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Processo n.º 427/2012
3ª Secção
Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam, em Conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de reclamação, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A. reclama para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 76.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho daquele Tribunal que não admitiu o recurso, por si interposto, para o Tribunal Constitucional.
O despacho reclamado tem o seguinte teor:
“O arguido e recorrente A. veio apresentar recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido, no Supremo Tribunal de Justiça, em 18/04/2012.
Acórdão esse proferido na sequência de reclamação para a conferência da decisão sumária da relatora, que decidiu rejeitar os recursos interpostos pelo arguido dos acórdãos da relação, por inadmissibilidade, confirmando os fundamentos da rejeição dos recursos, por inadmissibilidade, explicitados na decisão sumária, e, consequentemente, indeferindo a reclamação.
Convidado a indicar a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, ao abrigo da qual interpunha o recurso e, em conformidade, as demais especificações pertinentes, veio o recorrente esclarecer que o recurso era interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do referido artigo 70.º, que «as normas cuja inconstitucionalidade pretende que sejam apreciadas» são as dos artigos 410.º, n.º 2, e 412.°, n.º 3, do CPP, e as dos artigos 256.º e 217.º do CP, tendo suscitado a questão nas conclusões de recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça.
Ora, como é bom de ver pelos fundamentos do acórdão deste Tribunal, nele tais normas não foram sequer ponderadas e muito menos aplicadas por via de um processo interpretativo constitucionalmente proibido.
Razão por que o recurso para o Tribunal Constitucional se apresenta manifestamente infundado.
Assim, nos termos do artigo 76.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, indefiro o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional apresentado pelo arguido A.”.
2. Na reclamação apresentada junto deste Tribunal, o reclamante veio dizer o seguinte:
“A., arguido nos autos. supra id, vem reclamar para Vossa Excelência do indeferimento do requerimento de interposição de recurso da Decisão do STJ para o Tribunal Constitucional.
O recurso foi apresentado tempestivamente.
E foram indicadas as normas em conformidade com a lei do Tribunal Constitucional.
O recurso não é manifestamente infundado e se o for só o Tribunal Constitucional o pode declarar ipsis verbis.
Pelo exposto deve ser declarada a admissibilidade da presente Reclamação e mandado subir o recurso interposto”.
3. O requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, já depois de aperfeiçoado, tem o seguinte teor:
“1 – O recurso é interposto ao abrigo do art.º 70º – 1 – B) da Lei do Tribunal Constitucional.
2 – As normas já indicadas e cuja inconstitucionalidade se pretende seja apreciada:
- arts. 410 – 2 e 412 – 3 CPP: violam os arts. 29.º – 6, 32.º – 1, 202º e 205º da Lei Fundamental., art. 14 – 5 Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e Protocolo 7 da Convenção Europeia se entendidos que o direito ao recurso se limita e basta com a especificação de “pontos de facto” e o “texto da Decisão recorrida”, ostracizando a integral reapreciação da prova factual e dispensando a presença do recorrente no Tribunal Superior.
- arts. 256º e 217º do Código Penal, por violarem os arts. 1º, 32º - 1e 205º da Lei Fundamental e 40º do Código Penal…
A questão foi suscitada perante o STJ nas conclusões 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 13”.
4. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal veio pugnar pelo indeferimento da reclamação.
Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
5. Na reclamação apresentada, o reclamante entende que o recurso não é manifestamente infundado e que, de qualquer modo, só o próprio Tribunal Constitucional poderia julgá-lo como tal.
Não tem razão o reclamante.
Desde logo, e ao contrário da leitura que dele faz o reclamante, o despacho reclamado, não obstante nele se afirmar que «[…] o recurso para o Tribunal Constitucional se apresenta manifestamente infundado», não fundamentou a não-admissão do recurso na sua manifesta falta de fundamento. O fundamento para a não admissão do recurso de constitucionalidade foi o de não terem as normas que integram o seu objeto sido aplicadas pela decisão recorrida.
Em sede de fiscalização concreta, tratando-se de formular um juízo que tem por objeto uma norma tal como foi aplicada num caso concreto, é um pressuposto de conhecimento do recurso de constitucionalidade que a decisão que o Tribunal Constitucional venha a proferir sobre a questão de constitucionalidade suscitada seja suscetível de produzir algum efeito sobre a decisão de que se recorre (nesse sentido, entre muitos outros, v. Acórdãos do TC n.ºs 169/92, 463/94, 366/96 e 687/2004, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Entendeu o despacho reclamado não se verificar in casu, o pressuposto processual de efetiva aplicação pela decisão recorrida das normas cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, pressuposto esse sem a verificação do qual o Tribunal Constitucional não pode conhecer de recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
É de confirmar na íntegra o fundamento oferecido pelo despacho reclamado para a não admissão do recurso de constitucionalidade.
Com efeito, a decisão de que se interpôs recurso para o Tribunal Constitucional – o acórdão do STJ, de 18.04.2012 – ao indeferir a reclamação da decisão sumária que havia rejeitado dois recursos interpostos para o STJ, baseou a sua decisão no disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f) e no artigo 420.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal (e não nas normas que integram o objeto do recurso de constitucionalidade).
III – Decisão
6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando o despacho reclamado que não admitiu o recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 26 de setembro de 2012.- Maria Lúcia Amaral – Carlos Fernandes Cadilha – Rui Manuel Moura Ramos.
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