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Processo n.º 588/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Pela decisão sumária n.º 511/2012, decidiu o relator não conhecer do recurso que A. e mulher, B., ora reclamantes, interpuseram, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), da decisão proferida, em sede de recurso de apelação, pelo Tribunal da Relação de Guimarães, considerando não estarem reunidos os pressupostos processuais legalmente previstos para o efeito, seja porque a questão de inconstitucionalidade que se suscitou perante a instância recorrida e pretende ver reapreciada não assumia caráter normativo, seja porque o recurso não revestia utilidade por ter por objeto entendimento (decisório) que não foi acolhido pelo Tribunal recorrido.
Os recorrentes, inconformados, dela reclamam para a conferência, invocando, no essencial, que o Tribunal da Relação sufragou da lei (artigo 394.º do Código de Processo Civil) interpretação que ela não consente, assim violando o princípio da legalidade a que está constitucionalmente subordinado, tal como oportunamente se sustentou no recurso de apelação interposto da decisão proferida em primeira instância, pelo que, contrariamente ao sumariamente decidido, está em causa questão de inconstitucionalidade cujo mérito deve ser apreciado.
Os recorridos C. e mulher, D., notificados para o efeito, não apresentaram resposta ao presente incidente.
2. Cumpre apreciar e decidir.
A questão de inconstitucionalidade que os ora reclamantes sujeitaram à apreciação do Tribunal Constitucional tem por objeto os artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil (CPC), interpretados no sentido de que «a investidura do requerente na posse pode ser efetuada na sequência e através da condenação dos requeridos, que não foram ouvidos antes do decretamento da providência [restituição provisória da posse], porque não deviam sê-lo de conformidade com o disposto no artigo 394.º do CPC, na prática de atos concretos que antecipam a decisão».
Já durante o processo haviam os reclamantes invocado perante o Tribunal da Relação, no recurso de apelação nele interposto, que «o tribunal não pode, colocado ante determinada violação do direito, optar por uma decisão diversa daquela que a lei lhe impõe, sob pena de julgar conforme critérios e valores não tutelados», o que sucedeu no caso concreto ao adotar-se «uma interpretação do artigo 394.º do Código de Processo Civil (que prescreve que o juiz, reconhecendo que o requerente tinha a posse e foi dela esbulhado violentamente, deve ordenar a restituição sendo esta efetuada sem intervenção do requerido, que apenas tem de a consentir, mediante auto a lavrar por funcionário judicial) no sentido de que o juiz tanto pode proceder como a lei lhe manda que proceda, como ‘condenar’ os requeridos a reporem a situação pretérita, através da prática de quaisquer atos que lhe sejam impostos».
Considerou-se, na decisão sumária ora em reclamação, que o recorrente, ao questionar a bondade interpretativa do entendimento sufragado, tanto pelo Tribunal de Primeira Instância, como pelo Tribunal da Relação, nos recursos de apelação e constitucionalidade que interpôs das respetivas decisões, sustentando, no essencial, que ambas as instâncias violaram a lei ao dela extraírem interpretação que ela não consente, não censura a constitucionalidade de uma determinada norma jurídica mas a legalidade da própria decisão judicial que, a seu ver, desrespeitou a lei ao condenar os requeridos, no âmbito do procedimento cautelar de restituição provisória da posse, na prática de atos concretos, sem prévio contraditório, quando a lei apenas permite a sua sujeição (passiva) à correspondente medida cautelar mediante auto a lavrar por funcionário judicial.
Sustentou-se, por outro lado, que a decisão recorrida nem sequer adotou, em rigor, um tal entendimento da lei, pois que, como nela se esclarece, não está em causa a condenação dos requeridos, sem prévio contraditório, à prática de atos que antecipam a decisão final mas, e tão só, a imposição cautelar de que, antes da discussão das razões que lhes assistam, reponham a situação anterior ao esbulho que violentamente protagonizaram, mediante a prática dos atos materiais necessários para o efeito. Concluiu-se, assim, que, mesmo assumindo o objeto do recurso natureza normativa, sempre seria inútil o seu conhecimento por não estar em causa norma efetivamente aplicada como fundamento jurídico do julgado.
Os recorrentes, na presente reclamação, insistem pelo conhecimento de tal questão de inconstitucionalidade, reiterando as razões pelas quais entendem que o Tribunal recorrido violou a lei, mas não aduzem um único argumento tendente a demonstrar o seu caráter normativo e a utilidade do recurso.
Ora, reapreciando a essa luz o recurso de constitucionalidade interposto pelos reclamantes, verifica-se que não se reputa inconstitucional norma que tenha sido aplicada pelo Tribunal recorrido como critério de decisão mas a legalidade de uma dada solução de direito que nem sequer foi a aplicada na resolução concreta litígio, não havendo, nessas circunstâncias, qualquer fundamento para conhecer do objeto do recurso, tal como já se entendera na decisão reclamada.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 9 de janeiro de 2013. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral.
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