|
Processo n.º 384/11
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Notificado do acórdão de fls. 665 (Acórdão n.º 421/11) o recorrente A. apresenta a seguinte reclamação, por si subscrita:
“I. Em 29 de Maio de 1993, no discurso a fechar o Colóquio, iniciado na véspera, que – adstrito ao duplo tema da Legitimidade e Legitimação da Justiça Constitucional – ai assinalou o 10º Aniversário desse Tribunal Constitucional, o honorável jurisconsulto então seu Vice-Presidente, começando praticamente – a descrever o arco “Da politização à independência” – por apontar o «erro», e contestar o «mito», daqueles que entendem ser juízes «políticos», «contaminados», ou mesmo «infectados», os titulares desse preciso órgão de soberania, logo avisando que quem sustenta «que deve haver uma integração das duas jurisdições», a comum ou ordinária e a constitucional, o que está a propor, «não é a extinção do Tribunal Constitucional, mas sim a extinção do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto último grau de uma hierarquia e de uma carreira», deixou em remate a reafirmação (tida, inclusive, como assente no Direito Comparado) de que a questão essencial, neste particular domínio, «não é a da composição do Tribunal Constitucional, mas antes a do reforço das garantias de independência dos seus juízes»; glosando também a efeméride pouco depois, em artigo publicado na edição de 19 de Junho seguinte do semanário ‘Expresso’, sob o título “Nas dez anos do TC”, o não menos notável constitucionalista Vital Moreira denunciaria com precisão que, «em vez de se desincumbir soberanamente da missão de fazer valer a Constituição contra os detentores do poder (…), ele (o TC) parece ceder à tentação de funcionar, ao invés, como força de legitimação dessas mesmas medidas [inconstitucionais]». E «não é sem inquietação que se vê criar a impressão de que, por vezes, em questões constitucionalmente das mais sensíveis, as posições e conveniências do poder e dos interesses estabelecidos parecem prevalecer lá onde só a Constituição deve mandar. Se não for atempadamente elidida esta impressão, e se em vez disso ela se generalizar, tal não poderia deixar de repercutir-se negativamente sobre a autoridade da sua jurisprudência». Revisto isto,
II manda já a verdade se diga que o aresto agora aqui sob impugnação: o Acórdão n.º 421/11, de 28 de Setembro, dessa 3.ª Secção, representa a prova provada de que o almejado reforço das garantias de independência dos juízes constitucionais nacionais não foi ainda de todo assegurado, que mais uma vez – volvidos que são 18 anos, dezoito! – as posições e conveniências do poder e do establishment parecem prevalecer aí onde só a Constituição deve mandar. Com efeito,
III. ao julgar que para arguir, antes de mais, «a nulidade da decisão da Ordem dos Advogados [de suspensão da sua própria inscrição como advogado]» é necessária, para o signatário, «a constituição de advogado», está esse Alto Tribunal a infringir, decidida e decisivamente, o comando inequívoco do n.º 1 do artigo 134.º do Código do Procedimento Administrativo, o qual, consabidamente, determina que o «acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade». Mais precisa e concretamente,
IV. está esse Tribunal... Constitucional a aplicar a indicada norma segundo uma dimensão hermenêutica – revogatória, efectivamente – materialmente inconstitucional, porquanto integradora de violação, simul, dos princípios fundamentais da constitucionalidade e da legalidade (vinculativos, designadamente, do poder judicial: cf. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 4ª ed., Coimbra, Almedina, 1986, p. 465), assim como da garantia outrossim fundamental do processo equitativo:
V. magna inconstitucionalidade normativa esta que, na perspectiva jusprocessual mais imediata, configura erro judicial manifesto na determinação, ademais na densificação, destarte outrossim materialmente inconstitucionais, da norma – a do n.º 2 do artigo 32.º do CPC – in concreto aplicada na decisão sob censura. Ou seja,
VI. mais precisamente ainda: in casu, muito concretamente, está esse Tribunal supremo, destarte, a afirmar-se independente, tão-só, da Constituição e da Lei! O aresto reclamado não pode, portanto, em definitivo, proceder.
Termos por que, fazendo no caso, como lhe cumpre, sã e inteira justiça, esse Tribunal supremo, reconhecendo a final – mediando, eventualmente, o competente juízo de inconstitucionalidade – a nulidade ipso jure ou, no mínimo, a ineficácia actual da deliberação de suspensão da inscrição do advogado signatário, reformará completamente: revogará, efectivamente, o Acórdão sob reclamação, com todos os devidos efeitos processuais e legais.”
2. As questões suscitadas pelo requerente, nomeadamente aquela que consiste na inconstitucionalidade das normas aplicadas pelo acórdão cuja reforma se pretende, são indiscutivelmente questões de direito. O que, pelas razões do próprio acórdão que se contesta, só pode ser feito através de advogado habilitado ao exercício do patrocínio judiciário.
Nem se diga que com isso se veda a possibilidade de discussão sobre a legitimidade concreta de tal exigência ou a constitucionalidade da interpretação normativa que lhe subjaz. Sempre o interessado o poderá fazer recorrendo, se está em situação de carência económica, ao instituto do apoio judiciário. Se tiver razão, passará a poder pleitear por si, no presente processo.
Assim, é manifesto que, ao insistir numa conduta que sabe não ser admitida pelo Tribunal, o recorrente pretende obstar ao cumprimento da decisão proferida que só lhe permite intervir no processo a suscitar questões desta natureza constituindo mandatário.
Justifica-se, pois, que se extraia traslado nos termos do n.º 8 do artigo 84.º da LTC e do artigo 720.º do Código de Processo Civil.
3. Pelo exposto, determina-se:
a) Que se organize traslado com cópia de todo o processado a partir de fls. 574;
b) Que se devolva o processo ao Tribunal da Relação do Porto;
c) Que só depois de pagas as custas da responsabilidade do recorrente se proferirá decisão no traslado.
Lisboa, 15 de Novembro de 2011.- Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão.
|