Imprimir acórdão
Procº nº 177/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Em 26 de Maio de 1997 e nos presentes autos foi, pelo relator, lavrado despacho com o seguinte teor:-
'1. A., que nos presentes autos figura como recorrente, notificada que foi da exposição lavrada de fls. 218 a 229 pelo relator e elaborada nos termos do artº 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, veio, no primeiro dia útil subsequente ao prazo prescrito naquela mesma disposição, apresentar a sua «pronúncia» sobre tal exposição.
A acompanhar essa «pronúncia» apresentou requerimento no qual, em alternativa, solicitava que:
fosse dispensada do pagamento da multa;
fosse esta reduzida ao mínimo, 'atenta a manifesta desproporção que representa relativamente ao valor do recurso';
fosse considerado que a regra - instituída a partir das alterações ao Código de Processo Civil entradas em vigor em 1 de Janeiro de 1997 - segundo a qual os prazos processuais se contam continuamente, tornava a norma 'contida no art. 6º nº 2 do DL 329-A/95, de 12.12, quando conjugada com a nova redacção dada ao art. 144º do C.P.C.', inconstitucional, 'por violar de forma injustificada e desproporcionada o direito fundamental a um prazo razoável para o exercício dos poderes processuais, ínsito no princípio do contraditório', razão pela qual se deveria considerar que a sua «pronúncia» deu, em tempo, entrada neste Tribunal.
Cumpre decidir o requerido.
2. E, por uma questão de lógica, há que enfrentar, primeiramente, a questão de saber se o prazo consagrado na parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82 - contado, ex vi do artº 56º, nº 1, da mesma Lei, nos termos da redacção conferida ao artº 144º do Código de Processo Civil na redacção emergente dos Decretos-Leis números 329-A/95, de 12 de Dezembro, e 180/96, de 25 de Setembro -, se há-de perspectivar como inconstitucional, por restringir de forma desproporcionada o direito de «pronúncia» das «partes», como forma de exercício de um contraditório.
Diga-se desde já que até será possível defender-se que o
«contraditório», a que a recorrente faz apelo, é algo porventura questionável na medida em que, in casu, não está em causa uma situação em que a recorrente tenha de discretar sobre razões de facto ou de direito que foram aduzidas pelos recorridos, uma vez que, na verdade, somente se tem de pronunciar sobre uma exposição lavrada pelo relator e na qual o mesmo propugnou por se não dever tomar conhecimento do vertente recurso.
Mas, independentemente dessa questão, o que se afigura certo é que um prazo de cinco dias contados de forma contínua para ocorrer aquela
«pronúncia» é, numa situação como a dos autos, suficiente para que as «partes» possam tomar uma posição sobre a posição assumida pelo relator.
De facto, e tomando por parâmetro um recorrente, o mesmo é sabedor do modo como elaborou as suas peças processuais e do modo como foram decididas no tribunal a quo as questões conexionadas com a alegada aplicação, ou não aplicação, da norma cuja desconformidade com a Lei Fundamental ele pretende, com o recurso, que venha a ser apreciada pelo Tribunal Constitucional.
Ora, a título exemplificativo, se o recorrente não suscitou, não suscitou atempadamente ou não suscitou de um modo processualmente adequado, a questão de inconstitucionalidade, se o tribunal a quo não veio utilizar a norma questionada - no caso de a suscitação ter, anterior e correctamente, sido levada a efeito - como suporte da sua decisão ou, ainda, se não veio a utilizar o normativo em questão numa interpretação tal como aquela cuja desconformidade com o Diploma Básico foi posta em crise pelo recorrente, tudo isto constituirá matéria da qual, antecedentemente a ser lavrada a exposição, o mesmo recorrente já tinha conhecimento. E, se, no entender do recorrente, as razões carreadas à dita exposição se não apresentam como válidas, cumprirá, na «pronúncia» cuja oportunidade de efectuar lhe é dada pelo dito nº 1 do artº 78º-A, expor esse entendimento, fundado em razões de facto e de direito que já há muito conhecia.
Para tanto, o prazo de cinco dias contado continuamente não se afigura desproporcionado ou irrazoável, não diminuindo de forma acentuada as possibilidades de o recorrente manifestar nos autos o seu entendimento, o que vale por dizer que esses prazo e forma de contagem não desfiguram os mesmos autos como um due process of law.
3. Chegados à conclusão de que a norma resultante dos preceitos acima citados não sofre de vício de inconstitucionalidade, haverá que enfrentar a outra solicitação da recorrente e que se desdobra em, estribada no nº 7 do artº 145º do Código de Processo Penal, peticionar ou a dispensa de multa ou a sua redução ao mínimo legal.
Quanto a este particular, há que não passar em claro que o montante da multa devida no presente caso é de 8.500$00 e que os autos não demonstram, minimamente que seja, que a recorrente - que é técnica superior de educação - manifestamente padeça de carência económica. Por outro lado, tendo em conta que, nos casos de não conhecimento de recurso, o artº 18º do Decreto-Lei nº 149-A/83, de 5 de Abril, na redacção conferida pelo Decreto-Lei nº 72-A/90, de 3 de Março, comanda que a taxa de justiça poderá atingir o montante máximo de 80 unidades de conta, não se afigura que os aludidos 8.500$00 sejam manifestamente desproporcionados.
E daí que se não vislumbrem razões para deferir o requerido, o que consequencia que a recorrente deverá proceder, por força do nº 5 do artº 145º do Código de Processo Civil e caso deseje que a sua «pronúncia» seja junta aos autos, ao pagamento da multa a que se reporta tal preceito.
Notifique-se.'.
2. Do transcrito despacho reclamou para a conferência a aludida A., dando, na reclamação, por reproduzidos os fundamentos que invocou e que não foram atendidos pelo despacho reclamado.
Por último veio, no requerimento consubstanciador daquela reclamação, arguir 'a nulidade da notificação da Secretaria do processo para proceder ao pagamento da multa em causa até ao dia 12.06.97 em virtude de não conter as respectivas guias de depósito, ao contrário do disposto no art. 126º nº 2 do C.C.J.'.
Apreciando:
3. Porque aos Juízes que compõem esta Secção se afigura que as razões constantes do despacho sob reclamação já transcrito são, por si, suficientes do ponto de vista de facto e de direito para conduzir à decisão no mesmo ínsita, não necessitando, assim, de qualquer complementação fundamentativa, entende-se ser de manter tal despacho, motivo pelo qual se indefere a vertente reclamação.
3.1. E, uma vez que os autos se encontram submetidos à conferência para a decisão naquele particular, aproveita-se a oportunidade para a mesma, desde já, proferir juízo decisório sobre a arguida nulidade processual
(recte, irregularidade processual) e que, na perspectiva da arguente, consistiria em não ter a secretaria - ao notificá-la do despacho (acima transcrito) por intermédio do qual foi indeferida a sua pretensão de não pagamento de multa devida nos termos do nº 5 do artº 145º do Código de Processo Civil - enviado, com o instrumento de notificação, as guias passadas e respeitantes a tal multa.
Não se passará sem assinalar que a arguição ora in specie não deixa, de certo modo, de se revelar contraditória.
Efectivamente, se a arguente entende que não deveria proceder ao pagamento da dita multa (e, por isso, nem sequer deixou que o despacho que indeferiu a sua pretensão fizesse caso julgado formal nos presentes autos, dado que do mesmo reclamou para a conferência), não é perfeitamente compreensível que venha arguir a irregularidade de um processado que, ao fim e ao resto, intentava cumprir a determinação constante de um despacho que a arguente impugnou e cuja eficácia pretende que não venha a ter lugar.
Seja como fôr, há, de um outro passo, que ponderar que não é líquido que a notificação cotada a fls. 241 verso (ou seja, a notificação da ora arguente do teor do despacho reclamado) possa ser entendida como a notificação a que se reporta o nº 2 do artº 126º do vigente Código das Custas Judiciais, uma vez que se tratava da notificação do despacho que desatendeu a pretensão, já acima indicada, da mesma arguente, e não de uma notificação directa para pagamento da multa, designada e exemplificativamente, aquela que se reporta o nº
6 do artº 145º do Código de Processo Civil.
Mas, ainda que assim não seja entendido, isto é, ainda que se perfilhasse a óptica de harmonia com a qual a notificação em crise poderia ser visualizada como uma notificação correspondente à do nº 6 do citado artº 145º, o que é certo é que, tendo em conta a especialidade do regime de custas neste Tribunal (e, designadamente, do seu destino), entende-se que, quanto a ele, não
é cabível o cumprimento do preceituado naquele nº 2 do artº 126º.
Na realidade, as custas cobradas pelo Tribunal Constitucional constituem receitas do Estado (cfr. artº 20º, nº 1 do Decreto-Lei nº 149-A/83, de 5 de Abril), sendo o seu quantitativo pago nas Repartições de Finanças. Estas, efectuado o pagamento, não devolvem ao Tribunal Constitucional qualquer exemplar da guia paga, pelo que o sistema é diverso do prescrito nos artigos
127º e seguintes do aludido Código.
Face a tal circunstancionalismo, e tendo em conta que o que se encontra estatuído no Código das Custas Judiciais só é aplicável, quanto ao regime de custas vigente para o Tribunal Constitucional, a título subsidiário, com as devidas adaptações e somente no que respeita às disposições constantes da sua «parte cível», há que concluir, como acima se disse, que não é aqui aplicável o nº 2 do artº 126º daquele corpo de leis.
Nestes termos, e porque se não vê que tenha existido irregularidade processual, indefere-se a arguição.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em dez unidades de conta.
Lisboa, 15 de Julho de 1997 José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa