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Processo n.º 848/11
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão sumária:
«1. O recorrente foi condenado na pena de 4 anos de prisão pela prática do crime de roubo. Interpôs recurso da sentença condenatória alegando, além do mais, que:
“(…)
9- 48 meses de prisão por uma bagatela penal é um desconchavo... .Tal pena excede em muito a medida da culpa A pena de 4 anos é desajustada, não atende à conduta do arguido e não visa a REINSERÇAO e REINTEGRAÇÃO na SOCIEDADE: art. 40 C.P; Beccaria “Dos Delitos” 1764, Giorgio Dei Vecchio, in Direito e Paz, 1968, Scientia Jurídica, p. 41 e ainda L. Settembrinni, in Ricordanze delia mia vita - ed Bari 1934. Vol II- pag 41.
Violados que foram as normas supra invocadas, declarada a nulidade supra invocada, devendo o julgamento ser repetido, ou o arguido condenado em pena suspensa, Vossas Excelências farão a mais Lídima Justiça.
Normas violadas: a) arts. , 97-5 CPP e 205 da Lei Fundamental, 40 e 210 do Cód . Penal
b) O Tribunal a quo entendeu que os arts. 124 do C.P.P. e 210 Cód. Penal inculcam pena de prisão efectiva; o recorrente entende que isto induz a uma interpretação inconstitucional por violação dos arts. 32 da CRP e 50 da Convenção Europeia. E que atenta a postura processual ab initio e em julgamento deve ser condenado em pena suspensa na execução.
c) O Tribunal a quo interpretou o art. 210 CP num sentido restritivo e sem sopesar os malefícios da prisão; o recorrente entende que a assunção da culpa ab initio e a interiorização do crime bastam para a suspensão da pena, sendo certo que o arguido está para ser colocado em trabalho condigno e tem cumprido com a medida de Vigilância electrónica
Fazendo apelo aos Princípios da Igualdade e Humanidade das Penas, condenando em 4 anos, suspensos na sua execução, satisfaz-se o anseio da Comunidade, pelo que concedendo provimento ao recurso Vossas Excelências farão a mais Lídima Justiça!
(…).”
Por acórdão de 16 de Junho de 2011, o Tribunal da Relação e Lisboa negou provimento ao recurso interposto por este arguido. Quanto à questão da suspensão da execução da pena o acórdão ponderou:
“(…)
Quanto a este recorrente, o tribunal deu como provado que esteve no cerne da actuação criminosa, juntamente com os recorrentes A. e B., em comunhão de esforços, conjecturando a forma de concretização dos factos.
Porém, a decisão recorrida, na determinação concreta da pena quanto ao recorrente, faz uma distinção ao nível de gravidade da sua culpa, em relação aos arguidos referidos, relevando o papel que o recorrente teve para a mais rápida descoberta da verdade material, referindo expressamente que ‘A favor do arguido C. colhe-se o seu arrependimento, que se consubstanciou no papel relevante que teve na descoberta da verdade material, nos termos já acima mencionados, o que revela a assumpção do desvalor da sua conduta. Tal facto proporciona a leitura de que as necessidades de prevenção especial se encontram mais mitigadas do que as apresentadas pelos arguidos A. e B.. Cresceu num ambiente desestruturado, o que se reflectiu na sua auto-estima. No presente, possui apoios familiares e manifesta vontade de voltar a pautar a sua vida pelas normas sociais. Revela hábitos de trabalho, sendo que actualmente permanece inactivo, ao que não será alheia a medida de coacção a que se encontra sujeito.
Possui já um registo criminal por condução em estado de embriaguez, praticado quatro dias depois dos factos dos autos. Em seu desfavor milita, ainda, tal como para os arguidos A. e B. de que já se falou, intensas necessidades de prevenção geral. Acresce-lhe o dolo intenso da sua conduta e o facto de a ter premeditado e preparado”.
Verifica-se, assim, que a decisão recorrida atendeu a todos os factores exigíveis, nomeadamente, aos referidos nos artigos 40º, 70º e 71º do CP, não excedendo, ao contrario do alegado, a medida da culpa, sendo que, no caso concreto, a pena aplicada se situou, ligeiramente, acima do limite mínimo.
O facto de não registar antecedentes relevantes, ter 36 anos de idade, ter um filho menor e cumprir com rigor a medida de vigilância electrónica, não permite a suspensão da pena por 4 anos, como pretende o recorrente atenta gravidade dos factos praticados e as necessidades de prevenção geral e especial que, como bem salienta a decisão recorrida, se não compadecem com a suspensão da pena de prisão, sob pena de descredibilização do sistema judiciário por desproporção e desadequação entre a gravidade do facto e a punição.
(…).”
2. O recorrente interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional mediante requerimento do seguinte teor:
“O recurso tem em vista ser declarado que:
- o Tribunal a quo e o TRL entenderam que os arts. 124 do C.P.P. e 210 Cód. Penal inculcam pena de prisão efectiva; o recorrente entende que isto induz a uma interpretação inconstitucional por violação dos arts. 32 da CRP e 50 da Convenção Europeia.
E que atenta a postura processual ab initio e em julgamento deve ser condenado em pena suspensa na execução.
-o Tribunal a quo e o TRL interpretaram o art. 210 CP num sentido restritivo e sem sopesar os malefícios da prisão; o recorrente entende que a assunção da culpa ab initio e a interiorização do crime bastam para a suspensão da pena, sendo certo que o arguido está para ser colocado em trabalho condigno e tem cumprido com a medida de Vigilância electrónica
O recurso é interposto ao abrigo do art. 70-1-b) da Lei do Tribunal Constitucional
As questões foram suscitadas nas Conclusões e parte final do recurso.”
3. O recurso foi admitido, mas não pode prosseguir pelas seguintes razões de manifesta evidência, que tornam desnecessário a apreciação de quaisquer outras:
A)
Em primeiro lugar, o recurso não versa sobre uma “norma jurídica”, como é exigido pela Constituição (artigo 280.º da CRP) e pela Lei (artigo 70.º da LTC). O que o recorrente pretende ver apreciado não é um critério normativo de decisão abstractamente instituído ou retirado dos preceitos legais que identifica relativamente à escolha da pena, mas a própria decisão de não aplicar pena suspensa no circunstancionalismo do caso concreto. Está, pois, em causa a opção pela não suspensão da pena ou, na interpretação mais favorável, a constitucionalidade da decisão, não a constitucionalidade de qualquer norma jurídica a esse assunto respeitante.
Consequentemente, o recurso não pode prosseguir por não ter objecto idóneo [artigo 70.º, n.º1, alínea b), da LTC].
B)
Em segundo lugar, nem os preceitos legais que o recorrente indica se referem à opção pela aplicação ou não de pena suspensa, nem o acórdão recorrido retirou esse efeito de qualquer deles ou do seu conjunto. É destituída de relação com o teor do acórdão recorrido a afirmação de que o Tribunal da Relação entendeu os referidos preceitos legais no sentido de que esses preceitos “inculcam pena de prisão efectiva”.
Portanto, o recurso não pode prosseguir porque não versa sobre norma aplicada como ratio decidendi pelo acórdão recorrido [alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC).
Assim, sem necessidade de examinar outras razões – designadamente a falta de suscitação de modo processualmente adequado de uma questão de constitucionalidade normativa – não pode conhecer-se do objecto do recurso, o que imediatamente se decide ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
4. Decisão
Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso e condenar o recorrente nas custas, com 7 UCs de taxa de justiça.»
2. O recorrente reclamou para a conferência, nos seguintes termos:
“(…),vem RECLAMAR para a Conferência com os seguintes fundamentos.
- O recorrente invocou os arts. 124 CPP, 210 Cód. Penal, 32 da CRP e 5º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
2- E recorreu ao abrigo do art. 70-l-b) da Lei do Tribunal Constitucional
3- A fls 3 alega-se que o recorrente coloca cm causa a própria Decisão e não uma “norma jurídica” como é exigido pelo art. 280 da Constituição.
4 - O recorrente invocou fundamentos que colocam em crise as normas jurídicas na hermenêutica expendida pelo Tribunal da Relação Lisboa: arts. 124 CPP, 210 CP., 32 da CRP e 5º da Convenção Europeia.
5- O recurso merece provimento pelo que ao abrigo do art. 78-A – nº 3 da Lei do Tribunal Constitucional deve ser admitido.”
3. O Ministério Público responde nos termos seguintes:
“1º
Pela douta Decisão Sumária n.º 649/2011, não se tomou conhecimento do objecto do recurso, com base numa dupla fundamentação:
- o recorrente questionou a própria decisão e não qualquer “norma jurídica”;
- os preceitos legais indicados não tinham sido aplicados na decisão recorrida.
2º
Na reclamação agora apresentada, o recorente nada diz sobre as razões processuais porque entende que se devia ter conhecido do objecto do recurso.
3.º
Sendo evidente a inverificação daqueles dois requisitos de admissibilidade do recurso, deve a reclamação ser indeferida.”
4. A reclamação é manifestamente destituída de fundamento.
Com efeito, o reclamante não desenvolve o mínimo de argumentação destinada a rebater qualquer das razões pelas quais se decidiu não conhecer do objecto do recurso. Limita-se a afirmar que “invocou fundamentos que colocam em crise as normas jurídicas na hermenêutica expendida pelo Tribunal da Relação e Lisboa: arts 124 CPP, 210 C.P., 32 da CRP e 5.º da Convenção Europeia” o que não abala qualquer dos fundamentos da decisão reclamada, designadamente aquele que consiste em não ter sido dos artigos 124.º do Código de Processo Penal (CPP) e do artigo 210.º do Código Penal (CP) que o acórdão recorrido extraiu o critério de decisão quanto a suspender ou não a execução da pena de prisão.
5. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o recorrente nas custas, com 20 UCs de taxa de justiça
Lisboa, 14 de Dezembro de 2011.- Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão.
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