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Procº nº 366/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Supremo Tribunal de Justiça e em que figuram, como recorrente, A. e, como recorridos, o Ministério Público e B., concordando-se, no essencial, com a exposição lavrada pelo relator de fls.
287 a 292, que aqui se dá por integralmente reproduzida - mais precisamente, porque, de todo o modo, o artº 127º do Código de Processo Penal não foi minimamente aplicado, no acórdão impugnado, com o sentido que o recorrente considerou inconstitucional no requerimento de interposição do recurso -, exposição essa à qual o Ministério Público deu total anuência e que a
«pronúncia» do recorrente não abala, decide-se não tomar conhecimento do recurso, condenando-se o recorrente nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em oito unidades de conta.
Lisboa, 8 de Outubro de 1997 José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia José Manuel Cardoso da Costa
EXPOSIÇÃO PRÉVIA Procº nº 366/97.
2ª Secção.
1. Por acórdão de 2 de Maio de 1996, lavrado pelo tribunal colectivo da 8ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, foi A. condenado, como autor de factos que foram subsumidos à prática de um crime de prisão ilegal, previsto e punível pelo artº 417º, nº 1, do Código Penal, na pena de três anos de prisão, dos quais foi desde logo considerado perdoado um, sendo ainda condenado no pagamento, a título de indemnização ao ofendido, de um milhão de escudos.
Desse acórdão recorreu o arguido para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo, por entre o mais que ora não releva, referido na motivação de recurso que:-
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10 - O ACÓRDÂO RECORRIDO AO CONFUNDIR OS INSTITUTOS DA DETENÇÂO, PRISÂO ILEGAL E DE CONDUÇÂO DO ASSISTENTE A UM POSTO POLICIAL PRATICA UM CLAMOROSO ERRO DE QUALIFICAÇÂO JURÌDICA.
11 - E INDUZ EM ERRO NA APRECIAÇÂO CRÌTICA DA PROVA AO DAR COMO PROVADO QUE O DOC DE FLS 12 - UMA NOTICIA NA IMPRENSA - TRADUZ UMA VERSÂO DO PRÓPRIO RECORRENTE ONDE O ASSISTENTE AÍ É IDENTIFICADO QUANDO TAL NOTICIA É DE CARÁCTER GENÉRICO E SEM QUE AO RECORRENTE TENHA, EM MOMENTO SIDO IMPUTADA A SUA AUTORIA E, OU, PUBLICAÇÂO E, NA QUAL APENAS SE REFERE UM 'B.'....
12 - OS FACTOS A TEREM OCORRIDO NUM BAIRRO DEGRADADO ONDE EXISTEM MANIFESTOS
ÓDIOS CONTRA A POLICIA E ONDE SÂO FREQUENTES OS CONFLITOS COM AS FORÇAS POLICIAIS - A IMPRENSA DIÁRIA ESCRITA E FALADA FAZ ECO DOS MESMOS - COM UMA
'CULTURA DE GUETTO' - E ONDE O ASSISTENTE VIVE E É MUITO CONHECIDO - CULMINARIAM SEMPRE NO DESCRÉDITO DO RECORRENTE, ENQUANTO AGENTE DA P S P E NUMA INDEFESA POR NÂO TER MEIO RACIONAL DE CONVENCER DO CONTRÁRIO, NUMA VERSÂO CONTRA VERSÂO, NUMA CLARA FRAGILIDADE POR PARTE DO RECORRENTE, PELO QUE,
13 - A DAR-SE AMPLO ENTENDIMENTO AO PRINCIPIO DA LIVRE CONVICÇÂO PREVISTO NO ART
127 DO C P P, ESTAR-SE-Á A FAZER UMA INTERPRETAÇÂO INCONSTITUCIONAL DO PRECEITO POR CONTRÁRIA AO ART 32 - 1 DA C R P.
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Por acórdão de 19 de Dezembro de 1996, o Supremo Tribunal de Justiça concedeu parcial provimento ao recurso, absolvendo o arguido da condenação em indemnização cível, no mais confirmando a decisão prolatada em 1ª instância.
Nesse aresto, e por maiores esforços que se façam, não se vislumbra, minimamente que seja, que aquele Alto Tribunal tenha, em algum passo, convocado, para o juízo decisório nele contido, a norma ínsita no artº 127º, nº
1, do Código de Processo Penal, designadamente com uma interpretação (que, de qualquer modo, na motivação do recurso apresentada pelo arguido se não concretiza, de todo em todo, de modo claro e perceptível) que o mencionado arguido reputaria de desconforme com a Lei Fundamental.
Notificado do citado acórdão de 19 de Dezembro de 1996, veio o arguido arguir duas nulidades, consistindo a primeira numa omissão de pronúncia devida ao facto de, na sua óptica, não se ter tal aresto debruçado sobre matéria alegada no recurso e consubstanciada na inexistência de inquérito, o que implicaria a ocorrência de nulidade principal dos autos, e residindo a segunda na circunstância de aquele acórdão não conter a assinatura de um dos juízes, vindo a mesma a ser substituída pela menção, efectuada pelo Conselheiro Relator, de que tinha voto de conformidade de um dos Conselheiros Adjuntos, que não assinava por se não encontrar presente.
Por acórdão de 3 de Abril de 1997 foi a nulidade correspondente à omissão de pronúncia corrigida, sendo indeferida a segunda.
Notificado deste último acórdão, interpôs o arguido, fundado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, recurso para o Tribunal Constitucional, visando, por intermédio do mesmo, a apreciação das:
'inconstitucionalidade do art 127 do Cod. Proc. Penal por violação do art 32 - 1 da Lei Fundamental quando entendido no sentido de que o principio da livre convicção pode arredar os dados da experiência comum e as regras técnicas do apuramento factual gerando indefesa na pessoa do arguido por não ter meio racional de convencer do contrário e quando está em causa apenas versão contra versão de arguido e queixoso dado que quem tem interesse na causa não pode fazer prevalecer uma versão contrariada pela do visado';
'inconstitucionalidade dos arts 119 - D) e 262 do CPP por violação do artigo 32 - 1 e 5 da C.R.P.'.
Por despacho proferido pelo Conselheiro Relator em 11 de Junho de 1997 foi o recurso admitido.
Todavia, porque tal despacho não vincula este Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82) e porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a presente exposição, na qual se propugna por se não dever tomar conhecimento da vertente impugnação.
2. Na verdade, e como resulta do que acima já se disse, tocantemente à norma constante do artº 127º do Código de Processo Penal (recte, ao nº 1 daquele artigo), muito embora na motivação do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça o arguido tivesse sustentado que tal normativo seria inconstitucional se e quando interpretado de uma forma que, como se viu, não foi minimamente indicada de modo claro e perceptível, o que é certo é que aquele mais elevado Tribunal da ordem dos tribunais judiciais jamais convocou ou fez apelo, directa ou indirectamente, ao preceito em que tal norma se contém e, o que é mais, de molde a conferir-lhe uma interpretação que no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade é intentada esclarecer.
Falta, assim e neste particular, um dos pressupostos do recurso a que se reporta a aludida alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº
28/82, justamente aquele que consiste em ter a decisão sob censura aplicada a norma (ou a norma numa certa interpretação) que, antes da sua prolação, foi reputada como inconstitucional pelo recorrente.
2.1. Pelo que concerne aos artigos 119º, alínea d), e 262º, ambos do Código de Processo Penal, nunca sobre as mesmas, antes dos acórdãos de
19 de Dezembro de 1996 e 3 de Abril de 1997, fez o recorrente recair algum juízo de suspeita sobre a sua compatibilidade constitucional, contrariamente ao que pretende fazer crer no requerimento de interposição de recurso.
Para esta asserção basta ler atentamente o que o mesmo fez escrever no requerimento de fls. 261 a 263 (requerimento no qual se arguiram nulidades do acórdão de 19 de Dezembro de 1996) e na motivação do recurso interposto da decisão de 1ª instância (maxime fls. 177 e 178 e conclusão 6ª).
Daí que, quanto as estas normas, falte um pressuposto do recurso, qual seja o da não suscitação, durante do processo, da questão de inconstitucionalidade.
Cumpra-se a parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82.
Lisboa, 11 de Julho de 1997.