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Processo n.º 150/13
Plenário
ATA
Aos treze dias do mês de março de dois mil e treze, em sessão plenária, encontrando-se presentes o Excelentíssimo, Juiz Conselheiro Presidente Joaquim de Sousa Ribeiro e os Exmos. Juízes Conselheiros Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Carlos Fernandes Cadilha, Ana Maria Guerra Martins, Pedro Machete, Maria João Antunes, Maria de Fátima Mata-Mouros, José da Cunha Barbosa, Catarina Sarmento e Castro, Maria José Rangel de Mesquita, João Cura Mariano, Fernando Vaz Ventura e Maria Lúcia Amaral foram trazidos à conferência os autos do processo em referência para apreciação.
Após debate e votação, foi ditado, pelo Excelentíssimo Juiz Conselheiro Presidente Joaquim de Sousa Ribeiro, o seguinte:
Acórdão n.º 144/2013
1. Um grupo de deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira veio, ao abrigo da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição, apresentar um pedido de fiscalização abstrata sucessiva da legalidade, nos seguintes termos:
«OS DEPUTADOS ABAIXO-ASSINADOS, que representam mais do que um décimo dos Deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em efetividade de funções, vêm, ao abrigo do disposto no artigo 281.º, n.º 2 alínea g), da Constituição da República Portuguesa (CRP) apresentar,
PEDIDO DE FISCALIZAÇÃO SUCESSIVA ABSTRATA DA LEGALIDADE
Das normas contidas no Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2013, na redação dada pelo Decreto Legislativo Regional n.º 42/2012, publicado em Diário da República, I Série, n.º 252, de 31 de dezembro de 2012, e que se passam a transcrever:
Nos termos do artigo 69.º, al. n) do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPAM), compete ao Governo Regional da Madeira (GRM) elaborar a proposta de Orçamento Regional, adaptando o sistema fiscal regional à realidade económica madeirense (artigo 40.º, al. ff)) e submetê-la à Assembleia Legislativa Regional da Região Autónoma da Madeira (ALRAM) para discussão e votação.
Por seu lado, a ALRAM deve “Zelar pelo cumprimento da Constituição, do Estatuto, das leis e apreciar os atos do Governo (...)” e “Solicitar ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade e de ilegalidade das normas emanadas dos órgãos de soberania por violação de direitos da Região (...)”, artigo 38.º, al. a) e c) do EPAM.
Acontece porém que o GRM apresentou uma proposta de orçamento, na qual acolhe todas as normas do Orçamento de Estado para 2013, sem adaptar as suas regras à realidade madeirense e sem expurgar as inconstitucionalidades que adiante se apontam, como era sua obrigação.
Por sua vez, a ALRAM, através da maioria dos deputados do PSD, aprovou a proposta apresentada pelo GRM, não zelando pelo cumprimento da Constituição e do Estatuto e sem pedir a fiscalização das normas inconstitucionais que o GRM acolhe no seu Orçamento, como também era sua obrigação.
Assim, tendo o GRM apresentado, e a ALRAM aprovado, o Orçamento Regional para 2013, transpondo normas do OE para 2013 que julgamos serem violadoras da Constituição, vêm os Deputados abaixo-assinados, solicitar que o Tribunal Constitucional declare inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas do Orçamento da RAM para 2013, violadoras dos princípios plasmados infra, impedindo que produzam efeitos na nossa ordem jurídica:
1. Violação do princípio da igualdade, na dimensão da igualdade na repartição dos encargos públicos, consagrado no artigo 13.º da Constituição, ao reduzir as remunerações dos trabalhadores da administração pública regional e do setor empresarial da Região e designadamente ao retirar-lhes o pagamento do subsídio de férias;
2. Violação do n.º 1 do artigo 104.º segundo a qual «O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar», na medida em que ao agravar brutalmente a tributação incidente sobre os rendimentos do trabalho e das pensões ao contrário de outros tipos de rendimento, faz uma distribuição menos justa e menos equitativa da carga fiscal, sem qualquer efeito na redução das desigualdades;
3. Violação do princípio da proporcionalidade, na vertente da proibição do excesso, consignado no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, na medida em que ao aumentar de forma insustentável a tributação em IRS, bem como outros impostos que oneram os rendimentos das famílias, o Orçamento da RAM para 2013 preconiza uma carga tributária que no seu conjunto assume o caráter de confisco na medida em que aquilo que é exigido aos cidadãos a título de impostos ultrapassa a sua real capacidade económica;
4. Violação do princípio da progressividade consagrado no n21 do artigo 1049 da Constituição, ao introduzir uma sobretaxa adicional, que é uma taxa proporcional (ou plana) aplicada por igual a todos os escalões de rendimentos e, por desta forma, aumentar a carga fiscal de forma indiscriminada e sem qualquer relação com a capacidade contributiva de cada um;
5. Violação da norma do n.º 1 do artigo 104.º da Constituição na parte em que obriga à existência de um imposto único sobre o rendimento pessoal, ao atribuir à sobretaxa adicional características próprias diferenciadas das que enformam o próprio IRS (não progressividade, retenção autónoma, dedução especifica própria, não aplicação do quociente conjugal), apontando o Orçamento da RAM para 2013 para a criação de um novo imposto sobre o rendimento pessoal;
6. Violação do princípio da progressividade do imposto sobre o rendimento pessoal consagrado no n.º 1 do artigo 104.º da Constituição, ao reduzir o número de escalões de rendimento para efeitos do IRS de 8 para 5, por elevar os rendimentos mais baixos a um escalão superior e, por outro lado, colocar no mesmo escalão rendimentos de valores muito diferenciados; abdica do critério da capacidade económica na repartição dos impostos, que é um princípio fundamental da nossa constituição fiscal, através do qual se concretiza o princípio da igualdade fiscal;
7. Por outro lado, o GRM com o seu Orçamento da RAM para 2013 afronta diretamente a decisão do Tribunal Constitucional consubstanciada no Acórdão n.º 353/2012, publicado no Diário da República, 1.ª Série, de 20 de julho de 2012, que declarou a inconstitucionalidade das normas do Orçamento de Estado para 2012 que previam a redução remuneratória e a suspensão total ou parcial do subsidio de férias, quando insiste na redução remuneratória e na suspensão total ou parcial do subsídio de férias para os funcionários da administração pública regional.»
2. Por despacho do Presidente, de 26.02.2013, foram os requerentes notificados para «suprir a falta de indicação das normas cuja apreciação se requer» (cfr. fls. 24 dos autos).
O deputado primeiro signatário do pedido veio apresentar resposta com o seguinte teor:
«Carlos João Pereira, deputado, tendo sido notificado do despacho proferido por este Tribunal a 26.02.2013, no processo à margem identificado, vem esclarecer, nos termos e para os efeitos do art. 51.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, que as normas cuja apreciação requer são o artigo 1.º a 62.º, todos do Decreto Legislativo Regional n.º 42/2012, publicado em Diário da República, I Série, n.º 252, de 31 de dezembro de 2012.»
3. Nos termos da invocada alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição, têm legitimidade para requerer a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, com força obrigatória geral, designadamente, «um décimo dos deputados à respetiva Assembleia Legislativa, quando o pedido de declaração de inconstitucionalidade se fundar em violação dos direitos das regiões autónomas ou o pedido de declaração de ilegalidade se fundar em violação do respetivo estatuto.»
De acordo com o n.º 1 do artigo 51.º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, com as alterações posteriores, adiante designada LTC), o pedido de fiscalização abstrata da constitucionalidade ou da legalidade «deve especificar, além das normas cuja apreciação se requer, as normas ou os princípios constitucionais violados».
No caso vertente, tendo-se verificado a falta de indicação de um dos elementos referidos – a identificação das normas cuja apreciação se requer – foram os requerentes, através do despacho acima mencionado, convidados a suprir tal deficiência (cfr. n.º 3 do artigo 51.º da LTC).
Acontece que a resposta dos requerentes não supriu a falta identificada, uma vez que se limita a afirmar que se pretende a apreciação dos «artigos 1.º a 62.º» do Decreto Legislativo Regional n.º 42/2012/M, ou seja, de todos os preceitos legais que compõem este diploma que aprova o Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2013.
Por outro lado, como consta do pedido inicial, os requerentes, apesar de anunciarem que o pedido se reporta à “fiscalização sucessiva abstrata da legalidade”, na verdade, vêm invocar dois fundamentos distintos, um de ilegalidade e outro de inconstitucionalidade: por um lado, suscitam a ilegalidade (aparentemente, por violação dos artigos 40.º, alínea ff), e 69.º, alínea n), do EPARAM), que imputam ao facto de o Governo Regional da Madeira ter apresentado, e a Assembleia Regional ter aprovado, «uma proposta de orçamento na qual acolhe todas as normas do Orçamento de Estado para 2013, sem adaptar as suas regras à realidade madeirense e sem expurgar as inconstitucionalidades que adiante se apontam, como era sua obrigação»; por outro lado, invocam a inconstitucionalidade de normas da Lei do Orçamento Regional para 2013 (que não indicam quais), decorrente da alegada inconstitucionalidade das normas do Orçamento de Estado para 2013 (também não identificadas), que aquelas reproduzem, por violação, segundo se percebe, dos artigos 13.º, 18.º, n.º 2, 104.º, n.º 1, da Constituição, e ainda, da alegada força de caso julgado decorrente do Acórdão n.º 353/2012 deste Tribunal.
Ainda que se pudesse identificar, com o mínimo de precisão, as normas objeto do citado pedido de inconstitucionalidade – o que sempre caberia aos requerentes e não ao Tribunal –, sempre se verificaria que os requerentes carecem de legitimidade para um tal pedido de declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por o mesmo não se fundar em violação dos direitos das regiões autónomas (cfr. alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição).
Da mesma forma, não pode admitir-se o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, desde logo, por falta de especificação do seu objeto. A indicação de que se pretende uma pronúncia do Tribunal sobre todo o diploma regional é, no caso, manifestamente insuficiente, atendendo à variedade e diversidade de normas que o Decreto Legislativo Regional n.º 42/2012/M contém e à incerteza sobre quais as normas que os requerentes consideram que, sob pena de violação do EPARAM, careciam de adaptações à Região Autónoma da Madeira, pois só sobre estas – que, repete-se, se desconhece quais sejam – verdadeiramente, os requerentes formulam um pedido de ilegalidade (sem cuidar agora de saber se o fundamento para a ilegalidade está suficientemente sustentado).
Em suma, não pode o Tribunal substituir-se aos requerentes, construindo o objeto do pedido de fiscalização abstrata que aqueles, não obstante convite expresso para o efeito, se escusaram a especificar.
4. Pelo exposto, decide-se não admitir o pedido, ao abrigo do disposto no artigo 52.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.
Lisboa, 13 de março de 2013. – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Ana Guerra Martins – Pedro Machete – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – José da Cunha Barbosa – Catarina Sarmento e Castro – Maria José Rangel de Mesquita – João Cura Mariano – Fernando Vaz Ventura – Maria Lúcia Amaral – Joaquim de Sousa Ribeiro.
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