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Processo n.º 508/2011
2.ª Secção
Relator: Conselheiro José Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A. e outros foram condenados por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 7 de Julho de 2007, a pagarem aos Autores a quantia pedida de € 81.304,06 (oitenta e um mil trezentos e quatro euros e seis cêntimos).
Tal acórdão veio a ser proferido no âmbito de recurso de revista, interposto pelos Autores, do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que havia confirmado a sentença proferida no tribunal de 1.ª instância, sentença esta que, por sua vez, absolvera os Réus do pedido.
Notificada que foi daquele acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Julho de 2010, a reclamante apresentou requerimento em que conclui da seguinte forma:
(...)
Nestes termos, reconhecida a nulidade inicialmente invocada ou não reconhecida (artºs 264º e 664º do CPC, deve o Acórdão ser de qualquer forma declarado NULO, uma vez que deveria ter sido suscitado o mecanismo da REVISTA AMPLIADA, nos termos do nº 2 do artº 732º-A do CPC (“deve ser sugerido pelo relator”), sendo que a parte não tinha qualquer forma de o fazer anteriormente pois só tomou conhecimento com a Decisão agora proferida depois de notificada para o efeito (o que não ocorreria se tivesse havido qualquer notificação do sentido prévio mas iminente desta Decisão – nem que fosse para se pronunciar).
Esse julgamento devia ter sido, inclusivamente, sugerido por V. Ex.ª (salvo o muito devido respeito) nos termos do n.º 2 do preceito, porque facilmente seria visível que poderia vencer, como venceu, uma solução jurídica em oposição com jurisprudência anteriormente firmada, centralizando-se fulcralmente na oposição e antagonismo os Acórdãos do STJ (acima mencionados) cujos Relatores foram os Senhores Conselheiros Dr. João Camilo, Dr. Azevedo Ramos, Dr. Santos Bernardino e Dr. Serra Lopes, para em mais não falar).
Assim não sendo entendido, devem os autos ser remetidos a sua Excelência o Senhor Presidente do STJ, para que seja realizado Julgamento para Uniformização de Jurisprudência nos termos do art.º 732º-A aplicável no âmbito dos autos.
*
Em suma:
1. Deve ser reconhecida a nulidade do Acórdão agora proferido por violação dos arts. 264º e 664º do CPC;
2. Reconhecida a mesma, deve ser realizado Julgamento da Revista em termos ampliados ao abrigo do art.º 732º-A, nº 2 do CPC;
3. A não ser entendido dessa forma por V. Ex.ª, devem os autos ser remetidos a sua Excelência, Sr. Dr. Juiz Conselheiro, Presidente do STJ, para que seja efectuado Julgamento ampliado da revista, para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 732º-A do CPC.
(...).
Os AA., notificados da apresentação de tal requerimento, apresentaram resposta do seguinte teor:
(...)
O presente requerimento não passa de uma clara manobra dilatória, para assim adiar temporalmente o transito em julgado do Acórdão e poder alienar o imóvel, retirando todas as possibilidades aos AA. de poderem vir a receber a verba a que têm direito, sobretudo porque o Tribunal de primeira instancia acabou por improceder o Arresto requerido pelos AA.
(...)
O requerimento formulado pelos RR. foi indeferido por acórdão do S.T.J. de 12 de Outubro de 2010, nos termos e com os fundamentos seguintes:
(…)
1. Considerando a data da propositura da acção são aplicáveis os preceitos adjectivos (designadamente quanto ao julgamento ampliado da revista) na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, já que a nova formulação se aplica apenas às lides intentadas depois de 1 de Janeiro de 2008.
Daí que a intervenção oficiosa do Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do nº 1 do artigo 732-A do Código de Processo Civil, só tivesse sido possível ‘até à prolação do acórdão’, que não nesta fase ulterior.
Também ( e nos termos do n.º 2 daquele preceito) o ‘terminus ad quem’ do pedido de julgamento alargado por qualquer das partes (ou mesmo pelo Ministério Público) ou a sugestão por iniciativa dos julgadores seja o mesmo.
Certo que para afastar este escolho, a requerente pretende a anulação do Acórdão, situação que, se lograsse, permitiria o reinício da fase processual de julgamento.
Só que, e como veremos, não ocorre qualquer vício na decisão que invalide o aresto posto em crise, nem se perfila uma situação de irregularidade a afectar a cadeia teleológica que implique a anulação do processado.
…
2. Em primeira linha, a requerente assaca o vício de excesso de pronúncia, por, na sua óptica, ter conhecido o enriquecimento sem causa, o que estaria fora do pedido e da causa de pedir.
Tratar-se-ia do vício de limite da primeira parte da alínea d) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil.
Este vício ocorre quando são conhecidas questões para lá das fronteiras da segunda parte do nº 2 do artigo 660.º do mesmo diploma, ou seja, se o julgador, e para além do cognoscível ‘ex officio’, se ocupa de questões não suscitadas pelas partes.
Isto sempre, e como é claro, em acatamento da regra da disponibilidade do objecto, sem prejuízo de que, atento o princípio da substanciação (nº 4 do artigo 498.º do Código de Processo Civil), se deva definir o direito em função da qualificação jurídica dos factos necessários à sua determinação (cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 2004 – 04B853).
Como se julgou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Maio de 2009 – 162/09.1YFLSB – deste Colectivo: “(…) a causa de pedir tem de entender-se não como o acto ou facto jurídico abstracto, mas em concreto (aquele, o certo, o que foi determinado, o que o Autor individualizou – cf., o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 2003 – 03A1848 relatado pelo aqui 2º Adjunto. É então que é exercida a função delimitadora, impedindo o julgador de ultrapassar essa barreira, deixando-lhe tão somente, a liberdade de buscar, interpretar e aplicar as regras do direito”.
Ora, “in casu”, e como expressamente se refere no Acórdão reclamado, os Autores, logo na 1ª instância, quando e “ao abrigo do artigo 273.º do Código de Processo Civil, requereram a ‘ampliação’ do pedido alegaram que, apesar de sustentaram ter havido mútuo e enriquecimento sem causa”, pretendiam a declaração de nulidade de eventual doação.
De facto, na petição haviam invocado o enriquecimento sem causa, como uma das causas de pedir (cf., artigo 27.º da petição inicial).
E voltaram “à carga” com este instituto quer nas alegações da apelação, quer nas produzidas para este Supremo Tribunal de Justiça em sede de revista (ut, “sendo que se se considerar não existir um contrato de mútuo a acção deve proceder por enriquecimento sem causa cujos pressupostos estão presentes.”).
Ora, o Supremo Tribunal nunca poderia deixar de conhecer este segmento – esta “causa petendi” subsidiária – já que a mesma se identificava com a causa de pedir, sendo que o julgado coincidiu com o pedido (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Fevereiro de 1992 – BMJ 414-413; cf., ainda, o Acórdão deste Supremo Tribunal de 5 de Fevereiro de 2004 – 3B3809: “As questões a que se reporta o artigo 668.º, n.º 1, alínea d), 2ª parte, do Código de Processo Civil são os pontos de facto e ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, em que as partes centram o objecto do litígio …”).
Não há pois, e tal como acima se acenou, a nulidade da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil.
3. Mas a requerente pretende que o Acórdão seja nulo por, na sua óptica, o Relator não ter sugerido o julgamento alargado, no termos do n.º 2 do já citado artigo 732-A do Código de Processo Civil.
Mais uma vez sem razão.
Por um lado, mesmo que o Relator tivesse de o fazer no caso concreto, a omissão não geraria a nulidade do Acórdão, o que só seria possível se tivesse ocorrido qualquer dos vícios de limite elencados no artigo 668.º da lei adjectiva.
E, no caso em apreço, não se vê, nem a parte o refere apodicticamente, qual pudesse ser.
Para além desses casos, o Acórdão só poderia ser anulado se tivesse sido praticado, ou omitido, um acto que afectasse a cadeia teleológica que liga todos os actos ao processo, não tendo a ver com a bondade da deliberação em si, mas apenas por ser atingido pela anulação dos actos anteriores.
Seriam, então as regras do artigo 205º, e seguintes do Código de Processo Civil, que não o regime do n.º 3 do artigo 668.º.
Ora, o facto do Relator, qualquer dos Adjuntos ou o Presidente da 1ª Secção Cível (que, aqui, também é o Relator) não ter sugerido o julgamento ampliado não integra qualquer irregularidade e, portanto, não se gera nulidade.
Por um lado, não se previa, nem surgiu, decisão oposta a “jurisprudência anteriormente firmada”.
Este conceito tem duas possíveis interpretações: ou se reporta a jurisprudência já uniformizada e “importa assegurar a possibilidade de o próprio Supremo confirmar ou revogar a sua orientação anterior”, ou, não houve ainda uniformização mas “interessa prevenir uma eventual oposição com outra jurisprudência ordinária do Supremo.” (cf. Prof. M. Teixeira de Sousa, in ‘Estudos sobre o Novo Processo Civil’, 557 e ss.).
Não existe acórdão uniformizador sobre o ponto de direito em apreço.
Na última hipótese, há apenas que acautelar a existência de múltiplas oposições de julgados, numa área em que o Supremo Tribunal de Justiça ainda não uniformizou, o que não é, seguramente o caso.
De outra banda o dever do nº 2 do artigo 732-A do Código de Processo Civil não é estritamente vinculado nem a sua omissão gera nulidade por se tratar de um juízo de conveniência com ampla margem de discricionariedade.
Neste ponto adere-se à doutrina do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Novembro de 2003 – 03B2073 – que assim julgou:
“Parece óbvio que o dever de o relator (ou de um dos adjuntos) sugerir o julgamento ampliado da revista, quando tal dever deva ser exercido sem requerimento apresentado pelas partes ou pelo Ministério Público, tem necessariamente que se basear no prévio entendimento da sua parte de que se justifica a intervenção do plenário das secções cíveis. Só nesse caso tem o relator o dever de sugerir o julgamento ampliado. Se, como aqui sucede e já suficientemente se demonstrou, o relator considera que o julgamento ampliado se não impõe nem justifica, então não terá que o sugerir.
Doutra forma iríamos cair na caricata situação de ver o respectivo relator a sugerir, em todos os recursos de revista (poderá sempre existir um acórdão que tenha decidido em sentido contrário à mesma questão) o julgamento ampliado, sobrecarregando de modo injustificável as funções do Presidente do Supremo que, naturalmente, se não cingem à apreciação das sugestões dos relatores apresentadas nos termos do art. 732º-A, nº 2 do C. Prol. Civil.
Assim, porque não estava o relator obrigado (não ocorria um verdadeiro dever jurisdicional de o fazer) a sugerir, no caso sub judice, que a revista fosse julgada pelo plenário das secções cíveis, não está o acórdão reclamado, nem mesmo o processo, inquinado por qualquer nulidade, nomeadamente por aquela que o recorrente lhe imputa”.
(Cf., ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Novembro de 1994 – CJ/STJ, II.3,281, embora no âmbito do antigo recurso para o Tribunal pleno).
(…).
2. Notificada que foi do dito acórdão do S.T.J., a reclamante apresentou, por ‘fax’ de 03.11.2010 e registo de entrada no S.T.J. de 04.11.2010 (cfr. fls. 958 e 959, 961 e 962), um requerimento dirigido ao Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça com o seguinte teor:
(…)
A., recorrida na presente acção, inconformada com o teor da Decisão agora proferida vem da mesma suscitar a necessidade de ocorrer o JULGAMENTO DE REVISTA ALARGADA, o que faz ao abrigo do art°732°-A do CPC e nos termos seguintes:
Não existe um só Acórdão proferido no sentido agora decidido.
Não existe um só Acórdão proferido no domínio da mesma matéria e com a mesma legislação no sentido agora decidido.
Citaram-se ao longo do processo diversos Acórdãos, todos eles sem excepção. no sentido contrário, sendo que alguns dos quais tratam ipsis verbis a mesma questão.
A recorrida não se conforma com uma decisão manifestamente surpreendente, que em toda a linha contraria a jurisprudência desse STJ.
O recurso de revista alargada, neste caso, não poderia ter sido previamente requerido, pois inexistiu qualquer indicador do sentido decidido.
Parte da doutrina preconiza que a REVISTA ALARGADA pode ser efectivada a posteriori à prolação do Acórdão surpresa (Lebre de Freitas) que conflitua com anteriores Acórdãos.
De resto, de outra forma não haveria possibilidade de Uniformizar jurisprudência disforme.
Assim, coloca-se a questão à consideração Douta de V. Exa., requerendo-se que previamente seja dada vista ao Ministério Público, uma vez que se infere estar-se em presença manifesta da necessidade de uniformizar jurisprudência perante uma plenitude de Acórdãos proferidos anteriormente em sentido contrário ao Acórdão agora proferido.
(…)
Tal requerimento foi indeferido por decisão proferida pelo Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (cf. fls. 967), datada de 24.11.2010, com os seguintes fundamentos:
(…)
Indefere-se o requerido julgamento ampliado, já que sendo o presente processo anterior a 2008, tal julgamento só poderia ter lugar antes da prolação do acórdão deste S.T.J. (art. 732.º-A e segs. então em vigor).
Porque tal não sucedeu, indefere-se o pretendido.
(…)
3. A reclamante havia apresentado, por ‘fax’ datado de 22.11.2010 e registo postal de 23.11.2010, quando os autos se encontravam ‘conclusos’ para prolação do despacho acabado de referir, novo requerimento (cf. fls. 968 e ss.), dirigido ao Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, requerimento esse que veio a ser junto aos autos após a prolação do dito despacho, requerimento esse do seguinte teor:
(…)
A., recorrente nos presentes autos, vem, muito respeitosamente, expor e requerer a V. Excelência o seguinte:
Conforme se disse em anterior requerimento subsequente à notificação do Acórdão emanado da 1ª Secção, o mesmo seria nulo.
Além de se requerer a nulidade mencionada, nos termos que constam desse mesmo requerimento, mais se requereu que deveriam os autos “a não ser entendido dessa forma (...) ser remetidos a Sua Excelência, Sr. Dr. Juiz Conselheiro, Presidente do STJ, para que seja efectuado Julgamento ampliado da revista, para uniformização de Jurisprudência, nos termos do art°732°-A do CPC”.
Ou seja, contemplou-se 2 (dois) pedidos:
- ser reconhecida a nulidade e reconhecida que fosse se efectivasse a revista ampliada ao abrigo do art°732-A, n°2 do CPC (que deveria ter sido sugerida pelo respectivo Sr. Conselheiro Relator ou Adjuntos)
- a não ser assim entendido fosse realizada a revista ampliada, para uniformização de jurisprudência, também nos termos do mesmo preceito e, então, sob a égide de V. Excelência, perante a constatação de Acórdãos contraditórios sobre a mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação.
Isto porque parte da doutrina considera que a mencionada revista ampliada poderá ocorrer antes ou depois da prolação do Acórdão que surge a contrariar Jurisprudência firmada.
Autores como Lebre de Freitas e Lopes do Rego consagram essa hipótese nas respectivas anotações que efectivam ao dito art°732°-A do CPC, que a revista ampliada pode ocorrer antes ou depois da prolação do Acórdão aqui proferido pela 1a Secção.
A própria parte, essa é que não teve ou dispôs de um sinal sequer de que o sentido da decisão seria precisamente aquele que aconteceu, que em tudo contraria os diversos (e são muitos) Acórdãos emanados desse mesmo STJ sobre a mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação (que, aliás, vêm mencionados quer pelas instâncias anteriores, quer em requerimento de resposta à revista, quer no requerimento que invoca a nulidade e requer a revista ampliada).
Porém, veio a ser proferido novo Acórdão pela Secção que indeferiu a nulidade mencionada e, por conseguinte, a possibilidade de ocorrer a revista em termos ampliados.
Mas não apreciou o pedido alternativo, de serem os autos remetidos a V. Excelência.
Foi por essa razão que através de novo requerimento logo a 3/11/2010 se requereu então directamente a V. Excelência o julgamento da revista alargada (no sentido de revista ampliada), por se considerar que a mesma pode ocorrer sob a égide e determinação de V. Excelência, como único meio, de resto, na caso dos autos, de solucionar um conflito de jurisprudência evidente e notório em face do acórdão agora proferido a decidir o mérito da causa e todos os demais que sucessivamente foram elencados em sentido contrário sobre a mesma questão fundamental de direito.
Sucede que, entretanto, foi o signatário notificado para proceder ao pagamento da multa prevista no art°145°-6 do CPC, assim se pressupondo que haveria lugar a pagamento de taxa de justiça omitida e que o acto de requerer a remessa dos autos à alta e douta consideração de V. Excelência seria extemporâneo, embora cabendo no domínio do art°145° do CPC.
Face a essa circunstância, apresentou logo novo requerimento a V. Excelência, em 12 de Novembro, para ser esclarecido se realmente havia lugar ao pagamento de taxa de justiça e até de muita.
Porém, finda hoje mesmo o prazo para pagamento da multa e para juntar o comprovativo do pagamento com a taxa de justiça, sem que o signatário tenha sido notificado do despacho judicial a emanar de V. Excelência e, ao fim ao cabo, a ordenar tais pagamentos ou a eximi-los.
Por isso, à cautela de patrocínio e porque a recusa da revista ampliada sempre ditaria, salvo melhor entendimento e o inteiro respeito devido merecidamente a opinião e decisão que possa ser contrária, que fosse, como assim é — caso aconteça, inconstitucional o art°732°-A n°2 do CPC por violação dos art°s 20°-1 e 4, 202°-2 e 205°-1 da CRP, vai proceder-se imediatamente ao pagamento da taxa de justiça e da multa liquidada pela secção, para que não seja eventualmente por tal motivo que a mesma revista ampliada não venha a ser ditada por ordem de V. Excelência.
Na realidade, o entendimento que se fizesse a denegar a mencionada revista para uniformização de jurisprudência sempre acabaria por colidir com o direito a um processo equitativo e justo e de que se assegurasse a todos o acesso ao direito e aos Tribunais para defesa dos interesses legalmente protegidos, corno se trataria de violação do direito que detém os cidadãos de não serem confrontados com decisões judiciais contraditórias, como, aliás, resulta do art°35° da Lei 3/99 de 13-1 ou do art°43°-c) da Lei 52/2008 de 28-8.
Assim. pese embora o anterior requerimento dirigido a V. Excelência contendo o pedido a dirimir a respeito do pagamento de taxa de justiça e da muita — esclarecendo tal matéria — acaba, pois, por se proceder a tais pagamentos nos sobreditos termos.
(…)
4. Sobre tal requerimento veio a recair despacho, proferido pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator, em 26.11.2010 e a fls. 981, do seguinte teor:
(…)
Notifique a recorrente do douto despacho do M.º Cons. Presidente sobre o requerido a fls. 958 e 961.
Fica, assim, prejudicada o último requerimento (fl. 968 e ss.) onde, no essencial, se pedia a isenção de multa e a revista ampliada.
Quanto à primeira questão, como me foi deferida competência decisória, uso da faculdade 7ª do artigo 145 CPC e isento-a da multa, por a entender desproporcionada.
Restitua o depositado, tal como a taxa de justiça, que não era devida.
No tocante à segunda questão, Sua Excelência o Presidente já a decidiu.
(…).
5. A reclamante, notificada do teor da decisão proferida pelo Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, formulou pedido de aclaração da mesma com os seguintes fundamentos:
(…)
A., devidamente identificada nos vertentes autos, notificada do douto despacho proferido por V. Ex (agora dactilografado e inteiramente perceptível), vem requerer a seguinte ACLARAÇÃO do mesmo:
Em requerimento remetido a V. Excelência através de fax em 22/1 I e registo postal em 23/1 I, pugnou-se pela intervenção de V. Excelência para que fosse ordenada a REVISTA AMPLIADA, consistindo essa invocação pós produção do Acórdão emergido da secção do STJ e fundamentando-se, desde logo, no que preconizam quer Lebre de Freitas quer Lopes do Rego nas respectivas anotações que efectivam nas suas obras (Código de Processo Civil — Anotado) ao art°732°-A do CPC.
Na verdade o que se passa é que tais autores entendem que V. Excelência pode ordenar a REVISTA AMPLIADA nesses termos, sendo que V. Excelência entende em sinal contrário.
Porém, perante a eventualidade do entendimento que V. Excelência acabou por acolher, foi previamente suscitada a inconstitucionalidade do art°732°-A do CPC por violação dos art°s 20°-1 e 4, 202°-2 e 205°-I da CRP.
E a verdade é que V. Excelência acabou por não se pronunciar acerca dessa concreta questão submetida ao alto e douto entendimento de V. Excelência.
Por isso, crê-se que o juízo acerca da constitucionalidade plasmado no mencionado requerimento dirigido a V. Excelência terá de ter, necessariamente, pronúncia judiciai, para que, a ser o caso, possa ser interposto o recurso para o Tribunal Constitucional.
Nestes termos se requer a aclaração vertente, para que haja pronúncia acerca da alegada inconstitucionalidade.
(…)
Perante tal pedido de aclaração, o Exm.º Presidente do Supremo Tribunal de Justiça proferiu, em 9.3.2011, despacho do seguinte teor:
(…)
Requerimento de fls. 994 ( repetido a fls. 997, 1001 e 1003): não há nada a aclarar.
O despacho de fls. 967 é perfeitamente perceptível, a tal ponto que a requerente mostrou percebê-lo no requerimento agora apreciado.
*
A questão da inconstitucionalidade não foi nem tinha que ser apreciada no despacho de fls. 967 pois a requerente não a arguiu a fls. 961 (requerimento de 4/11/10); só mais tarde, depois de proferido aquele despacho, é que se veio a lembrar dela (cfr. fls. 968).
Indefere-se, ou melhor, não se conhece da questão arguida.
(…)
No seguimento deste despacho, a reclamante apresentou requerimento, através do qual pretende ver admitido recurso para este Tribunal Constitucional, com os seguintes fundamentos:
(…)
A., devidamente identificada nos autos, notificada do douto despacho judicial proferido a fls. 1012, vem interpor RECURSO para o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, o que faz ao abrigo do art.º 75°-A da Lei do TC e nos termos seguintes:
Foi aplicada norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo, concretamente o art°732°-A, n° 2 do CPC e mais tarde o próprio art°732°-A na integralidade.
Na verdade, assacou-se a essa norma, através do entendimento judicialmente perfilhado, violação aos art°s 20°-1 e 4, 202°-2 e 205°-1 da CRP. a qual aqui se renova.
Essa inconstitucionalidade foi invocada através de requerimento remetido aos autos, dirigido ao Exm° Sr. Presidente do STJ, através de fax em 22/11/2010 e através de registo postal em 23/11/2010, portanto, em data anterior ao douto despacho proferido apenas em 24/11/2010 e mais tarde renovada no requerimento contendo o pedido de aclaração sob o despacho proferido (que não apreciou a mencionada inconstitucionalidade — invocada, como se disse, antes da respectiva prolação).
Assim, diferentemente do referido no despacho agora proferido, a inconstitucionalidade foi suscitada (em 22/11/2010 — fax e 23/11/2010 — registo postal) antes de proferido o despacho (em 24/11/2010 - está bom de ver pela data nele aposta), sendo, pois, erróneo dizer-se, como se diz, que “(...) só mais tarde, depois de proferido aquele despacho, é que se veio a lembrar dela (...)”.
Sejamos claros, é irrelevante a ordem pela qual os papéis são juntos aos autos pela secção; verdadeiramente, o que conta é a data em que foram praticados e, será inequívoco que a inconstitucionalidade foi suscitada antes (e não mais tarde se lembrando dela...) da prolação do dito despacho (lembrou-se antes e não depois...).
Face ao exposto, é a alínea b) do n°1 do art.º 70° da Lei do TC e o art°732°-A- 2 (inicialmente) e o próprio art°732°-A do CPC (1 e 2) (na aclaração) do CPC, respectivamente, ao abrigo da qual se interpõe o presente Recurso e a norma cuja inconstitucionalidade se invocou e reitera, por ofensa àquelas disposições fundamentais acima mencionadas.
A peça processual em que a recorrente invocou a inconstitucionalidade é o requerimento supra referido, remetido aos autos em 22/11/2010 e também em 23/11/2010, respectivamente, por fax registado na AO e por registo postal, mais tarde renovada no pedido de aclaração (requerimento de fls. 994, repetido a 997, 1001 e 1003) do despacho proferido peio Sr. Presidente do STJ, já contemplando todo o preceito (e não apenas o número 2).
Para além das normas fundamentais violadas, invocou-se a violação dos princípios fundamentais a um processo justo e equitativo, que assegurasse a todos o acesso ao direito e aos Tribunais para defesa dos interesses legalmente protegidos e o direito que detém os cidadãos de não serem confrontados com decisões judiciais contraditórias nos termos referidos naquele mencionado requerimento que invocou a inconstitucionalidade.
Fundamentalmente, ao não ser reconhecido que o art.º 732°-A do CPC se trata de um poder dever do Presidente da secção em causa e do próprio Presidente do STJ e que é inconstitucional por prever que apenas possa ocorrer a Revista Alargada até à prolação de um Acórdão surpresa (bomba), perante o qual a parte o não podia adivinhar ou até imaginar (não foi sequer notificada para exercer o contraditório face à eventualidade da decisão surpresa), contrariando a jurisprudência não só da secção em causa mas até das secções cíveis do STJ.
Face ao exposto, requer-se a admissão do Recurso para o TC e que siga o processo os ulteriores termos. para que possa a recorrente oferecer as alegações que ao caso cabem.
(…)
Tal requerimento, interpondo recurso para este Tribunal Constitucional, mereceu, em 13.04.2011, por parte do Exmo. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, despacho de não recebimento do seguinte teor:
(…)
Não recebo o recurso interposto, pelos exactos fundamentos exarados no despacho de fls. 1012; ou seja, só mais tarde é que o recorrente se lembrou da inconstitucionalidade do art. 732.º-A do C. P. Civil quando o seu pedido de julgamento em revista ampliada fora indeferido já.
**
É certo que – em requerimento de 22 de Novembro/10 – o recorrente havia referido “à vol d’ oiseau” uma pretensa inconstitucionalidade, mas por um motivo totalmente diverso: por causa do pagamento de uma multa em que havia sido condenado e não pelos motivos agora invocados.
Daí que – se atendermos a este tipo de raciocínio jurídico do recorrente – é fácil arranjar inconstitucionalidades sempre, em todos os casos e para todos os recursos: basta o Autor, na sua petição inicial, ou o Réu, na sua contestação, arguirem a inconstitucionalidade prévia de todas as normas dos códigos processuais ou dos códigos de direito substantivo.
Porque – parafraseando o raciocínio do recorrente – não importa o momento temporal da arguição, mas sim a arguição em si mesmo, o que nos remete para um sistema de irresponsabilidade geral.
(…)
6. A reclamante, notificada de tal despacho de não recebimento, veio apresentar reclamação do mesmo, através de requerimento dirigido a este Tribunal Constitucional e com os seguintes fundamentos:
(…)
A., devidamente identificada nos presentes autos, notificada da não admissão do recurso interposto para o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, através de despacho proferido pelo Exm° Senhor Conselheiro Presidente do STJ, vem. respeitosamente. apresentar RECLAMAÇÃO, o que faz nos termos do art°76°-4 da LTC:
A recorrente invocou a inconstitucionalidade logo que se deparou com a respectiva presença.
A mesma foi arguida tempestivamente, como até emerge do próprio recurso que alega as circunstâncias em que a aplicação do preceito violador ocorreu.
Foi deduzida já sob a égide da tramitação presidida e decidida pelo Exm° Senhor Conselheiro Presidente do STJ, pois só nesse momento se deparou.
Assim, o recurso interposto é tempestivo e deverá ser aceite.
Na realidade, não tendo ocorrido a revista ampliada assacou-se a inconstitucionalidade do preceito em que a decisão proferida se estribou, o art°s 732°-A do CPC. por violação dos art°s 20°-1 e 4, 202°-2 e 205°-a da CRP.
Face ao exposto, requer-se seja o recurso admitido e siga o processo os ulteriores termos até final.
(…).
É esta reclamação que cumpre apreciar e decidir.
7. O Exmo. Representante do Ministério Público, junto deste Tribunal Constitucional, emitiu parecer no sentido do seu indeferimento, invocando que:
«…, a questão da inconstitucionalidade não foi suscitada “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar, obrigado a dela conhecer” (LOFTC, art. 72.º, n.º 2). Visto de outro ângulo, objectivo, “a inconstitucionalidade” não foi “suscitada durante o processo”, no sentido em que não foi invocada enquanto o poder jurisdicional era actual [idem, art. 70.º, n.º 1, al. b)].
Logo, sendo o presente recurso de constitucionalidade, por definição, nos termos do art. 70.º, n.º , al. b), da LOFTC, falta um seu pressuposto processual, …».
II. Fundamentos
8. A presente reclamação mostra-se formulada ao abrigo do disposto no artigo 76º, nº 4 da LTC e tem como objecto o despacho proferido pelo Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 13.04.2011 (cfr. fls. 1024), despacho esse em que, com fundamento em extemporaneidade na arguição da questão de (in)constitucionalidade da norma contida no artigo 732.º-A do CPC (aditado pelo artigo 2.º do Decreto Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro e na redacção anterior à que veio a ser introduzida pelo artigo 1.º do Decreto Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto), se não admitiu o recurso que a reclamante pretendia ver interposto.
A reclamante pretende que a questão de (in)constitucionalidade daquela norma foi arguida tempestivamente, porquanto o foi «… logo que se deparou com a respectiva presença. …», ou, precisando ainda mais, «… Foi deduzida já sob a égide da tramitação presidida e decidida pelo Exmº Senhor Conselheiro Presidente do STJ, pois só nesse momento se deparou. …».
Convirá notar, desde já, que o recurso que a reclamante pretende ver admitido para este Tribunal Constitucional se mostra interposto ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, al. b) da LTC, visando a apreciação de questão de (in)constitucionalidade da norma do artigo 732.º-A do CPC, na redacção anterior àquela que lhe veio a ser introduzida pelo artigo 1.º do Decreto Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, tal como foi aplicada no despacho datado de 24.11.2010 (cfr. fls. 967), proferido pelo Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do STJ, no qual se indeferiu o, pela reclamante, requerido julgamento ampliado com fundamento em que, ao abrigo de tal norma, «… sendo o presente processo anterior a 2008, tal julgamento só poderia ter lugar antes da prolação do acórdão deste S.T.J. (art. 732.º-A e segs. então em vigor). …».
É jurisprudência reiterada e uniforme deste Tribunal Constitucional o entendimento de que, nos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a suscitação da questão de (in)constitucionalidade reportada a normas, seus segmentos ou interpretação que delas se faça, há-de ocorrer ‘durante o processo’ em que se verifique a sua aplicação e sejam fundamento da decisão (‘ratio decidendi’), para além de outros pressupostos de admissibilidade que, no caso concreto, não importa considerar.
A exigibilidade de tal pressuposto de admissibilidade, isto é, que a suscitação da questão de (in)constitucionalidade haja ocorrido ‘durante o processo’, resulta abertamente do disposto no artigo 72.º, n.º 2 da LTC, pois aí se dispõe explicitamente que «Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão de inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (sublinhado nosso).
Aliás, no que se refere a tal questão, procurando fixar o sentido adequado de tal exigência, hoje legalmente consagrada, afirma Carlos Lopes do Rego (cfr. Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, págs. 77 e 78) que «… A exigência de que haja sido suscitada, em termos procedimentais adequados, a questão de inconstitucionalidade normativa – que a jurisprudência constitucional sempre inferiu do conceito legal de suscitação ‘durante o processo’ e que presentemente se mostra explicitamente consagrada no n.º 2 do artigo 72.º desta Lei – implica a existência de um tempo e de um modo adequados para levantar no “processo-base” a questão da inconstitucionalidade das normas relevantes para a dirimição do caso. / Na verdade, sempre entendeu o Tribunal Constitucional, em jurisprudência reiterada e uniforme, que deve interpretar-se esta exigência de suscitação da inconstitucionalidade “durante o processo” não num sentido meramente “formal” (de tal modo que a questão pudesse ser suscitada até à extinção da instância), mas num sentido “funcional”, carecendo a invocação da inconstitucionalidade de ter sido feita em momento processual em que ainda fosse possível ao tribunal “a quo” conhecer de tal questão jurídico-constitucional, tomando sobre ela posição, por não estar ainda esgotado o seu poder jurisdicional sobre a matéria a que diz respeito a questão de constitucionalidade a que o recurso se reporta. Será, pois, este o sentido a atribuir a este pressuposto ou requisito dos recursos de constitucionalidade previstos na alínea b), em consonância com a natureza da intervenção do Tribunal Constitucional em sede de fiscalização concreta – visando reaprecia uma questão que o tribunal “a quo” pudesse e devesse ter anteriormente apreciado e decidido, e não dirimir “questões novas” perante si inovatoriamente colocadas pelas partes – cfr., v.g., Acórdãos n.ºs 349/86, 199/88, 228/89, 318/90, 41/92, 269/94, 310/94, 352/94, 155/95, 178/95, 1144/96 e 618/98. / Assim – porque o poder jurisdicional se esgota, em princípio, com a prolação da sentença ou acórdão e a eventual aplicação de uma norma inconstitucional não constitui erro material ou lapso notório, não é causa de nulidade da decisão e não torna esta obscura ou ambígua – tem de entender-se que os incidentes pós-decisórios (pedido de aclaração, de reforma ou arguição de nulidade da decisão), previstos na lei de processo, não são já, em princípio, meios idóneos e atempados para suscitar, pela primeira vez, uma questão de constitucionalidade de normas aplicadas pelo julgador na decisão do pleito ou causa principal: é que, como é óbvio, se tais pretensões da parte forem indeferidas, por inverificação dos pressupostos do “incidente” requerido, as únicas normas aplicadas serão as normas processuais reguladoras da admissibilidade e âmbito dos pedidos de reforma ou nulidade – cfr., v.g., Acórdãos n.ºs 450/87, 46/88, 479/89, 61/92, 164/92, 152/93, 169/93, 261/94, 164/95, 122/98, 418/98, 496/99, 674/99, 374/00, 155/00, 142/01, 213/01, 300/02, 381/02, 443/02, 394/05, 533/07 e 55/08. …» (aliás, no mesmo sentido, vejam-se Guilherme da Fonseca e Inês Domingos, ‘in’ Breviário de Direito Processual Constitucional, 2.ª edição, págs. 45 a 48).
Perante tal entendimento, no que respeita ao sentido e alcance da expressão ‘durante o processo’, que este Tribunal Constitucional vem reiteradamente afirmando na sua jurisprudência, importa verificar se, no caso concreto, ocorre o mencionado pressuposto – suscitação da questão de constitucionalidade ‘durante o processo’ –, como pretende a reclamante, porquanto, como flui do despacho reclamado, o recurso para este Tribunal Constitucional não foi recebido com fundamento em que a questão de constitucionalidade não havia sido suscitada em tempo e modo adequados.
9. O despacho objecto de recurso de constitucionalidade, que a reclamante pretende ver admitido, é o proferido em 24.11.2010 (cfr. fls. 967), pelo Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J., e que, ao abrigo do «… (art. 732.º-A e segs. …)», indeferiu o requerimento apresentado por ‘fax’ datado de 03.11.2010 e entrada registada em 04.11.2010 (cfr. fls. 958, 959, 961 e 962), no qual a, ora, reclamante formulava pedido de julgamento ampliado com fundamento na citada norma.
Como resulta do teor do referido requerimento, integralmente mencionado supra sob ‘ponto 2 do Relatório’, nele se não invocou ou suscitou, implícita ou explicitamente, qualquer questão de constitucionalidade relacionada com a norma do artigo 732.º-A do CPC, limitando-se a aí requerente e aqui reclamante a fundamentar o seu pedido no facto de inexistir « … um só Acórdão proferido no domínio da mesma matéria e com a mesma legislação no sentido agora decidido. …», e, bem assim, que haviam sido citados « …ao longo do processo diversos Acórdãos, todos eles sem excepção, no sentido contrário, sendo que alguns dos quais tratam ipsis verbis a mesma questão. …», pretendendo, por se não poder conformar «… com uma decisão manifestamente surpreendente, que em toda a linha contraria a jurisprudência desse STJ. …», que haja lugar a ‘revista alargada para uniformização de jurisprudência’, visando com tal, naturalmente, vir a obter decisão em sentido contrário à que veio a ser proferida, em 7 de Julho de 2010, pelo acórdão do S.T.J. (cfr. fls. 874 a 878), sendo sempre certo que deste acórdão inexistia a possibilidade de interposição de novo recurso.
Aliás, como emerge dos autos, a, ora, reclamante, notificada que foi daquele acórdão de 7 de Julho de 2010, fez uso de todos os expedientes processuais que, por certo, se lhe afiguraram admissíveis legalmente; na realidade, notificada do teor deste, aquela logo apresentou requerimento em que suscitou a nulidade do acórdão, ao abrigo do artigo 668.º, n.º 1, al. d) do CPC, com fundamento em que conheceu de questões que não podia conhecer, sendo que o mesmo sempre deveria ser considerado nulo por não ter sido suscitado o mecanismo da ‘revista ampliada’, requerimento esse em que concluiu com o seguinte pedido: «1. Deve ser reconhecida a nulidade do Acórdão agora proferido por violação dos arts. 264º e 664º do CPC; 2. Reconhecida a mesma, deve ser realizado Julgamento da Revista em termos ampliados ao abrigo do art.º 732º-A, nº 2 do CPC; 3. A não ser entendido dessa forma por V. Ex.ª, devem os autos ser remetidos a sua Excelência, Sr. Dr. Juiz Conselheiro, Presidente do STJ, para que seja efectuado Julgamento ampliado da revista, para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 732º-A do CPC. …».
Tal requerimento foi integralmente indeferido por acórdão do S.T.J. de 12.10.2010 (cfr. fls. 946 a 953), nele se tendo deixado afirmado quanto à questão do julgamento alargado, para além do mais, que: « … 1. Considerando a data da propositura da acção são aplicáveis os preceitos adjectivos (designadamente quanto ao julgamento ampliado da revista) na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, já que a nova formulação se aplica apenas às lides intentadas depois de 1 de Janeiro de 2008. / Daí que a intervenção oficiosa do Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do nº 1 do artigo 732-A do Código de Processo Civil, só tivesse sido possível ‘até à prolação do acórdão’, que não nesta fase ulterior. /Também ( e nos termos do n.º 2 daquele preceito) o ‘terminus ad quem’ do pedido de julgamento alargado por qualquer das partes (ou mesmo pelo Ministério Público) ou a sugestão por iniciativa dos julgadores seja o mesmo. /Certo que para afastar este escolho, a requerente pretende a anulação do Acórdão, situação que, se lograsse, permitiria o reinício da fase processual de julgamento. /Só que, e como veremos, não ocorre qualquer vício na decisão que invalide o aresto posto em crise, nem se perfila uma situação de irregularidade a afectar a cadeia teleológica que implique a anulação do processado. …».
Ora, é no seguimento deste acórdão que a, ora, reclamante veio, por ‘fax’, formular o requerimento datado de 03.11.2010 (com registo de entrada no STJ de 04.11.2010), sobre o qual veio a recair a decisão do Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J., datada de 24.11.2010, indeferindo o julgamento ampliado, decisão essa de que a, ora, reclamante interpôs recurso para este Tribunal Constitucional e que veio a ser rejeitado por não suscitação da questão de constitucionalidade em tempo e modo adequados.
Dos factos acabados de referir, no que concerne à sucessão de decisões e requerimentos, uma conclusão se haverá necessariamente de extrair, como seja a de que, quando da formulação directa, em 03.11.2010, do requerimento de ‘julgamento ampliado’ para o Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J., já a reclamante havia sido confrontada, nos autos, com uma aplicação e interpretação do artigo 732.º-A do CPC idêntica à que veio a ser concretizada na decisão de que se pretende ver admitido recurso para este Tribunal Constitucional, pelo que, no que concerne à questão de constitucionalidade, sempre a reclamante, naturalmente, a podia e devia ter configurado e, consequentemente, suscitado naquele requerimento, não podendo, assim, quanto a ela, invocar qualquer surpresa em função dessa mesma decisão.
Aliás, isso mesmo resulta do teor da reclamação apresentada, quando ali afirma que a suscitou antes de ter sido proferida a decisão sobre que se pretende ver admitido recurso para este Tribunal Constitucional, designadamente, no requerimento apresentado em 22.11.2010, ainda que apenas junto aos autos após a prolação, em 24.11.2011, da decisão em causa.
Na realidade, nesse requerimento, apresentado em 22.11.2010, a reclamante, no que respeita à pretensa suscitação de questão de constitucionalidade, deixa tão só a simples e vaga afirmação - «… Por isso, à cautela de patrocínio e porque a recusa da revista ampliada sempre ditaria, salvo melhor entendimento e o inteiro respeito devido merecidamente a opinião e decisão que possa ser contrária, que fosse, como assim é — caso aconteça, inconstitucional o art°732°-A n°2 do CPC por violação dos art°s 20°-1 e 4, 202°-2 e 205°-1 da CRP, vai proceder-se imediatamente ao pagamento da taxa de justiça e da multa liquidada pela secção, para que não seja eventualmente por tal motivo que a mesma revista ampliada não venha a ser ditada por ordem de V. Excelência. …».
Todavia, a reclamante, com a formulação de tal requerimento, vem manifestar a sua discordância quanto à liquidação de taxa de justiça e de multa nos termos do artigo 145.º, n.º 6 do CPC, efectuada pela Secção, e, bem assim, dar conta que, mau grado aquela discordância, procedeu, entretanto, por mera cautela de patrocínio, ao seu pagamento.
Tal requerimento integra, assim, um mero incidente processual, posterior ao acórdão definitivo proferido pelo S.T.J., acórdão este que levou a, ora, reclamante, a requerer ao Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J. a revista ampliada para uniformização de jurisprudência e o que, por despacho proferido pelo mesmo, veio a ser indeferido, tendo a reclamante apresentado recurso para este Tribunal Constitucional e viu ser rejeitado por decisão que constitui objecto da presente reclamação.
Acresce que o incidente processual referente à liquidação de taxa de justiça e multa, mau grado aquele requerimento ter sido dirigido ao Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J., veio a ser decidido pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator no respectivo processo e por despacho de 26.11.2010 (cfr. fls. 981), já que da sua competência.
A, ora, reclamante no requerimento em que formulou pedido de revista ampliada para uniformização de jurisprudência, dirigido ao Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do STJ e único objecto da sua apreciação e decisão, não faz a mínima alusão a qualquer questão de (in)constitucionalidade, como do teor do mesmo se pode ver (cfr. fls. 958, 959, 961 e 962), e, menos ainda, portanto, em termos tais que sobre ela pudesse e devesse ser proferida decisão.
De tudo se haverá de concluir que, na decisão proferida pelo Exmo. Juiz Conselheiro Presidente do S.T.J., sobre a qual a reclamante pretende que seja admitido o recurso interposto para este Tribunal Constitucional, não tinha o mesmo que se pronunciar sobre qualquer questão de (in)constitucionalidade, por inexistência de suscitação de uma tal questão e, menos ainda, que tivesse sido suscitada em tempo e modo adequados, faltando, assim, um pressuposto de admissibilidade de recurso para este Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, al. b) da LTC, como seja, o de que a questão de inconstitucionalidade haja sido suscitada, pelo recorrente, « … de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» - artigo 72.º n.º 2 da LTC, isto é, haja sido suscitada em termos procedimentais adequados e durante o processo.
Impõe-se, assim, a manutenção da decisão objecto da presente reclamação.
III – Decisão:
Nos termos e com os fundamentos supra expostos, indefere-se a presente reclamação, mantendo-se o despacho reclamado.
Custas pela reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 UC.
Lisboa, 29 de Setembro de 2011. – J. Cunha Barbosa – Joaquim de Sousa Ribeiro – Rui Manuel Moura Ramos.
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