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Processo n.º 15/10
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e B. e Outros, o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, nos seguintes termos:
«[….] 3. Não obstante a resposta ao convite ao aperfeiçoamento, verifica-se que não estão reunidos os pressupostos necessários ao conhecimento do objecto do recurso. Desde logo, porque o recorrente não suscitou, perante o tribunal recorrido, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (cfr. artigo 72.º, n.º 2, da LTC). Na reclamação para a conferência do Tribunal da Relação do Porto (fls. 102/106 dos autos) o recorrente imputa o vício de inconstitucionalidade (violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP) ao despacho aí reclamado em si mesmo, e não a uma qualquer norma jurídica.
Saliente-se, aliás, que na resposta ao convite ao aperfeiçoamento apresentada neste Tribunal Constitucional – que, de qualquer forma, já não seria o momento atempado para suscitar uma questão de constitucionalidade – o recorrente não enuncia qualquer norma ou interpretação normativa, mas persiste em questionar a própria decisão recorrida.
Como é sabido, o controlo exercido pelo Tribunal Constitucional tem natureza estritamente normativa, apenas podendo incidir sobre o resultado interpretativo de determinada norma, não podendo incidir sobre o juízo subsuntivo de aplicação da norma ao caso concreto.
4. Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não conhecer do objecto do recurso. […]»
2. Notificado da decisão, o recorrente veio requerer a respectiva aclaração, pedido que foi indeferido por despacho de fls. 157.
3. Ainda inconformado, o recorrente veio reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
«[…] FUNDAMENTOS
Na douta Decisão sumária de fls... dos autos, pelo Ilustre Conselheiro Relator, foi decido não conhecer do objecto do recurso interposto pelo arguido A..
DA DECISÃO DE QUE SE RECLAMA
Por brevidade dá-se aqui por reproduzida a douta decisão sumária.
CRÍTICA DA DECISÃO SUMÁRIA
Contudo, salvo o devido respeito, não tem razão o Ilustre Relator e a sua decisão viola e posterga o direito do recorrente ao recurso, consagrado no artigo 32.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa. o que aqui se suscita para os devidos e legais efeitos.
Na douta decisão sumária o Ilustre conselheiro refere. para fundamentar a sua decisão que: “Não obstante a resposta ao convite ao aperfeiçoamento, verifica-se que não estão reunidas os pressupostos necessários ao conhecimento do objecto do recurso. Desde logo, porque o recorrente não suscitou, perante o tribunal recorrido, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, em termos de estar obrigado a dela conhecer (cfr. artigo 72.°, n.° 2, da LTC”.
Ora, o convite foi feito nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 75.°-A, n.° 1 e 2 da LTC. Logo, o convite prendeu-se com uma deficiência ou falta de indicação no requerimento de interposição de recurso e não por qualquer falta ou ausência de arguição de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal recorrido. O que diga-se não ocorreu.
O aqui reclamante deu cumprimento ao disposto no artigo 75.°-A, n.° 1 e 2 do LTC quando convidado para o efeito, se não vejamos:
“Vem, convidado para o e/eito, dar cumprimento ao disposto no artigo 75.°-A, n.º 1 e 2 da LTC.
O arguido interpôs recurso para o Venerando TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nos termos do artigo 70.° n.° 1 al. b) da Lei 28/82 de 15/11, com a redacção que lhe foi dada pela Rectificação n.° 10/98, de 23/05, para o que está em tempo e tem legitimidade - cfr. artigos 70.°, n.° 1, alínea b), 72.° e 75.° da citada Lei 28/82 com aquela alteração.
O recurso por interposto funda-se no disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 70.º acima invocado, sendo certo que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal recorrido em termos de estar obrigado a dela conhecer — cfr. artigo 72.º n.º 2 da mesma Lei Orgânica.
Na verdade o recorrente invocou na sua motivação de reclamação para a conferência do Tribunal da Relação do Porto de fls que o Mmo. Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto, nessa douta decisão sumária, violou, ao rejeitar o recurso interposto com fundamento de manifesta improcedência e postergar assim o direito ao recurso apesar de o recorrente ter devidamente fundamento o mesmo, o disposto no artigo 32.º, n.° 1 da Constituição da República Portuguesa, bem como, o disposto no n.° 6, alínea b) do artigo 417.°, 410.°, n.° 2, alínea c), 121.º, 122.° e 410.°, n.° 3 todos do Código Processo Penal, e ainda o 420.°, n.° 1, alínea a) do mesmo Código Processo Penal, quanto interpretados no sentido em que o Ilustre Desembargador Relator interpretou não conhecendo do recurso e dos seus vícios e postergando o direito ao recurso e a uma decisão de mérito sobre o seu objecto. Tal interpretação é materialmente inconstitucional, por violação do disposto no artigo 32.°, n.° 1 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que aqui expressamente se invoca para todos os efeito legais.
Ao recurso interposto são subsidiariamente aplicáveis as normas do Código de Processo Civil, em especial as respeitantes ao recurso de apelação — cfr. artigo 69.° da Lei 28/82.
Termos em que presente recurso, a final, deverá ser procedente, nos termos e pelos fundamentos invocados e nos demais que V. Ex.ªs suprirão.”
Acresce que, sem prescindir, os pressupostos Pelo exposto, sendo deficiências e requisitos diversos relativos a peças processuais distintas, urge esclarecer, para o requerente poder reclamar para a conferência. em que peça processual, no entendimento do Ilustre Juiz Conselheiro Relator, não foram cumpridos e não se encontram “reunidos os pressupostos necessários ao conhecimento do objecto do recurso”.
Nestes termos, deverá ser conhecido o objecto do recurso apresentado pelo recorrente A., devendo os mesmos prosseguir os demais termos até final.»
4. O representante do Ministério junto deste Tribunal Constitucional apresentou resposta, dando por reproduzida a resposta já apresentada a fls. 154 e 155 dos autos, na qual concluía o seguinte:
«1º
Vem deduzida reclamação da Decisão Sumária de fls. 142 a 144, em que se decidiu não tomar conhecimento do recurso, porque o recorrente não suscitara, durante o processo, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
2º
O convite a que alude o artigo 75.º, n.º 5, da LTC, destina-se a dar a possibilidade ao recorrente de suprir meras deficiências formais que o requerimento de interposição do recurso contenha.
3.º
Como no requerimento apresentado pelo recorrente, não constava qual a questão de constitucionalidade que pretendia ver apreciada, quais os preceitos constitucionais que entendia serem violados e onde, durante o processo, tinha suscitado a questão, foi ele notificado para colmatar, querendo, essas deficiências.
4.º
Na resposta do recorrente a esse convite, embora se fale de Constituição, continua a não vir enunciada, sequer, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
5.º
Por outro lado, dizendo ele que suscitara a questão na reclamação para a conferência, da Decisão Sumária que rejeitou o recurso por manifestamente improcedente - que seria, efectivamente, o momento processual próprio para o fazer -, aí, o que se reputa de inconstitucional, é a própria decisão.
6.º
Parece-nos claro que, como se decidiu na Decisão Sumária reclamada, não estamos perante a suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa, única susceptível de ser conhecida pelo Tribunal.
7.º
Deverá, pois, indeferir-se a reclamação.»
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
5. A decisão sumária ora reclamada pronunciou-se pelo não conhecimento do objecto do recurso com fundamento, essencialmente, no facto de o reclamante não ter suscitado, perante o tribunal recorrido, qualquer questão de constitucionalidade normativa, a qual também não foi capaz de formular junto deste Tribunal Constitucional.
A presente reclamação em nada contraria o assim decidido e, pelo contrário, o respectivo teor confirma o fundamento de não conhecimento constante da decisão recorrida, no sentido de que o ora reclamante se limita a imputar, à decisão recorrida, em si mesmo, a violação de preceitos constitucionais.
Acresce que, como bem salienta o Ministério Público, o reclamante em momento algum enunciou uma questão de constitucionalidade normativa: não o fez na reclamação para a conferência junto do tribunal recorrido, que era o momento próprio para suscitar tal questão; nem conseguiu enunciar a questão perante este Tribunal Constitucional, sendo certo que, de qualquer forma, já não seria o momento atempado para o fazer.
Ainda que tivesse suscitado a questão de constitucionalidade (o que não aconteceu) na resposta ao convite ao aperfeiçoamento que lhe foi dirigido por este Tribunal, nunca tal suscitação poderia considerar-se feita de forma adequada e atempada (cfr. artigo 72.º, n.º 2 LTC). Na resposta o reclamante apenas poderia ter colmatado deficiências formais do próprio requerimento de interposição do recurso, mas não a falta dos pressupostos exigidos ao respectivo conhecimento e, concretamente, a falta de suscitação da questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido.
III. Decisão
Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 17 de Junho de 2010
Joaquim de Sousa Ribeiro
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
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