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Processo n.º 362/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Por Acórdão de 10 de novembro de 2011, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça rejeitar, por extemporâneo, o recurso interposto por A., ora reclamante, da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 7 de junho de 2011, que manteve a deliberação do Conselho Permanente de 14 de dezembro de 2010, que, por sua vez, lhe aplicou a «pena de advertência registada pela violação dos seus deveres profissionais de zelo e de criar no público confiança na administração da justiça».
A recorrente, inconformada, dele recorreu para o Pleno das Secções do Supremo Tribunal de Justiça, tendo o relator, no Supremo Tribunal de Justiça, rejeitado, por legalmente inadmissível, o recurso, por despacho de 6 de janeiro de 2012.
A recorrente reclamou, então, deste último despacho, para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 688.º do Código de Processo Civil (CPC), tendo o Vice-Presidente desta mesma instância decidido, por despacho de 7 de fevereiro de 2012, não apreciar o requerimento apresentado, por se tratar de intervenção anómala e processualmente inadmissível.
Ainda inconformada, interpôs recurso de constitucionalidade, quer do Acórdão de 10 de novembro de 2011, quer dos despachos de 6 de janeiro de 2012 e 7 de fevereiro de 2012, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), a fim de ver apreciada a inconstitucionalidade, por violação dos princípios da tutela jurisdicional efetiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos e do duplo grau de jurisdição, consagrados no artigo 268.º, nºs. 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP), dos seguintes normativos legais:
a) artigo 169.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de junho (EMJ), «quando interpretado no sentido de que o prazo de interposição do recurso das deliberações do CSM para o STJ é sempre, em qualquer caso, de 30 dias, mesmo quando a deliberação recorrida seja nula;
b) artigo 169.º, n.º 1, do EMJ, «quando interpretado no sentido de que o prazo de 30 dias de interposição de recurso das deliberações do CSM para o STJ é um prazo contínuo que não se suspende durante as férias judiciais»; e
c) artigos 168.º, nºs. 1 e 2, e 178.º, do EMJ, «quando interpretados no sentido de que o recurso das deliberações do CSM para o STJ é de apenas um grau de jurisdição, não admitindo recurso ordinário as decisões jurisdicionais proferidas em primeira instância de recurso pela Secção de Contencioso do STJ».
O Supremo Tribunal de Justiça, por despacho do relator de 27 de março de 2012, não admitiu o recurso interposto do Acórdão de 10 de novembro de 2011, pelo facto de este não ter aplicado as normas identificadas em a) e c) e, ainda que se considerasse ter havido aplicação implícita daquela primeira, não ter sido observado o ónus de prévia suscitação, tal como sucede com a questão de inconstitucionalidade enunciada em b); e não admitiu, de igual modo, o recurso interposto, quer do despacho de 6 de janeiro de 2012, quer do despacho de 7 de fevereiro de 2012, porquanto, em relação ao primeiro, que implicitamente aplicou a norma impugnada em c), a recorrente não observou o ónus de prévia suscitação, e, em relação ao segundo, não foram aplicadas quaisquer das normas impugnadas.
A recorrente reclamou deste último despacho, nos termos do artigo 76.º da LTC, invocando, em síntese, que o Acórdão de 10 de novembro de 2011 aplicou as normas supra enunciadas em a) e b), no sentido aí especificado, e os despachos de 6 de janeiro de 2011 e 7 de fevereiro de 2012, por sua vez, as normas identificadas em c), no entendimento aí vertido. Por outro lado, sustenta ainda, suscitou perante o Tribunal recorrido, na motivação do recurso interposto para o Pleno das Secções do STJ e na reclamação dirigida ao Presidente do STJ, todas as questões de inconstitucionalidade que pretende ver julgadas no recurso de constitucionalidade, não o tendo feito antes «porque em nenhum momento anterior se adivinhavam as decisões que vieram a ser proferidas nas decisões impugnadas».
O Ministério Público, em resposta, emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação, pelas razões invocadas na decisão reclamada.
Cumpre apreciar e decidir.
2. A reclamante sujeitou à apreciação do Tribunal Constitucional, no requerimento de interposição do recurso, rejeitado pela decisão ora em reclamação, as seguintes questões de inconstitucionalidade:
a) artigo 169.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de junho (EMJ), «quando interpretado no sentido de que o prazo de interposição do recurso das deliberações do CSM para o STJ é sempre, em qualquer caso, de 30 dias, mesmo quando a deliberação recorrida seja nula;
b) artigo 169.º, n.º 1, do EMJ, «quando interpretado no sentido de que o prazo de 30 dias de interposição de recurso das deliberações do CSM para o STJ é um prazo contínuo que não se suspende durante as férias judiciais»; e
c) artigos 168.º, nºs. 1 e 2, e 178.º, do EMJ, «quando interpretados no sentido de que o recurso das deliberações do CSM para o STJ é de apenas um grau de jurisdição, não admitindo recurso ordinário as decisões jurisdicionais proferidas em primeira instância de recurso pela Secção de Contencioso do STJ».
No presente incidente, impugna a decisão de rejeição do recurso apenas na parte em que se considerou não terem sido aplicadas, em relação ao acórdão recorrido, a interpretação normativa supra identificada em a), e, em relação aos despachos recorridos, a interpretação normativa impugnada em c), sustentando, ainda, quanto às três questões de inconstitucionalidade, que cumpriu o ónus de suscitação na motivação do recurso para o Pleno do STJ e na reclamação dirigida ao Presidente do STJ, não lhe sendo exigível que o fizesse antes.
Vejamos, pois, no balizamento enunciado pela reclamante, se lhe assiste razão, designadamente no que tange à invocada aplicação, pelo acórdão recorrido, do artigo 169.º, n.º 1, do EMJ, «quando interpretado no sentido de que o prazo de interposição do recurso das deliberações do CSM para o STJ é sempre, em qualquer caso, de 30 dias, mesmo quando a deliberação recorrida seja nula».
Ora, mesmo que se admita que o Supremo Tribunal de Justiça, ao julgar o recurso extemporâneo, por não interposto dentro do prazo de 30 dias fixado no n.º 1 do artigo 169.º do EMJ, considerou implicitamente que o fundamento de nulidade não afastava o prazo regra previsto naquele preceito legal, o certo é que, nem na motivação do recurso interposto da deliberação do Conselho Superior da Magistratura, nem na resposta que lhe mereceu o parecer do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça, em que se invocava precisamente a intempestividade do recurso, suscitou a ora reclamante tal questão de inconstitucionalidade, pelo que, ainda que se tratasse de norma implicitamente aplicada, a verdade é que a recorrente não teria legitimidade para interpor, nessa parte, recurso de constitucionalidade (artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC), sendo que, não se tratando de interpretação insólita ou inesperada, não estava desonerada do correspondente ónus.
O mesmo sucede, aliás, em relação à questão de inconstitucionalidade do artigo 169.º, n.º 1, do EMJ, «quando interpretado no sentido de que o prazo de 30 dias de interposição de recurso das deliberações do CSM para o STJ é um prazo contínuo que não se suspende durante as férias judiciais», pois que também nas referidas peças processuais a reclamante não a invocou, o que se impunha, por ser esse o momento processualmente oportuno de o fazer e não haver qualquer causa que objetivamente justificasse tal omissão.
No que respeita ao recurso de constitucionalidade interposto do despacho de 6 de janeiro, que se admite ter aplicado, ainda que implicitamente, os artigos 168.º, nºs. 1 e 2, e 178.º, do EMJ, « interpretados no sentido de que o recurso das deliberações do CSM para o STJ é de apenas um grau de jurisdição, não admitindo recurso ordinário as decisões jurisdicionais proferidas em primeira instância de recurso pela Secção de Contencioso do STJ», apenas cumpre verificar se, não tendo a recorrente suscitado tal questão de inconstitucionalidade no requerimento de interposição do recurso para o Pleno das Secções do STJ, rejeitado pelo referido despacho, como, aliás, reconhece, estava ou não desonerada de o fazer.
A regra é a de que a questão de inconstitucionalidade deve ser suscitada antes da prolação do acórdão ou despacho recorrido, e não depois, pelo que, havendo oportunidade processual para tanto, como é o caso, apenas o caráter insólito ou imprevisível da interpretação dela objeto pode desonerar a parte de suscitar a sua inconstitucionalidade.
Ora, não prevendo a lei, pelo menos expressamente, a possibilidade de interposição do recurso para o Pleno das Secções do STJ das decisões proferidas nos recursos interpostos das deliberações do CSM, o que seria expectável era a adoção do entendimento perfilhado, pelo que quaisquer razões de ordem constitucional que impusessem o seu afastamento teriam de ser forçosamente invocados no requerimento de interposição do recurso, e não depois.
Por isso que, não tendo a ora reclamante suscitado, nesse preciso momento, tal questão de inconstitucionalidade, como lhe competia, carece de legitimidade para interpor, nessa parte, o presente recurso.
Finalmente, não tendo o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, no seu despacho de 7 de fevereiro de 2012, apreciado, sequer, a reclamação deduzida pela recorrente contra a decisão que rejeitou o recurso para o Pleno das Secções do STJ, por se tratar de «intervenção anómala e processualmente inadmissível», é evidente que não aplicou qualquer das interpretações normativas impugnadas, designadamente a supra identificada em c), o que torna inútil a apreciação do recurso de constitucionalidade dele interposto.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 19 de junho de 2012.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.
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