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Processo n.º 902/11
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal Central Administrativo Sul, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 66/2012:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido CEJ – Centro de Estudos Judiciários, foi interposto recurso, em 07 de novembro de 2011, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, do acórdão proferido, em conferência, pela 1ª Secção do 2º Juízo do Tribunal Central Administrativo – Sul, em 14 de julho de 2011, que foi posteriormente alvo de recurso de revista, que viria a ser rejeitado, com fundamento na sua inadmissibilidade legal, por acórdão proferido, pela 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal de Justiça, em 20 de outubro de 2011.
O recorrente pretende que seja apreciada a constitucionalidade da norma extraída do “artigo 27.º, n.º 1, da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, aplicável ex vi do artigo 8.º, da Lei n.º 95/2009, quando interpretados e aplicados, em concreto, de forma conjugada, no sentido de preverem a graduação de todos os candidatos em lista única, observando simplesmente a «ordem decrescente da respetiva classificação final», sem distinguir entre as notas dos candidatos provenientes da via profissional e da via académica, a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 1, do artigo 3 daquela Lei.” (p. 3 do requerimento de interposição de recurso).
Posto isto, cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo”, com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que deve começar-se por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator verificar que algum, ou alguns deles, não foram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
3. Apesar de o recorrente afirmar o contrário, não corresponde à tramitação processual espelhada nos autos que o recorrente tenha suscitado, de modo processualmente adequado, a questão de inconstitucionalidade normativa que pretende ver agora apreciada.
Se é verdade que o recorrente sempre invocou a questão jurídica relativa à alegada violação do princípio da igualdade – inclusive, fazendo menções ao artigo 13º da Constituição da República (CRP) –, não é menos certo que o recorrente nunca imputou, de modo direto e especificado qualquer inconstitucionalidade à norma extraída do artigo 27º, n.º 1, da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, aplicável ex vi artigo 8º da Lei n.º 95/2009, através de requerimento válido, que fosse apto a confrontar o tribunal recorrido com tal questão.
Com efeito, pode apenas conceder-se que o recorrente teria esboçado (ainda que imperfeitamente) a suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa no § p) das suas conclusões de recurso de revista, perante o Supremo Tribunal de Justiça (p. 25 das alegações de recurso). E ainda assim, tal suscitação não foi processualmente adequada – pois não explicita qual a interpretação normativa efetivamente adotada –, nem corresponde à interpretação normativa que agora individualizou e que pretende ver apreciada. Senão, veja-se:
“p) As normas ínsitas nos artigos 9º, nº 1, 26º, nº 1, 27º, nº 1, e 28º, nºs 1 e 3 da Lei 2/2008, de 14 de janeiro, e 3º, nº 1, als. a) e b), e 4º, n.º 4 e 6, da Lei n.º 95/09, quando interpretadas e aplicadas, em concreto, de forma singular e/ou conjugada como o foram no douto Acórdão recorrido, são materialmente inconstitucionais por violação dos artigos 13º, nºs 1 e 2, 17º, 18º, n.º 1, 47º, n.ºs 1 e 2, 204º, 266º, n.º 2, 268º, n.º 4 e 282º, n.ºs 1 e 2, da CRP”.
Ora, tendo em conta que o presente recurso vem interposto de decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo-Sul, torna-se evidente que as alegações de recurso perante o Supremo Tribunal Administrativo não constituem sequer meio apto para colocar em crise a constitucionalidade de determinada interpretação normativa (e isto, apenas na hipótese – não verificada – de que o recorrente o teria feito adequadamente). A questão de inconstitucionalidade normativa deve ser colocada perante o tribunal de cuja decisão se recorre, “em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (artigo 72º, n.º 2, da LTC).
Então, se verificarmos as alegações de recurso para o Tribunal Central Administrativo – Sul, constatamos que o recorrente também não logrou suscitar tal questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal recorrido. Pelo contrário, limitou-se a alegar o seguinte:
“19º
No mais e por economia, o recorrente limita-se a reiterar e reproduzir aqui integralmente quanto já alegou e concluiu quer no procedimento cautelar quer na ação administrativa especial apensa e agora decidida pela sentença recorrida.
(…)
f) Ocorreu igualmente erro de julgamento por violação da Lei, devendo ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, decretar-se a inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art. 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação das disposições conjugadas dos art.ºs 3.º n.º 1, al. a) e b), 4.º n.ºs 4, 5 e 6, 5.º n.ºs 2 e 3 e 7.º da referida Lei 95/2009, bem como dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade.”
Daqui decorre que o recorrente nunca suscitou perante o tribunal recorrido, como lhe era imposto pelo n.º 2 do artigo 72º da LTC, a inconstitucionalidade da precisa interpretação normativa que pretende ver agora apreciada. Por um lado, limita-se a remeter, genericamente, para as suas anteriores peças processuais; por outro lado, opta por invocar uma alegada violação de lei, considerando que o artigo 27º da Lei n.º 2/2008 teria sido indevidamente aplicado.
A mera referência, genérica, a vários princípios constitucionais não é apta a suprir esta ineficiência. E assim é porque o recorrente nunca individualizou qual teria sido a específica interpretação normativa daquele preceito que seria inconstitucional. Pelo contrário, limitou-se a referir aqueles preceitos legais “quando concretamente interpretados e aplicados, como foram”. Ora, não cabia ao tribunal recorrido delimitar qual a interpretação normativa que teria sido (no entender do recorrente) aplicada pelo tribunal de primeira instância, antes lhe cabendo a si, fixar qual o objeto da questão de constitucionalidade. Não o fez, porém.
Consequentemente, não se conhece do objeto do presente recurso, por preterição do ónus de prévia e adequada suscitação da questão de inconstitucionalidade.
III – DECISÃO
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, decide-se não conhecer do objeto do recurso.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.»
2. Inconformado com a decisão proferida, o recorrente veio deduzir reclamação, cujos termos ora se resumem:
«(…)
Analisada a douta Decisão Sumária que decidiu não conhecer do recurso, cumpre expor as razões pelas quais o Reclamante entende que o recurso deveria ter sido conhecido, que se passam a concretizar.
O ora Reclamante considera que suscitou a inconstitucionalidade das normas objeto de recurso, desde logo, na petição inicial da ação administrativa que interpôs onde se pode ler, nos seus artigos 12.º, 36.º, 37.º, 44.º e 45.º, o seguinte:
“12.º - (…) a decisão maioritária e que fez vencimento elaborou uma lista de classificação e de graduação final de todos os candidatos que veio a ser homologada pelo despacho ora impugnado, apresentando como única fundamentação ter sido “efetuada de acordo com os critérios resultantes do disposto no art.º 27º, da Lei nº, 2/2008 de 14.01, ex vi do art.º 8º da Lei nº 95/2009”, (…)
36.º - É contrária ao princípio da igualdade, a interpretação que leve à direta comparação de situações que embora aparentemente se reputem iguais, assentem em premissas diversas, como reconhecidamente se entende ser aquela existente entre os candidatos ora a concurso,
37.º - Gerando necessariamente graves distorções no posicionamento relativo dos candidatos, violadoras do princípio da proporcionalidade constitucionalmente assegurado, mais uma vez com inevitáveis reflexos em sede de igualdade entre candidaturas, (…)” (cfr. artigos 36.º e 37.º da petição inicial).
44.º - Como refere o Prof. Jorge Novais in “Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa”, pag. 101 e seguintes e foi concluído no notável Acórdão do Pleno do Tribunal Constitucional, n.º 232/03 de 13 de maio (Rel. Cons. Moura Ramos), o princípio da igualdade veda as chamadas discriminações indiretas em que, e sempre sem que tal se revele justificável de um ponto de vista objetivo, uma determinada medida, aparentemente não discriminatória, afete negativamente em maior medida, na prática, uma parte individualizável e distinta do universo dos destinatários a que vai dirigida”,
45.º - Porque assim é e porque no caso em apreço a repartição dos candidatos em listas de graduação separadas tem justificação objetiva, a classificação final, graduação e consequente habilitação da totalidade dos candidatos à frequência do curso especial, em lista única homologada pelo despacho impugnado, viola o princípio da igualdade e não deveria ter sido feita por ordem decrescente das notas obtidas, como foi, mas sim em listas separadas e tendo em conta a graduação conferida por tais notas a cada candidato no âmbito dos respetivos concursos e considerando habilitados, alternadamente, os melhor graduados, até ao limite das vagas postas a concurso.”.
Anota-se ainda que o ora Reclamante peticionou na própria p.i. da ação administrativa especial que intentou, o seguinte:
“Pelo exposto e com o sempre indispensável suprimento do Tribunal, tendo em atenção que todas as questões suscitadas se reconduzem a matéria de Direito, apenas havendo que aplicar corretamente a lei e os princípios constitucionais aos atos praticados e decisões tomadas pelo Réu, deve a presente ação ser julgada procedente por provada e em consequência decretar-se:
a. A inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação das disposições conjugadas dos art.ºs 3.º n.º 1, al. a) e b), 4.º n.ºs 4, 5 e 6, 5.º n.ºs 2 e 3 e 7.º da referida Lei 95/2009, bem como dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade, (…).”.
A douta Sentença de 1.ª instância conheceu do pedido formulado pelo ora Reclamante pela seguinte forma:
“(…) pretende o requerente, neste quadro legislativo aplicável, que a posição maioritária do Júri que logrou obter vencimento, e que resultou na elaboração da lista única de classificação e graduação final de todos os candidatos, por ordem decrescente das notas obtidas, a qual veio a ser homologada por despacho do Diretor-Adjunto em substituição legal da Diretora do CEJ, datado de 4 de dezembro de 2009, (cfr. al. e) do probatório), é ilegal, por ser contrária à lei (aqui considerando o bloco de legalidade), atenta a solução adotada (a constante do art.º 27.º da Lei 2/2008, por remissão do art.º 8.º da Lei n.º 95/2009) (…).”.
No recurso que interpôs para o TCA Sul o ora Reclamante reiterou, dando como reproduzidos, os argumentos e conclusões já constantes da sua petição inicial da seguinte forma:
“19.º
No mais e por economia, o recorrente limita-se a reiterar e reproduzir aqui integralmente quanto já alegou e concluiu quer no procedimento cautelar quer na ação administrativa especial apensa e agora decidida pela sentença recorrida.”. (cfr. página 5 das alegações)
À reiteração das alegações e conclusões já constantes do r.i. e da p.i. o ora Requerente acrescentou ainda nas suas alegações de recurso para o TCAS o seguinte: “(…) devendo ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, decretar-se a inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação (…) dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade,”). (vide, alínea f) das conclusões, na página 7.ª das alegações para o TCAS)
O TCA Sul aplicou as interpretações normativas acima enunciadas, mantendo a decisão de 1.ª instância, à luz do seguinte segmento decisório: “(…) afigurando-se, salvo o devido respeito pelo voto de vencido do Exm.º Sr. Conselheiro Salvador da Costa contido na Ata nº 6 daquele concurso, que nada na Lei nº 95/2009, de 2/9, permite concluir que candidatos substitutos de procurador-adjunto pudessem beneficiar de um regime mais favorável para efeitos de acesso àquele curso especial de recrutamento para o Ministério Público, infringindo o Júri do Concurso o disposto nos artº 27º da Lei nº 2/2008, de 14/1, e 3º/1/a) e b) e 8º da Lei 95/2009, de 2/9, a que acresce a circunstância também relevante que atuando aquele Júri do concurso no exercício do poderes estritamente vinculados, resultantes daquelas Lei, não poderia ocorrer violação dos aludidos princípios da igualdade, transparência e proporcionalidade, como também ficou decidido pela sentença recorrida.”.
Pelo exposto, considerando os diferentes momentos em que se peticionou expressamente a declaração da inaplicabilidade do art.º 27.º da Lei 2/2008, ex vi art.º 8.º da Lei n.º 95/2009, interpretado como o foi na decisão recorrida, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade, diremos que não só a arguição da inconstitucionalidade da interpretação normativa objeto do recurso interposto se deve considerar oportuna e suficientemente feita pelo Reclamante, como o tribunal (a 1.ª instância e o CTAS) puderam conhecer da mesma!
É que, para efetuar a reapreciação da causa, e conhecer do recurso do ora Reclamante ao TCAS – onde se peticiona “(…) devendo ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, decretar-se a inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação (…) dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade,”). (vide, alínea f) das conclusões, na página 7.ª das alegações para o TCAS) – o Tribunal recorrido tinha necessariamente de conhecer da constitucionalidade das normas cuja inaplicabilidade aos autos foi expressamente invocada e solicitada pelo Recorrente por violação dos citados princípios constitucionais.
Atento o artigo 204.º da CRP, o TCAS não só podia apreciar da constitucionalidade das normas aplicadas, como efetivamente tinha o dever de o fazer para decidir pela respetiva (in)aplicabilidade por violação dos princípios constitucionais invocados pelo Reclamante.
Ou seja, considerando o pedido formulado pelo Autor, o Tribunal de 1.ª instância e o TCAS não poderiam, respetivamente, apreciar e reapreciar a causa sem apreciar da aplicabilidade do art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação (…) dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade.
Nem se diga que o que o Reclamante peticionou ao Tribunal de 1.ª instância, e ao de recurso, foi a declaração da inaplicabilidade das interpretações normativas e não a declaração da respetiva inconstitucionalidade.
É que, a inaplicabilidade de uma norma (ou interpretação normativa) por violação de um princípio ou norma constitucional, é a consequência constitucional típica decorrente do juízo de inconstitucionalidade, conforme dispõe expressamente o artigo 204.º, n.º 1, da LTC (e artigo 80.º, n.º 3, da LTC, quanto aos efeitos da decisão do TC), dado que em sede de fiscalização concreta se realiza um mero julgamento de inconstitucionalidade, destituído de força obrigatória geral.
Tendo o Reclamante peticionado de forma expressa ás instâncias que julgassem inaplicável (consequência jurídica típica da inconstitucionalidade) uma concreta interpretação normativa, por violação de diversos princípios constitucionais, sendo a aferição da constitucionalidade das normas em causa uma obrigação apriorística do Tribunal (artigo 204.º da CRP), é manifesto que se deve de entender que o Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade de forma a que a mesma devesse ser apreciada e reapreciada.
Consequentemente, considerando a argumentação e o pedido formulado pelo Recorrente, mesmo à luz do artigo 204.º da CRP, é manifesto que o Reclamante colocou a questão da inconstitucionalidade da norma contida no “art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação (…) dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade” “em termos de [o Tribunal recorrido] estar obrigado a dela conhecer” considerando o disposto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC.
(…)
Das diversas alegações efetuadas pelo ora Reclamante, tanto no recurso para o TCAS, como nas alegações e conclusões da p.i. da ação administrativa especial (expressamente reproduzidas no recurso para o TCAS), resulta que a interpretação normativa a sindicar agora pelo TC, e anteriormente pelas diversas instâncias, foi sempre a mesma: a interpretação do artigo “27.º da Lei 2/2008, de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da Lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram,”, leia-se, de forma a ordenar no concurso, por ordem decrescente, os resultados das listas de candidatos da via profissional e da via académica, sem realizar qualquer distinção entre ambas, “em violação (…) dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade”.
Tal sentido interpretativo (alegadamente não identificável pelo tribunal Recorrido) é o mesmo que já o próprio Presidente do Júri, Exm.º Sr. Juiz Conselheiro Salvador da Costa, havia enunciado na sua declaração de voto, voto de vencido em que o Reclamante sempre se louvou para fundamentar a inaplicabilidade da interpretação normativa objeto do interposto recurso de constitucionalidade, e que consta até da matéria de facto julgada provada pela Sentença 1.ª Instância, e mantida pelo Tribunal Recorrido (v.d. alínea f) da matéria de facto na Sentença de 1.ª instância e na douta Decisão recorrida).
(…)
Efetivamente, no caso dos autos, é absolutamente nítido, desde o primeiro momento (leia-se, da petição inicial), que a questão de fundo e a causa de pedir se reconduzem ao pedido de inaplicabilidade da interpretação normativa aplicada pelo Júri, pela douta Sentença de 1.ª Instância, e douta Decisão recorrida, por violação de princípios constitucionais concretamente identificados pelo Autor, senão vejamos a parte final do articulado da petição inicial e o seu pedido:
63. Todos os elementos necessários à decisão estão integralmente disponíveis, não existindo matéria de facto controvertida e apenas estando em causa a correta aplicação da Lei às decisões e atos praticados e impugnados, à luz dos princípios e preceitos constitucionais.
64. O Autor não pode de resto conformar-se com qualquer conceção minimalista dos poderes de cognição e de decisão do Tribunal, porventura válida na vigência da antiga LPTA, embora então já muito contestada – cfr. Cons. Mário Torres “Três Falsas Ideias…” in “Estudos de Homenagem a Francisco José Veloso”, pág. 753 e seguintes e Prof. Mário Aroso de Almeida, “anulação de Atos Administrativos”, pág. 184 e seguintes,
65. E que hoje se pensaria estar definitivamente ultrapassada com a entrada em vigor do novo CPTA – cfr. Prof. Mário Aroso de Almeida “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 289 e “O Objeto do Processo no Novo Contencioso Administrativo” in “Cadernos da Justiça Administrativa”, n.º 36, pág. 7 e Prof. João Caupers “Introdução ao Direito Administrativo”, 9.ª edição, pág. 344 e seguintes.
66. O Autor reitera, finalmente, que as questões de violação da Constituição sempre terão de ser apreciadas porque os tribunais não podem, por força do art.º 204.º da Lei Fundamental, aplicar normas que a infrinjam ou aos princípios nela consignados
67. Sendo esta proibição, como são de há muito jurisprudência e doutrina constantes, extensiva a qualquer interpretação e aplicação concretas das normas que violem aquelas regras e princípios constitucionais
67. Neste mesmo sentido, de resto, afigura-se que, muito para além de uma justiça administrativa formal, se procura hoje alcançar uma justiça efetiva, material e de substância,
68. Pelo que a causa de pedir em ação de impugnação contenciosa de um ato administrativo é a própria invalidade desse ato, integrada por todos os vícios de que eventualmente padeça e que o invalidem,
69. Daí que o Tribunal não se afaste sequer do objeto do processo quando identifique alguma dessas possíveis causas de invalidade, mesmo que porventura não tivesse sido invocada expressamente, como estatui claramente o art.º 95.º n.º 2 do C.P.T.A.
70. E o certo é que se está perante uma situação em que não foi dado tratamento diferente ao que era diferente por forma a superar desigualdades, mas sim tratamento igual ao que era diferente, criando desigualdades
71. E ultrapassando-se largamente qualquer margem de discricionariedade ao dispor do legislador (ou de quem mal aplicou a lei).
Pelo exposto e com o sempre indispensável suprimento do Tribunal, tendo em atenção que todas as questões suscitadas se reconduzem a matéria de Direito, apenas havendo que aplicar corretamente a lei e os princípios constitucionais aos atos praticados e decisões tomadas pelo Réu, deve a presente ação ser julgada procedente por provada e em consequência decretar-se:
A inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação das disposições conjugadas dos art.ºs 3.º n.º 1, al. a) e b), 4.º n.ºs 4, 5 e 6, 5.º n.ºs 2 e 3 e 7.º da referida Lei 95/2009, bem como dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade,
Com a consequente declaração de nulidade da deliberação do júri votada por maioria e dos atos administrativos consubstanciados nos despachos proferidos pelo Senhor Diretor Adjunto, em substituição da Senhora Diretora do Centro de Estudos Judiciários, datados de 4 de dezembro de 2009 e que homologaram a lista unitária de classificação final e de graduação, bem como a de candidatos habilitados para frequência do curso especial de recrutamento de magistrados para o Ministério Público e sua substituição por decisão que reconheça o direito de frequência de tal curso por parte do Autor,
Designadamente, separando os candidatos ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 3.º da Lei 95/2009 em listas autónomas e ordenando-os, dentro de cada lista, por ordem decrescente da graduação obtida nos respetivos concursos de admissão do C.E.J.,
E ficando habilitados ex vi legis, à frequência do presente curso especial, alternadamente, os candidatos mais graduados de ambas as listas, até ao preenchimento total das vagas postas a concurso,
Tudo sem prejuízo de se respeitarem os direitos e legitimas expectativas adquiridos pelos candidatos que, entretanto, tenham eventualmente frequentado o curso até final.”. (“negrito” nosso)
Neste contexto processual, que desde o início enformou a ação proposta pelo Reclamante, apreciada pela 1.ª Instância, e reapreciada pelo Tribunal Recorrida, é de referir que a ratio do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, que justifica a limitação do direito ao recurso para o Tribunal Constitucional, não é:
a) impedir recursos em processos em que a questão da inaplicabilidade das normas, por desconformidade com princípios constitucionais, está no âmago do próprio pedido formulado na ação,
b) e, consequentemente, na reapreciação da mesmo através do recurso que antecede o recurso de fiscalização da constitucionalidade,
c) em casos em que a violação de princípios constitucionais constitui a principal causa de pedir esgrimida pela parte,
d) em casos que a parte peticione expressamente que se determine a inaplicabilidade ao caso concreto da interpretação normativa que reputa violadora da Constituição (v.d. alínea a) do pedido);
e) e peticiona expressamente que se determine aplicável a interpretação normativa que reputa como conforme à Constituição (v.d. alínea c) do pedido).
Tal ratio visa sim, salvo melhor opinião, impedir a apresentação de recursos de constitucionalidade meramente dilatórios, e em processos onde a constitucionalidade das normas nunca esteve em causa, o que manifestamente não se verifica no caso “sub judice”.
Exigências suplementares formalistas de que o Recorrente tem de no processo individualizar expressamente a interpretação normativa que considera inconstitucional, não apenas por diversas vezes em outros momentos processuais ou partes das suas alegações, mas igualmente no preciso local em que realizou a alegação de inconstitucionalidade, mesmo que a interpretação normativa em causa (e que se considera inconstitucional) seja evidente, constitui uma restrição completamente desnecessária para atingir o objetivo de evitar recursos abusivos para o Tribunal Constitucional. Ora, esta constitui a única teleologia constitucionalmente admissível para o artigo 280.º, n.º 4, CRP. Por exemplo, não é admissível a criação de exigências suplementares apenas por força da sobrecarga (que o reclamante reconhece que é manifesta, com lamentáveis consequências para os Srs. Conselheiros) do tribunal, tendo em vista aumentar a eficiência processual.
Interpretado nestes termos, o próprio artigo 72.º, n.º 2, da LTC, não poderá deixar de ser julgado como inconstitucional por violação do artigo 280, n.º 1, al. b), da CRP, sendo certo que este constitui um mero corolário do artigo 20.º, n.º 1, direito fundamental de natureza análoga a direito, liberdade e garantia, sujeito, pois, ao artigo 18.º, n.º 2, por força do artigo 17.º, todos da CRP, que exige respeito pelo princípio da necessidade, enquanto subprincípio do princípio da proibição do excesso.
O mesmo vale para uma exigência de que o Recorrente não se pode limitar a “A mera referência, genérica, a vários princípios constitucionais” (pág. 4 da douta decisão sumária recorrida). Na realidade, o artigo 75.º-A, n.º 2, da LTC, limita-se a exigir que sejam referidos os princípios constitucionais violados, sem exigir qualquer desenvolvimento ou concretização adicional. Nem qualquer exigência suplementar seria compatível com o princípio de que o conhecimento da inconstitucionalidade constitui uma questão de Ordem Pública, daí o seu caráter oficioso (artigo 204.º CRP). Em qualquer caso, o ora Reclamante não se ficou pela mera referência aos princípios desenvolvidos, tendo citado doutrina em apoio e concretizado porque entendeu violado particularmente o princípio da igualdade (cfr. artigo 44 da sua petição, supra citado na presente reclamação).
Pelo exposto, o recurso interposto pelo ao Reclamante é, à luz de todo o processado e dos requisitos previstos no artigo 72.º, n.º 2, da LTC, legítimo, sendo o único que, atenta a especialidade do Tribunal Constitucional, permitirá dirimir o litígio através de uma decisão definitiva, capaz de convencer as partes quanto à questão de constitucionalidade normativa que sempre esteve subjacente à ação.» (fls. 25 a 37)
3. Notificado para o efeito, o recorrido Centro de Estudos Judiciários veio responder nos seguintes termos, que ora se resumem:
«(…)
5 - Na reclamação ora apresentada, o Reclamante procura contraditar a linha argumentativa da decisão reclamada, evidenciando situações que, na sua ótica, serão suscetíveis de abalar a bondade da decisão sumária.
6 - No essencial o que está em causa é apurar se:
a) O Recorrente suscitou, de modo processualmente adequado, a questão da inconstitucionalidade normativa que pretende ver agora apreciada;
b) O Recorrente explicitou qual a interpretação normativa efetivamente adotada;
c) O Recorrente apenas faz referência genérica a vários princípios constitucionais que entende terem sido violados.
7 - Como bem se salienta na decisão reclamada, para os efeitos consagrados na alínea b) do n.º 1 do art. 70. ° da LTC, apenas importa quanto se alegou no recurso para o TCA Sul, pois é deste aresto de que se recorre, sendo descartáveis as alegações produzidas para o STA em sede de revista.
8 - Pese embora o Recorrente vir, agora, de uma forma detalhada e desenvolvida, procurar demonstrar o contrário, o que é certo é que não logra afastar as censuras contidas na Decisão Sumária, nem demonstrar a valia dos seus argumentos.
9 - Da reclamação apresentada, mais uma vez se confirma que o Tribunal a quo não se encontrava obrigado a conhecer de qualquer constitucionalidade normativa.
10 - Na verdade, apesar do Reclamante identificar concretamente os pontos dos articulados, onde, na sua perspetiva, teria suscitado as questões de constitucionalidade perante o tribunal a quo, em nenhum desses pontos é levantada, em termos processualmente adequados, qualquer questão de constitucionalidade normativa relativamente às normas que integram o presente recurso constitucional.
11 Ora, resulta do vertido no n.º 2 do art. 72.° da LTC, que a prévia apreciação jurisdicional relativamente a uma questão de constitucionalidade constitui pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade.
12 - Por outro lado, não surte efeito quanto o Reclamante afirma quanto à exigência suplementar que, presuntivamente, lhe teria sido pedida no campo de uma hipotética concretização adicional em sede dos convocados princípios constitucionais violados.
13 - O que se diz na decisão reclamada é bem diferente, como se comprova pela seguinte passagem: “A mera referência, genérica, a vários princípios constitucionais não é apta a suprir esta ineficiência.”
14 - E a ineficiência tem a sua génese no facto do Reclamante se ter limitado a remeter, genericamente, para as suas anteriores peças processuais, sem nunca ter individualizado qual teria sido a específica interpretação normativa daquele preceito que seria inconstitucional.
Termos em que deve a presente reclamação ser desatendida e julgada improcedente, com a consequente não admissão do recurso constitucional, por não se encontrarem reunidos os pressupostos para tal exigidos.» (fls. 69 e 70)
4. Igualmente notificados para o efeito, nenhum dos demais recorridos vieram aos autos apresentar resposta.
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. O reclamante vem alegar que a reprodução dos argumentos anteriormente esgrimidos, perante o tribunal de primeira instância, operada por força do § 19º das suas alegações de recurso perante o Tribunal Central Administrativo Sul, seria suficiente e adequada para garantir uma suscitação processualmente adequada da questão de inconstitucionalidade extraída do artigo 27º, n.º 1, da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, aplicável ex vi artigo 8º, da Lei n.º 95/2009. Ou seja, o reclamante concede que não suscitou, de modo explícito, a referida questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal recorrido – pois aceita ter apenas afirmado que “[n]o mais e por economia, o recorrente limita-se a reiterar e reproduzir aqui integralmente quanto já alegou e concluiu quer no procedimento cautelar quer na ação administrativa especial apensa” –, sustentando que o teria feito, indiretamente, por via dessa mesma remissão.
Vejamos se assim é.
Antes de mais, importa notar que a suscitação processualmente adequada de uma questão de inconstitucionalidade normativa não se basta com a sua mera invocação perante uma das instâncias anteriores, sendo forçoso que os recorrentes reiterem e persistam nessa mesma suscitação perante as instâncias de que recorrem. Ora, ao limitar-se a “reiterar e reproduzir aqui integralmente quanto já alegou e concluiu”, em duas peças processuais distintas – ou seja, no requerimento inicial de providência cautelar e na petição inicial de ação administrativa especial –, o recorrente exonerou-se do dever de fixação do objeto do recurso perante o Tribunal Central Administrativo do Sul e fez recair sobre este um encargo – legalmente inadmissível – de indagação exaustiva daquelas peças processuais e de delimitação oficiosa do respetivo objeto do recurso ordinário (então) interposto. Evidentemente, não cabia ao tribunal recorrido proceder à fixação oficiosa do objeto desse mesmo recurso.
Bem pelo contrário, cabia ao recorrente ter individualizado a questão de inconstitucionalidade normativa que pretende agora ver apreciada, “em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (cfr. artigo 72º, n.º 2, da LTC). Aliás, foi por isso mesmo que a decisão recorrida veio a constatar, ao decidir o seguinte:
«(…) tendo em consideração o referido no corpo das alegações no seu artº 19º, segundo o qual “o recorrente limita-se a reiterar e reproduzir aqui integralmente quanto já alegou e concluiu quer no procedimento cautelar quer na ação administrativa especial apensa e agora decidida pela sentença recorrida”, verificando-se que tais questões foram objeto de decisão pormenorizada pela sentença recorrida, conforme se alcança de fls. 22 a 26 e de fls. 28 a 32 da mesma sentença, teremos de concluir que a proclamação genérica de tais vícios, sem qualquer fundamentação das razões pelas quais ocorrerão é inócua, na medida em que não permite a reapreciação do decidido em 1ª instância (…)» (cfr. cópia datilografada do acórdão recorrido, a fls. 196-verso, do vol. IV dos autos recorridos)
Em suma, a própria decisão recorrida esclarece que não pode tomar uma posição consubstanciada sobre qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, por força da ausência de especificação de fundamentos aduzidos pelo recorrente, nesse sentido, sem prejuízo de, logo de seguida, esboçar uma discordância face ao voto de vencido aposto na ata do concurso impugnado.
Daqui resulta, sem qualquer margem para dúvidas, que a mera remissão genérica para outras peças processuais constantes dos autos não permitiu ao tribunal recorrido – nem tão pouco o obrigou – a conhecer da específica questão de inconstitucionalidade que constitui agora objeto dos presentes autos.
Além disso, a título meramente subsidiário, diga-se que, mesmo que assim não fosse – o que não se concede, mas por mera exaustão de fundamentação se pondera –, nem sequer é verdade que essas outras peças processuais tivessem logrado suscitar, de modo processualmente adequado, a exata questão de inconstitucionalidade que ora constitui objeto do presente recurso. Dos trechos transcritos pelo ora reclamante resulta apenas que o mesmo considerou inconstitucional uma “interpretação que leve à direta comparação de situações que embora aparentemente se reputem iguais, assentem em premissas diversas, como reconhecidamente se entende ser aquela existente entre os candidatos ora a concurso” (cfr. § 36º da petição inicial da ação administrativa especial instaurada), mas sem a imputar, de modo especificado, ao artigo 27º, n.º 1, da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, aplicável ex vi artigo 8º, da Lei n.º 95/2009. Aliás, mesmo quando peticionou a “inaplicabilidade em concreto do disposto no art.º 27.º da Lei 2/2008 de 14 de janeiro, ex vi do art.º 8.º da lei 95/2009 de 2 de setembro, quando concretamente interpretados e aplicados, como foram, em violação das disposições conjugadas dos art.ºs 3.º n.º 1, al. a) e b), 4.º n.ºs 4, 5 e 6, 5.º n.ºs 2 e 3 e 7.º da referida Lei 95/2009, bem como dos princípios constitucionais da igualdade, transparência e da proporcionalidade(…)”, o reclamante nunca especificou qual seria essa concreta interpretação/aplicação. A tal ponto, que, como o próprio admite, o tribunal de primeira instância apenas apreciou a questão da eventual violação de lei – isto é, do referido artigo 27º, n.º 1, da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, aplicável ex vi do artigo 8º, da Lei n.º 95/2009 –, mas já não a sua específica inconstitucionalidade normativa:
«(…) pretende o requerente, neste quadro legislativo aplicável, que a posição maioritária do Júri que logrou obter vencimento, e que resultou na elaboração da lista única de classificação e graduação final de todos os candidatos, por ordem decrescente das notas obtidas, a qual veio a ser homologada por despacho do Diretor-Adjunto em substituição legal da Diretora do CEJ, datado de 4 de dezembro de 2009, (cfr. al. e) do probatório), é ilegal, por ser contrária à lei (aqui considerando o bloco de legalidade), atenta a solução adotada (a constante do art.º 27.º da Lei 2/2008, por remissão do art.º 8.º da Lei n.º 95/2009) (…)».
Por estas razões, confirma-se a decisão reclamada, em função da falta de suscitação processualmente adequada da questão de inconstitucionalidade normativa.
5. Resta, por fim, ponderar a alegada inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 72º da LTC, quando este tiver sido interpretado no sentido de:
«a) impedir recursos em processos em que a questão da inaplicabilidade das normas, por desconformidade com princípios constitucionais, está no âmago do próprio pedido formulado na ação,
b) e, consequentemente, na reapreciação da mesma através do recurso que antecede o recurso de fiscalização da constitucionalidade,
c) em casos em que a violação de princípios constitucionais constitui a principal causa de pedir esgrimida pela parte,
d) em casos que a parte peticione expressamente que se determine a inaplicabilidade ao caso concreto da interpretação normativa que reputa violadora da Constituição (v.d. alínea a) do pedido);
e) e peticiona expressamente que se determine aplicável a interpretação normativa que reputa como conforme à Constituição (v.d. alínea c) do pedido).»
O n.º 2 do artigo 72.º da LTC estabelece, em consonância com o artigo 280.º, n.º 1, al. b), da CRP, um pressuposto funcionalmente adequado à natureza do acesso ao Tribunal Constitucional pela via de recurso.
Por último, não se afigura sequer dogmaticamente correto afirmar que o referido n.º 2 do artigo 72º da LTC vise, a título exclusivo, impedir a interposição de recursos dilatórios. Por um lado, aquela norma processual permite a sustação do conhecimento de quaisquer recursos de constitucionalidade, desde que não tenha sido cumprido o ónus de prévia suscitação. Por outro lado, a lei processual constitucional dispõe de outros mecanismos processuais para obstar ao emprego de meios processuais dilatórios – v.g. a condenação por litigância de má fé (artigo 84º, n.º 6, da LTC) ou a extração de traslado, com vista a obstar ao protelamento do trânsito em julgado (artigo 84º, n.º 8, da LTC).
III - DECISÃO
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 14 de março de 2013. – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Joaquim de Sousa Ribeiro.
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