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Processo n.º 180/11
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):
“1. A recorrente interpôs em 29 de Novembro de 2010 recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Março de 2007, mediante requerimento do seguinte teor:
“LIGA PORTUGUESA DE FUTEBOL PROFISSIONAL, recorrida nos autos de recurso de revista per saltum à margem mencionados, em que é recorrente A.
Considerando que a fls. 291/309 foi tirado, pelo pleno dessa 4ª Secção, o Acórdão de 7 de Março de 2007, através do qual se julgou inconstitucional os arts. 50.º, n.ºs 1 e 2, e 52.º, n.º 1, da convenção colectiva de trabalho celebrada entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, publicada no BTE, 1.ª s., n.º 33, de 8 de Setembro de 1999;
Considerando que a recorrida Liga veio arguir a nulidade daquele Acórdão de fls. 291/309;
Considerando que tal arguição de nulidade foi desatendida pelo Acórdão de 12 de Julho de 2007, de fls. ...;
Considerando que a recorrida Liga interpôs recurso para o Tribunal Constitucional contra esse Acórdão de 12 de Julho de 2007;
Considerando que o Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão n.º 19/2010 negou provimento ao recurso de constitucionalidade interposto contra o Acórdão de 12 de Julho de 2007;
Considerando que pelo requerimento de fls. ... a recorrida veio arguir, junto do Tribunal Constitucional, a nulidade daquele Acórdão n.º 19/2010;
Considerando que tal arguição de nulidade apenas veio a ser definitivamente desatendida pelo Acórdão n.º 405/2010 do Tribunal Constitucional, de 9 de Novembro de 2010;
Considerando que o referido Acórdão n.º 405/2010 do Tribunal Constitucional só transitou em julgado em 25-11-2010;
Considerando que apenas com o trânsito em julgado do Acórdão n.º 405/2010 do Tribunal Constitucional findou o incidente de arguição de nulidade do Acórdão de fls. 291/309, pelo que só a partir desse momento começou a correr o prazo para se recorrer deste último aresto;
Considerando que a decisão judicial que recuse a aplicação de uma norma jurídica com fundamento na sua inconstitucionalidade é sempre susceptível de recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da al. a) do n.º 1 do art. 70.º da Lei do Tribunal Constitucional;
Considerando finalmente que, na sequência da doutrina entretanto fixada pelo plenário do Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 174/2008, as cláusulas constantes de convenções colectivas de trabalho são de qualificar como normas jurídicas para efeitos de fiscalização da sua constitucionalidade por aquele colendo Tribunal;
Vem requerer, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art. 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional contra o Acórdão de 7 de Março de 2007, de fls. 291/309, com vista à fiscalização concreta da constitucionalidade dos arts. 50.º, n.ºs l e 2, e 52.º, n.º 1, da convenção colectiva de trabalho celebrada entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 33, de 8 de Setembro de 1999.”
2. Os recursos para o Tribunal Constitucional interpõem-se no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão recorrida., salvo na situação prevista no n.º 2 do artigo 75.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC).
É certo que, como diz Lopes do Rego (Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, pág. 189):
“3.2. Como se decidiu no Acórdão n.º 79/00, era de aplicar o regime constante do artigo 686.º do Código de Processo Civil (revogado pelo Decreto-Lei n.º 303/07) nos casos em que a parte, antes de interpor recurso de fiscalização concreta, começou por arguir, perante o tribunal “a quo”, certa nulidade de sentença ou acórdão irrecorrível na ordem jurisdicional em que se situa o tribunal recorrido: na verdade, atento o limite aos poderes cognitivos do Tribunal Constitucional, nunca poderia aplicar-se, em processo constitucional, o regime que, em processo civil, estava consagrado no n.º 3 do artigo 668.º do Código de Processo Civil (segundo o qual as nulidades da sentença – salvo a tipificada na alínea a) do n.º 1 deste preceito – têm de ser arguidas no âmbito do recurso ordinário dela interposto) – carecendo, pelo contrário, as nulidades de ser sempre invocadas autonomamente perante o tribunal que proferiu a decisão impugnada para o Tribunal Constitucional.
Deste modo, em processo constitucional, se alguma das partes requeresse a rectificação, aclaração ou reforma da sentença (cfr. Acórdão n.º 730/98), ou arguísse a nulidade da mesma (sendo esta irrecorrível na ordem jurisdicional respectiva) o prazo para interpor recurso de fiscalização concreta só começaria a correr depois de notificada a decisão proferida sobre o requerimento ou arguição de nulidade; e – como se decidiu no Acórdão n.º 188/98, – deveria beneficiar de tal regime o recorrente que – não tendo embora deduzido, ele próprio, pedido de aclaração, – aguardou pela dirimição do esclarecimento requerido por outra parte, tendo a matéria deste directa conexão com a questão de inconstitucionalidade apreciada pela decisão a aclarar.
De salientar que a reforma do processo civil, operada pelo Decreto-Lei n.º 303/07, alterou significativamente o regime de suscitação de incidentes pós-decisórios. Assim – e para além de se manter a regra de que as nulidades só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário (artigo 668.º, n.º 4), – o artigo 669.º veio estender tal regime aos pedidos de aclaração e reforma quanto a custas (artigo 669.º, n.º 3), mantendo-se o regime anterior de que o pedido de reforma quanto à decisão de mérito só pode ser deduzido autonomamente quanto não caiba recurso da decisão – sendo tal modo de suscitação que determinou a revogação do artigo 686.º, já que os incidentes de aclaração e reforma passaram também a incluir-se no âmbito do recurso ordinário possível.
Temos, porém, como evidente que o entendimento jurisprudencial, formado na vigência das anteriores disposições da lei de processo civil, se terá de manter, alicerçando-se – perante a derrogação do artigo 686.º do Código do Processo Civil – no princípio da adequação formal: na verdade, não detendo o Tribunal Constitucional competência para a apreciação dos referidos incidentes pós-decisórios – que nunca poderão ser incluídos no âmbito de um recurso de fiscalização concreta – é evidente que — sendo os mesmos suscitados, de modo necessariamente prévio e autónomo, perante o Tribunal “a quo” – só poderá começar a correr o prazo para interposição do recurso de constitucionalidade quando seja sobre eles proferida decisão definitiva, na ordem jurisdicional respectiva.”
Porém, este diferimento do prazo de interposição do recurso só se verifica a medida da razão que o justifica. Indeferida a arguição de nulidade por decisão definitiva na ordem judicial respectiva, tal decisão incorpora-se na decisão relativamente à qual a nulidade era arguida, começando a partir da respectiva notificação a correr o prazo para o recurso de constitucionalidade, seja da primitiva decisão, seja da decisão que apreciou o incidente. Com efeito, a partir do momento em que é apreciada a arguição de nulidade a decisão anterior torna-se definitiva na ordem judiciária respectiva, cessando a razão que leva ao afastamento da regra de que o prazo de interposição dos recursos se desencadeia com a notificação da decisão recorrida.
Assim, o recurso agora interposto do acórdão de 7 de Março de 2007, de que a recorrente foi notificada por carta de 9 de Março de 2007 (fls. 311), é manifestamente extemporâneo (artigo 75.º, n.º 1 da LTC).
3. Decisão
Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não tomar conhecimento do recurso e condenar a recorrente em 7 unidades de conta de taxa de justiça, nos termos do artigo 84.º, n.º 4, da LTC e dos artigos 2.º, 7.º e ponderados os critérios do n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-lei n.º 303/98, de 7 de Outubro.”
2. O recorrente reclama desta decisão para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do citado artigo 78.º-A da LTC sustentando, em síntese, que o prazo de interposição de recurso de constitucionalidade do acórdão recorrido só começou a correr com a decisão definitiva do incidente da respectiva nulidade. E que a decisão deste só se considera definitiva com o trânsito em julgado da decisão do recurso de constitucionalidade que recaiu sobre essa decisão incidental.
3. A regra é que o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias, contados a partir da notificação da decisão de que se recorre (artigo 75.º da LTC e artigo 685.º, nº 1, do CPC). Apesar disso, em desvio a esta regra, quando seja arguida a nulidade da decisão, a jurisprudência vem entendendo que o recurso de constitucionalidade não tem de ser interposto imediatamente, admitindo que o seja somente após apreciadas as nulidades que contra ele tenham sido arguidas. Aplica por analogia, de modo expresso ou implícito, o estabelecido no n.º 1 do artigo 686.º do CPC (na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto).
Mas fá-lo por uma razão precisamente determinada. E ela é a de assegurar que a parte disponha da possibilidade de arguir e ver apreciadas nulidades de que entenda enfermar a decisão de que pretende interpor o recurso de constitucionalidade. Efectivamente, nos termos gerais do processo civil, admitindo a decisão recurso, a arguição de nulidades de que porventura enferme faz-se no recurso dessa decisão. Porém, como a competência do Tribunal Constitucional é restrita às questões de constitucionalidade, a nulidade não pode ser arguida nesse tipo de recurso, pelo que se impõe compatibilizar o prazo de interposição do recurso com a possibilidade de arguição da nulidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Mas, obtida a pronúncia sobre a arguição de nulidade, cessa a razão que leva a afastar a regra de que o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional se conta a partir da notificação da decisão recorrida. Efectivamente, se a arguição de nulidade é atendida, a nova decisão incorpora-se, nessa medida, na decisão primitiva. Se é desatendida, a decisão arguida de nula torna-se a esse nível jurisdicional definitiva. Em qualquer dos casos, cessa a razão que justifica o diferimento do prazo de interposição do recurso da primitiva decisão (aquela cuja nulidade se arguira sem sucesso).
É, aliás, o que resulta do preceito cuja aplicação analógica aos recursos de constitucionalidade antecedidos de arguição de nulidade permite o afastamento da regra de que o prazo de recurso se inicia com a notificação de decisão de que se recorre. Efectivamente, do n.º 1 do artigo 686.º do CPC, na redacção considerada, resultava que com a notificação da decisão proferida sobre o requerimento de rectificação, aclaração ou reforma se desencadeava o prazo que a formulação desse requerimento deferira.
4. É certo que a própria decisão que aprecia a nulidade é ela mesmo susceptível de recurso de constitucionalidade, se estiverem reunidos os respectivos pressupostos – quanto às normas nela especificamente aplicadas ou a que foi recusada aplicação com fundamento em inconstitucionalidade. Mas nenhuma razão há para que as questões de constitucionalidade relativas a essa decisão e à decisão em que ela se integra ou complementa (a decisão sem sucesso arguida de nula) deixem de subir conjuntamente ao Tribunal Constitucional. O contrário é que é exigido, seja pelo texto do artigo 75.º da LTC e dos artigos 685.º, n.º 1 e 686.º, n.º 1 do CPC, seja pelos princípios de celeridade e economia processuais. A efectividade da tutela jurisdicional só exige e só justifica o diferimento do prazo de interposição do recurso até à apreciação da nulidade na ordem jurisdicional respectiva. A partir daí não se vislumbram razões para que deixem de ser imediatamente colocadas ao Tribunal Constitucional todas as questões de constitucionalidade que o interessado entenda procederem, seja da primitiva decisão, seja da decisão que recaiu sobre a arguição de nulidades. Contrariamente ao que a recorrente parece supor, aguardar o transito em julgado da decisão do Tribunal Constitucional sobre o recurso de constitucionalidade que o interessado entenda interpor da decisão incidental para só então se iniciar o prazo de recurso da decisão principal não tem qualquer fundamento legal e racional, não servindo senão propósitos dilatórios.
5. Aliás, no caso, o anterior recurso de constitucionalidade nem sequer versou sobre um incidente de arguição de nulidade do acórdão final, mas sobre a decisão de uma arguição de uma nulidade processual, embora consubstanciada pela prolação do acórdão em alegada violação do princípio do contraditório. E neste tipo de situações é até duvidoso que deva ter aplicação a referida regra jurisprudencial de que o início do prazo fica diferido para o momento da notificação da decisão do incidente, porque não está em discussão qualquer vício intrínseco da estrutura da decisão, mas um vício do procedimento. Mas, mesmo que se entenda que deve aplicar-se o mesmo desvio à regra do artigo 75.º da LTC nas duas hipóteses – tanto na arguição de nulidades da decisão, como na arguição de nulidades processuais que possam repercutir-se na subsistência do acórdão final e que só com este se revelem –, nada justificaria que fosse maior o alcance desse desvio na hipótese de arguição de nulidade processual do que na arguição de nulidade do acórdão. Em qualquer dos casos, a partir do momento em que fica resolvido o incidente, não subsistem razões de regular exercício do contraditório, de competência dos tribunais, de lógica ou de economia processual para que deixe de ser interposto o recurso de constitucionalidade da decisão principal. O mais que podem surgir são relações de prejudicialidade relativamente a determinadas questões, mas isso é problema que só em concreto e na fase de apreciação do recurso, consoante o sentido da decisão, se colocará.
6. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação, condenando a recorrente em 20 Ucs de taxa de justiça.
Lisboa, 28 de Setembro de 2011. – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão.
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