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Proc. nº 78/92
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - No acórdão nº 344/97, o Tribunal Constitucional decidiu não tomar conhecimento do recurso interposto por A.. Na verdade, a decisão recorrida, do Supremo Tribunal Administrativo, considerara ilegítima a entidade demandada, pelo que o conhecimento do recurso de constitucionalidade não obteria sobre essa decisão qualquer eficácia.
O recorrente vem agora requerer 'a reforma ou aclaração' do mesmo acórdão, concretizando, assim, o seu pedido:
'1. Não se tomou conhecimento do recurso por se considerar que a Caixa é 'pessoa jurídica diferente do Estado', entidade demandada.
Só que,
2. O TC, quiçá, não terá atentado que a CGD não podia ser demandada. Com efeito,
3. A Caixa funciona como entidade depositária.
Ora,
4. O depósito aí efectuado, no caso de caução crime, não tem a mesma natureza de muitos outros depósitos obrigatórios.
5. No caso de caução-crime, o Tribunal ordena um depósito.
6. A Caixa irá remunerar esse depósito conforme o seu Regulamento.
Contudo,
7. No caso de caução-crime, o que, por fim é devolvido, tem de ser igual ao depósito efectuado.
Por isso,
8. O Estado deve a diferença entre a remuneração da sua depositária e aquilo a que o caucionante tem direito. Ou seja,
9. O Estado não se pode escudar no facto de ser a Caixa que foi depositária do dinheiro - nem foi o caucionante que escolheu o depositário.
Daí,
10. O caucionante nada tem a exigir à Caixa.
11. O caucionante tem indubitavelmente direito a ser reembolsado por inteiro do depósito a que foi intimado.
12. De contrário, não há restituição integral.
E,
13. Com isso, ofendem-se os efeitos da prescrição extintiva.
Ou seja,
14. Esse Tribunal não esclareceu as seguintes questões:
a) Deve, ou não, uma quantia em dinheiro, depositada à ordem de instância-crime, ser restituída por inteiro se for declarada a prescrição extintiva de um procedimento criminal?
b) Devolvendo o Estado, anos depois, a caução acrescida apenas dos juros à taxa regulamentar da CGD, está o Estado a devolver o dinheiro correspondente ao valor caucionado?
c) Escudando-se o Estado no referido Regulamento da Caixa para não entregar a diferença entre esse 1% e as reais taxas de desvalorização da moeda, não é flagrante a inconstitucionalidade do invocado para o caso, nº 2 do art.
26º do DL 694/70, de 31 de Dezembro?
Ora,
15. O TC, parece, não enfrentou a questão de fundo, substantiva, desviou-se para uma, embora aparente, questão adjectiva.
Todavia,
16. Parece evidente, que às questões das als. a) e b), o TC responderá afirmativamente.
Por isso,
17. Respondia também afirmativamente à questão da al. c) se tivesse apresentado tal questão.
Sendo assim,
18. Não se percebe, e nem está de modo algum esclarecido - o que se pede - porque se não enfrenta a responsabilização do Estado?
19. Não viola o Estado, a coberto de tal D.L. o conteúdo essencial de um direito fundamental do cidadão de ver repostos, por inteiro, os valores mobiliários depositados em casos de caução-crime?
De tudo, espera-se que o TC reforme, e, pelo menos, aclare, o douto acórdão - arts. 78º-A e 69º da Lei 85/89 e art. 669º do CPC, e que, no caso específico de restituição de caução-crime, considere inconstitucional a aplicação exclusiva do dispositivo legal que vem permitindo ao Estado iludir a retenção que fez do diferencial para o valor do depósito-caução.
Esclarecendo a questão, e, em conformidade, considerando, a final, a inconstitucionalidade, no caso, do DL 694/70, de 31 de Dezembro, por violação dos arts. 16º, 62º, 29º, nº 6 (final), e 266º, todos da CRP, e art. 17º da DUDH, com a consequente aplicação, também pelo devedor Estado, das taxas de desvalorização da moeda, com a consequente obrigação do estado da reposição integral da caução-crime [...]'.
II - 1 - O pedido de aclaração destina-se ao 'esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade' da sentença [Código de Processo Civil, artigo 669º, nº 1, alínea a)]. Ora, no caso, como decorre dos próprios termos em que o pedido é formulado, o acórdão nº 344/97, de que se pede aclaração, não suscitou qualquer dúvida ao reclamante. Do que se trata é, antes, de uma discordância dos fundamentos e do sentido dessa decisão. Mas para isso não serve
o pedido de aclaração.
2 - O pedido de reforma da decisão pressupõe manifesto lapso na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos, ou ainda, manifesto lapso na consideração de quaisquer elementos que aqui implicassem conhecimento do mérito na procedência do recurso [Código de Processo Civil, artigo 669º, nº 2, alíneas a) e b)]. No acórdão nº 344/97, esses pressupostos não se verificam, como é evidente. Para mais, esta norma nova não é aplicável aos processos pendentes.
III - Nestes termos, decide-se indeferir o requerimento de reforma e aclaração do acórdão nº 344/97. Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em três unidades de conta.
Lisboa, 18 de Junho de 1997 Maria da Assunção Esteves Antero Alves Monteiro Diniz Vítor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Maria Fernanda Palma Armindo Ribeiro Mendes José Manuel Cardoso da Costa