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Processo n.º 804/04
2.ª Secção Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A., recorrente nos presentes autos, reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 78º-B da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do despacho proferido pelo relator no Tribunal Constitucional que indeferiu o seu pedido de que “nos termos da norma que se extrai do n.º 4 do art.º 80º do Código das Custas Judiciais [...] seja o recurso recebido por ter por efeito manter a liberdade do arguido” e que julgou deserto o recurso interposto para o Tribunal Constitucional nos termos do n.º 7 do art.º 75º-A da LTC.
2 – Como fundamento da reclamação o recorrente aduz o seguinte:
«Pretende-se com a presente reclamação que seja assegurada a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos nos termos da norma que se extrai do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
I. Violação do Direito à tutela jurisdicional efectiva
As decisões jurisdicionalmente equilibradas só se podem obter com a submissão dos órgãos da função jurisdicional ao resultado da procura e da compreensão das circunstâncias em que os direitos e os deveres de cada um foram criados, por ser nessas circunstâncias que reside a equidade (o equilíbrio de interesses, a justiça material).
Sem a confiança na garantia efectiva dos direitos, o indivíduo não tem confiança em si próprio. A confiança de cada pessoa no Estado-juiz depende da justiça das decisões jurisdicionais, e não da certeza do direito que advém da aplicação mecânica das normas.
No caso concreto, o ora recorrente respondeu ao convite efectuado pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator do Tribunal Constitucional, para dar cumprimento ao disposto no artigo 75º-A da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro.
Por esse motivo, deve ser apreciado o recurso interposto pelo recorrente e não ser julgado deserto, apenas pelo facto de não ter sido paga a multa dentro do prazo legal, quando foi requerido pelo próprio a emissão de novas guias para pagamento da multa de € 89,00 ! A lei, além de poder não transportar consigo qualquer vestígio de justiça, pode mesmo, como sucedeu com o despacho do Ex.mo Juiz Conselheiro converter-se em um modo de organização anti-jurídico ! Para dar cumprimento ao convite formulado no despacho datado de 7 de Outubro de
2004, que se presumiu notificado no dia 11 de Outubro de 2004, o ora recorrente enviou o requerimento de folhas 369 e ss. por fax no dia 22 de Outubro de 2004
às 9h07 da manhã, ou seja, o dia da notificação não conta para efeitos de contagem de prazo, contando dez dias a partir do dia 12 de Outubro que termina a
22 de Outubro, data do envio do respectivo requerimento. Ao ser-lhe negada a faculdade de interpor recurso devido a um sancionamento de cariz meramente processual, violam-se as garantias de defesa do ora recorrente, viola-se o princípio da descoberta da verdade material e a tutela efectiva dos direitos. A justiça devida a cada pessoa, além da participação desta, exige como condição a proximidade entre o órgão do Estado e o direito contextual próprio de cada caso decidendo, proximidade sem a qual não é possível realizar a ponderação de todos os bens jurídicos em confronto. Por esta razão, sendo necessária a proximidade com o caso concreto para que o estado com os seus juízos não coloque em perigo os valores superiores da nossa ordem jurídica, e estando esta tarefa reservada aos órgãos da função jurisdicional1, o juiz tem necessariamente de ter o poder e a obrigação de afastar o uso da lei, sempre que com o seu uso viole o direito contextual de cada caso. Se assim é, como estamos convictos que é, compete a V. Eªs , neste caso decidendo, preencher o conteúdo específico do direito á tutela jurisdicional efectiva, tarefa na qual têm de ter sempre em consideração a realidade das circunstâncias concretas de cada situação juridicamente relevante2 (o direito contextual) e, se necessário for, têm ainda de afastar o uso dos comandos do legislador, mesmo se abstractamente constitucionais. São estas exigências que obrigam o juiz a deixar de operar com o conceito de homem ideal, ou com o conceito bom pai de família3, e que o remetem para a análise da vida de cada pessoa em concreto, para o homem situado na sua vida.
No caso concreto, a justiça a realizar implica que não se possa usar os critérios do legislador, devendo a decisão jurisdicional de ter exclusivamente em consideração a ideia de justiça vigente numa determinada situação4 , o que faz com que o direito contextual não possa ser lesionado ou afastado pelo legislador ou pelo juiz sem que lesione a autonomia da pessoa humana. Quando os órgãos da função jurisdicional, devendo-o fazer, não garantem efectivamente os direitos de cada um, estamos perante uma lesão de um direito fundamental subjectivo (o direito á tutela jurisdicional efectiva)5 que tem consequências devastadoras na autonomia da pessoa humana.
II – Violação do n.º 4 do artigo 80º do Código das Custas Judiciais com a interpretação com que foi aplicada pelo Exmo. Juiz Relator
No despacho que ora se reclama, o Exmo. Juiz Relator refere que 'a situação dos autos tem a natureza de um sancionamento de cariz meramente processual por o arguido não praticar, no recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade admitido, o acto de resposta ao convite do relator efectuado nos termos do n.º 5 do artigo 75º-A da LTC dentro do prazo peremptório estabelecido.'
É deste entendimento que o ora recorrente se permite discordar , porque o disposto no n.º 4 do artigo 80º do Código das Custas Judiciais prevê que o recurso que tenha por efeito manter a liberdade do arguido seja recebido independentemente da taxa de justiça de interposição. Assim, interposto o recurso com vista a recuperar a liberdade, o mesmo deve ser admitido. Como se compreende, a realização da justiça que a nossa Constituição ordena, convoca um juiz que na execução da sua tarefa, como diz PAULO FERREIRA DA CUNHA, não se comporte como «uma máquina de resolver silogismos6, porque a qualidade da justiça que se pretende só se pode obter, como refere LUÍS CABRAL MONCADA,
«mediante a avaliação dialéctica de factos e valores7».
É por esta razão que os órgãos da função jusrisdicional têm de ter capacidade para penetrar no interior dos direitos, porque, efectivamente, como ensina CASTANHEIRA NEVES, a justiça é um valor «imanente aos acontecimentos da vida social - mais precisamente, vai implicada na dialéctica de acontecimento da vida e norma, de ser e dever ser8». As decisões juridicamente equilibradas só se podem obter com a submissão dos
órgãos da função jurisdicional ao resultado da procura e da compreensão das circunstâncias em que os direitos e os deveres dos arguidos foram criados, por ser nessas circunstâncias que reside a equidade (o equilíbrio de interesses; a justiça material). A ideia de justiça vigente numa determinada situação, só pode ser captada no direito contextual próprio da cada situação9 10.
Conclusões
1) Houve uma clara violação do direito á tutela jurisdicional efectiva do ora recorrente: O direito á tutela jurisdicional efectiva do direito é um direito fundamental que sujeita directamente o estado-juiz, pelo que não necessita da mediação do legislador ordinário para o concretizar.
2) Ao abrigo do princípio da descoberta da verdade material e da tutela efectiva do direito dos ora recorrentes, deve ser admitido o recurso para o Tribunal Constitucional, para assegurar a defesa de direitos e interesses legalmente protegidos do ora recorrente.».
3 – O Procurador-Geral Adjunto no Tribunal Constitucional respondeu dizendo:
«1- A presente reclamação carece manifestamente de fundamento.
2- Na verdade, é evidente que o efeito produzido, no que toca ao não conhecimento do recurso interposto, é exclusivamente imputável à falta de diligência na condução da lide, decorrente do não cumprimento atempado dos ónus que recaíam sobre o recorrente, nos termos do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
3- Deixando identicamente - e de forma negligente - de aproveitar a oportunidade processual que lhe foi facultada de suprir as deficiências do requerimento de interposição de recurso.
4- Bem como de aproveitar a possibilidade que decorre do artigo 145º, n.ºs
5 e 6, do Código de Processo Civil, de 'validar' os efeitos do acto praticado para além do prazo peremptório - matéria que nada tem que ver com a das 'taxas de justiça' a que alude o artigo 80º, n.º 4, do Código das Custas Judiciais.
5- Ora, como é evidente e incontroverso, o princípio da tutela jurisdicional efectiva em nada obsta a que as partes sejam responsabilizadas pelas consequências de uma litigância negligente, que não se preocupa minimamente com o cumprimento de prazos e ónus que sobre elas incidem.».
4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
«1 – A. foi notificado por carta registada de 7 de Outubro de 2004 do despacho do relator no Tribunal Constitucional, proferido nestes autos,
“para no prazo de 10 dias, dar cabal cumprimento ao disposto no artigo 75º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão” (LTC).
2 – O recorrente presume-se notificado desse despacho no dia 11 de Outubro, em virtude de o dia 10 ter recaído em domingo, de acordo com o disposto no art.º 254º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art.º 69º da LTC.
Visando dar cumprimento ao convite referido na alínea anterior, o recorrente enviou por fax expedido no dia 22 de Outubro de 2004 o requerimento de fls. 369 e segs.
3 – Porque o prazo para a prática do acto sem pagamento de qualquer multa terminou no dia 21 de Outubro e o recorrente não solicitou guias para o pagamento imediato da multa devida pela prática do acto no 1º dia útil para além do prazo legal nos termos do n.º 5 do art.º 145º do CPC, a secretaria liquidou a multa devida nos termos do n.º 6 do mesmo artigo e notificou o recorrente, por carta registada de 26 de Outubro de 2004, para proceder ao pagamento dessa liquidação no prazo contínuo de 10 dias, prazo esse que terminou em 8/11/2004, dada a notificação do recorrente se presumir feita em 29 de Outubro, por mor daquele preceito do n.º 2 do referido art.º 254º do CPC.
4 – Em 15 de Novembro de 2004 – ou seja muito para além do termo do prazo para o pagamento da multa nos termos do n.º 6 do art.º 146º do CPC – o recorrente veio requerer que “nos termos da norma que se extrai do n.º 4 do art.º 80º do Código das Custas Judiciais, que o recurso seja recebido por ter por efeito manter a liberdade do arguido”.
No mesmo requerimento “requer a emissão de novas guias para pagamento da multa de € 89,00 pelo facto de desconhecer o paradeiro do arguido, não tendo conseguido contactar este último no prazo estipulado”.
5 – Antes de mais cumpre acentuar ser irrelevante o facto de a senhora advogada não ter conseguido contactar o seu cliente dentro do prazo”, dado o acto a praticar não ter a natureza de um acto pessoal a praticar pelo arguido, pelo que o advogado exercendo o respectivo direito do arguido bem o podia ter praticado, de acordo com o disposto no art.º 36º do CPC, aqui aplicável por força do disposto no art.º 69º da LTC.
Por outro lado, é de notar ainda que a multa devida tem como causa a falta de prática de um acto - a apresentação da resposta ao convite efectuado pelo relator no Tribunal Constitucional referido supra, cuja responsabilidade cabe ao advogado - dentro do prazo processual em que o devia ter sido e a sua prática apenas no primeiro dia útil para além desse prazo, de acordo com o disposto nos n.ºs 5 e 6 do art.º 145º do CPC.
Esta última circunstância afasta, desde logo, a situação em causa do
âmbito da hipótese a que se refere o n.º 4 do art.º 80º do Código das Custas Judiciais. Na verdade, ao contrário do que aí acontece, a multa em dívida não corresponde a qualquer taxa que seja devida pela interposição ou seguimento de recurso de decisão que tenha decretado ou mantido a privação de liberdade do arguido – na situação dos autos, de acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que rejeitou o recurso interposto de acórdão da Relação que manteve a condenação do arguido decretada pela 1ª instância na pena de três anos e seis meses de prisão, pela prática de um crime de homicídio cometido por omissão, p.e p. pelos art.ºs 131º,
10º, n.ºs 1 a 3 e 72º do Código Penal - mas tem antes a natureza de um sancionamento de cariz meramente processual por o arguido (através do seu advogado) não praticar, no recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade admitido, o acto de resposta ao convite do relator efectuado nos termos do n.º 5 do art.º 75º-A da LTC dentro do prazo peremptório estabelecido.
Por outro lado, sendo o prazo de pagamento da multa um prazo peremptório, o seu decurso fez extinguir o direito de o praticar (art.º 145º, n.º 3, do CPC). Não existe qualquer disposição legal que faculte a emissão de novas guias para o seu pagamento “pelo facto de o advogado desconhecer o paradeiro do arguido e não ter conseguido contactá-lo dentro do prazo estipulado”. Acresce que nem sequer essa circunstância poderá ser relevada como correspondendo a um justo impedimento, nos termos do art.º 146º do CPC. Na verdade, independentemente de a impossibilidade de contacto com o arguido indiciar uma situação de incumprimento do mesmo das suas obrigações de arguido
(cfr. art.º 196º do Código de Processo Penal), verifica-se que o requerente nenhuma prova ofereceu no sentido de demonstrar a existência desse impedimento, como se exige no n.º 2 do art.º 146º do CPC, e por isso há que dá-lo como não provado.
6 – Por tudo o exposto indefere-se o requerimento do arguido referido no ponto 4 supra.
7 – Por outro lado resulta daí que não poderá considerar-se válido o requerimento de resposta ao convite feito pelo relator nos termos do n.º 5 do art.º 75º-A da LTC apresentado pelo arguido, a que se alude em 2, de acordo com o disposto nos n.ºs 5 e 6 do referido art.º 145º do CPC.
8 – E não podendo considerar-se válido esse requerimento há que considerar que o recorrente não respondeu ao convite efectuado pelo relator no Tribunal Constitucional e que por isso se impõe julgar deserto o recurso nos termos do n.º 7 do art.º 75º-A da mesma LTC, como se decide.».
B – Fundamentação
5 – Ao contrário do que o reclamante sustenta, embora aceitando a presunção da sua notificação do convite efectuado nos termos do n.º 5 do art.º
75º-A da LTC no dia 11 de Outubro de 2004, é seguro que o prazo para lhe responder terminou em 21 de Outubro de 2004, dado ser o dia em que se perfizeram
10 dias constados desde o dia imediato (dia 12) àquele em que se presume efectuada a dita notificação.
Sendo assim, havendo essa resposta sido apresentada no dia 22 de Outubro de 2004, é evidente que o foi fora do prazo legal.
6 – Pretexta, porém, o reclamante que, ao contrário do concluído pelo relator, se deverá atender a esta apresentação fora do prazo legal sob pena de violação do princípio da descoberta da verdade material e a tutela efectiva dos direitos.
Segundo ele, e em síntese, “no caso concreto, a justiça a realizar implica que não possa usar os critérios do legislador, devendo a decisão jurisdicional ter exclusivamente em consideração a ideia de justiça vigente numa determinada situação, o que faz com que o direito contextual não possa ser lesionado ou afastado pelo legislador ou pelo juiz sem que lesione a autonomia da pessoa humana”.
O reclamante defende assim que o juiz, fora do quadro de recusa de aplicação de norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, pois a não suscita, possa não aplicá-la para realizar o que tem por melhor justiça.
Mas independentemente de se poder questionar a competência do juiz para sobrepor o seu juízo ao do legislador fora do domínio de existência de inconstitucionalidade da norma aplicanda, é de concluir que tal situação não corresponde ao quadro fáctico-processual dos autos.
Na verdade, o reclamante gozou de três oportunidades para poder responder ao convite do relator e, desse modo, conseguir uma apreciação liminar do recurso interposto: a apresentação do requerimento de resposta ao convite do relator dentro do prazo de 10 dias que não se afigura que possa ser considerado prazo insuficiente atenta a natureza de um articulado que é de mero suprimento de deficiência de acto anterior que a parte já devia ter praticado de modo correcto; a apresentação com multa liquidada voluntariamente ao abrigo do disposto no n.º 5 do art.º 145º do CPC e a apresentação com pagamento da multa elevada ao dobro consequente de prévia notificação feita pela secretaria para o efeito, nos termos do n.º 6 do mesmo artigo. Não se pode assim dizer que o reclamante não pôde acautelar devidamente o exercício do seu direito a uma tutela efectiva, através do recurso de constitucionalidade, dos seus direitos. O não uso dos sucessivos prazos concedidos pela lei para poder praticar e validar o acto, o último dos quais precedido até de notificação expressa para o efeito, não pode deixar de ser havido como conduta processual manifestamente negligente e por isso não merecedora de tutela jurídica. A isto acresce que o acto a praticar dentro do prazo se trata de acto cuja prática compete apenas ao defensor e que essa prática ocorre até dentro do exercício normal da sua profissão. Finalmente, não se afiguram desadequados e desproporcionados os ónus processuais cujo estabelecimento pode ver-se no caso e cuja violação importou a consequência decretada pelo despacho reclamado, de fixação de um prazo para a resposta ao convite feito pelo relator tido como necessário à definição do objecto do recurso de constitucionalidade e de obrigatoriedade de pagamento de uma multa pecuniária variável consoante é paga imediatamente à prática do acto ou apenas mediante solicitação da secretaria e cuja variação encontra a sua razão de ser no maior atraso processual que nesta hipótese se verifica, pois que tais ónus desempenham uma função útil ao prosseguimento do processo enquanto sucessão normal de actos cujo momento de prática deve poder ser conhecido antecipadamente pelas partes (cf., a este respeito, os Acórdãos n.ºs 457/99,
646/99, 230/00, 191/03 e 724/04, respectivamente, publicados nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 44º vol. pp. 629 e 45º vol. pp. 461, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, publicado no Diário da República II Série, de 28 de Maio de 2003, e disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Não se vê assim como possa o reclamante imputar à actuação do Tribunal no que se refere ao seu juízo de ponderação/subsunção das específicas circunstâncias do caso concreto perante o Direito a violação do princípio da verdade material e do princípio da tutela efectiva dos seus direitos de defesa. Mesmo a entender-se, como faz o reclamante, que o não conhecimento do objecto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade importa a violação de tais princípios, um tal resultado apenas poderá ser imputado à actuação do próprio reclamante e como tal efeito dos seus próprios actos.
7 – Refuta ainda o reclamante o entendimento seguido no despacho reclamado de não haver o pagamento da multa estabelecida no art.º 145º, n.ºs 5 e
6, do CPC como “taxa de justiça” devida pela interposição de recurso que tenha por efeito manter a liberdade do arguido ou seja, como caso subsumível ao disposto no n.º 4 do art.º 80º, n.º 4, do Código das Custas Judiciais.
Não afasta, todavia, o reclamante a bondade da fundamentação em que aquele se abona e que aqui se renova.
A sua argumentação assenta, todavia, uma vez mais, no entendimento de o juiz poder sobrepor o critério normativo que tem por mais ajustado às especificidades do caso concreto ao critério definido pelo legislador.
Mas sendo assim valerão também aqui as considerações feitas no ponto anterior.
C – Decisão
8 – Destarte, atento tudo o exposto, decide o Tribunal Constitucional indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante com taxa de justiça que se fixa em 20 UC.
Lisboa, 1 de Fevereiro de 2005
Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Rui Manuel Moura Ramos
1 No sentido em que a reserva de jurisdição constitui um limite ao poder legislativo , cf. J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra,1998, pags.580, 588 e 589.
2 A unidade e a coerência podem ser racionalidade, mas nem sempre são verdade. Cf. A. Castanheira Neves, Dworkin e a interpretação jurídica - ou a interpretação jurídica. a Hermanêutica e a Narratividade, in, Estudos de Homenagem ao prof. Doutor Rogério Soares, Coimbra, 2001, p.286.
3 Abandonando o método e o percurso lógico dedutivo da interpretação e da aplicação da lei para adoptar outro, «construtivo» que lhe permita «uma compreensão aguda dos valores e necessidades presentes». (Cf. Luís S. Cabral Moncada, Estudos de Direito Público, Coimbra, 2001, p.295 ).
4 Cf. António Pedro Barbas Homem, O justo e o Injusto, Lisboa, 2001, p.83.
5 A interferência negativa do estado nos Direitos Fundamentais só se pode admitir se for justificada previamente com o benefício que essa restrição comporta para outros direitos fundamentais.
6 PAULO FERREIRA DA CUNHA, Res publica, Ensaios Constitucionais, Coimbra, 1998, p.105.
7 Cf. Luís S, CABRAL MONCADA, Estudos de Direito Público, Coimbra, 2001, p.186 e p. 288.
8 Cf. A. CASTANHEIRA NEVES, Dworkin e a interpretação Jurídica - ou a Interpretação Jurídica e Hermenêutica e a Narratividade, in, Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares, Coimbra, 2001, p.322.
9 Sob pena de o juiz se tornar cúmplice do legislador nas injustiças sempre que a lei não é justa, ou sempre que do seu uso resultem situações antijurídicas.
(Cf. ALAIN MINC, au nom de Ia loi, Paris, 1998, p.115 ).
10 Cf. ANTÓNIO PEDRO BARBAS HOMEM, O justo e o Injusto, Lisboa, 2001, p.83.
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050053.html ]