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Processo n.º 863/04
2.ª Secção Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
1.A. e outros vieram interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Abril de 2004, através de um requerimento onde se podia ler que pretendiam
“interpor o competente recurso para o Tribunal Constitucional nos termos dos art.ºs 70.º, n.º 1, al. b), e 72.º, n. .º1, al. b), da LOFTJ aprovada pelo Dec. Lei n.º 186/A/99, de 31 de Maio [querendo certamente referir-se, antes, à Lei do Tribunal Constitucional] e art.º 280.º da Constituição da República. De harmonia com o art.º 75.º, n.º 2, do Dec. Lei n.º 186/A/99 [quereriam por certo dizer da Lei do Tribunal Constitucional], indicam-se como violados os arts.º 13.º, 20.º e 32.º da Constituição da República – princípios da igualdade, processo equitativo e garantias de defesa, sustentados nas conclusões das alegações para o STJ e os arts.º 17.º e 18.º da Constituição da República – omissão de pronúncia – no requerimento da arguição de nulidade do Acórdão recorrido. [sic] As normas legais violadas são os art.ºs 659.º, n.º 2, 713.º, n.º 5, 726.º e
799.º, n.º 2, do C. P. Civil e arts.º 266.º, 266.º-B, 334.º, 487.º, n.º 2, 494.º e 497.º do C. Civil. Termos em que se requer a V. Ex.ª que o recurso seja admitido, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo (art.º 78.º, n.º 4, do Dec. Lei n.º
186/A/99 [da Lei do Tribunal Constitucional, ter-se-á pretendido dizer].”
2.Admitido o recurso, em face deste requerimento o relator no Tribunal Constitucional proferiu o seguinte despacho a fls. 894 dos autos:
“Requerimento de recurso (fls. 885 e seg.): convido os recorrentes, nos termos do artigo 75.º-A, n.ºs 5 e 6, da Lei do Tribunal Constitucional, a, no prazo de
10 (dez) dias, indicarem os elementos exigidos pelos n.ºs 1 e 2 daquele artigo
75.º-A, mais precisamente:
- as normas cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada com o presente recurso;
- a peça processual em que suscitaram a questão de constitucionalidade.” Os recorrentes vieram responder, dizendo
“informar no requerimento de interposição de recurso as normas cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada e a peça processual em que suscitaram a questão de constitucionalidade, já foram indicadas, conforme a seguir se transcreve:
‘De harmonia com o art.º 75.º, n.º 2, do Dec. Lei n.º 186/A/99, indicam-se como violados s arts.º 13.º, 20.º e 32.º da Constituição da República – princípios da igualdade, processo equitativo e garantias de defesa, sustentados nas conclusões das alegações para o STJ e os arts.º 17.º e 18.º da Constituição da República – omissão de pronúncia – no requerimento da arguição de nulidade do Acórdão recorrido. As normas legais violadas são os art.ºs 659.º, n.º 2, 713.º, n.º 5, 726.º e
799.º, n.º 2, do C. P. Civil e arts.º 266.º, 266.º-B, 334.º, 487.º, n.º 2, 494.º e 497.º do C. Civil.’” Tendo esta resposta dada entrada no Tribunal Constitucional no 2.º dia útil para além do prazo legal de dez dias, e não tendo sido paga pelos recorrentes a multa prevista no artigo 145.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (aplicável por força do artigo 69.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional), foi a multa liquidada pela secretaria, nos termos do n.º 6 daquele artigo 145.º, tendo os recorrentes sido notificados para proceder ao seu pagamento “no prazo contínuo de dez dias, prazo esse que termina no dia
10.01.2005”. Não tendo esta multa sido paga, em 18 de Janeiro de 2005 o relator no Tribunal Constitucional proferiu o seguinte despacho:
“Nos termos do artigo 145.º, n.º 6, do Código de Processo Civil (aplicável por força do artigo 69.º da Lei do Tribunal Constitucional), declaro perdido o direito de praticar o acto de resposta ao despacho de aperfeiçoamento do requerimento de recurso (fls. 894), e, por conseguinte, na falta de resposta, julgo deserto o recurso, nos termos do artigo 75.º-A, n.º 7, da Lei do Tribunal Constitucional.”
3.Os recorrentes vieram reclamar deste despacho para a conferência, “de harmonia com o disposto nos art.ºs 78.º-A e B da Lei do Orgânica do Tribunal Constitucional”, dizendo:
«1.° No requerimento da interposição do Recurso, perante o STJ, os Recorrentes indicaram de harmonia com o que dispõe o art.º 75.°-A da Lei Orgânica quais as normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie e a peça onde foram suscitados. Pede-se vénia para transcrever os 2 últimos parágrafos do referido requerimento:
“De harmonia com o art.º 75.°, n.º 2, do Dec. Lei n.º 186/A/99, indicam-se como violados os art.ºs 13.º, 20.º e 32.° da Constituição da República - princípios da Igualdade, processo equitativo e garantias de defesa, sustentados nas conclusões das Alegações para o STJ e os art.ºs 17.° e 18.° da Constituição da República - omissão de pronúncia - no requerimento da arguição de nulidade do Acórdão recorrido. As normas legais violadas são os art.º[s] 659.°, n.º 2, 713.° n.º 5, 726.° e
799.°, n.º 2, do C.P.Civil e art.ºs 266.°, 266.°-B, 334.°, 487.°, n.º 2, 494.° e
497.° do C.Civil.”
2.° Ora acontece que os Recorrentes foram surpreendidos com o despacho de fls. de 24.10.2004 do Ex.m.º Relator, no qual eram convidados a indicar: a) - as normas cuja inconstitucionalidade pretendem ver apreciada com o presente recurso; b) - a peça processual em que suscitaram a questão da constitucionalidade.
3.° Estes factos já tinham sido apresentados em sede própria no requerimento de interposição de recurso. Todavia e porque é uma permanente preocupação colaborar com a Justiça responderam com o requerimento de fls.
4.° É certo que tal requerimento não foi apresentado no prazo de 10 dias dado pelo Sr. Relator. E nem tinha que o ser. E nem era obrigação dos Recorrentes apresentar o referido requerimento, por entenderem que os elementos solicitados estavam todos contidos no requerimento de interposição de recurso, no cumprimento escrupuloso da lei.
5.° Consideram assim e salvo o devido respeito o Despacho, dito de Aperfeiçoamento, inútil e desnecessário, pelo que o mesmo é nulo e nulos devem ser os actos subsequentes que dele emergem, designadamente o Despacho de que ora se reclama (art.º 201.° do C.P.Civil, aplicável ex vi do art.º 69.° da Lei Org. do Trib. Constitucional).
6.° E estavam os Recorrentes convencidos na sua boa fé e na sua esperança na Justiça de que o despacho a receber seria o de dar prazo para as alegações, reconhecida que fosse, como se impunha em melhor reflexão, pelo Ex.m.º Relator a nulidade, por inútil e desnecessária do despacho anterior.
7.° Infelizmente tal não aconteceu, o que leva os Recorrentes, a colocar a seguinte questão, que é pungente: Será que, até no Tribunal Constitucional, os Recorrentes, por meras questões formais irrelevantes vão ser também penalizados, frustrando-se a Justiça às suas responsabilidades?
8.° Não é essa a ideia que se tem desta Alta Instância, antes a de procurar sempre fazer Justiça e aplicar os princípios legais e constitucionais em vigor. TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO, que V. Ex.as, Ex.mos Conselheiros não deixarão de suprir com bom conhecimento e sabedoria, se requer que a presente RECLAMAÇÃO seja deferida e anulados os despachos sub judice do Ex.m.º Relator, que julgou deserto o recurso e o anterior.» As recorridas responderam à reclamação, defendendo o seu indeferimento.
4.A presente reclamação foi deduzida ao abrigo do disposto nos artigos 78.º-A e
78.º-B da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional. E, efectivamente, no n.º 2 deste artigo 78.º-B prevê-se que das decisões dos relatores, entre as quais a que julgue deserto o recurso, “pode reclamar-se para a conferência, nos termos do n.º 3 do artigo 78.º-A, aplicando-se igualmente o n.º 4 da mesma disposição”.
É notório, porém, que a presente reclamação não pode ser atendida. Na verdade, os recorrentes reconhecem que praticaram o acto de resposta ao convite para aperfeiçoamento do requerimento de recurso fora do respectivo prazo. Não tendo pago a correspondente multa, é de “considerar perdido o direito de praticar o acto”, nos termos do artigo 145.º, n.º 6, do Código de Processo Civil. O que os reclamantes contestam é, porém, a justificação para o convite para aperfeiçoamento do requerimento do recurso de constitucionalidade, pois, segundo afirmam, nele já se continham os elementos solicitados no despacho respectivo,
“no cumprimento escrupuloso da lei”. Os reclamantes defendem, assim, que o despacho “dito de aperfeiçoamento”, era “inútil e desnecessário”, pelo que seria
“nulo e nulos devem ser os actos subsequentes que dele emergem, designadamente o Despacho de que ora se reclama.” Esta alegação, para além de extemporânea, é, porém, manifestamente improcedente, como resulta logo da leitura do requerimento de recurso. Trata-se, desde logo de uma alegação extemporânea, porque os recorrentes não reagiram contra o despacho que os convidou a aperfeiçoar o requerimento de recurso de constitucionalidade, contestando o seu fundamento. Antes os ora reclamantes responderam (embora remetendo para o que haviam dito no requerimento de recurso) a esse despacho, embora fora do prazo, e só agora, depois de tal resposta não poder ter sido considerada (por facto imputável aos recorrentes), é que vêm pôr em causa a justificação do despacho de convite para o aperfeiçoamento do requerimento de recurso, defendendo a sua nulidade. De qualquer modo, trata-se, em segundo lugar, de uma argumentação que é, também, manifestamente improcedente, na medida em que, como resulta do requerimento de recurso transcrito, este – para além dos vários lapsos que continha, como a indicação de disposições legais inexistentes (os citados artigos do “Dec. Lei n.º 186/A/99” e o artigo “266.º-B” do “C. Civil”) – não indicava os elementos exigidos pelo artigo 75.º-A, n.ºs 1 e 2, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional. Recorde-se que estas normas exigem a indicação dos seguintes elementos: (1.º) a alínea do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo da qual o recurso é interposto; (2.º) a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie; sendo o recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º, (3.º) a norma ou princípio constitucional ou legal que se considera violado, bem como (4.º) a peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade. Ora, no requerimento de recurso, acima transcrito, os recorrentes disseram que este era interposto ao abrigo do artigo
70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (embora se tivessem referido a um “Dec.Lei n.º 186/A/99”), e, depois, indicaram “como violados os arts.º 13.º, 20.º e 32.º da Constituição da República – princípios da igualdade, processo equitativo e garantias de defesa, sustentados nas conclusões das alegações para o STJ e os arts.º 17.º e 18.º da Constituição da República – omissão de pronúncia – no requerimento da arguição de nulidade do Acórdão recorrido” [sic]. E disseram ainda que as “normas legais violadas são os art.ºs
659.º, n.º 2, 713.º, n.º 5, 726.º e 799.º, n.º 2, do C. P. Civil e arts.º 266.º,
266.º-B, 334.º, 487.º, n.º 2, 494.º e 497.º do C. Civil”. Como se vê, não se indicava qualquer inconstitucionalidade de normas, mas antes a violação de normas legais, também não se referindo qualquer peça processual na qual tenha sido suscitada a inconstitucionalidade de normas – antes se referiam apenas parâmetros constitucionais que se dizem “sustentados nas conclusões das alegações para o STJ e os arts.º 17.º e 18.º da Constituição da República”. Mesmo independentemente dos vários lapsos na identificação das normas invocadas no requerimento de recurso, era, pois, patente a falta de indicação, em termos minimamente perceptíveis para se poder tomar conhecimento do recurso, dos elementos exigidos pelo artigo 75.º-A, n.ºs 1 e 2, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional. Pelo que se tornava necessário convidar os recorrentes a indicá-los, nos termos dos n.º 5 e 6 do mesmo artigo 75.º-A. Tratou-se, pois, de um acto processual válido e imposto por lei, e, aliás, um acto que foi efectuado no interesse dos recorrentes, destinado a conceder-lhes oportunidade de aperfeiçoarem o requerimento que eles próprios haviam formulado com insuficiências. Os recorrentes não aproveitaram esta oportunidade, não tendo respondido a este requerimento – ou, como reconhecem, respondendo fora do prazo, e omitindo (intencionalmente ou não, é irrelevante) a prática dos actos indispensáveis para que a resposta pudesse ser considerada. Pelo que, por facto imputável exclusivamente aos recorrentes, o recurso tinha de ser julgado deserto, nos termos do artigo 75.º-A, n.º 7, da citada Lei do Tribunal Constitucional. A presente reclamação é, pois, de indeferir, confirmando-se o despacho reclamado, que julgou deserto o recurso.
5.Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação para a conferência e confirmar o despacho do relator que julgou deserto o recurso de constitucionalidade. Custas pelo reclamantes, com 15 (quinze) unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 23 de Fevereiro de 2005 Paulo Mota Pinto Mário José de Araújo Torres Rui Manuel Moura Ramos