.
Não tendo tal recurso sido admitido por despacho da relatora, veio A. sustentar que o relator no Tribunal Constitucional seria incompetente para apreciar o requerimento de interposição do recurso para o Plenário, requerendo, em consequência, que tal requerimento fosse apreciado pelo Plenário do Tribunal Constitucional.
Face ao indeferimento de tal requerimento pela relatora no Tribunal Constitucional, veio A. reclamar para o Plenário.
Através do acórdão n.º 97/2012, tirado em Plenário, o Tribunal Constitucional decidiu indeferir a reclamação.
Notificado desse acórdão, veio A. dizer o seguinte:
“1º
O recorrente nos autos em epigrafe, face à douta notificação de despacho proferido pela Mma. Juíza Conselheira Relatora, veio interpor recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional.
2º
Foi proferida pela Mma. Relatora no sentido de não admissão do recurso, indeferindo o respectivo requerimento de interposição.
3º
Nesse seguimento foi reclamado pelo recorrente no sentido de que, conforme o disposto no art. 700º, nº3 do CPC e com o acórdão n.º 170/1993, a apreciação do respectivo requerimento de recurso deve ser junto do Plenário do Tribunal Constitucional e não pela Ex.ma. Sra. Relatora.
4º
Apesar de tal reclamação, vem, novamente, a Ex.ma Sra. Relatora insistir que possui poderes para o efeito com base no artigo 78º-B da LTC em conjugação com o artigo 685º-C, aplicável ex vi artigo 69º da LTC.
5º
Mais refere a Ex.ma. Sra. Relatora que é competente quer para admitir quer para indeferir o requerimento de interposição de recurso para o Plenário a que se refere o artigo 79º-C da LTC.
6º
Mais alegou que o recorrente no sumário do acórdão n.º 170/93 o mesmo refere que “incumbe ao Plenário do Tribunal Constitucional, e não à secção, apreciar o requerimento apresentado, ao abrigo do art. 700º, nº3 do CPC, por quem se considere prejudicado pelo despacho do relator”.
7º
E, no caso concreto, o recorrente, considerado prejudicado pelo despacho da Ex.ma. Sra. Relatora de não admissão do recurso, veio efetuar-se a competente reclamação de não admissão do recurso, de forma a que o próprio Plenário, conhecesse da referida reclamação e não a Ex.ma Sra. Relatora, já que a lei não lhe permite devendo efetura-se a sua interpretação adequada da norma do nº2 do art. 78º-B da LTC.
8º
Assim, da conjugação e análise dos art. 69º, 78º-B, 79º-D, todas da LTC, bem como o acórdão n.º 170/93, resulta que não cabem nos poderes atribuídos ao relator a apreciação do requerimento por quem se considere pelo despacho do próprio relator, tendo legitimidade neste caso, para conhecer da questão, o Plenário do Tribunal Constitucional.
9º
No entanto, a Ex.ma Relatora ao praticar acto para o qual não tem legitimidade, e portanto não dando cumprimento ao que refere a lei, praticou um acto que a lei não admite e que ao abrigo da norma do art. 201º do CPC aplicável ex vi art. 69º da LTC, aqui o recorrente arguiu a nulidade desse mesmo acto quando a lei o declara ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame da decisão da causa.
10º
Para sustentar a posição do recorrente, invocou a jurisprudência do Tribunal Constitucional (vide ACTC) – Processo, o mesmo 26/04, Plenário, Relator Conselheiro Benjamim Rodrigues “… o meio processual adequado para conhecer da reclamação da decisão do relator que não admita o recurso interposto para o Plenário só poderá ser para a conferencia desse mesmo Plenário do Tribunal, e fazer-se uma interpretação adequada da norma constante do nº2 do art. 78º-B da LTC”.
11º
E, com os supra alegados fundamentos o recorrente argui a nulidade do ato praticado pela Mma. Juíza relatora.
Posto isto, vejamos
I – Questão da inconstitucionalidade da norma do art. 78º-B da LTC
12º
A fundamentação da decisão da Mma. Juíza Relatora estribou-se no disposto no nº1 do art. 78º-B da Lei do Tribunal Constitucional.
13º
Ora tal aplicação esbarra a disfuncionalidade do poder jurisdicional hermético concedido ao Relator, que na primeira fase não admitiu o recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional da sua própria decisão.
14º
A questão a dirimir trata-se de aferir se a atribuição por parte do legislador de poderes para rejeitar (indeferir), mediante decisão sumária, um recurso interposto a um Relator de um Tribunal Constitucional contrário ou não o direito fundamental de acesso à Justiça (art. 20º, nº1 da CRP)!
15º
Presentemente, a esfera de proteção normativa do direito fundamental ao recurso em sede da norma constitucional não foi tida em conta.
16º
A invocação do art. 20º, nº1 da CRP, salvo douta decisão, conflitua com os direitos fundamentais de acesso à Justiça.
II – Decisão normativa à luz da Convenção Europeia dos Direitos do Homem
17º
A decisão da Mui Sra. Relatora à face da aplicação da norma Constitucional 78º da LTC, viola o art. 6º nº1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
18º
Viola o art. 8º e 20º da CRP.
19º
A Convenção Europeia dos Direitos do Homem aplica-se a pessoa singular, o mesmo tendo de acontecer com o art. 20º da CRP, resultante da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
20º
Assim, deve ser considerada ferida de inconstitucionalidade a norma do art. 78º-B nº1 da LTC.
Conclusões
1ª – Da conjugação e análise dos art. 69º, 78º-B, 79º-D, todas LTC, bem como o acórdão n.º 170/93, resulta que não cabem nos poderes atribuídos ao relator a apreciação do requerimento/reclamação por que se considere prejudicado pelo despacho do próprio relator, tendo legitimidade nesse caso, para conhecer da questão, o Plenário do Tribunal Constitucional.
2ª – A Ex.ma Sra. Relatora ao insistir que possuía poderes para o efeito, com base no artigo 78º-B da LTC em conjugação com o artigo 685º-C do CPC, aplicável ex vi artigo 69º da LTC, assim como invocando o artigo 79º-C da LTC, está a extravasar os seus poderes.
3ª – A Ex.ma Sr. Relatora simplesmente praticou um acto para o qual não possuía legitimidade, e que ao abrigo da norma do art. 201º do CPC aplicável ex vi art. 69º da LTC, deve ser declarado nulo, com as devidas consequências legais.
4ª - Ao se indeferir o requerimento/reclamação apresentado pelo recorrente, na parte em que se pede que o tribunal declare a “nulidade do ato praticado pelo juiz relator, bem como os termos subsequentes que dele dependem absolutamente, ao abrigo da norma do artigo 201º do CPC” viola o Plenário os princípios constitucionais dos artigos 8º e 20º da CRP.
5ª – A norma 78º-B, nº1 da LTC padece da inconstitucionalidade instrumental e em consequência a alegada nulidade.
6ª – Ao decidir-se aplicar a norma constitucional 78º-B da LTC viola-se o art. 6º, nº1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
7ª – A Convenção Europeia dos Direitos do Homem aplica-se a pessoa singular, o mesmo tendo de acontecer com o art. 20º da CRP, resultante da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
8ª – Assim, deve ser considerada ferida de inconstitucionalidade a norma do art. 78º-B, nº1 da LTC.
9ª – Deve ser considerado nulo e sem efeito o acórdão recorrido.”
2. Sendo manifesto que, com o presente requerimento, o recorrente pretende tão-só obstar à baixa do processo, justifica-se o uso da faculdade prevista nos artigos 84.º, n.º 8, da LTC e 720.º do Código de Processo Civil.
O uso dessa faculdade implica que se considere “provisoriamente transitada em julgado” a decisão (in casu, o Acórdão n.º 357/2011, de 12.07.2011, através do qual o Tribunal decidiu indeferir a reclamação apresentada, confirmando o fundamento oferecido na decisão sumária reclamada para a não admissão do recurso de constitucionalidade interposto) a cujo cumprimento a parte procura obstar através da suscitação de incidentes anómalos ou dilatórios.
Assim sendo, o processo deverá prosseguir os seus regulares termos no tribunal recorrido, sem ficar à espera da decisão dos incidentes processados no traslado, sob pena de, se assim não se procedesse, se inutilizar a eficácia desse mecanismo de “defesa contra demoras abusivas”.
Na eventualidade de o Tribunal Constitucional vir a deferir o requerido, então aplicar-se-á o disposto na parte final do n.º 2 do artigo 720.º do Código de Processo Civil, anulando-se o processado afetado pela modificação da decisão (tal como sucede na hipótese de provimento de recurso de revisão de decisões judiciais transitadas em julgado). Até lá, tudo se deverá processar como se o Acórdão n.º 357/2011 tivesse transitado em julgado (cf. Carlos Francisco de Oliveira Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2.ª edição, Coimbra, 2004, p. 615, e jurisprudência aí citada).
3. Em face do exposto, determina-se que:
a) após extração de traslado integrado por cópia das fls. 60-64, 69, 72, 74, 83, 94-95, 112-117 e 123-128 e do presente acórdão e contado o processo, se remetam de imediato os autos ao Supremo Tribunal Administrativo;
b) apenas se abra conclusão no traslado para apreciação do requerimento de fls. 123-128 após o pagamento das custas devidas.
Lisboa, 17 de abril de 2012.- Maria Lúcia Amaral – J. Cunha Barbosa – Maria João Antunes – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão – João Cura Mariano – Ana Maria Guerra Martins – Catarina Sarmento e Castro – Joaquim de Sousa Ribeiro – Vítor Gomes – Carlos Pamplona de Oliveira – Rui Manuel Moura Ramos.
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