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Processo n.º 14/2012
2.ª Secção
Relator: Conselheiro José Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., melhor identificado nos autos, reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão, da decisão sumária proferida pelo relator que decidiu não conhecer das questões de constitucionalidade apontadas no seu requerimento de interposição de recurso.
2. A reclamação apresentada pelo recorrente é do seguinte teor:
“ (…)
A., Recorrente melhor id. no processo à margem referenciado, vem aos autos apresentar a sua reclamação para a Comissão da decisão sumária proferida nos autos e requerer que o recurso supra citado seja apreciado pelo Tribunal Constitucional, devendo revogar-se a decisão proferida pelo Juiz Relator, nos termos e ao abrigo do art. 78º-A, nº 3 da LTC, com redação da Lei nº 13-A/98, de 26 de fevereiro.
(…)”.
3. Notificados os recorridos da reclamação apresentada, vieram os mesmos responder nos seguintes termos:
“(…)
B. e C., recorridos nos autos à margem identificados, em que é recorrente A., notificados para responder ao requerimento/pedido de reclamação apresentado pelo recorrente, vêm dizer o seguinte:
Os recorridos acompanham na íntegra o teor da Douta decisão sumária n°56/2012, proferida pelo Sr. Juiz Conselheiro.
De resto, como muito bem refere o Sr. Juiz Conselheiro, o art. 70º da LTC, delimita bem quais as decisões suscetíveis de serem conhecidas e apreciadas por este Douto Tribunal.
E, o fundamento que o recorrente A. invoca no seu recurso, não cabe em nenhum dos pontos constantes no referido art. 70º da LCT.
E, sendo certo que, no decurso do processo, o recorrente nunca levantou qualquer questão de inconstitucionalidade, o recurso não poderia ter sido conhecido.
Com o presente recurso, o que o recorrente A. pretende é protelar no tempo a aplicação de uma decisão, sabendo bem que a mesma já não é suscetível de recurso.
Tanto mais que, como se disse, em fase de recurso para o Tribunal de Évora, tendo a ação sido instaurada contra o recorrente e mulher e, tendo sido ele a receber as duas citações, a dele e a da mulher, não houve qualquer nulidade na citação, como não há qualquer inconstitucionalidade na apreciação.
Assim, deve indeferir-se o pedido apresentado pelo recorrente, e manter-se a decisão sumária 56/2012.
(…)”.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
4. A decisão objeto da presente reclamação, é do seguinte teor:
“(…)
1. A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alíneas a) e b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), requerendo “a Declaração de Inconstitucionalidade da Omissão da aplicação ao caso sub-júdice dos arts. 195º e 198º do C.P.C., ao não considerar como nula a citação da mulher do A., D. (…) A., sumariamente identificada no Ofício de Citação Postal como D1.”. Mais explicita que a “questão em apreço a esse Tribunal é a apreciação da inconstitucionalidade por omissão da aplicação dos artigos do CPC supra referidos, os quais o Tribunal da Relação deveria ter aplicado de acordo com a interpretação de que o recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça deveria ser admitido”.
2. O recurso foi admitido pelo Tribunal recorrido. Contudo, em face do disposto no artigo 76.º, n.º 3, da LTC, e porque o presente caso se enquadra na hipótese normativa delimitada pelo artigo 78.º-A, n.º 1, do mesmo diploma, passa a decidir-se nos seguintes termos.
3. O presente recurso vem fundado no disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Em ambos os casos, a intervenção do Tribunal Constitucional não incide sobre a correção jurídica do concreto julgamento, mas apenas sobre as normas que constituíram ratio decidendi da decisão recorrida, no caso da alínea a), quando a sua aplicação tiver sido recusada com fundamento em inconstitucionalidade, no caso da alínea b), quando essa questão tiver sido suscitada durante o processo.
Em todo o caso é sempre forçoso que, no âmbito dos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional, se questione a (in)constitucionalidade de normas, não sendo, assim, admissíveis os recursos que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol, sindiquem, sub species constitutionis, a concreta aplicação do direito efetuada pelos demais tribunais, em termos de se assacar ao ato judicial de “aplicação” a violação (direta) dos parâmetros jurídico-constitucionais dado que não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do julgamento efetuado in concreto pelo tribunal a quo.
Deste modo, sendo o objeto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade constituído por normas jurídicas, que violem preceitos ou princípios constitucionais, não pode sindicar-se, no recurso de constitucionalidade, a decisão judicial em si mesma, quer no que tange à eventual aplicação que a mesma faça, diretamente, de preceitos ou princípios constitucionais, quer no que respeita ao modo como a mesma determinou o direito infraconstitucional ou subsumiu a ele as circunstâncias concretas do caso.
Nestes termos, não cabe a este Tribunal aferir se aplicação, ou não, de certas normas aos factos padece de qualquer vício de julgamento ou de inconstitucionalidade, não lhe sendo possibilitado o controlo de qualquer omissão de aplicação do direito ordinário.
Ainda assim, cumpre explicitar que o controlo de constitucionalidade possibilitado pela alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, apenas abrange os casos em que existe uma efetiva recusa de aplicação ao caso de uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, o que não sucedeu in casu.
Por outro lado, nos casos abrangidos pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, apenas se admite o recurso relativamente a normas cuja constitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo, circunstância que igualmente não se verifica no presente caso concreto.
Nestes, face à delimitação do âmbito do recurso, perspetiva-se igualmente que o mesmo assenta em objeto inidóneo, porquanto referido especificamente à decisão recorrida, questão esta que exorbita do âmbito normativo que recorta a esfera de competência cognitiva deste Tribunal.
4. Termos em que, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso.
(…)”.
5. O reclamante, como se alcança do teor da reclamação por si formulada, não aduz qualquer argumento, muito menos novo, suscetível de infirmar o sentido da decisão sumária reclamada, porquanto naquela se limita a formular pedido de revogação desta e, bem assim, que o recurso interposto seja apreciado pelo Tribunal, concluindo com a indicação do normativo processual que consente a formulação da reclamação.
Ora, a mera manifestação de discordância com o sentido da decisão sumária proferida, sem que se invoque qualquer fundamento que o controverta, dificilmente consente que se possa concluir pela existência de uma autêntica reclamação ou, no mínimo, reclamação sustentada.
Porém, mau grado tal omissão, sempre se dirá que de uma leitura minimamente atenta dos autos não resulta qualquer fundamento ou argumento que possa sustentar a alteração do sentido daquela decisão, antes pelo contrário; na realidade, da análise dos autos conclui-se, tal como se afirma na decisão reclamada, que «… face à delimitação do âmbito do recurso, ... o mesmo assenta em objeto inidóneo, porquanto referido especificamente à decisão recorrida, questão esta que exorbita do âmbito normativo que recorta a esfera de competência cognitiva deste Tribunal».
Assim, impõe-se concluir pela manifesta a improcedência da presente reclamação.
III. Decisão
6. Nos termos supra expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 (vinte) UCs., sem prejuízo de apoio judiciário concedido nos autos.
Lisboa, 24 de abril de 2012. – J. Cunha Barbosa – Joaquim de Sousa Ribeiro – Rui Manuel Moura Ramos.
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