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Processo n.º 777/12
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em que é reclamante A., LDA. e reclamados B., C., D. e E., o primeiro vem pedir a reforma do Acórdão n.º 606/2012, de 6 de dezembro de 2012, que indeferiu a reclamação do despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 21/09/2012 que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. fls. 217-231).
2. O pedido de reforma do citado Acórdão n.º 606/2012, para além de considerações iniciais («I – Considerações Introdutórias»), é formulado nos seguintes termos (cfr. fls. 236-240 e 241-245):
«(…) II - Má interpretação e aplicação do direito
Como já se afirmou nas Considerações Introdutórias, a não admissibilidade do Recurso pela Relação teve como um dos seus fundamentos que o artigo 678 n° 4 do C.P.C., em vigor à data dos factos, não se aplicava por causa do valor da alçada.
Isto independentemente do que lá se diz, ou seja que é sempre admissível recurso desde que haja contradição entre acórdão dos Tribunais da Relação ou do STJ, reconduzindo a admissibilidade do recurso sempre ao valor da alçada, o que nos remetia sempre para o artigo 678° n° 1 do C.P.C. não sendo necessário o n° 4 do mesmo artigo.
Para além de que a A. na invocação da Nulidade faz referência a esta mesma argumentação
Lá se diz, para além do mais, que o disposto no artigo 678° n° 4 do C.P.C., tem que ser apreciado no sentido de que serão sempre admissíveis os recursos de Revista para o STJ quando se verifique a contradição de acórdãos e isto independentemente de o valor da Ação ser ou não superior ao da Relação.
E foi esse o fundamento do recurso de Revista e da nulidade invocada perante o STJ e da Reclamação para o Tribunal Constitucional.
Dizer-se que a inconstitucionalidade da norma nunca foi invocada é um facilitismo, já que foi o Acórdão da Relação do Porto, ao indeferir o Recurso para o Supremo que fundamentou essa decisão com a dependência do Recurso para o STJ, nos termos do artigo 678° no 4, estar sempre dependente da alçada do Tribunal.
E foi este argumento que levou à Reclamação para este Tribunal e que foi indeferida nos termos dela constantes, bem como ao Recurso para o Tribunal constitucional,
Pedindo-se ao Tribunal constitucional que declara-se aquela norma inconstitucional na interpretação que só era passível de recurso nos termos do art° 678° n° 4 se se impusesse, entre outros requisitos, que o acórdão recorrido seja insuscetível de Recurso ordinário por motivo estranho à Alçada do Tribunal a menos que, por razão da alçada, cumulativamente outrossim não seja admissível.
Tal norma, como já se disse na reclamação, com a interpretação com que foi aplicada, viola os artigos 13º e 20 n° 1 da Constituição da República Portuguesa, que prevê o princípio da igualdade entre todos perante a lei e garante a todos o acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses igualmente protegidos.
Mais se invocou na Reclamação para este Tribunal acórdãos da Relação que estavam em contradição quanto à interpretação do artigo 678° n° 4 do CP.C. o que também fundamentou o nosso pedido de inconstitucionalidade.
Por haver esta contradição de acórdãos é que a A. Reclamou para este Tribunal por entender que o disposto no artigo 678° n° 4 do CP.C. deverá ser interpretado no sentido de que serão sempre admissíveis os Recursos de Revista para o STJ quando se verifique contradição entre acórdãos.
E isto independente do valor da ação ser ou não superior à Alçada da Relação.
Designadamente, que o segmento do n° 4 do artigo 678° do C.P.C. do qual consta, que “do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do Tribunal” ë inconstitucional por violação dos artigos 13° e 20º da C.R.P. e dos princípios neles constantes, designadamente o principio da igualdade de todos perante a Lei e o princípio do direito de todos terem acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
Deve assim ser admitido o Recurso para o STJ tudo com as demais consequências legais.
III - Da Reforma das Custas
O Tribunal Constitucional no acórdão que indeferiu a Reclamação condenou a A. em custas fixando-se a taxa de Justiça em (vinte) 20 UC, nos termos do art° 7 do Decreto-Lei 303/98, de 7 de outubro.
O mínimo fixado naquela norma é de 5 UC e o máximo de 50 UC
Verifica-se pela leitura do ato processual produzido pelo TC que aquele não foi de grande complexidade.
Limitou-se, com devido respeito, mais a citar as peças processuais das partes, já que para a parte da fundamentação e decisão não se escreveram mais de duas páginas.
Aliás nas alíneas a) e b) do n° 7 do art° 4° do atual Regulamento das Custas Processuais existe uma definição do que é uma ação de especial complexidade: por um lado as ações respeitantes a questões de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica, ou que importem a análise ou que importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso, e, por um outro, que impliquem a audição de elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências morosas de produção de prova.
Ora na Reclamação que foi apresentada nada do que está na definição anterior está incluído.
Não é uma questão de elevada especialização jurídica ou técnica já que se trata de uma mera Reclamação a que o TC deu expedita e sucinta resposta.
Não houve mais do que uma questão jurídica combinada a analisar nem houve necessidade de ouvir testemunhas ou da análise de qualquer outro meio de prova.
A relevância dos interesses em causa, por não serem pessoais, mas antes relativamente a uma ação de despejo, não são de molde a considerar-se a Reclamação como sendo uma questão jurídica essencial para o bem-estar e sobrevivência das partes.
Com o devido respeito pensamos que neste caso se deve ter em conta o Artigo 9.° do mesmo Decreto-Lei, ou seja, que a taxa de justiça é fixada tendo em atenção a complexidade e a natureza do processo, a relevância dos interesses em causa e a atividade contumaz do vencido.
Ora o Tribunal Constitucional fixou arbitrariamente as custas a pagar pela A..
No tendo sequer fundamentado a sua decisão violando a CRP quando diz que todas as decisões do Tribunal, que não sejam de mera expediente, devem ser fundamentadas – cfr. Art° 205 n° 1 da C.R.P.
Entende-se assim que deve ser reformada a conta de custas fixando-se esta em limites razoáveis.
Nestes termos e no mais de direito deve a presente Reforma ser julgada procedente bem como deve ser reformulada a conta de custas tudo com as demais consequências legais.»
3. Os reclamados, notificados para o efeito, não responderam (cfr. cota lavrada a fls. 247).
Cumpre apreciar e decidir.
II - Fundamentação
4. Do teor do requerimento apresentado pelo reclamante resulta que as questões colocadas se dirigem, por um lado, a uma alegada «má interpretação e aplicação do direito» e, por outro lado, à «reforma das custas» por se considerar i) excessivo e arbitrário o montante fixado e ii) não fundamentada a decisão de condenação em custas.
4.1 Desde logo, quanto à parte II do requerimento que invoca a ocorrência de uma «má interpretação e aplicação do direito», verifica-se que o pedido de reforma, nos termos formulados, não encontra acolhimento na lei processual que regula os pedidos de reforma de decisões judiciais e tipifica os respetivos fundamentos, em concreto, o artigo 669.º do Código do Processo Civil (aplicável subsidiariamente ex vi artigo 69.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão – Lei de Funcionamento do Tribunal Constitucional (LTC)):
«ARTIGO 669.º
Esclarecimento ou reforma da sentença
1 - Pode qualquer das partes requerer no tribunal que proferiu a sentença:
a) O esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade da decisão ou dos seus fundamentos;
b) A sua reforma quanto a custas e multa.
2 - Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:
a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos;
b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.
3 - Cabendo recurso da decisão, o requerimento previsto no n.º 1 é feito na alegação.»
4.1.1 Na falta de invocação expressa, na parte II do requerimento («Má interpretação e aplicação do direito»), da norma legal aplicável, por referência aos motivos atendíveis para a reforma de decisões judiciais, conclui-se, no confronto do requerimento apresentado com as disposições acima transcritas, não encontrarem as razões invocadas pelo requerente quanto à reforma do Acórdão n.º 606/12 acolhimento na lei processual civil vigente. Com efeito, desde logo se afasta a aplicação do n.º 1 do artigo 669.º do Código de Processo Civil (CPC), pois não é requerida a aclaração da sentença quanto a qualquer obscuridade ou ambiguidade da decisão ou dos seus fundamentos (alínea a), do n.º 1, do artigo 669.º, do CPC), nem se trata aqui da reforma das custas (esta objeto de pedido na parte III do requerimento). Por outro lado, o requerimento formulado também não refere em parte alguma a ocorrência de um lapso do juiz – que teria de ser manifesto - que pudesse consubstanciar qualquer das situações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 669.º, do CPC. Desde logo, e atentas as características específicas do processo de fiscalização da constitucionalidade de normas, por inaplicabilidade das disposições contidas nas referidas alíneas do n.º 2 do artigo 669.º, na parte em que preveem o uso deste meio processual quando ocorra erro na qualificação jurídica dos factos (alínea a) in fine) ou quando constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida (alínea b).
4.1.2 Mesmo que, por hipótese, se equacionasse a possibilidade de ao caso vertente ser aplicável o disposto na primeira parte da alínea a) do n.º 2 do citado artigo 669.º do CPC, ou seja, fazer-se corresponder a alegada «má interpretação e aplicação do direito» ao fundamento do pedido de reforma decorrente de erro na determinação da norma aplicável, ainda assim não encontraria o requerente apoio na lei.
4.1.3 Isto, por duas razões principais. Em primeiro lugar, por se dirigir toda a argumentação expendida aos fundamentos da decisão inicialmente reclamada - o despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 21/09/2012 que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. fls. 236-240) - e não à decisão e fundamentos do Acórdão n.º 606/2012 que indeferiu a reclamação apresentada. Verifica-se, outrossim, que o requerimento de reforma da decisão traduz tão só a discordância do ora requerente quanto aos fundamentos da decisão que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, os quais foram apreciados em sede própria, ou seja, na decisão da reclamação exarada no Acórdão n.º 606/2012 e de que já não cabe recurso. Em segundo lugar, um erro na determinação de norma aplicável só poderia ocorrer por referência à lei processual do Tribunal Constitucional (LTC), não sendo invocado qualquer lapso manifesto que determinasse um erro na determinação das normas processuais aplicáveis.
4.1.4 Assim, e relativamente à primeira questão colocada pelo requerente, impõe-se indeferir o pedido de reforma do Acórdão n.º 606/2012.
4.2 Quanto às duas outras questões colocadas na parte III do requerimento, que baseiam o pedido de reforma do Acórdão n.º 606/2012 em matéria de custas, dirigidas ao montante fixado e à fundamentação da decisão de condenação em custas, e tendo suporte no artigo 669.º, n.º 1, alínea b) do CPC, cumpre ter presente que o regime de custas no Tribunal Constitucional é o estabelecido pelo artigo 84.º da LTC e pelo Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (Regime de Custas no Tribunal Constitucional). A regra é a isenção objetiva ou a não sujeição dos processos a custas (artigo 84.º, n.º 1, da LTC). E, mesmo nos processos em que pode haver tributação, o acesso ao Tribunal não está dependente do prévio pagamento de custas (artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 303/98). Só fica sujeita a custas a parte que decair em recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º que conheçam do objeto (n.º 2 do artigo 84.º da LTC), o reclamante quando as reclamações sejam indeferidas (n.º 4 do artigo 84.º da LTC), ou o recorrente quando se não conheça do objeto por faltarem pressupostos de admissibilidade (n.º 3 do artigo 84.º da LTC).
4.2.1. No acórdão cuja reforma ora se reclama, o reclamante foi condenado em custas porque a sua reclamação para a conferência foi indeferida, o que sujeita a reclamação à taxa de justiça a fixar entre 5 e 50 UC (artigo 84.º, n.º 4, da LTC e artigo 7.º do Regime de Custas no Tribunal Constitucional).
As custas foram graduadas em montante que corresponde à prática corrente do Tribunal em casos do género, dentro dos limites estabelecidos pelo artigo 7.º, sobretudo abaixo do limite máximo, e de acordo com os critérios que o artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 303/98 manda observar. Efetivamente, para efeitos de aplicação destes critérios (complexidade e natureza do processo, relevância dos interesses em causa e atividade contumaz do vencido), o presente recurso não se afasta do que ocorre na generalidade dos recursos do mesmo género e que tem sido objeto de idêntica tributação.
Assim, nada há que justifique a alteração do montante em causa.
4.2.2. Reconhecendo-se que o acórdão não contém fundamentação específica quanto à graduação das custas, passa a constituir fundamentação aquela que se expôs no n.º 4.2.1, assim se suprindo essa omissão.
III – Decisão
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5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir o pedido de reforma do acórdão, suprindo-se, porém, a falta de fundamentação específica quanto à condenação em custas nos sobreditos termos.
Por essas mesmas razões há lugar à condenação em custas, na parte em que decaiu, que se fixam em 5 (cinco) unidades de conta.
Lisboa, 12 de junho de 2013. Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.
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