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Processo n.º 777/12
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em que é reclamante A., LDA. e reclamados B., C., D. e E., o primeiro vem reclamar, ao abrigo dos artigos 76.º, n.º 4, e 77.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 21/09/2012 que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. fls. 179).
2. O ora reclamante apresentou requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, al. b) da Lei nº 28/82, de 15 de novembro, nos termos seguintes (cfr. fls. 160 a 165):
«(…) A. LDA., R. recorrente nos autos em epígrafe, não se conformando com a douta decisão exarada peio Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, da mesma vem interpor Recurso para o Tribunal Constitucional que, salvo melhor opinião, sobe imediatamente e com efeito suspensivo, o que faz nos termos do artigo 70°, n.º 1, al. b) da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro e com os seguintes fundamentos:
1°
A R. Recorrente, por não se conformar com o acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto, dele interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 678°, n° 3, 686°, 716°, 721° e ss. e 732°-A do C.P.C. na versão em vigor à data dos fatos em discussão nos autos.
2°
Designadamente, a R. Recorrente interpôs tal recurso do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto por entender que o mesmo está em contradição com outros acórdãos, daquele mesmo Tribunal da Relação do Porto e outros Tribunais da Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito relativa ao abuso do direito por parte do senhorio.
3°
Designadamente, entre outros, os proferidos pelo Tribunal da Relação do Porto de 12.01.2012 no processo n° 585/103 TJPRT.P 1, pelo Tribunal da Relação de Guimarães de 22.02.2011 no processo n.º 2019/06.9TBVCT.G1, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 24.01.2008 no processo n.º 10615/2007-2, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 13.01.2011 no processo n.º 1655/09.6TBCSC.L1-2, pelo Tribunal da Relação de Coimbra de 01.07.2008 no processo n.º 181/04.4TBSRE.C1, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 29.04.2004 no processo n.º 2548/2004-6, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 24.01.2008 no processo no 10615/2007- 2, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 07.01.2007 no processo n° 7478/06-6.
4º
Pelo que será sempre admissível recurso do acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça.
5º
Sucede que o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação apresentada pela R. Recorrente, tendo considerado que sendo o valor da causa inferior à alçada da Relação, à data predita, não obliterado, ainda o plasmado no art.° 678°, nº 1 do CPC, censura não merece o despacho reclamado, razão pela qual se indefere a reclamação.
6°
Daí a R. Recorrer deduzir o presente requerimento de interposição de recurso para este Tribunal Constitucional por entender que o disposto no artigo 678°, n.º 4 do C.P.C. deverá ser interpretado no sentido de que serão sempre admissíveis os recursos de revista para o Supremo Tribunal de Justiça quando se verifique a contradição de acórdãos.
7°
E isto independentemente de o valor da ação ser ou não superior à alçada da Relação.
8°
Designadamente, que o segmento do n.º 4 do artigo 678° do C.P.C. do qual consta que do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal é inconstitucional por violação dos artigos 13° e 20° da C.R.P e dos princípios constitucionais neles constantes, designadamente, o princípio da igualdade de todos perante a lei e o princípio do direito de todos terem acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
9º
Deste modo, a R. Recorrente pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 678°, nº 4 do C.P.C., quando interpretada conforme foi da douta decisão recorrida que afirma que “para a admissibilidade de recurso com o fundamento contemplado no art. ° 678 n. ° 4 do CPC impõe-se, entre outros requisitos, que o acórdão recorrido seja inconceptível de recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, a menos que, por razão da alçada, cumulativamente, outrossim não seja admissível”.
10°
Tal norma, com a interpretação com que foi aplicada, viola os artigos 13º e 20°, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, que prevê o princípio da igualdade de todos perante a lei e garante a todos o acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
11º
Face ao presente caso concreto, em que, por via da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que não admitiu o recurso de revista interposto, se produz tão intensa ofensa a valores fundamentais constitucionalmente protegidos, uma interpretação meramente literal do citado n.º 4 do artigo 678.° do C.P.C., acolhendo um sentido restritivo que, no caso concreto, produza o efeito de impedir o recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, e, em virtude disso, a tutela jurisdicional efetiva dos direitos e legítimos interesses dos recorrentes, bem como o seu direito a receberem dos tribunais um tratamento similar ao de todos os seus concidadãos, é incompatível com o nº 1 do artigo 13° e com o nº 1 do artigo 20º, ambos da C.R.P..
12°
O artigo 13º, nº 1 da C.R.P., nas suas várias dimensões, estipula a igualdade material e formal dos cidadãos perante a lei.
13º
Isto é, por um lado, a igualdade prevista no artigo 13°, nº 1 da C.R.P. significa uma aplicação imparcial e neutral da lei.
14º
Por outro lado, implica o não tratamento de sujeitos de forma arbitrária e diferenciada.
15º
Ora, a uniformidade da jurisprudência dos tribunais superiores é um valor necessariamente perseguido pelo sistema jurídico (cfr. artigo 8°, nº 3 do C.C.), pois é emanação dos princípios constitucionais da igualdade e do Estado de Direito — cf. artigo 2° e 13° da C.R.P.
16º
Pelo que um sistema processual em que uma parte, confrontada com uma decisão inovadora de um tribunal, relativa a uma causa de valor inferior à alçada da relação e que esteja em oposição com decisões anteriores dos tribunais superiores quanto à mesma questão fundamental de direito, e que não tenha ao seu dispor nenhum meio de a impugnar, não é conforme à Constituição, violando assim os artigos 2°, 13° e 20°, todos da C.R.P.
17º
Sendo que em causa está também a apreciação do abuso do direito suscitado pela R. Recorrente com violação dos limites impostos pela boa-fé, bons costumes e pelo fim social ou económico desse direito — cf. artigo 334° do C.C.
18°
O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto está em contradição com os acórdãos acima enunciados porquanto segue uma doutrina e jurisprudência minoritárias e entende que não se verifica abuso de direito por parte dos AA. Recorrentes, decidindo contra a jurisprudência corrente do próprio Tribunal da Relação do Porto e de outros tribunais superiores.
19º
Na verdade, e conforme sentença de primeira instância e os acórdãos referidos em 3°, não se verifica a existência de fundamento para a resolução do contrato de arrendamento porquanto a R. Recorrente alegou e provou factos dos quais resulta que continua a ser objetivamente razoável a manutenção do contrato.
20º
Daqui retira-se que a R. Recorrente sempre veio exercendo a sua atividade comercial à vista de todos e, em especial, dos pais de alguns dos AA. Recorrentes e dos próprios AA. Recorrentes, os quais desde 1986 sempre foram recebendo as rendas devidas pelo locado, sem nunca levantar qualquer objeção.
21°
Desta maneira, a pretensão dos AA. Recorrentes é passível de ser considerada como UM ABUSO DE DIREITO, nos termos do disposto no artigo 334° do C.C., preceito que expressamente se invoca com todas as legais consequências.
22°
Pelo que será sempre admissível recurso do acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça, sob pena de violação do artigo 20°, nº 4 da C.R.P. a título de violação do direito a um processo equitativo.
23°
Só agora com a notificação da decisão recorrida foram esgotados pela R. Recorrente todos os meios de recurso ordinário previstos na lei, conforme o disposto nos artigos 70°, n.º 2 e 72°, n.º 2 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.
Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se mui respeitosamente a V. Exª que se digne admitir o presente recurso para o Tribunal Constitucional, seguindo-se os demais ulteriores termos da lei.».
3. Os AA. e recorridos nos autos vieram dizer o seguinte (cfr. fls. 174 a 177):
«(…) 1)- Com o devido respeito, não é admissível Recurso para o Tribunal Constitucional, pois nunca a Requerente suscitou qualquer pretensa inconstitucionalidade durante o processo, não ocorrendo o fundamento invocado e previsto no artº 70º, n.º 1, al. b) da Lei N 28/82 de 15/11, uma vez que nenhuma norma foi aplicada, cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo, como exige o mencionado inciso legal.
2)- Prescreve ainda o art.º 72º, nº 2 da mencionada Lei, que Os recursos previstos nas alíneas b)(...) do n.º 1 do artigo 70º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade (...) de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
3)- A Recorrente não indicou, nem podia indicar, a peça processual, onde suscitara a questão da inconstitucionalidade, pela razão óbvia, da inobservância do ónus de prévia suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, como decorre da análise e cotejo dos autos.
4)-TAL NÃO SUCEDEU, pelo que está precludida tal possibilidade, não tendo a Recorrente legitimidade para o presente recurso que pretende agora interpor.
5)- O douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, é irrecorrível, pelo que não foi admitido qualquer Recurso, conforme bem decidiu o Supremo Tribunal de Justiça.
6)- A admissibilidade de Recurso de Revista, para o S.T.J., quando haja contradição de Julgados, dessa ou de diferente Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito, exige ainda ou cumulativamente que a decisão seja irrecorrível por natureza para o STJ, pois, como prescreve o artº 678º nº 4 do C.P.C., na redação do DL. N.º 38/2003 de 8/3, aplicável aos presentes autos, para além daquele requisito, não demonstrado, é ainda necessário, como literalmente consta do preceito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal.
7)- Tal inciso legal condiciona ou limita a admissibilidade deste recurso a tais casos, que não é similar ao dos autos, e por isso, inaplicável, sendo irrecorrível o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto.
8)- A propósito da ratio legis desta norma e de modo inexcedível se pronunciou, em Anotação, o Sr. Prof. Antunes Varela, na RLI, Ano 116, 1983-1984, a pags. 93 e ss., onde se conclui, que para tal recurso, a questão contraditória, teria que ser daquelas, que por natureza não podiam ser conhecidas pelo Supremo, por respeitarem a matérias subtraídas ao conhecimento do Supremo, porque as demais aí poderão ir se o valor da ação ultrapassar a alçada do Tribunal da Relação, pela via do recurso ordinário, que também não é o caso, sendo irrecorrível o douto Acórdão.
9)- No caso sub Júdice, atenta a matéria e a questão em apreço, para além do mais, não se verifica o requisito da irrecorribilidade da decisão, por causa estranha à alçada do tribunal da Relação, o que tanto basta, para que não seja admissível o recurso pretendido.
10)- A interpretação literal e teleológica da norma, são neste sentido, sufragado pela Doutrina.
11)- Trata-se de uma questão de aplicação da lei processual civil no tempo, nomeadamente em matéria de Recursos, sendo incontroversamente aplicável ao caso dos autos, o regime dos Recursos vigente em 2007, por ser essa a data da instauração da Ação, já que a Reforma apenas entrou em vigor e se aplica a Processos instaurados a partir de 1 de Janeiro de 2008.
12)- Pelo que não houve qualquer interpretação do art 678º, nº 4, do C.P.C., que seja inconstitucional, ou que viole o direito ao recurso, ou à igualdade e acesso ao Direito e aos Tribunais, ou qualquer outra, como infundadamente propugna a Recorrente.
13)- A esse propósito, cita-se o Acórdão N° 164/2012 de 28/03/2012
“Face à reiterada jurisprudência deste Tribunal (largamente referenciada no acórdão indicado pela decisão sumária reclamada) sobre a inexistência da consagração constitucional de um direito geral de recurso de decisões judiciais e, muito menos, do direito a um duplo recurso (ou um triplo grau de jurisdição), é infundada a questão de constitucionalidade da norma (...)”, aplicável ao caso dos autos.
14)- Os “argumentos” invocados pela Recorrente seguramente que não tem a virtualidade de contrariar a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a inexistência da consagração constitucional de um direito geral de recurso de decisões judiciais e, muito menos, do direito a um duplo recurso (ou um triplo grau de jurisdição), pois o que dessa jurisprudência se retira é justamente a ampla liberdade de conformação de que goza o legislador ordinário nessa matéria. Dito de outro modo, a circunstância de o legislador ordinário poder ter, eventualmente, revisto o regime de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, alargando-o a situações não contempladas pela lei antiga, em nada releva para a questão jurídico-constitucional sob apreciação que é a de saber se ele a tanto estaria constitucionalmente vinculado.
15)- Em idêntico sentido o Ac. N.º 75/2011 de 31/1/2011 ”Compulsados os autos, verifica-se que em lugar algum das suas alegações (...) para o Supremo Tribunal de Justiça o recorrente suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma (...), pois que, para efeitos de poder considerar-se satisfeito o pressuposto processual de suscitação prévia, de modo processualmente adequado, da questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer, tal como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.° da LTC, teria que ter colocado tal questão, para dela o Tribunal conhecer.
16)- “Em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, consistindo a intervenção do Tribunal Constitucional em uma reapreciação, enquanto instância de recurso, do juízo efetuado pelo tribunal a quo sobre uma questão de constitucionalidade normativa, é um pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade que se verifique, de facto, uma prévia apreciação jurisdicional relativamente a uma questão de constitucionalidade. Assim, para que, posteriormente, ao recorrente esteja aberta a via de recurso para o Tribunal Constitucional, é indispensável que, previamente tenha suscitado a questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
17)- Tanto basta para que se não possa admitir o presente recurso de constitucionalidade.
Nestes termos e nos demais de direito invocados e pelo que será doutamente suprido por Vª EXA., não deverá ser admitido o Recurso interposto para o Tribunal Constitucional.».
4. O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em 21/09/2012, proferiu despacho de não admissão do recurso para este Tribunal com o seguinte fundamento (cfr. fls. 179):
«(…) Requerimento de fls. 160 e segs.:
Não se admite o recurso interposto pelos exactos motivos invocados na resposta de fls. 174 e segs. )…)».
5. Inconformada, a recorrente e ora reclamante reclamou para a conferência, do despacho do Presidente do STJ que indeferiu o requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, e 77.º da LTC, com os seguintes fundamentos (cfr. fls. 192 a 197):
«(…) RECLAMAÇÃO (…)
I — Considerações introdutórias:
O MM.° Presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu o recurso interposto tendo, em suma, considerado que sendo o valor da causa inferior à alçada da Relação, à data predita, não obliterado, ainda o plasmado no art.° 678°, n.º 1 do CPC, não é admissível
E, a final, decidiu não conhecer admitir recurso interposto pela R. recorrente, nos termos constantes do requerimento de interposição.
No entanto, com o devido respeito e toda a consideração, não assiste razão ao ilustre MM.° Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, porquanto se considera que ocorreu incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, violadoras do disposto no artigo 32°, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, como adiante se vai demonstrar.
II — Da questão de inconstitucionalidade
A R. Recorrente pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 678°, n.º 4 do C.P.C., quando interpretada conforme foi da douta decisão recorrida que afirma “que para a admissibilidade de recurso com o fundamento contemplado no art.° 678°, nº 4 do CPC impõe-se, entre outros requisitos, que o acórdão recorrido seja insusceptível de recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, a menos que, por razão da alçada, cumulativamente, outrossim não seja admissível”.
Tal norma, com a interpretação com que foi aplicada, viola os artigos 13° e 20°, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, que prevê o princípio da igualdade de todos perante a lei e garante a todos o acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
Face ao presente caso concreto, em que, por via da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que não admitiu o recurso de revista interposto, se produz tão intensa ofensa a valores fundamentais constitucionalmente protegidos, uma interpretação meramente literal do citado n.º 4 do artigo 678.° do C.P.C., acolhendo um sentido restritivo que, no caso concreto, produza o efeito de impedir o recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, e, em virtude disso, a tutela jurisdicional efetiva dos direitos e legítimos interesses dos recorrentes, bem como o seu direito a receberem dos tribunais um tratamento similar ao de todos os seus concidadãos, é incompatível com o n.º 1 do artigo 13° e com o n.º 1 do artigo 20°, ambos da C.R.P..
O artigo 13°, n.º 1 da C.R.P., nas suas várias dimensões, estipula a igualdade material e formal dos cidadãos perante a lei.
Isto é, por um lado, a igualdade prevista no artigo 13°, n.º 1 da C.R.P. significa uma aplicação imparcial e neutral da lei.
Por outro lado, implica o não tratamento de sujeitos de forma arbitrária e diferenciada.
Ora, a uniformidade da jurisprudência dos tribunais superiores é um valor necessariamente perseguido pelo sistema jurídico (cf. artigo 8°, n.º 3 do C.C.), pois é emanação dos princípios constitucionais da igualdade e do Estado de Direito — cf. artigo 2° e 1 3° da C.R.P.
Pelo que um sistema processual em que uma parte, confrontada com uma decisão inovadora de um tribunal, relativa a uma causa de valor inferior à alçada da relação e que esteja em oposição com decisões anteriores dos tribunais superiores quanto à mesma questão fundamental de direito, e que não tenha ao seu dispor nenhum meio de a impugnar, não é conforme à Constituição, violando assim os artigos 2°, 13° e 20°, todos da C.R.P.
Sendo que em causa está também a apreciação do abuso do direito suscitado pela R. Recorrente com violação dos limites impostos pela boa-fé, bons costumes e pelo fim social ou económico desse direito — cf. artigo 334° do C.C..
O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto está em contradição com os acórdãos acima enunciados porquanto segue uma doutrina e jurisprudência minoritárias e entende que não se verifica abuso de direito por parte dos AA. Recorrentes, decidindo contra a jurisprudência corrente do próprio Tribunal da Relação do Porto e de outros tribunais superiores.
Na verdade, e conforme sentença de primeira instância e os acórdãos referidos em 3°, não se verifica a existência de fundamento para a resolução do contrato de arrendamento porquanto a R. Recorrente alegou e provou factos dos quais resulta que continua a ser objetivamente razoável a manutenção do contrato.
Daqui retira-se que a R. Recorrente sempre veio exercendo a sua atividade comercial à vista de todos e, em especial, dos pais de alguns dos AA. Recorrentes e dos próprios AA. Recorrentes, os quais desde 1 986 sempre foram recebendo as rendam devidas pelo locado, sem nunca levantar qualquer objeção.
Desta maneira, a pretensão dos AA. Recorridos é passível de ser considerada como UM ABUSO DE DIREITO, nos termos do disposto no artigo 334° do c.c., preceito que expressamente se invoca com todas as legais consequências.
Pelo que será sempre admissível recurso do acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça, sob pena de violação do artigo 20º, nº 4 da C.R.P. a título de violação do direito a um processo equitativo.
Só com a notificação da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça foram esgotados pela R. Recorrente todos os meios de recurso ordinário previstos na lei, conforme o disposto nos artigos 70°, n.º 2 e 72°, n.º 2 da Lei n.º 28/82, de 1 5 de Novembro.
Pelo que deveria o objeto do recurso ora interposto ter sido conhecido, nos termos dos artigos 79º e ss. da Lei n.º 28/82, de 1 5 de Novembro.
III — Da admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça
A R. Recorrente, por não se conformar com o acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto, dele interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 678°, n° 3, 686°, 716°, 721° e ss. e 732°-A do C.P.C. na versão em vigor à data dos fatos em discussão nos autos.
Designadamente, a R. Recorrente interpôs tal recurso do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto por entender que o mesmo está em contradição com outros acórdãos, daquele mesmo Tribunal da Relação do Porto e outros Tribunais da Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito relativa ao abuso do direito por parte do senhorio.
Designadamente, entre outros, os proferidos pelo Tribunal da Relação do Porto de 12.01.2012 no processo n° 585/10.3TJPRT.P1, pelo Tribunal da Relação de Guimarães de 22.02.2011 no processo n.º 2019/06.9TBVCT.G1, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 24.01.2008 no processo nº 10615/2007-2, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 13.01.2011 no processo n.º 1655/09.6TBCSC.L1-2, pelo Tribunal da Relação de Coimbra de 01.07.2008 no processo n.º 181/04.4TBSRE.C1, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 29.04.2004 no processo n.º 2548/2004-6, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 24.01.2008 no processo n° 1061 5/2007- 2, pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 07.01.2007 no processo n° 7478/06-6.
Pelo que será sempre admissível recurso do acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça.
Sucede que o MM. Juiz Desembargador indeferiu o recurso de revista interposto, pelo que a R. recorrente interpôs reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Por sua vez, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação apresentada pela R. Recorrente, tendo considerado que sendo o valor da causa inferior à alçada da Relação, à data predita, não obliterado, ainda o plasmado no art.° 678°, nº 1 do CPC, censura não merece o despacho reclamado, razão pela qual se indefere a reclamação.
Daí a R. Recorrer ter deduzido o competente requerimento de interposição de recurso para este Tribunal Constitucional por entender que o disposto no artigo 678°, n.º 4 do C.P.C. deverá ser interpretado no sentido de que serão sempre admissíveis os recursos de revista para o Supremo Tribunal de Justiça quando se verifique a contradição de acórdãos.
E isto independentemente de o valor da ação ser ou não superior à alçada da Relação.
Designadamente, que o segmento do n.º 4 do artigo 678° do C.P.C. “do qual consta que do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal” é inconstitucional por violação dos artigos 13° e 20° da C.R.P e dos princípios constitucionais neles constantes, designadamente, o princípio da igualdade de todos perante a lei e o princípio do direito de todos terem acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
Acontece que o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a admissão da interposição de recurso para este Tribunal Constitucional, justificando tal decisão com os fundamentos anteriores.
Isto é, com fundamento no facto de o valor da causa ser inferior à alçada da Relação, à data predita, não obliterado, ainda o plasmado no art.° 678°, n.º 1 do CPC, tendo considerado que não merecia censura o despacho reclamado, razão pela qual se indefere a reclamação.
Nestes termos, e com os fundamentos ora aduzidos, requer-se a V. Exas. que se dignem a julgar procedente a presente Reclamação e em consequência seja admitido o recurso interposto pela R. recorrente, tudo com as demais consequências legais.»
6. Os AA. e recorridos responderam concluindo pelo indeferimento da reclamação e da não admissão do recurso para este Tribunal, nos termos seguintes (cfr. fls. 201-202):
«(…) 1)- Com o devido respeito, bem decidiu o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça ao não admitir o Recurso para o Tribunal Constitucional, porque no caso em apreço, não é admissível Recurso para o Tribunal Constitucional, pois nunca a Reclamante suscitou qualquer pretensa inconstitucionalidade durante o processo, não ocorrendo o fundamento invocado e previsto no artº 70º, n.º 1, al. b) da Lei N 28/82 de 15/11, uma vez que nenhuma norma foi aplicada, cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo, como exige o mencionado inciso legal.
2)- Prescreve ainda o art.º 72º, nº 2 da mencionada Lei, que “Os recursos previstos nas alíneas b)(...) do n.º 1 do artigo 70º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade (...) de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
3)- A Reclamante não indicou, nem podia indicar, a peça processual, onde suscitara a questão da inconstitucionalidade, pela razão óbvia, da “inobservância do ónus de prévia suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa”, como decorre da análise e cotejo dos autos.
4)-TAL NÃO SUCEDEU, pelo que está precludida tal possibilidade, não tendo a Recorrente legitimidade para o presente recurso que pretende agora interpor.
5)- O douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, é irrecorrível, pelo que não foi admitido qualquer Recurso, conforme bem decidiu o Supremo Tribunal de Justiça.
6)- A admissibilidade de Recurso de Revista, para o S.T.J., quando haja contradição de Julgados, dessa ou de diferente Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito, exige ainda ou cumulativamente que a decisão seja irrecorrível por natureza para o STJ, pois, como prescreve o artº 678º nº 4 do C.P.C., na redação do DL. N.º 38/2003 de 8/3, aplicável aos presentes autos, para além daquele requisito, não demonstrado, é ainda necessário, como literalmente consta do preceito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal.
7)- Tal inciso legal condiciona ou limita a admissibilidade deste recurso a tais casos, que não é similar ao dos autos, e por isso, inaplicável, sendo irrecorrível o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto.
8) — A propósito da ratio legis desta norma e de modo inexcedível se pronunciou, em Anotação, o Sr. Prof. Antunes Varela, na RLI, Ano 116, 1983-1984, a pags. 93 e ss., onde se conclui, que para tal recurso, a questão contraditória, teria que ser daquelas, que “por natureza não podiam ser conhecidas pelo Supremo”, “por respeitarem a matérias subtraídas ao conhecimento do Supremo”, porque as demais aí poderão ir se o valor da ação ultrapassar a alçada do Tribunal da Relação, pela via do recurso ordinário, que também não é o caso, sendo irrecorrível o douto Acórdão.
9)- No caso sub Júdice, atenta a matéria e a questão em apreço, para além do mais, não se verifica o “requisito da irrecorribilidade da decisão, por causa estranha à alçada do tribunal da Relação”, o que tanto basta, para que não seja admissível o recurso pretendido.
10)- A interpretação literal e teleológica da norma, são neste sentido, sufragado pela Doutrina.
11)- Trata-se de uma questão de aplicação da lei processual civil no tempo, nomeadamente em matéria de Recursos, sendo incontroversamente aplicável ao caso dos autos, o regime dos Recursos vigente em 2007, por ser essa a data da instauração da Ação, já que a Reforma apenas entrou em vigor e se aplica a Processos instaurados a partir de 1 de Janeiro de 2008.
12)- Pelo que não houve qualquer interpretação do art 678º, nº 4, do C.P.C., que seja inconstitucional, ou que viole o direito ao recurso, ou à igualdade e acesso ao Direito e aos Tribunais, ou qualquer outra, como infundadamente propugna a Reclamante.
13)- A esse propósito, cita-se o Acórdão N° 164/2012 de 28/03/2012
“Face à reiterada jurisprudência deste Tribunal (largamente referenciada no acórdão indicado pela decisão sumária reclamada) sobre a inexistência da consagração constitucional de um direito geral de recurso de decisões judiciais e, muito menos, do direito a um duplo recurso (ou um triplo grau de jurisdição), é infundada a questão de constitucionalidade da norma (...)”, aplicável ao caso dos autos.
14)- Os “argumentos” invocados pela Recorrente “seguramente que não tem a virtualidade de contrariar a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a inexistência da consagração constitucional de um direito geral de recurso de decisões judiciais e, muito menos, do direito a um duplo recurso (ou um triplo grau de jurisdição), pois o que dessa jurisprudência se retira é justamente a ampla liberdade de conformação de que goza o legislador ordinário nessa matéria. Dito de outro modo, a circunstância de o legislador ordinário poder ter, eventualmente, revisto o regime de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, alargando-o a situações não contempladas pela lei antiga, em nada releva para a questão jurídico-constitucional sob apreciação que é a de saber se ele a tanto estaria constitucionalmente vinculado”.
15)- Em idêntico sentido o Ac. N.º 75/2011 de 31/1/2011 ”Compulsados os autos, verifica-se que em lugar algum das suas alegações” (...) “para o Supremo Tribunal de Justiça o recorrente suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma”. (...), pois que, “para efeitos de poder considerar-se satisfeito o pressuposto processual de suscitação prévia, de modo processualmente adequado, da questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer, tal como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.° da LTC”, teria que ter colocado tal questão, para dela o Tribunal conhecer.
16)- “Em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, consistindo a intervenção do Tribunal Constitucional em uma reapreciação, enquanto instância de recurso, do juízo efetuado pelo tribunal a quo sobre uma questão de constitucionalidade normativa, é um pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade que se verifique, de facto, uma prévia apreciação jurisdicional relativamente a uma questão de constitucionalidade. Assim, para que, posteriormente, ao recorrente esteja aberta a via de recurso para o Tribunal Constitucional, é indispensável que, previamente tenha suscitado a questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
17)- “Tanto basta para que se não possa admitir o presente recurso de constitucionalidade”.
18) Carecendo de quaisquer fundamentos a Reclamação apresentada. (…)».
7. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal concluiu pelo indeferimento da reclamação (cfr. 13, fls. 214), nos termos e com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 212 a 214):
«1. A., Lda. interpôs recurso de revista ampliada para o Supremo Tribunal de Justiça, do Acórdão da Relação do Porto, de 26 de Janeiro de 2012, complementado pelo proferido em 8 de Fevereiro de 2012, que indeferiu um pedido de reforma do primeiro.
2. A Relação julgara procedente a apelação dos autores e, revogando a sentença proferida em 1.ª instância, declarou cessado o contrato de arrendamento em causa, condenando a ré, A., Lda., a entregar o arrendado aos autores, livre de pessoas e coisas.
3. Como o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (n.º 1) não foi admitido pelo Senhor Desembargador Relator, dessa decisão recorreu A., Lda., para o Supremo Tribunal de Justiça.
4. A reclamação foi indeferida pelo Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal, pelos exactos fundamentos que constavam da decisão, então, reclamada.
5. Após ter arguido, sem sucesso, uma nulidade, A., Lda. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional.
6. Consta do requerimento que a recorrente pretende ver apreciada a seguinte questão de inconstitucionalidade:
“(…) a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 678.º, n.º 4, do CPP., quando interpretada conforme foi da douta decisão recorrida que afirma que “ para a admissibilidade de recurso com o fundamento contemplado no art.º 678.º, n.º 4 do CPC impõe-se, entre outros requisitos, que o acórdão recorrido seja insusceptível de recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, a menos que, por razão da alçada, cumulativamente, outrossim não seja admissível”
7. Como o recurso não foi admitido, reclamou, então, para este Tribunal.
8. Um dos pressupostos de admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º da LTC (como é o caso) consiste em a questão de constitucionalidade que se submete à apreciação do Tribunal Constitucional, ter sido suscitada adequadamente durante o processo.
9. Os recorrentes apenas estão dispensados desse ónus, quando a interpretação acolhida na decisão recorrida for anómala, inesperada ou surpreendente, não tendo os recorrentes possibilidade de, anteriormente, questionar a sua inconstitucionalidade.
10. Não é esta obviamente a situação que se verifica nos presentes autos, nem sequer ela é invocada pela reclamante.
11. A recorrente teve plena oportunidade de suscitar a questão de constitucionalidade na reclamação para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, da decisão que, na Relação, não lhe admitira o recurso (vd. nºs 3 e 4).
12.Vendo essa peça processual, facilmente se constata que ali não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, nela não se mencionando, sequer, qualquer princípio ou preceito constitucional.
13. Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.»
Cumpre apreciar e decidir nos termos do n.º 3 do artigo 77.º da LTC
II – Fundamentação
8. A ora reclamante reclama para a conferência do despacho do Presidente do STJ de 21/09/2012 por discordar do decidido quanto à inadmissibilidade do recurso interposto para este Tribunal.
8.1 A ora reclamante interpõe recurso para este Tribunal com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
8.2 A fundamentação da decisão do Presidente do STJ de 21/09/2012 que não admitiu tal recurso é efetuada por remissão para os «exatos motivos invocados na resposta de fls.174 e ss.» (cfr. fls 179).
8.3 Tais «exatos motivos» encontram-se, assim, na resposta dos AA., recorridos e ora reclamados, de fls 174 a 177.
8.4 E tais «motivos» de inadmissibilidade do recurso para este Tribunal aí invocados – e apenas estes relevam para a apreciação da presente reclamação – reconduzem-se, no essencial, aos seguintes: não aplicação de nenhuma norma cuja inconstitucionalidade tenha sido invocada durante o processo de modo processualmente adequado, como exige o artigo 72.º, n.º 2, da LTC (cfr. 1) e 2), fls. 174); não indicação (e impossibilidade de indicação), como decorre da análise dos autos, da peça processual onde suscitara a questão de inconstitucionalidade pela razão de inobservância do ónus de prévia suscitação adequada da questão de inconstitucionalidade normativa (cfr. 3), fls. 174), motivo ilustrado por jurisprudência deste Tribunal (cfr. 15) a 17), fls. 176-177).
8.5 Na sua reclamação para a conferência, que ora se aprecia, a reclamante, em nenhuma das três partes do seu requerimento de reclamação (I, II e III) manifesta discordância com o decisão do Presidente do STJ que não admitiu o recurso para este Tribunal com fundamento, ainda que por remissão, na falta de observância do ónus de suscitação da questão de constitucionalidade normativa de modo processualmente adequado, tal como impõe o n.º 2 do artigo 72.º da LTC quanto aos recursos previstos na alínea b) do artigo 70.º da mesma Lei, como é o caso dos autos.
8.6 E na mesma reclamação, na parte que se refere à alegada questão de inconstitucionalidade (cfr. II – Da questão de inconstitucionalidade, fls. 184-186), o reclamante não vem indicar o momento e a peça processual onde suscitou tal questão nem alega a existência de uma «decisão surpresa» que tivesse por efeito dispensá-lo da observância do referido ónus de suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade.
8.7 No final do ponto II da Reclamação a reclamante limita-se a afirmar que «Só com a notificação da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça foram esgotados pela R. Recorrente todos os meios de recurso ordinário previstos na lei, conforme o disposto no artigo 70.º, n.º 2, e 72.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro», concluindo que «deveria o objeto do recurso ora interposto ter sido conhecido nos termos dos artigos 79.º e ss. (…) da LTC.
8.8 E, no ponto III, parte final, da sua reclamação apenas afirma que o Presidente do STJ indeferiu a admissão de recurso para este Tribunal Constitucional «com fundamento no facto de no facto de o valor da causa ser inferior à alçada da Relação, à data predita, não obliterado, ainda o plasmado no art.° 678°, n.º 1 do CPC, tendo considerado que não merecia censura o despacho reclamado, razão pela qual se indefere a reclamação» - fundamentos que não relevam para a apreciação do objeto da presente reclamação que apenas diz respeito à decisão do Presidente do STJ de não admissão de recurso para este Tribunal e respetivo fundamento nos termos do disposto na LTC.
8.9 Acresce que da análise das peças processuais da reclamante constantes dos autos, em especial o requerimento de interposição de recurso de revista para o STJ (cfr. fls. 92 e 93), e o requerimento de arguição de nulidade da decisão do Vice-Presidente do STJ de 14/6/2012 (cfr. fls 123 a 129), se constata que ali não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa nem invocada a violação de qualquer norma ou princípio constitucional.
9. Termos em que se impõe indeferir a presente reclamação.
III – Decisão
10. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro.
Lisboa, 6 de dezembro de 2012. – Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.
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