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Processo n.º 718/04
3.ª Secção Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. reclama para a conferência do despacho de fls.868 que, por não vir subscrito por advogado, não lhe admitiu a junção ao processo de um requerimento em que reclamava para a conferência de decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso.
Assinando agora como “advogado estagiário em causa própria”, o reclamante
- arguiu a nulidade do despacho reclamado por falta de fundamentação;
- pede a revogação do mesmo despacho, com fundamento em que, gozando de apoio judiciário, deveria o relator ter-lhe nomeado defensor, antes de ordenar a devolução do requerimento.
2. Interessa destacar as ocorrências processuais seguintes:
a) Em 11 de Outubro de 2004 (fls. 826-835), o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso interposto pelo ora reclamante, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, do acórdão do Tribunal da Relação de Évora que confirmara a decisão de 1ª instância que o condenara, pela prática dos crimes de falsificação de documento autêntico e de injúria e difamação agravadas, na pena de 2 anos e 4 meses de prisão, com suspensão da execução da pena pelo período de 3 anos, condicionada ao pagamento de indemnização aos ofendidos. b) Em 26 de Outubro de 2004 (fls. 841), o reclamante apresentou um requerimento pedindo além da aclaração desta decisão sumária, a remessa do processo ao Tribunal da Relação de Évora, a fim de ser apreciada uma arguição de nulidade e a prescrição do procedimento criminal. c) Nas intervenções referidas nas alíneas antecedentes, o reclamante agiu representado pelo Advogado Dr. B., conforme procuração datada de 1 de Outubro de
2002 e junta aos autos na sessão da audiência de julgamento em 1ª instância realizada em 22 de Outubro de 2002 (fls. 515); d) Por ofício de 18 de Outubro de 2002, na sequência de pedido de escusa de anterior patrono oficioso, a Ordem dos Advogados comunicara ao Tribunal de Olhão da Restauração a nomeação do Dr. B. para o patrocínio do arguido, ora reclamante. e) Em 16 de Novembro de 2004, o Dr. B. renunciou ao mandato (fls 852). f) O recorrente foi notificado da renúncia e para constituir novo mandatário, nos termos do artigo 39.º do Código de Processo Civil, por carta registada de 19 de Novembro de 2004 (fls. 854). g) O recorrente não constitui novo mandatário no prazo de 20 dias e nada requereu. h) Em 6 de Janeiro de 2005 foi proferido despacho a indeferir o requerimento referido na antecedente alínea b), determinando-se expressamente a notificação ao reclamante, nos termos do n.º 1 do artigo 255.º do Código de Processo Civil. i) Em 21 de Janeiro de 2005, o reclamante apresentou um requerimento, por si assinado, reclamando para a conferência da decisão sumária referida na antecedente alínea a). j) A secretaria prestou a seguinte informação:
“Em 26/Janeiro/05, com a respeitosa informação de tenho dúvidas quanto à junção dos autos do requerimento que fica por linha, dado o mesmo não vir subscrito por advogado, face ao preceituado no art.º 83.º. n.º 1 da Lei n.º 28/82 à renúncia de fls. 852, e à notificação de fls. 854 e 859. Pelo exposto, abro conclusão a V. Exa. a fim de ordenar o que tiver por conveniente.”
k) O relator proferiu, na mesma folha do processo, o seguinte despacho:
“Pelas razões da informação que antecede, que faço minhas, não admito o requerimento, ordenando a sua devolução ao apresentante.”
3. Cumpre apreciar a reclamação (n.º 2 do artigo 78.º-B da LTC).
3.1. A secretaria abriu “conclusão” ao relator, expondo dúvidas quanto à junção do requerimento de reclamação para a conferência [supra 2.i)], com minuciosa indicação das razões de facto (ocorrências processuais) e direito que as motivavam [supra 2.j)]. Com a remissão expressa constante do despacho reclamado
– o que não é proibido pelo n.º 2 do artigo 158.º do CPC, porque não se trata de adesão passiva aos fundamentos alegados por uma das partes, mas de resolver dúvidas colocadas pela secretaria –, essas razões passaram a integrar o despacho reclamado. Ora, o seu teor foi incluído na notificação deste despacho, de modo que o destinatário de tal notificação ficou em condições de saber que não se admitia a reclamação por não vir subscrita por advogado, como exige o n.º 1 do artigo 83.º da LTC.
Assim, a arguição de nulidade do despacho reclamado por falta de fundamentação é manifestamente improcedente.
3.2. O n.º 1 do artigo 83.º da LTC estabelece a regra de patrocínio judiciário obrigatório. No caso, após a junção da procuração [supra 2.c)], o recorrente passou a estar representado em juízo pelo advogado constituído, nessa qualidade, e não por defensor oficiosamente nomeado. Cessou, para este efeito, o apoio judiciário (artigo 46.º da Lei n.º30-E/2000, de 20 de Dezembro). Nestas circunstâncias, a renúncia ao mandato desencadeia o procedimento previsto no artigo 39.º do Código de Processo Civil – o que no caso foi respeitado – e não, como o recorrente pretende, quaisquer diligências com vista à nomeação de patrono pela Ordem dos Advogados.
Importa, apenas, deixar uma observação : naqueles casos em que a parte que recorre para o Tribunal Constitucional ocupa a posição de réu (lato sensu, sujeito passivo do processo) na causa de que emerge o incidente de constitucionalidade, não há lugar à suspensão da instância mas ao prosseguimento dos termos do recurso, aproveitando-se os actos praticados pelo mandatário
(artigo 39.º, n.º 3, do Código de Processo Civil). Por isso, perante o silêncio do interessado, o processo prosseguiu após o termo do prazo para a constituição de novo advogado.
Por outro lado, não há lugar – ao menos nos casos em que o arguido é recorrente, deixando-se de remissa a hipótese inversa, em que os interesses confluentes podem apresentar-se de modo diverso – à nomeação obrigatória de defensor por aplicação da alínea d) do n.º 1 do artigo 64.º do Código de Processo Penal. Os recursos ordinários ou extraordinários a que o preceito se refere são os recursos como tal regulados no Código (artigos 399.º e ss.) e não o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, que não se enquadra em qualquer dessas categorias. O recurso de constitucionalidade é um recurso sui generis, regulado, seja qual a natureza do processo em que a questão de constitucionalidade se enxerta, pela LTC e, subsidiariamente, pelas normas do Código de Processo Civil, em especial as respeitantes ao recurso de apelação
(artigo 69.º da LTC).
Assim, inserindo-se a reclamação ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC no âmbito dos actos que a parte só pode praticar através de advogado
(cfr. n.º 2 do artigo 32.º do Código de Processo Civil) e não tendo o reclamante invocado, ao apresentar requerimento, apenas assinado por si, em que pretendeu exercer essa faculdade, título que lhe permitisse exercer advocacia em causa própria, só resta confirmar o despacho que não admitiu a prática do acto.
4. Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação e condena-se o reclamante nas custas, fixando a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 25 de Fevereiro de 2005
Vítor Gomes Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Artur Maurício