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Processo n.º 344/05
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal
Constitucional,
1. A., B., C., D., E. e F. interpuseram recurso de
acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa para o Supremo Tribunal de Justiça, que
não foi admitido.
Contra essa não admissão apresentaram reclamação para o
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que foi indeferida.
Na sequência desse indeferimento da reclamação,
apresentaram, em 17 de Setembro de 2004, no Tribunal da Relação de Lisboa,
requerimento (fls. 17 007-17 008 do processo principal e 21-22 destes autos)
arguindo a nulidade do anterior acórdão dessa Relação.
Esse requerimento foi indeferido por despacho do
Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de Outubro de
2004, por ser manifestamente extemporânea a arguição de nulidade (fls. 17 022
do processo principal e 23 destes autos).
Em 9 de Novembro de 2004, os referidos recorrentes
requereram ao Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa o
esclarecimento da “não aplicabilidade do disposto no n.º 3 do artigo 670.º do
Código de Processo Civil ao caso vertente, designadamente quanto à aí invocada
extemporaneidade da arguição das nulidades” (fls. 17 029 do processo principal e
24 destes autos).
O Desembargador Relator do Tribunal da Relação de
Lisboa, por despacho de 18 de Novembro de 2004, explicitou que o n.º 3 do artigo
670.º do Código de Processo Civil (“Se alguma das partes tiver requerido a
rectificação ou aclaração da sentença, o prazo para arguir nulidades ou pedir a
reforma só começa a correr depois de notificada a decisão proferida sobre esse
requerimento”) não tem aplicação porque nesse preceito “contempla-se e prevê-se
situação que manifestamente não ocorre nestes autos” (fls. 17 030 do processo
principal e 25 destes autos).
Em 30 de Novembro de 2004, os aludidos recorrentes
apresentaram requerimento de fls. 17 043-17 044 do processo principal e 26-27
destes autos, em que arguem a nulidade do despacho de 22 de Outubro de 2004 (que
rejeitou, por extemporaneidade, arguição de nulidade do acórdão da Relação) e
“também desde já se suscita a inconstitucionalidade da não aplicação da citada
norma do artigo 670.º, n.º 3, do Código de Processo Civil”.
Por despacho do Desembargador Relator do Tribunal da
Relação de Lisboa, de 14 de Dezembro de 2004 (fls. 17 045 verso do processo
principal e 28 verso destes autos), o anterior requerimento foi indeferido
porquanto: “o acórdão proferido neste Tribunal tornou-se definitivo quanto aos
arguidos ora requerentes, já não sendo possível a arguição de qualquer nulidade,
assim como também não é possível suscitar questão de inconstitucionalidade a
apreciar pelo Tribunal Constitucional”.
Vieram então os mesmos recorrentes interpor recurso
desse despacho do Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei
de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional,
aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela
Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), referindo (fls. 17 048-17 049 do
processo principal e 29-30 destes autos):
“– pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da não
aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 670.º do CPC, conjugado com a alínea d)
do n.º 1 e n.º 3 do artigo 668.º do mesmo diploma legal, na interpretação que
lhe foi conferida pelo douto despacho recorrido, ao não acolher, por
extemporânea, a apreciação das nulidades invocadas;
– isto porque, sendo certo que as nulidades só podem ser invocadas antes do
trânsito em julgado do acórdão, transitando este se dentro de dez dias não tiver
sido interrompido o prazo, o acórdão em apreço ainda não transitou mercê da
interrupção operada pelos sucessivos requerimentos, no sentido de se verem
apreciadas as nulidades invocadas;
– havendo, assim, lugar à aplicação das normas referidas;
– tal interpretação viola, entre outras, as normas dos artigos 20.º, n.ºs 4 e 5,
32.º, n.º 1, e 204.º, todas da CRP.”
O recurso não foi admitido por despacho de 13 de Janeiro
de 2005 (fls. 17 050 verso do processo principal e 31 verso destes autos), por
falta de esgotamento dos meios ordinários de impugnação, pois os recorrentes
não reclamaram do despacho de 14 de Dezembro de 2004 (de que pretenderam
interpor recurso para o Tribunal Constitucional) para a conferência, como o
preceitua o artigo 700.º, n.º 3, do CPC, aplicável ex vi artigo 4.º do Código
de Processo Penal (CPP).
Em 25 de Janeiro de 2005, os recorrentes vieram requerer
(fls. 17 053 do processo principal e 32 destes autos), ao abrigo do artigo
700.º, n.º 3, do CPC, que sobre a matéria do despacho de 14 de Dezembro de 2004
recaísse acórdão.
Esse requerimento foi indeferido, por extemporâneo, por
despacho do Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa, de 31 de
Janeiro de 2005 (fls. 17 051 do processo principal e 33 destes autos), uma vez
que o despacho reclamado fora notificado aos recorrentes por carta expedida em
15 de Dezembro de 2005 e o requerimento de sujeição à conferência deu entrada em
25 de Janeiro de 2005, “muito para além do prazo marcado na lei para a
consecução do objectivo pretendido (cf. artigo 153.º do CPC)”.
Por requerimento de 11 de Fevereiro de 2005 (fls. 17 058
do processo principal e 34 destes autos), os recorrentes vieram arguir a
nulidade do anterior despacho por ilegitimidade do Relator para se pronunciar
sobre a reclamação para a conferência (cabendo-lhe tão-somente, depois de ouvir
a parte contrária, submetê-la à conferência) e, desde logo, “pela jurisprudência
das cautelas”: (i) se vier a ser desatendida a arguição de nulidade, requerer a
submissão à conferência do despacho de 31 de Janeiro de 2005; e (ii) suscitar a
violação dos artigos 700.º, n.º 3, do CPC e 204.º da CRP.
Por acórdão de 3 de Março de 2005 (fls. 17 061-17 062 do
processo principal e 35-36 destes autos), foi indeferida a reclamação do
despacho de 14 de Dezembro de 2004 (fls. 17 045 verso do processo principal e 28
verso destes autos), por extemporaneidade dessa reclamação.
Em 16 de Março de 2005 (fls. 17 609 do processo
principal e 37 verso destes autos), os recorrentes vieram requerer a aclaração
do anterior acórdão, aduzindo que “entre o douto despacho de fls. 17 045 verso e
o requerimento de fls. 17 053 existiram outros requerimentos, que mereceram
outros tantos doutos despachos, os quais, a nosso ver, interromperam
sucessivamente o trânsito em julgado, conforme se pode constatar dos autos”,
pelo que solicitam se esclareça “a razão pela qual não foram levados em conta”.
Por despacho da Desembargadora Relatora do Tribunal da
Relação de Lisboa, de 29 de Março de 2005 (fls. 17 695-17 698 do processo
principal e 38-41 destes autos), foi o anterior pedido indeferido por nenhuma
obscuridade ou ambiguidade ter sido apontada à decisão aclaranda, pretendendo
os recorrente “obter um efeito que não podem obter com sucessivas arguições de
nulidades – a constatação do não trânsito da decisão”, acrescentando:
“Pois bem, interposto recurso da decisão e não aceite este, a única
possibilidade que lhes restava era a da reclamação para o Ex.mo Senhor
Presidente do Venerando Supremo Tribunal de Justiça sobre a não admissão do
mesmo recurso.
Todos os demais requerimentos são inidóneos para produzir o efeito
pretendido e deles não resulta outra coisa que não seja a anormal tramitação do
processado de recurso (...).”
Vieram então, em 15 de Abril de 2005, os aludidos
recorrentes apresentar reclamação para o Tribunal Constitucional do despacho de
não admissão de recurso, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 76.º da LTC,
do seguinte teor (fls. 1-3 destes autos):
“Os reclamantes, não se conformando com o douto acórdão proferido
nos autos, interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Este pedido foi indeferido, o que levou os recorrentes a reclamarem
para o Ex.mo Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Nesta reclamação foi proferido douta decisão. a qual mantém o
despacho reclamado, confirmando que a decisão não é recorrível, donde a dado
passo diz: «... se o acórdão é irrecorrível, a nulidade só pode ser invocada
perante o próprio tribunal que proferiu a decisão ...».
Na esteira desta decisão, formulou-se o pedido de nulidade, dentro
do prazo legal, nos termos constantes do requerimento de fls. 17 007, no qual se
suscitou a inconstitucionalidade da não aplicação das normas nele citadas, o que
deve constar da certidão de que se requer junção, o qual aqui se dá como
reproduzido, no qual s [sic].
Sobre este requerimento foi proferido despacho a fls. 17 022 que o
indefere, com o fundamento de que é extemporâneo.
Também dentro do prazo legal, pediu-se o esclarecimento porque não
foi aplicado o n.º 3 do artigo 670.° do CPC ao caso vertente, designadamente
quanto à aí invocada extemporaneidade da arguição das nulidade.
Foi proferido despacho sobre aquele requerimento, do qual se lê:
«...no citado normativo contempla-se e prevê-se situação que manifestamente não
ocorre nestes autos».
Novamente, e dentro do prazo legal, se pediu a nulidade daquele
despacho e suscitou-se a insconstitucionalidade da não aplicação da citada
norma do artigo 670.°, n.º 3, do Código de Processo Civil, conforme se vê do
requerimento de fls. 17 043 e 17 044.
Vem novo despacho, do qual consta que o acórdão proferido neste
Tribunal da Relação se tomou definitivo, pelo que «também não é possível
suscitar questão de inconstitucionalidade a apreciar pelo Tribunal
Constitucional».
Então, e dentro do prazo legal, se interpuseram recurso para esse
Tribunal Constitucional, conforme consta do requerimento de fls. 17 048 e 17
049, que aqui se dá como reproduzido.
Foi proferido despacho sobre o mesmo, no qual, em resumo, diz que
não prevê a admissibilidade do mesmo já que não reclamou desse despacho para a
conferência.
Insistiu-se, dentro do prazo legal, com o requerimento de fls. 17
053, que sobre o aludido despacho recaísse acórdão.
Outro despacho surge, a fls. 17 054, do qual conta «que o
requerimento ora em apreço foi apresentado muito para além do prazo marcado na
lei ...».
Não desistindo, apresentaram novo requerimento, dentro do prazo
legal, pedindo a nulidade daquele despacho e insistindo-se para que recaia
acórdão, suscitando-se novamente a inconstitucionalidade.
É proferido acórdão sobre o mesmo, no qual se conclui em que «o
requerimento de fls. 17 053 foi apresentado para além do prazo estabelecido no
normativo por último aludido, sendo, como tal, extemporâneo».
Ora, como entre o despacho de fls. 17 045 e o requerimento de fls.
17 053 existiram outros requerimentos, apresentaram novo requerimento, dentro
do prazo legal, a pedir esclarecimento, em requerimento junto a fls. 17 609.
Vem então o acórdão, do qual se extrai que os requerimentos
apresentados não suspenderam o trânsito em julgado e o que restava aos
reclamantes «era a da reclamação para o Ex.mo Senhor Presidente do Venerando
Supremo Tribunal de Justiça ...».
Mas isso foi o que os reclamantes já tinham feito, do qual obtiveram
a orientação de que o que deveriam fazer era o pedido de nulidade do douto
acórdão, que foi o que fizeram.
Como se verifica, a acórdão de que se pretende recorrer, por não ter
apreciado as nulidades invocadas, ainda não transitou em julgado e, dentro do
prazo legal, interpuseram recurso para esse Tribunal Constitucional, o qual não
foi admitido.
Termos em que,
deve julgar-se procedente a presente reclamação e, em consequência,
ordenar-se a revogação do despacho reclamado, que não admitiu o recurso para
esse Tribunal Constitucional, por outro que o admita, pois assim decidindo,
V.Ex.a fará Justiça.”
O representante do Ministério Público no Tribunal
Constitucional emitiu parecer do seguinte teor:
“Os ora reclamantes interpuseram recurso de constitucionalidade em 3
de Janeiro de 2005, o qual foi rejeitado por despacho proferido pelo
Desembargador Relator em 13 de Janeiro de 2005, devidamente notificado aos
recorrentes, só vindo a ser deduzida reclamação pela não admissão de tal
recurso em 15 de Abril de 2005, muito para além do prazo legal de que dispunham
para exercer o meio impugnatório previsto no artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º
28/82.
A reclamação é, pois, intempestiva, já que os incidentes anómalos
que entretanto haviam sido suscitados no Tribunal a quo em nada afectaram o
decurso do prazo para reclamar para este Tribunal.”
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. O despacho que não admitiu o recurso interposto para
o Tribunal Constitucional foi proferido em 13 de Janeiro de 2005 e notificado
aos recorrentes seguramente em data anterior a 25 de Janeiro de 2005 (data da
apresentação de requerimento em que fazem expressa referência à notificação do
despacho de 13 de Janeiro de 2005 – cf. fls. 17 053 do processo principal e 32
destes autos).
É, assim, manifestamente extemporânea a reclamação do
despacho de não admissão de recurso apresentada em 15 de Abril de 2005, sendo
seguro que nenhum dos incidentes anómalos suscitados pelos recorrentes no
âmbito do processo principal tem a virtualidade de interromper ou suspender o
prazo de 10 dias para a dedução da reclamação ora em causa (artigos 76.º, n.º 4,
da LTC e 688.º, n.º 2, do CPC ex vi artigo 69.º da LTC).
Acresce que na reclamação apresentada os recorrentes
nenhum argumento aduzem para contrariar o fundamento do despacho reclamado: não
ser o despacho do Relator no Tribunal da Relação decisão recorrível para o
Tribunal Constitucional, por falta de exaustão dos “recursos ordinários”, como
tal se considerando as “reclamações dos despachos dos juízes relatores para a
conferência” (n.ºs 2 e 3 do artigo 70.º da LTC).
3. Em face do exposto, acordam em indeferir a presente
reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça
em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 8 de Julho de 2005
Mário José de Araújo Torres
Paulo Mota Pinto
Rui Manuel Moura Ramos