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Processo n.º 407/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Por Acórdão de 23 de fevereiro de 2009, proferido no processo comum coletivo n.º 263/06.8JFLSB pela 1ª Vara Criminal de Lisboa, foi o arguido A., ora reclamante, condenado em pena de multa pela prática, como autor material, de um crime de corrupção ativa para ato lícito, previsto e punido pelo artigo 18.º, n.º 2, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, na redação introduzida pela Lei n.º 108/2001, de 28 de novembro.
Desse Acórdão condenatório recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa, quer o arguido, que pediu a sua absolvição, quer o Ministério Público e o Assistente B., que pediram a sua condenação, tendo o tribunal de recurso, por Acórdão de 22 de abril de 2010, absolvido o arguido.
O Ministério Público e o assistente, inconformados, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por decisão sumária do relator, confirmada em conferência, rejeitou os recursos, recusando aplicar, por inconstitucional, o artigo 400.º do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que é admissível um segundo grau de recurso, nos casos de absolvição na relação em recurso de uma condenação na primeira instância em pena não privativa da liberdade.
O Tribunal Constitucional, no recurso dele interposto, julgou, porém, não existir tal inconstitucionalidade, pelo que prosseguiram os recursos interpostos do acórdão absolutório do Tribunal da Relação, tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 20 de janeiro de 2012, concedido parcial provimento aos recursos, condenando o arguido, pela prática do crime de que vinha pronunciado, na pena de 5 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, com a condição de entregar a quantia de €200.000,00 na Repartição de Finanças da área da sua residência.
O arguido arguiu a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 29 de fevereiro de 2012, indeferido a arguição de nulidade, por manifesta falta de fundamento, considerando tratar-se, para os efeitos dos nºs. 1 e 2 do artigo 720.º do Código de Processo Civil (CPC), na redação anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, de um «óbvio expediente dilatório, com o intuito de impedir o trânsito em julgado da condenação».
O arguido veio, então, recorrer para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), quer do Acórdão condenatório do Supremo Tribunal de Justiça, quer dos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa e da 1ª Vara Criminal de Lisboa, que o precederam, a fim de ver apreciadas seis questões de inconstitucionalidade, mas o Supremo Tribunal de Justiça, por despacho do relator, indeferiu, por intempestivo, o requerimento de interposição do recurso, considerando, em síntese, que a dedução pelo arguido/recorrente de um incidente pós-decisório meramente dilatório não prolonga o prazo inicial de recurso nos termos do artigo 670.º do CPC, pelo que, tendo o mesmo sido notificado do Acórdão condenatório do STJ em 20 de janeiro de 2012, já havia decorrido o prazo de 10 previsto no artigo 75.º da LTC aquando da interposição do recurso em 16 de março de 2012.
É deste último despacho que o arguido agora reclama, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da LTC, pugnando pela admissão do recurso, pelos fundamentos que resume nos seguintes termos:
«1- Como bem nota o douto despacho reclamado, não se pode aplicar ao caso vertente a redação dada ao artigo 720.º do C.P.C. pelo D.L. n.º 303/2007, de 24 de agosto, designadamente com o aditamento do seu n.º 5.
2- Certo é, porém, que o douto despacho, de facto e contra a premissa de que partiu, aplicou o n.º 5 do artº 720º, na redação do DL 303/2007.
3- Incorreu, assim, o douto despacho em manifesta contradição, que não fica afastada através da observação de que ‘a anterior redação dos nºs. 1 e 2 desta norma, aplicável subsidiariamente ao processo penal, já traduzia o conceito de que o requerimento dilatório, posterior ao acórdão proferido em recurso, não impede o ‘cumprimento do julgado’.
4- O conceito de ‘cumprimento do julgado’ é diferente e muito mais restrito do que o de ‘trânsito em julgado’, podendo as decisões (o julgado) ser cumpridas sem que tenham transitado em julgado.
5- Não é lícito invocar-se em desfavor do Reclamante mais do que a virtualidade do acórdão de 20.1.2012 para ser cumprido sem o obstáculo da reclamação que sobre ele incidiu e esteve na origem do traslado extraído.
6- O Tribunal Constitucional não tem poderes cognitivos para apreciar quaisquer nulidades da decisão impugnada.
7- Muito menos tem poderes para apreciar e declarar se uma reclamação por nulidade tem ou não natureza dilatória ou impertinente, para efeitos do artigo 720.º do CPC.
8- De onde resulta que as nulidades de qualquer decisão de que se pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional têm de ser arguidas perante e resolvidas pelo Tribunal recorrido.
9- Não é compatível com o sistema de recursos para o Tribunal Constitucional a possibilidade de estes poderem ser interpostos de decisões que estejam pendentes de reclamação.
10- O artº 670.º CPC tem de ser conjugado com o princípio fundamental de que só é admissível recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da previsão da al. b) do n.º 1 do artº 70.º LTC, de decisões definitivas.
11- Como flui da conjugação das normas contidas nos nºs. 2 a 6 do artº 70.º e no n.º 2 do artº 75º, as decisões que admitam ou estejam pendentes de reclamação ou recurso ordinário nunca são definitivas e, portanto, não são passíveis de recurso para o Tribunal Constitucional.
12- Uma decisão que esteja pendente (e enquanto estiver pendente) de reclamação – ainda que esta venha depois a ser declarada dilatória ou impertinente, na aceção do artº 720º CPC -, não é passível de recurso para o Tribunal Constitucional.
13- O prazo de interposição do recurso não pode iniciar-se enquanto a decisão se não tornar definitiva, pelo que o prazo estabelecido no artº 75.º LTC só se inicia depois de esgotado o prazo para reclamar ou recorrer da decisão ou de ter sido decidida a reclamação.
14- Considerando o teor literal do artº 677º CPC e o disposto nos arts 70.º, nºs 2 a 6, e 75.º, nºs 1 e 2, LTC, só as decisões transitadas em julgado admitem recurso para o Tribunal Constitucional, pelo que o termo inicial desse recurso se conta a partir do trânsito da decisão e não a partir da data desta ou do prazo abstrato para dele se reclame ou recorra.
15- Porque e na medida em que o Tribunal Constitucional não tem poderes cognitivos para apreciar quaisquer nulidades da decisão impugnada, nem, muito menos, para decidir se as reclamações apresentadas têm ou não natureza dilatória ou impertinente, o prazo previsto no artº 75º, 1, LTC, só se inicia depois de resolvidas as questões processuais conexas com as reclamações da decisão recorrida (incluindo as relativas à sua natureza dilatória ou impertinente).
16- O nº 2 do artº 75º LTC não estabelece qualquer restrição à regra que relaciona o termo inicial do prazo à decisão definitiva que não admita um recurso inadmissível, muito menos a limita aos casos em que a irrecorribilidade não seja manifesta ou em que o recurso interposto tenha motivação dilatória ou impertinente.
17- Não se vê que outro possa ser o regime para os casos já não de irrecorribilidade mas de nulidade da decisão.
18- O douto despacho reclamado aplicou de facto a atual redação do nº 5 do artigo 720º CPC, pese embora declare não o ter feito, com o que violou, além dos preceitos que ficaram indicados, o nº 1 do artº 11º do DL 303/2007.»
Quer o assistente, quer o Ministério Público, se pronunciaram pelo indeferimento da reclamação, considerando, de essencial, que a dedução de um incidente processual anómalo não tem a virtualidade de suspender ou interromper o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional, estabelecido no artigo 75.º da LTC, como tem sido jurisprudência assente, pelo que, sendo esse o caso, o recurso é manifestamente extemporâneo por interposto muito além do prazo de 10 dias fixado no citado normativo legal.
Por despacho proferido pelo relator, foi o reclamante notificado para, querendo, se pronunciar quanto à possibilidade de não admissão do recurso, por errada indicação da norma sobre que poderia incidir o juízo de inconstitucionalidade, no que se refere à primeira das questões de inconstitucionalidade enunciadas no requerimento de interposição do recurso, e por inutilidade do recurso decorrente do facto de as normas sindicadas, no que respeita às demais questões, não constituírem ratio decidendi do acórdão recorrido.
O reclamante, em resposta, sustentou que o recurso está em condições processuais de ser admitido, por estarem verificados os respetivos pressupostos processuais, incluindo os especificados pelo relator no convite a que responde.
2. Cumpre, pois, apreciar e decidir, antes de mais, se o recurso em causa foi ou não interposto no prazo legal, apenas se impondo a apreciação dos demais pressupostos processuais do recurso, atento o disposto no artigo 77.º, n.º 4, da LTC, caso se conclua pela sua tempestividade.
Sendo o prazo de recurso de 10 dias (artigo 75.º, n.º 1, da LTC), a questão que importa, em concreto, apreciar, atenta a avaliação decisória que, sob esse ângulo normativo, o tribunal reclamado fez da específica dinâmica processual ocorrida nos autos, e a perspetiva argumentativa, de sinal contrário, sustentada pelo reclamante, é a de saber se o referido prazo legal se iniciou, como é regra (artigo 685.º, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo 69.º da LTC), com a notificação do recorrente, ora reclamante, do acórdão condenatório proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, ou, ao invés, apenas com a notificação do acórdão que indeferiu a arguição de nulidade que o mesmo recorrente havia deduzido contra aquela primeira decisão condenatória.
Entendeu o Supremo Tribunal Justiça, no essencial, que, tendo o arguido deduzido um incidente pós-decisório manifestamente infundado, apenas com o objetivo processualmente vedado de protelar o trânsito em julgado da decisão condenatória, não poderia, por essa via, beneficiar da prorrogação do prazo prevista no artigo 670.º do Código de Processo Civil, extraindo, desse modo, consequências processuais, também ao nível do prazo de interposição do recurso de constitucionalidade previsto no artigo 75.º da LTC, da precedente qualificação de tal incidente como expediente dilatório, nos termos e para os efeitos do artigo 720.º do mesmo código, na redação aplicável.
Sucede que, e como o reclamante bem sublinha, não pode o Tribunal Constitucional aferir do caráter materialmente fundado ou infundado de um incidente processual que, estando previsto na tramitação legal do respetivo processo, a parte acionou nas instâncias, por se tratar de matéria que extravasa os seus poderes cognitivos, sendo precisamente essa a razão por que a jurisprudência constitucional tem defendido a aplicabilidade, para efeitos de contagem do prazo do de recurso de constitucionalidade, do disposto no n.º 1 do artigo 686.º do CPC, na redação aplicável, não apenas aos incidentes pós-decisórios nele expressamente previstos, mas também às arguições de nulidade (cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs. 79/00, 64/2007 e 195/2009).
E, não podendo o Tribunal Constitucional apreciar do bem ou mal fundado de uma concreta arguição de nulidade, visando decisão das instâncias, nem sindicar a decisão a tal propósito proferida pelo tribunal competente, também não pode aferir, sem riscos de desarmonia processual intrassistémica, ainda que apenas para efeitos de verificação da tempestividade do recurso de constitucionalidade, do caráter manifestamente infundado de um tal incidente.
Por isso que, se é certo que o Tribunal Constitucional tem considerado, em jurisprudência consolidada, que a dedução de incidentes pós-decisórios anómalos não tem a virtualidade de interromper o prazo do recurso, tem, contudo, restringido tal doutrina aos casos que rigorosamente se enquadram em tal conceito, reportando a anomalia processual do ato, não ao fundamento material em que assenta, mas à sua relação com a tramitação legal do processo (cf. Alberto dos Reis, RLJ n.º 2985, pp. 2985).
Assim, tendo a parte deduzido incidente que não está, de todo, previsto na tramitação legal do respetivo processo (cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs. 511/93, 641/97, 618/03, 1/04, 166/05, 278/05, 378/05, 64/07, 173/07, 279/07, 463/07, 514/07, 80/08, 241/08, 178/09, 195/09, 72/10, 357/11 e 640/11), ou em termos que, pese embora o nomen juris que lhe é por si atribuído, manifestamente não correspondem à essencial modelação processual do respetivo instituto (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 210/08), não poderá tal desvio, por processualmente inepto, operar qualquer efeito no processo, designadamente o de prorrogar o termo inicial do prazo do recurso de constitucionalidade.
Mas, em contraponto, estando em causa incidente processual previsto e admitido pela lei que foi deduzido em moldes que, aferidos à concreta dinâmica processual em curso, nela têm ainda correspondência, quer pelos termos em que se apresenta (contendo a invocação de factos materializadores dos respetivos pressupostos), quer pelo contexto processual em que é deduzido (no momento processualmente adequado), é de considerar que, independentemente da bondade material dos fundamentos invocados, que, sublinhe-se de novo, não compete a este Tribunal Constitucional apreciar, opera a interrupção do prazo legal do recurso, nos termos previstos citado artigo 686.º, n.º 1, do CPC, aplicável, pelo que o prazo do recurso para o Tribunal Constitucional da decisão que é objeto de um tal incidente só começará a correr, em tais casos, depois de a parte ser notificada da decisão que o julga.
Afigura-se ser o caso.
Com efeito, o arguido, ora reclamante, notificado do acórdão condenatório, veio arguir a sua nulidade, por omissão de pronúncia, invocando que dada questão, que aí claramente enunciou, não foi apreciada quando o deveria ter sido. Ora, assista-lhe ou não razão, a verdade é que usou, no momento processualmente oportuno, e por uma única vez, de um meio previsto e admitido por lei, invocando razões que, em abstrato, têm a virtualidade de afetar, na perspetiva da sua validade, o decidido, o que se afigura bastante para operar, tal como reclamado, a interrupção do prazo do recurso para o Tribunal Constitucional.
Aliás, nem podia ser de outro modo.
Com efeito, sendo pressuposto processual do recurso de constitucionalidade interposto nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC a definitividade da decisão recorrida, o que obriga o recorrente a exaurir previamente todos os recursos ordinários possíveis - em cujo conceito tem a jurisprudência constitucional incluído os próprios incidentes processuais pós-decisórios (cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 534/04, 24/06 e 286/08) –, é evidente que o ora reclamante não só podia como devia ter interposto recurso de constitucionalidade da decisão condenatória só depois de notificado da decisão que indeferiu a arguição de nulidade por si deduzida, assumindo a correspondente opção, nesse contexto, a natureza de uma verdadeira exigência processual de cuja verificação dependia o próprio conhecimento do recurso.
Assim sendo, tendo o arguido, ora reclamante, interposto recurso de constitucionalidade do acórdão condenatório proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça dentro dos dez dias subsequentes à notificação do acórdão que indeferiu a arguição de nulidade por si deduzida, há que concluir pela tempestividade do recurso.
No entanto, cumpre verificar ainda se o recurso, embora tempestivamente interposto, está em condições processuais de ser admitido.
Afigura-se que não.
Com efeito, pretende o recorrente, no recurso interposto quer do Acórdão condenatório do Supremo Tribunal de Justiça, quer dos precedentes acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 22 de abril de 2010 e da 1ª Vara Criminal de Lisboa, de 23 de fevereiro de 2012, ver apreciadas as seguintes questões de inconstitucionalidade:
“A – art. 310º, nº 1 do CPP, interpretado no sentido de que formam caso julgado as decisões relativas à validade ou nulidade das provas e à inconstitucionalidade das normas nelas implicadas, proferidas em recurso, durante a fase da instrução, por violação do art. 32º, nº 1, da CRP;
B – conjunto normativo integrado pelos art. 2º e 3º da Lei 101/2001, de 25 de agosto, 187º, nº 1, 189º, nº 1, do CPP, e 1º e 6º da Lei 5/2002, de 11 de janeiro, por violação dos arts. 18º, nº 2, 32º, nº 1, e 205º, nº 1, da CRP, interpretado no sentido de se considerar validamente autorizados meios ocultos de investigação (ações encobertas, escutas telefónicas, e gravações de conversas entre presentes e de imagens), através de despacho que não contenha a descrição e análise dos factos concretos que suportam a suspeita fundada da prática de crimes do catálogo que admitem o recurso a esses meios, e a ponderação, necessidade/dispensabilidade de utilização desses meios e da sua proporcionalidade à gravidade concreta do crime a investigar;
C – conjunto normativo integrado pelos arts. 189º, nº 1, do CPP, 2º, al. m), da Lei 101/2001, de 25 de agosto, e 1º, nº 3 e 6º, da Lei 5/2002, de 11 de janeiro, por ofensa do art. 18º, nº 2, da CRP, quando interpretado no sentido de permitir o recurso à ação encoberta e ao registo de voz e imagem para investigação de crimes de corrupção ativa, para ato lícito ou ilícito;
D – conjunto normativo integrado pelos art.s 2º e 3º da Lei 101/2002, de 25 de agosto, 125º, 187º, nº 1, e 189º, nº 1, do CPP, e 1º e 6º da Lei 5/2002, de 11 de janeiro, por violação do art. 18º, nº 2, da CRP, quando interpretado no sentido de se considerar válidas para provar um crime de corrupção ativa para ato lícito as provas obtidas (quer por conhecimento fortuito quer por conhecimento de investigação através do recurso a meios ocultos de investigação (ações encobertas, escutas telefónicas e gravações de conversas entre presentes e de imagens) autorizados para investigação de um crime de corrupção ativa para ato lícito pelo qual o Arguido foi absolvido;
E – art. 3º, nº 3, da Lei 101/2001, de 25 de agosto, por ofensa dos arts. 18º, nº 1 e 32º, nºs 1 e 8, da CRP, na interpretação segundo a qual podem ser executados e são válidos os atos praticados no âmbito da ação encoberta antes de proferido despacho de validação expressa ou de decorrido o prazo de validação tácita; e
F – conjunto normativo integrado pelos arts. 2º e 3º, nº 1, da Lei 101/2001, de 25 de agosto, e 87º, nº 1, al. e), e nº 5, da Lei 15/2005, de 26 de janeiro, por violação do art. 187º da CRP, na interpretação segundo a qual é permitida a atuação, como agente encoberto de um advogado, maxime com violação do sigilo profissional.”
O recurso de constitucionalidade interposto dos acórdãos proferidos pelo Tribunal de Primeira Instância e pelo Tribunal da Relação não pode, porém, ser admitido. Com efeito, tais arestos, em face da interposição dos recursos para o Supremo Tribunal de Justiça, que os conheceu, perderam autonomia, não representando, pois, a última palavra decisória proferida, quanto ao objeto dos autos, na respetiva ordem jurisdicional. Não assumem, por isso, o caráter de definitividade que é condição processual do recurso de constitucionalidade interposto (artigo 70.º, nºs. 1, alínea b), e 2, da LTC).
Por outro lado, no que respeita ao Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de que também se recorreu, a verdade é que, como resulta da sua leitura, nele manifestamente não se aplicaram quaisquer das normas sindicadas nos pontos B. a F. do requerimento de interposição do recurso.
Com efeito, sustentou o Supremo Tribunal de Justiça, quando confrontado com diversas questões incidentais atinentes ao despacho de pronúncia, relativas à proibição de provas, inclusive de índole constitucional, que, tendo tais questões sido apreciadas pela Relação no recurso interposto daquela decisão instrutória, por acórdão transitado (acórdão de 21 de outubro de 2008), não podia, agora, no recurso em apreciação, voltar a discuti-las, sob pena de violação do caso julgado formal.
De modo que, não tendo o Tribunal recorrido proferido, por tal razão, qualquer pronúncia de mérito sobre tais questões, manifestamente não aplicou as correspondentes normas, cuja inconstitucionalidade o reclamante pretende ver apreciadas, revelando-se inútil conhecer do recurso, nessa parte, sendo certo que, ainda que este viesse a proceder, não teria a virtualidade de operar modificação de julgado.
Por outro lado, e no que respeita à inconstitucionalidade do artigo 310.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretado «no sentido de que formam caso julgado as decisões relativas à validade ou nulidade das provas e à inconstitucionalidade das normas nelas implicadas, proferidas em recurso, durante a fase da instrução», verifica-se que o recorrente, inobservando o correspondente ónus, não identificou, de modo claro e preciso, o critério normativo usado pelo Tribunal recorrido quanto à questão da possibilidade de reapreciar tais decisões, indicando a fonte legal precisa em que se baseou tal interpretação, efetivamente assente apenas na norma nuclear do artigo 672.º do Código de Processo Civil (CPC), que se julgou subsidiariamente aplicável, e não no preceito legal isoladamente invocado do artigo 310.º, n.º 1, do CPP, cujos termos literais, exclusivamente reportados à irrecorribilidade do despacho de pronúncia por factos constantes da acusação, não consentiriam, aliás, só por si, uma tal interpretação.
Pelo que, por deficiente enunciação da questão de inconstitucionalidade, também não é possível conhecer, nessa parte, o objeto do recurso.
Impõe-se, pois, ainda que por razões distintas das invocadas no despacho reclamado, o indeferimento da reclamação.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação deduzida, nos presentes autos, pelo arguido A..
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 24 de outubro de 2012.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Joaquim de Sousa Ribeiro.
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