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Processo n.º 20/05
1.ª Secção Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. A. e mulher, B., deduziram reclamação do despacho do Conselheiro Relator que, no Supremo Tribunal de Justiça, não admitiu os recursos que pretendiam interpor para o Tribunal Constitucional.
2. Resulta dos autos que:
2.1. No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, A. e mulher, B., intentaram contra o Estado Português acção com processo comum e forma ordinária pedindo a condenação do Réu a pagar-lhes determinadas quantias, invocando omissão de providências consulares de protecção, providências de ordem legislativa, diplomática e de actuação prática alegadamente impostas pelo artigo 14º da Constituição da República Portuguesa.
Contestou o Estado, alegando, por excepção, a prescrição do direito dos Autores. Foi depois proferida sentença que julgou procedente a invocada excepção peremptória de prescrição e absolveu o Réu Estado do pedido.
2.2. Apelaram os Autores, invocando abuso de direito, na modalidade de proibição de “venire contra factum proprium”, mas o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso, confirmando inteiramente a decisão da 1ª instância.
2.3. No recurso de revista que interpuseram da decisão do Tribunal da Relação, os Autores pediram julgamento ampliado do recurso e sustentaram a improcedência da prescrição por considerarem que o Estado tem vindo sucessivamente a reconhecer o direito dos Autores e por entenderem que assim permanece a situação geradora da indemnização pedida.
2.4. Através de decisão proferida em 19 de Maio de 2004 pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, foi determinado que não se procederia ao julgamento com intervenção do plenário das secções cíveis (despacho de fls. 6 dos presentes autos de reclamação, notificado aos ora reclamantes por carta registada expedida em 21 de Maio de 2004, cfr. cota de fls. 7).
2.5. O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 30 de Setembro de 2004, decidiu negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida (fls. 9 e seguintes).
Lê-se nesse acórdão, na parte que agora importa considerar:
“[...] Deve dizer-se, antes de mais, que não se discute aqui a existência ou inexistência do direito dos AA, como de muitos outros milhares de portugueses, a serem indemnizados ou compensados pela perda de seus bens (materiais ou imateriais) nos acontecimentos que antecederam ou se seguiram à independência dos Territórios em que viviam ou até nasceram. No recurso está, apenas, em causa saber se o direito dos AA, suposto que tenha existido, se extinguiu por prescrição. Que prescreveu, decidiram as Instâncias; não prescreveu, afirmam os AA, porque se não propuseram antes a acção foi porque confiaram no «seu Estado», porque os actos e omissões imputados ao Estado ainda perduram e o Estado praticou muitos e repetidos actos interruptivos de eventual prescrição que, além do mais, o fariam incorrer em abuso de direito se, depois deles, persistisse em invocar a prescrição. Nos termos do art. 14° da Constituição, «os cidadãos portugueses que se encontrem ou residam no estrangeiro gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência do país». Conforme o art. 22° da mesma Lei Fundamental, «o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem». Nos termos do n.° 1 do art. 304° do CC, completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
[...] Como dito no n.° 1 do art. 306° CC, o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido... O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos – art. 309° CC.
[...] A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, ficando a nova prescrição [...] sujeita ao prazo da prescrição primitiva – art. 326° CC.
É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito – art. 334° CC.
[...] Nos termos do art. 498º, n.º 1, do CC, o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso. Por força do disposto no art. 5º. n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, e nos termos do n.º 2 do art. 71º do Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho, «o direito de indemnização por responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo o direito de regresso, prescreve nos termos do artigo 498º do Código Civil.
[...] Como disse o Ex.mo juiz, «não está em causa a prescrição do direito fundamental
à protecção do Estado... mas a prescrição do direito de crédito à indemnização
(do cidadão desprotegido) resultante da violação desse dever por parte do Estado. É este direito de crédito que os AA pretendem fazer valer nos autos e, enquanto direito de crédito à indemnização, na ausência de normas especiais, está sujeito às regras de prescrição». Não se referiu – nem tinha que o fazer – a cada um dos documentos juntos. Mas tratou a questão que lhe foi submetida. Pelo que, como se decidiu no Acórdão recorrido, não padece a sua decisão – nem o Acórdão revidendo – da invocada nulidade por omissão de pronúncia. Nem vale a pena discorrer sobre o prazo de prescrição aqui aplicável, se o de três anos, da responsabilidade extracontratual, se o ordinário de vinte anos, privativo da responsabilidade contratual, da obrigação de indemnizar por facto lícito ou de obrigações directamente resultantes da lei. Decorreram mais de vinte e três anos entre Março de 1976 e Setembro de 1999, entre a data em que os AA, pelo escrito de fs. 14 a 16 interpelaram o Estado e o mês de entrada da petição. Mas, dizem os AA, o Estado praticou muitos e repetidos actos de reconhecimento do direito, interruptivos da prescrição, que inutilizaram para este efeito todo o tempo antes decorrido. Não vemos que algum dos vários actos acima alinhados – as autorizações de operações de crédito (nas várias leis orçamentais da década de 90) para fazer face à regularização de situações decorrentes da descolonização, a Resolução do Conselho de Ministros de 1992, a criação do Gabinete de Apoio aos Espoliados, o Despacho do Primeiro Ministro dirigido ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, a abertura de processo (em 1976) e a autenticação, em 22.4.99, da exposição apresentada em 1976 – possa significar reconhecimento, ainda que tácito, do direito dos AA, tal como caracterizado pelo art. 325° do CC, atrás analisado. Nem se diga que o Estado está a agir em abuso de direito quando invoca a prescrição, apesar do comportamento reiterado durante estes anos. Não se vê que em momento algum o Estado tenha agido por forma a criar nos AA fundada esperança de que, mais tarde ou mais cedo, os indemnizaria. Bem ao contrário, o silêncio à exposição/requerimento de 1976, os nulos resultados das várias declarações, resoluções ou criação de gabinetes, deviam ter alertado os AA para a necessidade de, ao menos dentro do mais longo prazo de prescrição, de vinte anos, pôr o preto no branco, chamar o Estado a contas, propor a adequada acção de responsabilidade. Em resumo:
– o eventual direito dos AA devia ter sido exercido dentro do prazo de três ou vinte anos contados a partir de 1976;
– não tendo ocorrido qualquer acto interruptivo dentro deste mais longo prazo, estava prescrito tal suposto direito quando a acção foi proposta (art. 323°, n.°
2, CC);
– o Estado exerceu, sem excesso, o direito de invocar a prescrição que a lei
(art. 301° e 303° CC) lhe confere. Pelo que o recurso não merece provimento.
[...].”
2.6. Notificados deste acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, A. e mulher pretenderam recorrer para o Tribunal Constitucional, em 13 de Outubro de 2004, através do requerimento de fls. 17 e seguinte, nos seguintes termos:
“[...] vêm interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo dos arts. 70.1 alíneas b), c) e f) e 2 e 71.1 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro [...] Pretendem os recorrentes que seja: a - ponderada a legalidade da decisão do Senhor Conselheiro Relator para, de per si, determinar que não haveria julgamento com intervenção do plenário das Secções Cíveis e, na ausência desta legalidade, determinando que só a Conferência dos Mºs. Juízes Conselheiros tem competência para decidir tal questão. Foi suscitada a questão da necessidade de harmonizar jurisprudência entre o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora em 01.07.97 (BMJ 467 pág. 644) e o Tribunal da Relação de Lisboa em acórdão datado de 18.03.03 (então sub judice neste processo) acerca da aplicação do art. 334 do Código Civil que define o princípio do abuso do direito: pode ou não invocar prescrição quem, com a sua conduta, tenha obstado ao exercício do direito da outra parte? O Tribunal da Relação de Évora entendeu que não; o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que sim. Há que saber qual o assento final da nossa jurisprudência sobre esta importante e muito justa questão, o que não aconteceu neste processo por mero alvedrio do Senhor Conselheiro Relator. b - Foi suscitada no processo a questão da violação do disposto nos art°s. 14,
22 e 203 da Constituição da República portuguesa além de outras disposições de direito civil e processual civil. Questão esta que, salvo o devido respeito, foi mal decidida. Daí o presente recurso, que se espera seja admitido.
[...].”
2.7. Por despacho do Relator, foram os recorrentes notificados, ao abrigo do disposto no artigo 75º-A, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional, para
“indicarem a norma ou normas cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade pretendem que o Tribunal Constitucional aprecie, bem como a peça processual em que suscitaram a questão de inconstitucionalidade e ou ilegalidade em causa” (fls.
21).
2.8. Os recorrentes responderam através do requerimento de fls. 23 e seguintes:
“[...]
2 - Como foi indicado no requerimento de interposição do recurso, este foi interposto ao abrigo dos art°s. 70.1 alíneas b), c) e f) e 2 e 71.1 da Lei n.º
28/82 de 15 de Novembro.
– Quanto à alínea b): Ver conclusões 1 e 4 das alegações do recorrente para o S.T.J. apresentadas em
15.04.04, alegações da Senhora Procuradora Geral Adjunta apresentadas em
12.05.03 (fls. 423), conclusões 6ª e 9ª e final das alegações da Digmª. Procuradora Geral Adjunta apresentadas em 16.09.03 e Acórdão do T.C. nº. 147/97 de 26.02.97 in Procº. 849/96 publicado no BMJ 464 pág. 170.
– Quanto às alíneas c) e f) e n.º 2: Há que ponderar no entendimento que decorre do Ac. Rel. Lxª. de 07.05.02 (Rev. Leg. e Jur., Ano 134, 3027 e 3928, 202) e à forma como a questão foi encarada no Ac. S.T.J. de 2004.10.06, designadamente no que concerne ao entendimento dos artºs. 14 e 22 da C.R.P. para que se alertou logo no requerimento apresentado em
13.10.04. cujo teor se reitera.
– Quanto ao artº. 71.1: O acórdão de que se recorreu está ferido de ilegalidade por não considerar sucessivos actos do Estado que têm de ser julgados como interruptivos da prescrição que acabou por ser decretada judicialmente; mas mal, salvo o devido respeito. Os requerentes pretendem se lhes faça Justiça, e para isso esgotarão todas as instâncias possíveis (a que legalmente puderem recorrer, com a força moral de que deram ao Réu-Estado toda uma vida árdua e muito difícil e que o Estado através dos seus órgãos até hoje intervenientes neste demorado processo não consideraram).
[...].”.
2.9. O Conselheiro Relator no Supremo Tribunal de Justiça decidiu não admitir os recursos para o Tribunal Constitucional (despacho de 30 de Novembro de 2004, a fls. 27 e seguinte), fundamentando assim a sua decisão:
“[...] O recurso da decisão de Sua Excelência o Presidente do Supremo Tribunal foi interposto muito para além dos dez dias fixados no art. 75° da Lei do Tribunal do Constitucional e nada tem a ver com o Acórdão final de que também se recorre.
Tem, por isso, tal recurso de ser, nessa parte, rejeitado – art. 76°, n.º 2 da dita Lei. No tocante ao Acórdão que julgou verificada a prescrição do eventual direito dos AA, não indicam os Recorrentes, mesmo depois de para tanto notificados, qual a norma aplicada cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade tenham suscitado e pretendem ver apreciada pelo Tribunal Constitucional – al. b), c) e f) do n.º 1 do art. 70º da Lei do TC. Por outro lado, os recursos de decisões judiciais para o Tribunal Constitucional são restritos à questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade suscitada – art. 71°, n.º 1 da mesma Lei. O Tribunal Constitucional não é uma 4ª Instância. Ora, no Acórdão em crise nada se decidiu acerca do direito à protecção do Estado que têm os cidadãos portugueses no estrangeiro – art. 14° da Constituição – ou da responsabilidade do Estado por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem – art. 22° da CRP – pela simples razão de que se não chegou a entrar na fase de apuramento da factualidade para tanto relevante por se ter julgado que os direitos dos AA, a existirem, estavam prescritos. Também nesta parte é o recurso de rejeitar, nos termos do n.º 2 do art. 76° da Lei do Tribunal Constitucional.
[...].”.
2.10. A. e mulher vieram deduzir reclamação do despacho de não admissão dos recursos para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 76º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional, através do requerimento de fls. 2, em que nada invocaram para fundamentar o pedido.
3. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional emitiu parecer (fls. 33 v.º), do seguinte teor:
“A presente reclamação carece ostensivamente de fundamento, já que o recurso interposto para este Tribunal Constitucional não se mostra direccionada para a apreciação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa – carecendo, pois, manifestamente de objecto idóneo, mesmo após o aperfeiçoamento que aos recorrentes foi facultado.”.
Cumpre apreciar e decidir.
II
4. Os ora reclamantes pretendiam recorrer para este Tribunal, ao abrigo do disposto nas alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, de duas decisões distintas: do despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Maio de 2004, que determinou que não se procederia ao julgamento ampliado do recurso interposto para o Supremo pelos ora reclamantes; e do acórdão de 30 de Setembro de 2004 do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, que julgou verificada a prescrição do eventual direito dos ora reclamantes e, consequentemente, negou provimento ao recurso por eles interposto para esse tribunal e confirmou o acórdão da Relação então recorrido (supra,
2.6.).
O Conselheiro Relator no Supremo Tribunal de Justiça não admitiu os recursos pelas seguintes razões: quanto ao recurso do despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por entender que “o recurso foi interposto muito para além dos dez dias fixados no art. 75° da Lei do Tribunal do Constitucional”; e, quanto ao recurso do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Setembro de 2004, por considerar que “não indicam os Recorrentes, mesmo depois de para tanto notificados, qual a norma aplicada cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade tenham suscitado e pretendem ver apreciada pelo Tribunal Constitucional”.
Em suma, o Conselheiro Relator considerou inadmissível os recursos para o Tribunal Constitucional por não se mostrarem verificados os respectivos pressupostos processuais (supra, 2.9.).
5. Não merece qualquer censura o despacho reclamado.
Antes de mais, o despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Maio de 2004, que determinou que não se procederia ao julgamento ampliado do recurso interposto para o Supremo pelos ora reclamantes, há muito havia transitado em julgado quando foi interposto o recurso para o Tribunal Constitucional (supra, 2.4.).
Por outro lado – tendo sido invocado como fundamento dos recursos o disposto nas alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional –, é manifesto que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de
30 de Setembro de 2004, que julgou verificada a prescrição do eventual direito dos ora reclamantes:
– não aplicou qualquer norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada pelos ora reclamantes “durante o processo”, “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (cfr. artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º
2, da Lei do Tribunal Constitucional);
– não recusou a aplicação de qualquer norma constante de acto legislativo, “com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado” (cfr. artigo 70º, n.º 1, alínea c), da Lei do Tribunal Constitucional);
– não aplicou qualquer norma cuja ilegalidade (por violação de lei com valor reforçado, por violação de estatuto de Região Autónoma ou por violação de lei geral da República) tenha sido suscitada pelos ora reclamantes “durante o processo”, “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (cfr. artigos 70º, n.º 1, alínea f), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
Sublinhe-se, ainda, que nem no requerimento de interposição dos recursos para o Tribunal Constitucional, nem na resposta ao despacho de aperfeiçoamento apresentada no Supremo Tribunal de Justiça – que, de todo o modo, não constituíam já momentos adequados para considerar suscitadas as questões de inconstitucionalidade ou de ilegalidade “durante o processo”, no sentido que a jurisprudência deste Tribunal tem atribuído a tal exigência constitucional e legal –, os ora reclamantes identificaram uma questão de inconstitucionalidade normativa ou de ilegalidade reforçada susceptível de constituir objecto idóneo de um recurso fundado nas normas invocadas.
Note-se, por último, que os termos em que se encontram redigidos quer o requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional quer a resposta ao despacho de aperfeiçoamento apresentada no Supremo Tribunal de Justiça denotam que os ora reclamantes pretendem afinal submeter à apreciação do Tribunal Constitucional as próprias decisões proferidas nos autos pelo Supremo Tribunal de Justiça. Tal pretensão excede porém a competência que a Constituição e a lei atribuem ao Tribunal Constitucional no âmbito dos recursos de fiscalização concreta de inconstitucionalidade ou de ilegalidade reforçada, que se restringe à apreciação de normas ou interpretações normativas.
6. Conclui-se assim que não estão verificados, no caso em apreço, os pressupostos processuais estabelecidos nas alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional – as alíneas invocadas como fundamento dos recursos pelos ora reclamantes –, pelo que não são admissíveis os recursos interpostos.
Tanto basta para concluir que a reclamação tem de ser indeferida.
III
7. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em vinte unidades de conta, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam.
Lisboa, 2 de Fevereiro de 2005
Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050061.html ]