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Processo n.º 82/13
1.ª Secção
Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros
Acordam, em Conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Foi proposta ação de despejo sob a forma sumária contra A., agora recorrente, no 2.º Juízo Cível de Lisboa que julgou a ação improcedente e a absolveu dos pedidos formulados.
2. Inconformadas, as Autoras recorreram da sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa que julgou parcialmente procedente a apelação, revogou a sentença recorrida e julgou procedente a ação, em acórdão proferido a 12 de julho de 2012.
3. Após pedido de reforma do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, e vendo a sua pretensão indeferida, vem agora a Recorrente interpor recurso para este Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea f) da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante designada LTC) dizendo, no seu requerimento (cfr. fls. 441 e 442 dos autos), o seguinte:
“A., Recorrida nos autos de recurso de apelação cível à margem referenciados que lhe moveram B. e Outra, notificada do acórdão proferido em 20/11/2012 que lhe indeferiu o pedido de reforma do acórdão proferido em 12/07/2012 que revogou a sentença absolutória proferida em 1ª Instância e que, por conseguinte, decretou a resolução do contrato de arrendamento da sua residência e o consequente despejo do locado, com esta última decisão não concordando nem se podendo conformar e porque dela, em função do valor do processo e da alçada desse Tribunal, não poder interpor recurso ordinário de revisão para o Supremo Tribunal de Justiça, dela vem, atempadamente e ao abrigo do disposto nos arts. 70º nº 1 f), 71º nº 1, 72º nº 1 b) e nº 2, , 759 n9 l, 75º nº 1, 75ºA nº 1 e 2, 76º e 78º nº 3 da Lei nº 28/82 de 15 de novembro, nas redações alteradas pela Lei nº 85/89 de 7 de setembro e Lei nº 13º-A /98 de 26 de fevereiro, interpor RECURSO em processo de fiscalização concreta de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, com fundamento no facto de a decisão ora recorrida ao ter aplicado, com a interpretação e qualificação jurídica que dele ilegalmente fez, o art. 1.093º nº 1 d) do Código Civil, na sua versão originária de 1966, violou frontalmente o direito constitucional à habitação consagrado no art. 65º n° 1 da Constituição da República Portuguesa, ilegalidade esta que foi oportunamente suscitada pela ora Recorrente nos nºs 25 a 28º do requerimento de reforma do acórdão recorrido, submetido a Juízo em 17/09/2012.
Nestes termos e nos melhores de Direito ao caso aplicáveis que V. Exa., meritíssima Desembargadora-Relatora, doutamente suprirá, deve admitir-se o presente recurso em processo de fiscalização concreta da constitucionalidade interposto para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido em 12/07/2010 por essa Relação de Lisboa, recurso este que deve, assim, subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, com todas as devidas e legais consequências.”
4. Pela Decisão Sumária n.º 103/13 decidiu-se não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto, com a seguinte fundamentação:
“5. Recorda-se que o ónus de suscitação atempada e processualmente adequada da questão de constitucionalidade não traduz um simples dever de cooperação do recorrente com o Tribunal, antes uma exigência formal essencial, como tem sido entendido pelo Tribunal Constitucional (cfr., entre muitos outros, Acórdão n.º 195/06, disponível em www.tribconstitucional.pt).
Note-se, igualmente, que a jurisprudência do Tribunal Constitucional entende que a indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, ao abrigo da qual o recurso é interposto, define irreversivelmente o tipo de recurso em causa, não sendo admissível qualquer alteração subsequente ou a convolação do tipo de recurso (cfr., a mero título de exemplo, os Acórdãos n.os 77/2000, 248/2002, 468/2003, 533/2005, 193/2007 e 420/2008, todos disponíveis no sítio supra aludido). Ora, o presente recurso suscita problemas que impedem, desde logo, o seu conhecimento pelo Tribunal Constitucional.
6. Compulsado o requerimento e o respetivo processo, resulta o não cumprimento dos pressupostos constantes da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, na medida em que não se vislumbra minimamente – e não foi invocada – qualquer questão de ilegalidade cognoscível pelo Tribunal Constitucional e suscetível de lhe servir de base. Em parte alguma do requerimento ou do respetivo processo se fundamentou a arguição de «ilegalidade» da referida norma em «violação de lei com valor reforçado» ou em «violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República».
Na verdade, a arguição feita é de «inconstitucionalidade» (cfr. conclusão f) do pedido de reforma, fls. 413 dos autos) e não de «ilegalidade». Por outro lado e decisivamente, os fundamentos aduzidos, explanados ao longo do processo e no requerimento de interposição de recurso (cfr. fls. 441 dos autos), são de violação direta do artigo 65.º, n.º 1, da CRP.
7. Tanto basta para se demonstrar que se não mostram preenchidos os requisitos para o conhecimento do recurso previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea f), da LTC.”
5. Vem agora reclamar daquela decisão com as seguintes conclusões:
“I - A Recorrente nos nºs 25 a 28 e conclusão F) do seu pedido de reforma do acórdão da Relação de Lisboa a fls. 413 e segs. invocou e arguiu a inconstitucionalidade da interpretação e da qualificação jurídica da factualidade subjacente aos autos naquela decisão efetuada por reporte à versão originária do art. 1.093º d) do Código Civil, com a consequente violação frontal do direito constitucional à habitação consagrado no art. 65º nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
II - Essa invocação e arguição foi reiterada no requerimento recursório.
III - É manifesto e ostensivo que estes fundamentos e objeto do recurso interposto para esse Tribunal nunca se poderiam enquadrar na alínea f) do nº 1 do art. 70º da LTC, atento o respetivo teor e redação.
IV - A Recorrente queria referir-se à alínea b) do invocado preceito legal, mas cometeu um ostensivo e manifesto lapso de escrita, que se revela do próprio contexto da declaração corporizada pelo requerimento recursório em apreço.
V - A Recorrente tem, assim, direito, ao abrigo do disposto no art. 249º do Cód. Civil, a retificar a todo o tempo o seu invocado direito, o qual ora exerce, declarando que o recurso “sub-judice” é interposto nos termos da alínea b) do nº l do art. 70º da LTC.
VI - Este direito à retificação é plenamente aplicável às peças processuais apresentadas no âmbito de processos judiciais, como é jurisprudência pacífica dos tribunais.
VII - O que nestes autos efetivamente se encontra em causa é o direito constitucional à habitação da Recorrente, viúva, quase septuagenária, que apenas sobrevive de uma magra pensão e que será despejada, ficando sem teto para habitar, se este seu último pedido não for atendido.
VIII - No caso dos autos, a jurisprudência dos interesses deve prevalecer sobre a jurisprudência dos conceitos, por forma a que esse Tribunal cumpra a função para a qual foi concebido, que é a de Fazer JUSTIÇA.
Nestes termos e nos melhores de Direito ao caso aplicáveis que V. Exas., Meritíssimos Juízes Conselheiros, doutamente suprirão, deve considerar-se devidamente retificado o ostensivo e manifesto lapso de escrita da Recorrente, no sentido de o recurso “sub judice” ter sido interposto a abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC e, consequentemente, revogar-se a decisão sumárias de indeferimento liminar reclamada, admitindo-se o recurso interposto para esse Tribunal, assim se conhecendo do seu objeto e se fazendo JUSTIÇA”.
6. Notificadas, as recorridas não responderam.
7. Atendendo à reclamação apresentada e tendo em conta a necessidade de verificação dos pressupostos de admissão do recurso previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante LTC), as partes foram convidadas a pronunciar-se sobre o cumprimento do ónus de suscitação atempada e processualmente adequada da questão de inconstitucionalidade relativamente ao caso.
Em resposta ao convite, a Reclamante veio apresentar requerimento, onde alega, nomeadamente (cfr. fls. 486 ss. dos autos):
“1.º
Até à prolação do acórdão da Relação de Lisboa de 12 de julho do ano transato não existia motivo algum nos autos para que se suscitasse a questão da inconstitucionalidade da interpretação e qualificação jurídica de factualidade subjacente a esta demanda no âmbito do art. 1.093º nº 1 d) do Cód. Civil na sua versão originária.
Com efeito,
2º
o Sr. Juiz “a quo” da 1ª instância, na sua douta sentença de 21/12/2011, havia feito uma correta interpretação e qualificação jurídica da invocada factualidade e do mencionado normativo legal, no sentido de ter considerado, face ao resultado da prova pericial e da prova testemunhal nestes autos produzida, de que as obras introduzidas no locado em apreço não eram de molde a ser consideradas como alteração substancial da respetiva divisória interna e da sua afetação funcional ao destino da habitação, pelo que nunca determinariam a resolução do contrato de arrendamento aqui em causa com esse fundamento.
3º
A questão coloca-se verdadeiramente pela primeira vez com o invocado acórdão recorrido na Relação de Lisboa.
Na verdade,
4º
contra toda a doutrina e jurisprudência invocada pela Recorrente ao longo das diversas peças dos autos e contra tudo o que a esse propósito seria expectável, a Relação de Lisboa entendeu que os trabalhos e obras de que os autos dão notícia constituem alteração substancial daquelas características essenciais do locado e, por conseguinte, decretou com esse fundamento a resolução do contrato de arrendamento habitacional subjacente a esta demanda.
5º
Daí que, só com o pedido da sua reforma a fls.__ e submetido pela Recorrente a Juízo em 17/09/2012 é que esta última teve motivo para suscitar a questão da inconstitucionalidade da interpretação e qualificação jurídica dos factos e do direito positivo aqui em causa, isto mais concretamente no que respeita aos nºs 25 a 28 do invocado articulado.(…)
11º
no acórdão “sub judice” e surpreendentemente ao invés de tudo quanto a esse propósito jurisprudencial e doutrinariamente se encontrava definido e assente e até mesmo ao contrário do que consta da prova pericial nestes autos produzida, a Relação de Lisboa entendeu que os trabalhos e obras introduzidos no locado dos autos constituem uma alteração substancial e essencial da sua divisória interna e da sua afetação funcional.(…)”
As recorridas, por seu lado, apresentaram requerimento, onde concluem que “o recurso, independentemente do alegado erro de escrita invocado, não deve ser admitido.”, (cfr. fls. 492 dos autos)
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
8. Nos presentes autos foi proferida decisão sumária de não conhecimento do objeto do recurso, por não se mostrarem preenchidos os requisitos para o conhecimento do recurso previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea f), da LTC, nos termos do qual estava interposto.
Como bem referiu a decisão sumária, a jurisprudência do Tribunal Constitucional adota um entendimento extremamente rigoroso relativamente à necessidade de correta indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto. Esta indicação define irreversivelmente o tipo de recurso em causa, não sendo admissível qualquer alteração subsequente ou a convolação do tipo de recurso (cfr., a mero título de exemplo, os Acórdãos n.º 77/2000, n.º 248/2002, n.º 468/2003, n.º 533/2005, n.º 193/2007 e n.º 420/2008, todos disponíveis em www.tribconstitucional.pt).
A reclamante vem alegar que «cometeu um ostensivo e manifesto lapso de escrita, que se revela do próprio contexto da declaração», pois queria referir-se à alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC (cfr. Conclusão III e IV da reclamação, fl. 475 dos autos).
Independentemente da apreciação da questão em causa, a verdade é que se o presente recurso viesse interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, como alega a reclamante, ou seja, se o recurso para o Tribunal Constitucional incidisse sobre decisão que aplica norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, existem outros requisitos de admissibilidade que se deveriam encontrar preenchidos. Entre esses requisitos podemos encontrar, desde logo, a necessidade de suscitação atempada e processualmente adequada da inconstitucionalidade – o que não se verifica no caso.
9. Analisa-se, em primeiro lugar, a questão da suscitação atempada da questão de constitucionalidade relativa à interpretação feita pela decisão recorrida do artigo 1093.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil.
Recorda-se que para o conhecimento pelo Tribunal Constitucional de um pedido de fiscalização concreta da constitucionalidade é necessário que em fase anterior à do requerimento de recurso para este Tribunal, no decurso do processo, a reclamante tenha identificado expressamente a questão de inconstitucionalidade, de forma expressa, direta e clara de modo a criar para o Tribunal a quo o dever de pronúncia sobre a matéria em causa. Como tem sido entendimento uniforme do Tribunal Constitucional, a identificação da inconstitucionalidade deve ser feita em termos de o Tribunal «a poder enunciar na decisão, de modo a que os respetivos destinatários e os operadores do direito em geral fiquem a saber que essa norma não pode ser aplicada em tal sentido» (cfr., entre muitos, o Acórdão n.º 367/94, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt).
Ora, a reclamante não suscitou a questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, atempadamente, dando-lhe oportunidade de abordar e solucionar tal problema jurídico.
De facto, a reclamante apenas invocou a inconstitucionalidade de qualquer interpretação do artigo 1093.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil, em pedido de reforma do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de que agora recorre (cfr. fls. 397 a 414, em especial fls. 409 e 413). Assim, esta invocação apenas ocorreu após a prolação do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, em momento processual em que o Tribunal a quo já não se podia pronunciar sobre tal matéria e, consequentemente, posterior ao esgotamento do poder jurisdicional deste tribunal quanto ao litígio em causa. O pedido de reforma, em princípio, não constitui um meio idóneo e atempado para suscitar a questão da constitucionalidade de normas aplicadas pelo Tribunal a quo (cfr., por todos, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 533/2007, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt).
A própria Reclamante admite não ter suscitado previamente tal questão, alegando, contudo, que tal omissão apenas ocorreu em função da natureza imprevisível da interpretação concedida à norma. É, portanto, a natureza imprevisível da interpretação normativa aplicável que importa apreciar.
A este propósito importa citar o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 55/2008, que faz uma síntese da jurisprudência assente do Tribunal sobre a matéria:
“É verdade que, como já decidido por este Tribunal, os recorrentes podem ser dispensados, a título excecional, da invocação prévia da inconstitucionalidade de normas aplicadas por decisões dos tribunais comuns, sempre que não lhes for processualmente exigida a previsão de aplicação da norma ou da interpretação normativa efetivamente aplicada. Note-se, contudo, que tal sucede quando a aplicação da norma ou da interpretação normativa seja objetivamente imprevisível ou insólita. Assim, ver:
a. Acórdão n.º 394/2005 – “A razão pela qual o Tribunal Constitucional tem dispensado este ónus em casos excecionais ou anómalos, como se refere na decisão reclamada, é a de considerar não exigível antecipar um sentido objetivamente inesperado, sobre o qual o recorrente não teve a oportunidade de se pronunciar antes de proferida a decisão recorrida”;
b. Acórdão n.º 120/2002 – “Todavia, como este Tribunal também tem salientado (assim, por exemplo, do citado Acórdão n.º 352/94), tal situação sofre restrições 'em situações excecionais, anómalas, nas quais o interessado não disponha de oportunidade processual para suscitar a questão de inconstitucionalidade antes de proferida a decisão final'. É o que acontece também quando, pela natureza insólita ou surpreendente da interpretação (ou da aplicação) da norma em causa efetuada pela decisão recorrida, não era exigível ao recorrente que contasse com ela.
Entende-se que é esta a situação no caso presente – tal como, por exemplo, nos casos dos Acórdãos 74/00 e 56/01 (ainda não publicados), considerando-se como 'decisão-surpresa', de conteúdo imprevisível para o recorrente, a decisão proferida pelo tribunal recorrido, para rejeição do recurso em causa”;
Contudo, a natureza imprevisível, surpreendente ou insólita da norma ou interpretação normativa efetivamente aplicada depende do preenchimento de um grau reforçado de diligência do recorrente. Este grau de diligência implica uma antecipação das diversas soluções jurídicas potencialmente aplicáveis ao litígio controvertido, devendo aquele precaver-se contra a adoção de soluções que, ainda que minoritárias, possam ser configuradas como objetivamente admissíveis face à letra da lei. Só no caso de não ter sido possível antecipar a aplicação de norma ou interpretação normativa contrária à Constituição da República – sendo esta possibilidade sempre aferida de modo objetivo – é que será admissível a dispensa de suscitação prévia da inconstitucionalidade. Neste sentido, ver:
a. Acórdão n.º 489/94 – “O Tribunal tem considerado até que cabe às partes considerar antecipadamente as várias hipóteses de interpretação razoáveis das normas em questão e suscitar antecipadamente as inconstitucionalidades daí decorrentes antes de ser proferida a decisão”);
b. Acórdão n.º 479/89 – “(…) não pode deixar de recair sobre as partes em juízo o ónus de considerarem as várias possibilidades interpretativas das normas de que se pretendem socorrer, e de adotarem, em face delas, as necessárias cautelas processuais (por outras palavras, o ónus de definirem e conduzirem uma estratégia processual adequada). E isso – acrescentar-se-á – também logo mostra como a simples «surpresa» com a interpretação dada judicialmente a certa norma não será de molde (ao menos, certamente, em princípio) a configurar uma dessas situações excecionais (…) em que seria justificado dispensar os interessados da exigência da invocação «prévia» da inconstitucionalidade perante o tribunal «a quo».
Mas – e agora em segundo lugar – se alguma vez tal for de admitir, então haverá de sê-lo apenas numa hipótese em que a interpretação judicial seja tão insólita e imprevisível, que seria de todo o ponto desrazoável a parte contar (também) com ela”.
Na medida em que a aplicação do preceito em causa, na interpretação que lhe é dada pelo tribunal recorrido, é uma das questões de fundo do processo, discutida desde a primeira instância, não pode a reclamante alegar surpresa na sua aplicação. A interpretação adotada pelo Tribunal a quo não pode configurar-se como insólita ou inaudita, antes afigurando-se como uma das interpretações que qualquer sujeito processual, devidamente representado por mandatário judicial, seria obrigado a equacionar.
Assim, ao não cumprir este seu ónus, a reclamante não concedeu ao tribunal perante o qual a questão foi colocada a possibilidade de decidir sobre a inconstitucionalidade da norma supostamente em questão. Por força deste fundamento, é legalmente inadmissível conhecer do objeto do presente recurso mesmo que se considere interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
10. Conclui-se, assim, que mesmo que se considerasse o recurso em causa interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, como alega a reclamante, esta não suscitou de forma processualmente atempada e adequada a inconstitucionalidade das “normas” em causa perante o tribunal recorrido. Assim, pela falta do preenchimento deste requisito processual, não seria possível conhecer do recurso.
III – Decisão
12. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, não conhecer do objeto do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 28 de junho de 2013. – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria João Antunes – Maria Lúcia Amaral.
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