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Processo n.º 16/06
1.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos da 1ª Vara de Competência Mista de Sintra, em que
são reclamantes A. e B. e reclamado o Ministério Público, vêm os primeiros
reclamar, conforme previsto no artigo 76º, nº 4, da Lei da Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho proferido
naquele Tribunal, em 14 de Novembro de 2005, que decidiu não admitir os recursos
interpostos para o Tribunal Constitucional.
2. No dia 18 de Outubro de 2005, foi proferido nos autos que originaram a
presente reclamação, e em que são arguidos os ora reclamantes, despacho pelo
qual, por impossibilidade de constituição do tribunal colectivo, foi
desconvocada continuação de audiência de julgamento designada para esse dia e,
em substituição, designado para o efeito o dia 20 de Outubro, pelas 14 horas.
Mais se determinou que para tal data fossem notificados apenas os arguidos e
respectivos defensores e que a audiência prosseguiria no dia 15 de Novembro, às
9 horas e 15 minutos, data e hora para a qual seriam notificadas as demais
pessoas que deviam comparecer na data dada sem efeito.
Os arguidos juntaram então aos autos, no próprio dia 18 de Outubro, o seguinte
requerimento, com a menção “muito urgente”:
«B. e A., arguidos, notificados do teor do Douto Despacho que deu sem efeito a
data designada de julgamento (hoje às 9h 15), designando o dia 20/10 às 14 horas
e o dia 15/11 às 9h, vêm dizer e requerer o que segue, nos termos e com os
fundamentos seguintes:
1) O arguido B. tem uma diligência no tribunal de Mafra no dia
20 às 14 h, para que foi notificado em primeiro lugar e para a qual não aceitará
ser prescindido.
2) Nenhum dos arguidos aceita ser defendido, por mais ninguém
nos presentes autos, senão pelo seu defensor – Advogado C..
3) O Defensor dos ora arguidos tem já diligências marcadas nas
datas designadas, para que foi notificado em primeiro lugar, estando
absolutamente impedido no dia 20 às 14 horas (Por estar a acompanhar o arguido
B. no Tribunal de Mafra) e bem assim no dia 15.11.2005 às 9 h por estar a
acompanhar a defesa no Procº. 1876/04 que corre termos no 1º Juízo Criminal de
Oeiras (julgamento em Tribunal Colectivo, com arguidos presos e algumas dezenas
de testemunhas).
4) Uma vez que a diligência de 20/10 no tribunal de Mafra com o
arguido B., terminará precisamente cerca das 15 h, requer este arguido que a
continuação da audiência nos presentes autos, tenha lugar às 15h30 min de 20/10
e não às 14h00
5) Ambos os arguidos, requerem que, em substituição da
diligência designada para 15/11/2005 às 9h, sejam designadas novas datas, de
acordo com as disponibilidades do signatário: 3, 7, 9, 10, 11, 14, 21, 22, 24,
25, 28, 29 de Novembro, 02, 7, 12 a 16 e 19 a 23 de Dezembro.
6) O Defensor tem disponibilidade para a diligência já marcada
para 15/11 à tarde (há muito marcada)».
3. Seguidamente, a 19 de Outubro, foi proferido o seguinte despacho:
«Fls. 1521 - Atenta a informação do Arguido B. de que no dia 20 do corrente
mês, pelas 14H00 deverá comparecer no Tribunal de Mafra, defiro o seu
requerimento no que concerne a que a continuação da audiência de julgamento dos
presentes autos não tenha lugar em tal dia e hora.
Assim, para a continuação da audiência de julgamento designo o dia 20 de
Outubro, pelas 9H00, notificando-se para essa data apenas os Arguidos e os
respectivos defensores.
Procedam-se às notificações, de modo célere, designadamente via telefónica ou
fax, bem assim comunique-se ao E. P. onde os Arguidos se encontram detidos para
procederem ao seu atempado transporte.
*
No que concerne à marcação da audiência de julgamento para o dia 15 de Novembro,
pelas 9H15, o Tribunal não tem outra data disponível, pelo que se indefere o
requerimento dos Arguidos, a este respeito, de fls. 1521».
4. No dia 20 de Outubro, realizou-se uma sessão de audiência de julgamento. Da
respectiva acta importa reter o seguinte:
«Quando eram 09 horas e 50 minutos, pelo Mmº Juiz Presidente foi declarado
reaberta a audiência de discussão e julgamento, só nesta altura em virtude do
atraso na chegada ao Tribunal dos arguidos detidos (...).
Pelo Juiz Presidente foram informados os presentes que a continuação da
audiência de julgamento foi marcada para o dia de hoje apenas para garantir a
salvaguarda do prazo de 30 dias a que alude o artigo 328°, n.º 6 do CPP, e que
era dia em que outro colega presidia ao Tribunal Colectivo nesta Vara,
encontrando-se já marcadas para a manhã de hoje audiências de julgamento noutros
dois processos, designadamente um com arguido preso, pelo que a duração da mesma
seria breve, analisando-se apenas alguns documentos.
Logo de seguida à prestação de tal informação ou esclarecimento, pelo defensor
dos arguidos B. e A. foi dito que estes pretendiam prestar declarações, ao que o
Juiz Presidente lhe referiu que os mesmos poderiam fazer na próxima sessão da
audiência de julgamento, atento a que nesta não haveria tempo para o efeito,
pelas razões primeiramente expostas.
De seguida o mesmo Sr. Advogado disse que pretendia fazer um requerimento.
Perguntado pelo juiz Presidente qual o objecto do requerimento, por aquele foi
dito que “é sobre o objecto do processo.” (Sic)
Seguidamente pelo Mm.º Juiz Presidente foi proferido o seguinte:
DESPACHO
“Atenta a informação prestada aos presentes acerca do objectivo da sessão da
audiência no dia de hoje, da sua brevidade e das respectivas razões, tendo em
consideração o protelamento do início da produção de prova a que deu causa o
mesmo Sr. Advogado, escusadamente, na anterior sessão de audiência, com os seus
sucessivos requerimentos e considerando também que, não obstante lhe ter sido
perguntado, o mesmo não informou em concreto qual o objectivo do requerimento
que ora pretendia ditar para a acta, nos termos do artigo 362°, nº 2 do CPP,
ordeno que a transcrição desse requerimento seja feita somente depois da
prolacção do acórdão.
Foram analisados em audiência de julgamento os documentos de fls. 6, 18 e 53
(...)».
5. No dia 21 de Outubro, os arguidos fizeram juntar aos autos o seguinte
requerimento:
«I) Notificados (através de seu Defensor) do teor da notificação datada de
19.10.2005, expedida para o escritório do signatário via fax às 09h24 de
19.10.2005, que (na segunda parte) manteve o dia 15.11.2005 às 09h15 para a
continuação do Julgamento, indeferindo o requerido pelos arguidos, através de
requerimento subscrito por eles e por seu Defensor (cfr. fls. 1521, entregue às
10h30 min do dia 18.10.2005) vêm dizer, arguir e requerer a final o que segue,
nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. O requerimento de fls. 1521 foi apresentado tempestivamente
ao abrigo dos artigos 155 do CPC e 312 n.º 4 do CPP.
2. Embora o art.º 312 n.º 4 do CPP se refira a advogado
constituído, o certo é que, ao interpretar este preceito, no sentido de se
excluir a possibilidade poderem ser propostas datas alternativas por parte os
defensores dos arguidos (nomeados ou escolhidos oficiosamente) que comprovem a
sua impossibilidade, o Tribunal violou a lei e os mais elementares princípios e
normas constitucionais.
3. Ao excluir a hipótese de o Defensor Oficioso do arguido em
processo penal, poder propor datas alternativas (como propôs, indicando mais de
uma dezena de datas alternativas) em caso de impedimento (comprovadamente
justificado) o Tribunal está a descriminar abusiva, injusta e injustificadamente
os arguidos que não têm meios suficientes para constituir mandatário, em
violação do artigo 13° n.º 2 da Constituição da República Portuguesa,
sujeitando-os a serem defendidos por quem estiver de escala !
4. Na realidade, os arguidos em processo penal, devem ser
tratados da mesma forma, quer o seu defensor seja um mandatário, quer seja um
simples defensor oficioso.
5. A entender-se o contrário, violam-se as mais elementares
garantias de defesa do arguido, constitucionalmente previstas.
6. De acordo com o artigo 32 n.º 3 da Constituição da Republica
Portuguesa. “O arguido tem o direito de escolher defensor e a ser assistido por
ele em tidos os actos do processo (...)”
7. Os arguidos escolheram como Defensor o aqui signatário,
pretensão que lhe foi concedida.
8. Os arguidos não pretendem ser assistido por mais ninguém,
senão pelo seu defensor aqui nomeado, direito que lhe assiste também nos termos
do artigo 61 n.º 1 d) do CPP (...).
14. Por maioria de razão, em processo penal, o art.º 312 n.º 4 do CPP, não
pode, de modo algum, ser interpretado restritiva e literalmente no sentido de
excluir a possibilidade de serem propostas datas alternativas, ao defensor
oficioso que, comprovadamente, esteja impedido, por causa de diligência
anteriormente marcada.
15. O art.º 312 n.º 4 do CPP, quando interpretado no sentido de apenas permitir
a marcação de nova data para julgamento, a quem está representado por advogado,
excluindo os arguidos representados por defensor oficioso, viola os artigos 13
n.º 2 e 32 n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (...).
II) Na sessão de Julgamento que decorreu na manhã de hoje (dia 20.10.2005) os
arguidos B. e A. pediram a palavra para falar sobre o objecto do processo, por
intermédio de seu defensor, aqui signatário, direito que lhes foi expressamente
negado pelo Tribunal, através do Despacho constante da acta, isto em violação do
art 61 n.º 1 alínea b do CPP. O Tribunal, ao negar o direito dos arguidos
falarem em Julgamento, interpretou o art 61 n.º 1 alínea b e 362 n.º 2 do CPP,
em violação das mais elementares garantias de defesa em processo penal e bem
assim do art 32 da Constituição de República Portuguesa.
III) Terminada a análise feita pelo Tribunal a uma série de documentos dos
autos, o signatário, levantando o dedo, pediu a palavra ao Tribunal, para ditar
um requerimento protesto para a acta, direito que lhe foi expressamente
recusado, alegando o Exmo. Senhor Juiz Presidente do Colectivo que a Sessão
tinha terminado. Deste facto, foram testemunhas, para além de todos os arguidos
presentes, os guardas prisionais, a Exma Senhora Escrivã de Direito da Secção e
os restantes defensores de outros arguidos. Nos termos e para os efeitos do art
75 do Estatuto da Ordem dos Advogados, o signatário exerce aqui o seu Direito de
Protesto, passando a indicar a matéria do requerimento e o objecto que tinha em
vista. A fls. 1521, os arguidos B. e A. declararam (tendo assinado o respectivo
requerimento) designadamente, não prescindir da presença do seu defensor, ora
signatário, na defesa dos seus interesses nos presentes autos, tendo requerido
que o Julgamento não prosseguisse na manhã de 15.11.2005, por indisponibilidade
de agenda de seu defensor. Através de ofício expedido por fax para o escritório
do defensor dos arguidos, o Tribunal informou (na segunda parte) que se encontra
designado o dia 15.11.2005 às 09h15 para a continuação do Julgamento. Ao não
levar em conta a vontade expressamente manifestada pelos arguidos e a agenda de
seu defensor (que apresentou mais de uma dezena de alternativas à manhã de
15.11.2005, apesar de se manter disponível para a tarde do mesmo dia há muito
designada para Julgamento) o Tribunal interpretou o art 312 n.º 4 em violação do
disposto nos artigos 13 e 32 n.º 1 da Constituição da República Portuguesa,
inconstitucionalidade que vai aqui expressamente arguida, para todos os devidos
e legais efeitos. Nestes termos, requer o Defensor Oficioso dos Arguidos B. e A.
(que tem acompanhado a defesa dos interesses daqueles desde a fase de inquérito,
instrução e durante todas as sessões de Julgamento que decorreram até à data) a
melhor compreensão do Tribunal no sentido de a próxima sessão de Julgamento ter
lugar apenas na tarde de 15.11.2005, designando-se nessa data, novas datas para
continuação, em função da Agenda do Tribunal e de todos os intervenientes
processuais, incluindo arguidos e seus Defensores (...)».
6. Foi então – a 4 de Novembro de 2005 – proferido o seguinte despacho:
«Sob o item I de fls. 1541 a 1543 o defensor dos Arguidos A. e B., na sequência
do indeferimento do seu requerimento de fls. 1521, no que concerne a que a
continuação da audiência de julgamento não tenha lugar no dia 15 de Novembro,
pelas 9H15, vem apresentar novo requerimento nesse sentido, alegando que nesse
dia e hora tem uma diligência que fora marcada previamente, na comarca de
Oeiras, “com Arguidos presos e algumas dezenas de testemunhas”.
Sob o item III a fls. 1543 o sr. advogado insiste na mesma pretensão,
requerimento este alegadamente no exercício do direito de protesto, por lhe ter
sido “expressamente recusado” o direito de ditar um requerimento/protesto para a
acta.
Começando por este último requerimento, cujo teor aliás merece uma explicação já
que a questão aí suscitada quanto ao direito de protesto não consta na acta.
Com efeito, no início da audiência o sr. advogado disse que queria fazer um
requerimento, cuja transcrição foi ordenada que fosse feita somente após a
prolacção do acórdão. Após este despacho produziu-se a prova que era suposto ser
produzida nessa sessão da audiência e foi esta declarada encerrada. Após tal
declaração de encerramento da audiência o sr. advogado disse que queria exercer
o direito de protesto, ao que lhe foi dito que a sessão já se encontrava
encerrada, mas mesmo que se o protesto ainda pudesse ser feito a sua transcrição
também só teria lugar após a prolacção do acórdão.
Introduzidos estes factos, como justificativos do direito invocado pelo sr.
advogado, indicada que vem a matéria de tal requerimento, na medida em que ela é
idêntica à do requerimento formulado no item I é apreciada conjuntamente.
Compreende-se o interesse do defensor em estar presente em todos os actos em que
devesse estar, mas havendo coincidências de marcações, há mesma hora, em locais
distintos, naturalmente que tal não é possível, pelo que terá de se fazer
substituir naqueles em que não poder estar presente.
Com efeito, não obstante pretender-se sempre evitar conflitos de agendamento ou
de disponibilidade entre todos os intervenientes processuais e sem prejuízo das
normas que nesse sentido foram recentemente introduzidas quer no Código de
Processo Civil quer no Código de Processo Penal, situações há em que a
compatibilização não é viável, designadamente porque não é possível prever com
suficiente antecedência as datas das diligências, o que frequentemente sucede em
casos de continuações de audiências de julgamento.
A agenda do Tribunal não permite que a continuação da audiência de julgamento
não prossiga na data que se encontra designada, o que significaria que a
produção da prova que é suposto ser aí produzida só o fosse numa data posterior
(entenda-se, em “mais uma” data posterior, atenta a morosidade que se tem
verificado na produção da prova em audiência), O que implicaria mais um
adiamento de uma audiência de julgamento marcada noutro processo, na medida em
que a agenda do Tribunal está preenchida.
Cumpre também considerar que no presente processo, além dos dois Arguidos que o
Sr. advogado defende, encontra-se mais um Arguido sujeito à medida de coacção de
prisão preventiva, desde 16-4-2004, e um quarto Arguido sujeito à medida de
permanência na habitação, pelo que até, inclusivamente, já não se está longe de
atingir o prazo de duração máxima da prisão preventiva, nesta fase processual.
Nesta conformidade indefiro o requerimento, mantendo-se a continuação da
audiência de julgamento marcada para o dia 15 de Novembro, pelas 9H15.
Notifique.
**
F1s. 1543 – O defensor dos Arguidos A. e B. vem dizer que: “na sessão de
Julgamento que decorreu na manhã de hoje (dia 20.10.2005) os arguidos B. e A.
pediram a palavra para falar sobre o objecto do processo, por intermédio de seu
defensor, aqui signatário, direito que lhes foi expressamente negado pelo
Tribunal, através do Despacho constante da acta, isto em violação do art 61 nº 1
alínea b do CPP. O Tribunal, ao negar o direito dos arguidos falarem em
Julgamento, interpretou o art. 61 n° 1 alínea b) e 362 n° 2 do CPP. em violação
das mais elementares garantias de defesa em processo penal e bem assim do art 32
da Constituição de República Portuguesa.”
O sucedido na sessão da audiência de julgamento encontra-se expresso na acta de
fls. 1533 e 1534, de onde se afigura claro o que sucedeu na mesma e bem assim
compreensível a razão porque, na sequência do Sr. advogado ter dito que os
Arguidos pretendiam prestar declarações, ter-lhe sido dito que os mesmos
poderiam fazê-lo na próxima sessão de audiência (e não “expressamente negado” o
direito de prestarem declarações, conforme vem referido).
Escrevendo tal texto, o defensor dos Arguidos nada requer nesta sede, pelo que o
que vem exposto constitui total inutilidade processual, é alheio ao
desenvolvimento normal do processo e configura um incidente para os termos do
que dispõe o art. 84° do C.C.J., a que os Arguidos são estranhos, na medida em
que quem lhe dá causa é o próprio sr. advogado.
Nestes termos e em conformidade com o que dispõe o art. 84° do C.C.J. fixo em 1
UC a taxa de justiça devida pelo incidente, a cargo do defensor dos Arguido A. e
B., Dr. C.».
7. Notificados desta decisão, cada um dos arguidos interpôs recurso para o
Tribunal Constitucional , no dia 11 de Novembro de 2005, mediante requerimento
de igual conteúdo:
«- O recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art 70 da LTC (Lei
28/82 de 15.11).
- Pretende ver-se apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos art.º
312 n.º 4 do CPP e do art 155 do CPC. Tais normas (dos artigos 312 n.º 4 do CPP
e do art 155 do CPC) quando interpretadas no sentido de apenas permitir a
marcação de nova data para julgamento, a quem está representado por advogado,
excluindo os arguidos representados por defensor oficioso, viola os artigos 13
n.º 2 e 32 n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
- Pretende ver-se apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos art.º
312 n.º 4 do CPP e do art 155 do CPC. Tais normas (dos artigos 312 n.º 4 do CPP
e do art 155 do CPC) quando interpretadas no sentido de não se permitir a
marcação de nova data para julgamento, em processo crime, a quem escolheu
defensor e declarou que não pretende ser representado por mais ninguém senão
pelo Defensor Escolhido, quando este declarou estar impedido, viola os artigos
13 n.º 2 e 32 n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
- Pretende ver-se apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos art.º
61 n.º 1 alínea b e 362 n.º 2, ambas do CPP. Tais normas (art.º 61 n.º 1 alínea
b e 362 n.º 2, ambas do CPP) quando interpretadas no sentido de não se permitir
que um arguido fale sobre o objecto do processo, durante uma audiência de
discussão e julgamento, quando pede educadamente a palavra para o fazer, por
intermédio de seu defensor, viola o artigo 32 n.º 2 a 6 da Constituição da
República Portuguesa.
- As questões de inconstitucionalidade foram expressamente suscitadas, em
requerimento apresentado nos presentes autos – 1ª Vara Mista de Tribunal de
Sintra (a fls. 1541 a 1543).
O presente recurso subirá imediatamente, nos próprios autos e com efeito
suspensivo.
Invoca apoio judiciário concedido em primeira instância».
8. Os recursos não foram admitidos, pela decisão agora reclamada, do seguinte
teor:
« Fls. 1583 a 1588 – Os Arguidos A. e B. dizem que vêm interpor recurso para o
Tribunal Constitucional do despacho de fls. 1561, que indeferiu o requerimento
por eles apresentado de fls. 1541 a 1543 e que manteve a continuação do
julgamento para 15/11/2005, às 9H15, pretendendo:
1 – ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 312°, n.º 4 do
C.P.P. e do art.º 155° do C. P. C., quando interpretadas no sentido de apenas
permitir a marcação de nova data para julgamento a quem está representado por
advogado, excluindo os arguidos representados por defensor oficioso;
2 – ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos arts. 312°, n.º4 do C.
P. P. e do art.º 155° do C. P. P. , quando interpretadas no sentido de não
permitir a marcação de nova data para julgamento em processo crime a quem
escolheu defensor e declarou que não pretende ser representado por mais ninguém
senão pelo defensor escolhido, quando este declarou estar impedido; e
3 – ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 61, n.º1, al.
b) e 362°, n.º2 do C. P. P., quando interpretadas no sentido de não se permitir
que um arguido fale sobre o objecto do processo, durante uma audiência de
discussão e julgamento, quando pede educadamente a palavra para o fazer, por
intermédio do seu defensor.
**
Decidindo sobre a admissibilidadde do recurso
Relativamente à primeira questão
Em nenhum despacho proferido no processo se fez qualquer distinção entre
defensores “oficiosos” e defensores constituidos através de procuração forense,
no que concerne à marcação da data para a continuação da audiência de
julgamento, pelo que nesta parte o recurso, carece, manifestamente, de
fundamento, além de ser extemporâneo, porque não obstante no despacho que os ora
recorrentes fundamentam a sua pretensão ter sido decidida a marcação da data do
julgamento, essa questão já tinha sido decidida em 19/10/2005, despacho esse que
em 21 do mesmo mês era do conhecimento dos recorrentes, conforme resulta de fls.
1523 e 1541 a 1545.
A renovação do requerimento, que já haviam formulado a fls. 1521, em 18/10/2005,
não obstante a prolação de novo despacho, no mesmo sentido do anterior, não faz
renovar o prazo para interposição do recurso, que se contará após a notificação
do primeiro despacho, que ocorreu pelo menos a 21 de Outubro.
Termos em que, nesta parte, não admito o recurso (artigo 76°, n.º1, n.º2 e
artigo 75° da Lei nº 28/82, de 15/11).
Relativamente à segunda questão
Tendo sido marcada nova data para continuação da audiência de julgamento em
18/10/2005 (fls. 1519), os Arguidos ora recorrentes requereram que tal marcação
fosse dada por sem efeito, em virtude da indisponibilidade do seu defensor e não
pretenderem ser representados por outro defensor, requerimento que foi
indeferido, por despacho de 19/10/2005 (cfr. fls. 1521 e 1523), despacho que os
Arguidos conheciam pelo menos desde 21 do mesmo mês, altura em que renovaram o
requerimento apresentado a fls. 1521, acrescentado-lhe, agora, os convenientes
artigos da Constituição para fundamemntarem a sua pretensão. Sem prejuízo de
sobre este segundo requerimento ter recaido o respectivo despacho, a questão
havia sido decidida no despacho proferido em 19/10/2005, de cuja notificação se
há-de contar o prazo para os Arguidos deduziram a respectiva oposição,
notificação que foi efectuada através de carta registada expedida no mesmo dia
(cfr. fls. 1529) e que pelo menos em 21 do mesmo mês tiveram conhecimento.
Nesta conformidade, tendo o requerimento de recurso sido apresentado em 11 de
Novembro, mostra-se o mesmo intempestivo, pelo que, nesta parte, também não
admito o recurso (arts. 75°, n.º1 e 76°, n.ºs 1 e 2 da Lei 28/82, de 15/11).
*
Relativamente à terceira questão
A mesma prende-se com factos ocorridos no decurso da audiência de julgamento, em
20 de Outubro, (cfr. fls. 1533 e 1534) e pelas razões que constam na respectiva
acta, sendo que no despacho de fls. 1561, em que os Arguidos fundam o respectivo
recurso, que vem apresentado no 21° dia, além de se afigurar também
manifestamente infundado, atentas as razões que determinaram o ocorrido na
audiência de julgamento, conforme vêm expressas na acta, recurso esse que, por
outro lado reveste de inutilidade, pela falta de interesse em agir.
Termos em que igualmente, nesta parte, não admito o recurso (arts. 75° n.º1 e
76°, n.ºs 1 e 2 da Lei 28/82, de 15/11)».
9. Os arguidos reclamam deste despacho, com a fundamentação que aqui se
transcreve:
«Os ora reclamantes apresentaram os seus requerimentos de recursos em
11.11.2005, reagindo ao despacho de fls. 1561 que indeferiu o requerimento por
eles apresentado de fls 1541 a 1543. Os recursos para o TC de 11.11.2005 foram
apresentados em tempo, por se traduzirem numa reação dos reclamantes ao despacho
de fls. 1561 notificado aos arguidos por ofício expedido pelo Tribunal em
07.11.2005.
O Tribunal de 1ª Instância não admitiu os recursos, invocando que foram
apresentados intempestivamente
Termos em que devem as presentes reclamações ser admitidas, revogando-se as
decisões recorridas que deverão ser substituídas por outras que admitam os
recursos interpostos para o Tribunal Constitucional».
10. Neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se
pronunciou pela forma seguinte:
«A presente reclamação é manifestamente improcedente.
É, desde logo, duvidosa a tempestividade da interposição do recurso, face à
natureza não inovatória do despacho impugnado, que se limitou a reiterar e
confirmar inteiramente a precedente decisão judicial que havia rejeitado, por
impossibilidade de agenda do tribunal, a pretensão de designação de outra data
para a continuação da audiência.
Acresce que a norma constante do art. 312º, nº 4, do CPP e 155º do CPC não foi
seguramente interpretada e aplicada com o sentido normativo especificado pelo
recorrente, não se vislumbrando, minimamente qualquer “discriminação” do
defensor oficioso, relativamente ao advogado constituído: como se referiu, o
tribunal “a quo” limitou-se a fazer actuar o princípio do tendencial “acordo de
agendas”, considerando impossível a designação de outra data pela mera
circunstância de – face à urgência do julgamento – não dispor de data
disponível, conforme à solicitação do defensor do arguido.
Quanto à questão reportada à norma do artº 362º, nº 2, e 61º, nº 1, al. b) do
CPP, é manifesto que se não mostra suscitada, em termos processualmente
adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, prendendo-se o
incidente levantado exclusivamente com circunstâncias práticas e concretas da
disciplina da audiência (cfr. fls. 21 dos autos).
Finalmente, o reclamante não esgotou os recursos ordinários possíveis,
relativamente aos incidentes que colocou no decurso da audiência – e que, na sua
óptica, extravasam manifestamente o plano dos – irrecorríveis – despachos de
mero expediente ou proferidos no uso de um poder discricionário: na verdade,
face à argumentação do recorrente, o que estará em causa não é naturalmente a
mera fixação de uma data para a audiência, mas a pretensa violação pelo tribunal
de 1ª instância de direitos fundamentais do arguido, pelo que lhe cumpria
impugnar perante a Relação a decisão que julgou insubsistentes as invocadas
“nulidades” cometidas no decurso da audiência».
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação
Vem a presente reclamação deduzida contra o despacho que não admitiu os recursos
interpostos para este Tribunal, da decisão que os reclamantes identificam como
sendo o despacho de fls. 1561, proferido a 4 de Novembro de 2005 (despacho
reproduzido no relatório que antecede, sob o ponto 6.).
1. Quanto às questões que os então recorrentes formularam, no requerimento de
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, relativamente aos
artigos 312º, nº 4, do Código de Processo Penal e 155º do Código de Processo
Civil, é de concluir que foi por despacho, de 19 de Outubro de 2005, que o
tribunal recorrido indeferiu, por não ter outra data disponível, o requerimento
dos arguidos, de 18 de Outubro, para que fosse substituída a data de 15 de
Novembro de 2005, pelas 9 horas e 15 minutos. O despacho de 4 de Novembro de
2005 limita-se, pois, a reiterar o já decidido, pelo que, não tendo sido
interposto recurso do primeiro dos mencionados despachos, não podem
considerar-se tempestivamente interpostos os recursos para o Tribunal
Constitucional, à luz do disposto no artigo 75º da LTC.
2. Quanto à outra questão, a relativa aos artigos 61º, nº 1, alínea b), e 362º,
nº 2, do Código de Processo Penal, decorre da acta da sessão de julgamento,
realizada no dia 20 de Outubro, que foi neste dia que o Tribunal decidiu que as
declarações que os ora reclamantes pretendiam prestar só poderiam ser feitas na
sessão seguinte da audiência de julgamento (cf. pontos 4. e 5., II) do
Relatório) . Também aqui se impõe, por conseguinte, a conclusão de que do
despacho proferido a 4 de Novembro de 2005 nada se pode retirar quanto à
problemática subjacente à invocação daqueles artigos. Consequentemente, não
podem considerar-se tempestivamente interpostos os recursos para o Tribunal
Constitucional, atendendo ao estatuído no artigo 75º da LTC.
Assim, como bem se decidiu no despacho reclamado, os recursos não podem ser
admitidos.
III. Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.
Lisboa, 31 de Janeiro de 2006
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos
Artur Maurício