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Processo n.º 270/10
3.ª Secção
Relator: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos, em que é reclamante A., e recorrido o Ministério Público, foi proferido, em conferência, o Acórdão n.º 278/2010, de 1 de Julho de 2010, que indeferiu a reclamação de despacho proferido pelo Relator junto da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora, em 11 de Março de 2010 (fls. 71), nos termos do qual foi decidida a não admissão de recurso de constitucionalidade, para efeitos de apreciação de interpretação normativa extraída dos artigos 169º, n.º 2, e 170º, n.º 4, ambos do Código da Estrada.
2. Por requerimento apresentado em 1 de Setembro de 2010, o reclamante, conformando-se com o teor da decisão proferida (cfr. fls. 129), limitou-se a requerer reforma de custas, invocando, designadamente, que:
“Em primeiro lugar, o montante de custas fixado é ilegal, porque não atende, nem aplica os critérios legais de fixação de taxa de justiça.
(…)
Em segundo lugar, o montante de custas também é ilegal, porque totalmente irrazoável e desproporcionado face ao objecto dos autos.” (fls. 129 e 130)
3. Devidamente notificado, o Ministério Público apresentou a seguinte resposta, que ora se sintetiza:
«(…)
Vejamos, então, se o montante fixado, para a taxa de justiça, se poderá considerar excessivo.
5. De acordo com o art. 7º do diploma em apreciação – Decreto-Lei 303/98 -, “nas reclamações, incluindo as de decisões sumárias, nas arguições de nulidades e nos pedidos de esclarecimento ou reforma de decisões, a taxa de justiça é fixada entre 5 UC e 50 UC”.
Ora, a taxa de justiça fixada no Acórdão nº 278/2010, agora impugnado, foi de 20 UC, logo, dentro do valor estabelecido por este artigo. Mais: esse valor é inferior a metade do montante máximo nele previsto.
6. Nos termos do art. 9º, nº 1, do mesmo diploma, a “taxa de justiça é fixada tendo em atenção a complexidade e a natureza do processo, a relevância dos interesses em causa e a actividade contumaz do vencido”.
Ora, no caso em apreciação, a taxa de justiça aplicada foi idêntica à aplicada em situações da mesma natureza, anteriormente julgadas por este Tribunal, pelo que obedece aos critérios habituais, por este Tribunal utilizados.
Vejamos, contudo, se se poderá entender haver algo a apontar à taxa de justiça fixada, tendo em atenção “a complexidade e a natureza do processo, a relevância dos interesses em causa e a actividade contumaz do vencido”, como o ora reclamante pretende.
7. Está em causa, nos presentes autos, a impugnação judicial de decisão proferida pela Direcção-Geral de Viação de Portalegre, proferida em processo de contra-ordenação, que aplicou ao ora reclamante a sanção acessória de inibição de conduzir.
Ora, tal decisão foi impugnada junto do Tribunal Judicial de Portalegre, do Tribunal da Relação de Évora e, agora, junto do Tribunal Constitucional.
Por outras palavras, muito embora se possa entender, como alega o ora reclamante, que o processo em causa não apresenta particular complexidade, mesmo assim, envolveu já 4 entidades distintas, se juntarmos, às entidades judiciárias acabadas de referir, a Direcção-Geral de Viação de Portalegre.
Em todas estas instâncias houve, pois, necessidade de apreciar a argumentação do ora reclamante.
Dir-se-á, por isso, que os presentes autos têm, no fundo, a complexidade que o próprio reclamante criou com a sua porfiada e tenaz litigância. Direito seu, como é evidente, mas de onde decorrem as necessárias consequências processuais e de pagamento de custas.
8. Por outro lado, no que respeita especificamente a este Tribunal Constitucional, o Acórdão agora impugnado teve de apreciar a motivação dos sucessivos recursos e reclamações do interessado, o que envolveu a análise, pelo menos, dos seguintes elementos:
- reclamação para este Tribunal Constitucional (cfr. págs. 4-10, 12-17 dos autos, com 39 números);
- Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 15 de Outubro de 2009 (cfr. fls. 20-32 dos autos);
- pedido de aclaração do mesmo Acórdão (cfr. fls. 38-41 dos autos)
- novo Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 19 de Novembro de 2009, em resposta ao pedido de aclaração anterior (cfr. fls. 45 dos autos);
- recurso do interessado para o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. fls. 49-60 dos autos, com 80 números e 6 conclusões), que acabou por não ser admitido;
- parecer do Ministério Público, no Tribunal Constitucional, sobre a reclamação do interessado (cfr. fls. 77-79 dos autos);
- despacho da Ilustre Conselheiro Relatora, convidando o reclamante a pronunciar-se sobre o possível indeferimento da sua reclamação (cfr. fls. 80 dos autos);
- resposta deste ao mesmo despacho (cfr. fls. 82-87, 91-96 dos autos, com 38 números).
9. Não se pode, assim, concluir, como o faz o ora reclamante, que a actividade processual deste Tribunal tenha sido diminuta [cfr. designadamente nº 37 da presente reclamação, em que refere o facto de a taxa de justiça fixada ser “desproporcionada (salvo o total e imenso respeito) em relação ao labor aplicado na elaboração do Acórdão …”].
Com efeito, o Acórdão impugnado analisou todos os problemas jurídicos suscitados pelo interessado na sua reclamação, como lhe competia, e teve, para isso, de compulsar e analisar toda a argumentação apresentada no decurso dos presentes autos.
Poder-se-ia, isso sim, perguntar se a porfiada litigância do ora reclamante se poderá considerar justificada em relação ao (diminuto) motivo que a determinou. Mas a tal pergunta, apenas, o próprio reclamante estará em condições de dar uma resposta.
(…)
11. No caso vertente, sobretudo em face do despacho de fls. 80, da Ilustre Conselheira Relatora, e da argumentação dele constante, era fácil de prever o sentido final do acórdão, que veio a recair sobre a reclamação do interessado.
Nessa medida, o ora reclamante não terá feito a melhor escolha, à luz desse convite, ao prevalecer-se da possibilidade de manter inalterada a sua reclamação, o que, naturalmente, pode ter concorrido para onerar a sua conta final.
12. Julga-se, por isso, de indeferir o seu requerimento de fls. 121-127, por não parecer haver nenhuma discrepância, quanto aos critérios habitualmente utilizados, por este Tribunal, para a fixação de custas nos processos que, perante ele, correm.
13. Por último, para o caso de o pedido de reforma de custas, por parte do reclamante, pretender obviar ao trânsito em julgado da decisão proferida em 1ª instância, crê-se de aplicar, na presente situação, o art. 84º, nº 8 da LTC, que refere:
“Sendo manifesto que, com determinado requerimento, se pretende obstar ao cumprimento da decisão proferida no recurso ou na reclamação ou à baixa do processo, observar-se-á o disposto no artigo 720º do Código do Processo Civil, mas, só depois de pagas as custas contadas no Tribunal, as multas que este tiver aplicado e as indemnizações que houver fixado, se proferirá decisão no traslado”.
14. Julga-se, pois, uma vez que o interessado já se conformou com o teor da decisão impugnada, com excepção da taxa de justiça nela fixada (cfr. nº 12 da sua reclamação), que o processo deverá, desde já, baixar ao tribunal a quo, ficando traslado das folhas relativas às custas da responsabilidade do reclamante, para os ulteriores termos relativos ao respectivo pagamento.»
Cumpre agora apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. Antes de mais deve sublinhar-se que os critérios legais fixados pelo artigo 9º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2008, de 2 de Julho), foram integralmente respeitados, tendo sido tida em conta a “complexidade e natureza do processo, a relevância dos interesses em causa e a actividade contumaz do vencido”. Aliás, basta conferir a actividade processual levada a cabo pela Relatora e pelos demais Juízes da conferência do acórdão proferido.
Para além disso, nem sequer se pode concluir – como pretendia o reclamante – que o montante de custas aplicado é objectivamente desproporcionado, face ao limite legal fixado que oscila entre 5 UC´s e 50 UC´s (artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98).
Aliás, as comparações que estabelece entre as custas fixadas nos tribunais recorridos e aquelas fixadas pelo Tribunal Constitucional pecam por descontextualizadas, já que o Regulamento das Custas Processuais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro), aplicável aos recursos pendentes nos demais tribunais – judiciais e administrativos – apenas estabelece, em função do valor da causa, um limite legal entre 0,5 UC e 20 UC´s (cfr. n.º 2 do artigo 6º do Regulamento das Custas e Tabela I.B anexa).
Como tal, é notório que o legislador quis manter um limite máximo de custas bastante superior nos recursos que são tramitados junto do Tribunal Constitucional, por comparação com aqueles que correm perante os demais tribunais, caso contrário teria alterado os limites fixados pelo artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, quando o reviu, através do Decreto-Lei n.º 91/2008.
Para além disso, atento o referido limite legal – fixado entre 5 UC´s e 50 UC´s – nem sequer se pode afirmar que o valor concretamente fixado – de 20 UC´s – seja particularmente elevado, por não ter sequer chegado a metade do limite máximo. Acresce ainda que dois motivos sobressaem na fixação daquele montante:
i) Por um lado, a Relatora convidou o reclamante a pronunciar-se sobre o possível indeferimento da reclamação, pelo que aquele poderia ter renunciado à reclamação deduzida, sendo, então, beneficiado em sede de custas;
ii) Por outro lado, o acórdão que o condenou em custas constatou que o reclamante lançou mão de um meio processual anómalo, perante o Tribunal da Relação de Évora, na medida em que a lei é clara ao vedar o recurso para terceira instância de decisões proferidas em processo-contraordenacional, pelo que só o uso abusivo de meio processual anómalo deu causa ao presente recurso para o Tribunal Constitucional.
Em suma, o montante da taxa de justiça a que o reclamante foi sujeito pelo Acórdão n.º 278/2010 não pode ser considerado excessivo ou desproporcionado.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, decide-se indeferir o pedido de reforma quanto a custas.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro.
Lisboa, 23 de Setembro de 2010.- Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Gil Galvão.
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