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Processo n.º 180/2007
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam no Tribunal Constitucional
1.
A. não se conformando com o acórdão da Relação de Évora, proferido em 12 de
Dezembro de 2006, que negou provimento ao recurso interposto da decisão
instrutória que o pronunciou pela prática dos crimes de homicídio qualificado,
ocultação de cadáver e posse e detenção de arma proibida, recorre, ao abrigo do
disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro,
para o Tribunal Constitucional para apreciação da constitucionalidade dos
artigos 174º n.º 4 alínea a) e n.º 5 e artigo 177º n.º 2 do Código de Processo
Penal por, em seu entender, a interpretação que deles foi feita na decisão
recorrida violar o disposto nos artigos 32º n.º 8 e 34º n.ºs 1 e 2 da
Constituição.
1.1.
No recurso para a Relação de Évora o recorrente formulara as seguintes
conclusões:
(…)
1. Vem o presente recurso do douto despacho proferido pelo Meritíssimo Juiz de
Instrução no qual, em sede de questão prévia, se pronuncia pela ilegitimidade do
ora recorrente para arguir a Nulidade de busca realizada em casa de co-arguido,
bem como, pelo indeferimento da Nulidade dessa busca, considerando que esta foi
imediatamente comunicada ao juiz de Instrução e por este “...apreciada em ordem
à sua validação.” (artº 174º nº 5 do Código de Processo Penal).
2. Quanto à questão da ilegitimidade do recorrente, não se compreende como, os
objectos eventualmente colhidos em resultado de uma busca domiciliária se podem
utilizar como elemento de prova contra arguido não residente, mas já estava
vedado a esse arguido a possibilidade de controlar a forma como tais objectos
foram colhidos e entraram nos autos.
3. Na verdade, o artº 120º n.º 1 do Código de Processo Penal diz que “Qualquer
nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos
interessados...”, devendo ser considerados como interessados “... os
participantes processuais (todos) que porventura possam beneficiar da
procedência da arguição, isto é, que tenham interesse em que o acto seja
praticado com regularidade e sem vícios.” (Vr. Simas Santos e Leal-Henriques,
Código de Processo Penal Anotado, 1 Volume, 2 Edição, 2003, pág. 627).
4. Assim sendo, não nos restam dúvidas de que o ora recorrente tem toda a
legitimidade, uma vez que é um dos participantes processuais que porventura
poderá beneficiar da procedência da arguição de nulidade, ou seja, em ver
apreciada a regularidade do acto pelo qual foram colhidos elementos probatórios
eventualmente considerados contra si.
5. Quanto à não comunicação imediata da busca efectuada nos autos, considera o
recorrente que sua posição se traduz na constatação de que, de facto, não houve
sequer uma comunicação ao Meritíssimo Juiz de Instrução da realização de uma
busca, e assim, muito menos nos termos (imediatamente) e para os efeitos
(validação) do nº 5 do artº 174º do Código de Processo Penal.
É que,
6. Vem estabelecido no artº 99º do Código de Processo Penal quando se diz que:
“O auto é o instrumento destinado a fazer fé quanto aos termos em que se
desenrolam os actos processuais
7. Ora, cotejando os autos, na verdade, o que verificamos existir são “Relatos
de Diligência Externa” cujo único fito não é fazer fé nos autos da realização de
uma busca e a sua comunicação, mas antes, apenas e só, relatar e justificar nos
autos a actuação e procedimento adoptado pela Polícia Judiciária.
8. Assim sendo, resultará a evidência lógica de que, toda a mencionada
actividade dos autos embora na prática se tenha traduzido na realização de uma
busca, na verdade não foi encarada dessa forma, pelo que, não faria sentido
efectuar a comunicação a que alude aquele artº 174º n.º5 do Código de Processo
Penal.
9. Aliás, com todo o devido respeito, o raciocínio adoptado pelo tribunal a quo
não explicaria a vontade expressa pelo legislador ao exigir na norma que a
realização da diligência seja “comunicada” ao juiz, dado que, de acordo com o
raciocínio adoptado, sempre, em todo e qualquer caso, os tais elementos colhidos
nas diligências efectuadas seriam juntos aos autos, o que nos levaria à
conclusão de que sempre as mesmas seriam comunicadas.
10. Ora, o legislador, pelos interesses em causa, exigiu muito mais do que isso;
e isto tanto mais certo é quando se verifica que a busca efectuada foi a uma
residência, local onde mais prementemente se impõe a ratio legis.
11. Enfim, nem formal nem substancialmente se podem entender as informações
constantes dos autos nem as promoções subsequentes do Mº Pº como comunicação
para efeitos da citada norma.
12. Ainda que assim não fosse, cumpria-nos sempre dizer que tal “comunicação”
não teria sido feita imediatamente, ou seja, “sem qualquer demora”. Uma vez que,
13. Tal expressão não se compadece com a passagem das 24 horas seguintes (ou
seja, de todo período de funcionamento normal do tribunal no dia 16 de
Setembro), sem que a mencionada “comunicação” seja feita ao Meritíssimo JIC.
14. Quanto à não validação da busca pelo meritíssimo JIC basta ler o douto
despacho proferido a fls. 176 e 177 dos autos, o qual em lado algum anuncia
apreciar ou validar a busca efectuada.
15. Na verdade, conforme se diz no douto despacho recorrido, é manifesto que o
mesmo teve em conta os elementos dos autos para efeitos de “validação da
detenção dos arguidos” e quanto aos “fortes indícios dos crimes que sustentaram
a aplicação da medida prisão preventiva”. Mas não teve seguramente para efeitos
de apreciação e validação da própria busca.
16. E também aqui não poderão confundir-se as realidades em discussão: a
apreciação e validação de uma busca terá de resultar de um acto expresso e
inequívoco do JIC, o que não existe;
17. Por outro lado, “validar uma detenção” não quer dizer “validar um busca”, e
apreciar os elementos probatórios existentes nos autos para efeito de indiciação
dos arguidos, não significa “valido uma busca”. Em suma,
18. Estamos na diferença entre apreciar a validade de determinado meio de prova,
e valorar o resultado desse meio de prova.
19. E é inequivocamente esta última a actividade desenvolvida pelo Meritíssimo
JIC no douto despacho de fls. 176 e 177 ao afirmar que “Resulta para já
fortemente indiciado nos autos, a prática por todos os arguidos, em
co-autoria...”.
20. Nestes termos e por tudo o exposto, deveria a arguida Nulidade ser declarada
procedente, retirando-se do facto a devidas e legais consequências.
21. Aliás, consideramos que a interpretação dada pelo tribunal a quo aos artºs
174º n.º 4 al. a) e nº 5 e artº 177º nº 2 do Código de Processo Penal, com o
sentido de que a comunicação imediata (nº 5 já citado) de busca domiciliária
realizada (ao abrigo das citadas normas), se basta com a presença nos autos de
informação (“Relato(s) de Diligência Externa”) da PJ dando conta da entrada em
casa de um cidadão e dos objectos que foram recolhidos do seu interior, bem como
com o sentido de que, com a apresentação dos arguidos e de tal expediente, não
no dia útil seguinte à detenção mas no segundo desses dias, constitui uma
comunicação imediata tal como a lei a configura, inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas, por violação do disposto nos artº s 32º
nos 8 e 34º n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.
22. Consideramos ainda que a interpretação dada pelo tribunal a quo aos artºs
174º nº 4 al. a) e nº 5 e artº 177º no 2 do Código de Processo Penal, com o
sentido de que para efeitos de apreciação e validação (nos termos do nº já
citado) de busca domiciliária realizada (ao abrigo das citadas normas), basta e
é suficiente (encontrando-se o Meritíssimo JIC a realizar essa operação de
apreciação e validação da busca), que este valide as detenções dos arguidos e
aprecie os indícios existentes nos autos em ordem à fixação de uma medida de
coacção, sem expressa e/ou inequivocamente declarar que valida a busca
realizada, inquina de inconstitucionalidade aquelas normas, por violação do
disposto nos artº s 32º nºs 8 e 34º nos 1 e 2 da Constituição da República
Portuguesa. (…)”
1.2.
A Relação de Évora, por acórdão lavrado em 12 de Dezembro de 2006, negou,
porém, provimento ao recurso.
Na parte que ora releva, disse:
“ (…)
2.5.2 - Segunda questão (a nulidade da busca)
O recorrente invoca a nulidade da busca alegando dois motivos:
- a ausência da comunicação imediata da realização da busca ao juiz;
- a não validação dessa busca.
Para a resolução desta questão é fundamental atender, entre outros, à previsão
dos arts. 174º e 177º n.º 1 e 2 do Código de Processo Penal.
A transcrição da previsão do primeiro mostra-se efectuada no ponto anterior.
No que concerne ao segundo estabelece:
“1 - A busca em casa habitada ou numa sua dependência fechada só pode ser
ordenada ou autorizada pelo juiz e efectuada entre as 7 e as 21 horas, sob pena
de nulidade.
2 - Nos casos referidos no artigo 174º n.º 4, alíneas a) e b), as buscas
domiciliárias podem também ser ordenadas pelo Ministério Público ou ser
efectuadas por órgão de polícia criminal. É correspondentemente aplicável o
disposto no artigo 174º n.º 5”
É evidente que, face à previsão dos citados arts. 177º n.º 2 e 174 n.º 4 al. a)
ambos do Código de Processo Penal, as buscas domiciliárias podem ser efectuadas
pelos órgãos de polícia criminal, nomeadamente, em situações “de terrorismo,
criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da
prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou integridade física
de qualquer pessoa “.
Nessas circunstâncias, o citado art.º 174 n.º 5, do Código de Processo Penal,
como retro referido, estabelece: “a realização da diligência é, sob pena de
nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em
ordem à sua validação “.
O conceito dessa expressão não está definido na lei.
Contudo, deve ser aferido com recurso ao bom senso.
Assim sendo, deve atender-se, não só, ao sentido atribuído a tal expressão na
linguagem comum, recorrendo, como ocorre noutros casos, à previsão do art.º 9º
n.º 3, do Código Civil que estabelece: “o intérprete presumirá que o
legislador... soube exprimir o seu pensamento em termos adequados “, mas também,
à finalidade pretendida com tal comunicação imediata da realização da diligência
ao juiz de instrução.
Tal como se refere no Ac. de 05/12/06, proferido no Proc. n.º 2530/06, desta
Relação e Secção: “Imediatamente significa, em suma, “de modo imediato, sem
demora, “urgentemente “, “o mais rapidamente possível “, por outro lado, com
aquela comunicação imediata visa o legislador assegurar um controlo efectivo da
legalidade da diligência (e da legalidade das provas assim obtidas), de modo a
garantir que a mesma enquanto intromissão na vida privada de alguém - se
revelava necessária e proporcionada aos fins visados, sem deixar de ter em
conta, também, as circunstâncias concretas em que ela se realiza, muitas vezes
integrada numa complexidade de factos e diligências que não permitem a sua
imediata comunicação ao juiz de instrução, sob pena de se frustrarem os fins
visados com a investigação, que não se circunscrevem àquela diligência.
Pretende-se, em suma, procurar uma situação de equilíbrio entre os fins visados
com a busca e a investigação dos ilícitos que justificam a sua realização, por
um lado, e o respeito pelos direitos dos cidadãos, maxime, dos arguidos, que se
visam acautelar com um controlo efectivo da legalidade da busca pelo juiz de
instrução.
Ora, tendo em conta, por um lado, a complexidade (e gravidade) dos factos em
investigação, que resulta, quer dos crimes em causa (pelos quais os arguidos
vieram a ser pronunciados:
um crime de sequestro, um crime de homicídio qualificado, um crime de
profanação/ocultação de cadáver e um crime de detenção ilegal de arma de defesa)
quer da quantidade dos arguidos envolvidos (cinco), por outro, a complexa
organização do processo/expediente - que se infere daqueles factos, mas que
resulta de outras diligências documentadas nos autos e referenciadas no despacho
de pronúncia - para ser presente com os arguidos (detidos) ao juiz de instrução,
temos de considerar:
- que a apresentação do expediente (relativo à busca) ao juiz de instrução,
juntamente com os arguidos (detidos) para lº interrogatório judicial (no dia
17.09.2005), foi efectuada num prazo razoável, ou seja, o mais rapidamente
possível, atentas as circunstâncias do caso, apreciadas de acordo com os
critérios da razoabilidade e do bom senso (não faria sentido, contrariamente ao
alegado, que nesse complexo de diligências de investigação, em que está a ser
preparado/organizado todo o expediente para apresentar ao juiz de instrução,
juntamente com os arguidos, detidos, para 1º interrogatório judicial, que a
comunicação da busca merecesse tratamento privilegiado e isolado em relação à
apresentação dos arguidos, quando é certo que os elementos de prova nela
recolhidos eram essenciais para o interrogatório e seriam necessariamente aí
considerados);
que - como se argumentou no despacho recorrido - não seria razoável (e não
resulta que essa fosse a sua intenção) que o legislador pretendesse impor um
prazo mais curto para a comunicação da busca ao juiz de instrução do que o
imposto para a apresentação do arguido detido para 1º interrogatório judicial,
sendo certo que a privação da liberdade se apresenta como uma restrição mais
grave aos direitos dos cidadãos do que a restrição de quaisquer outros direitos;
que a apresentação desse expediente ao juiz de instrução (que o manuseia, com
ele contacta materialmente e aprecia), juntamente com os arguidos detidos para 1
º interrogatório judicial, vale como comunicação da busca (comunicar não é mais
do que levar ao conhecimento de...), pois o juiz de instrução - com tal
formalidade e com o interrogatório dos arguidos - tomou necessariamente
conhecimento da busca, circunstâncias em que foi realizada e dos elementos de
prova recolhidos na mesma, como se demonstra pelo interrogatório efectuado (que
incidiu sobre os elementos de prova recolhidos na casa onde foi efectuada a
busca) e da necessária referência a tais elementos, designadamente, ao cadáver
da vitima encontrado na busca.”.
Portanto, é lógico e acertado recorrer-se ao prazo de apresentação do arguido
detido para 1º interrogatório judicial, nas 48h seguintes à detenção, para se
concluir que será esse o prazo máximo, para as necessárias comunicações, o que
veio efectivamente a acontecer.
Assim, atendendo à actuação do OPC, no âmbito do mencionado processo, tendo os
arguidos, entre eles o recorrente, sido apresentados ao juiz, no período das
48h, após a detenção, não sendo logo no dia seguinte, atenta a complexidade dos
autos e a necessidade de preparar todo o expediente policial a juntar aos autos,
não existem críticas a apontar.
Acresce que, apresentado o expediente ao juiz, teve lugar o primeiro
interrogatório dos arguidos detidos, tendo sido determinada a prisão preventiva
de todos eles.
Carece, nesta parte, razão o recorrente.
2.5.2.1. No que concerne à validação da busca dir-se-á, tão só, que a nulidade
da diligência prevista no art.º 174 n.º 5 do Código de Processo Penal não
resulta da não validação da mesma pelo juiz, mas da sua não comunicação, pois a
letra da lei é: “a realização da diligência é, sob pena de nulidade, comunicada
ao juiz de instrução e por este apreciada...”.
Atendendo, ao retro afirmado, essa comunicação considera-se efectuada com a
apresentação do expediente ao juiz juntamente com os arguidos detidos, entre
eles o recorrente, para serem interrogados, designadamente, sobre os indícios
recolhidos na busca.
Mas, ainda que fosse outro o entendimento, a busca e os elementos de prova nela
recolhidos foram apreciados pelo juiz de instrução, atendendo ao conteúdo do
despacho que validou e manteve a detenção dos arguidos, pois, em face dos
elementos de prova recolhidos que lhe foram presentes, nomeadamente, os indícios
de prova recolhidos na busca, mostra-se, fortemente, indiciada a prática, por
todos os arguidos, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado,
de um crime de ocultação de cadáver e de posse e detenção de arma proibida. É
necessário atender a que o cadáver da vítima e as armas apreendidas foram
encontrados no interior da casa onde foi efectuada a busca, não podendo deixar
de se concluir que o juiz de instrução, fundamentando a sua decisão nessas
provas, não só tomou conhecimento da busca e dos elementos de prova nela
recolhidos, como a ponderou, implicitamente, válida, aceitando e valorando as
provas nela recolhidas para validar a detenção dos arguidos e manter os mesmos
em prisão preventiva.
Neste mesmo sentido, o acórdão do STJ de 15.12.1998, in www.dgsi.pt, onde se
escreveu, em sumário: “... Quanto à validação da busca... ela resulta
inequivocamente do despacho do Mm.º Juiz de Instrução Criminal, proferido no dia
imediato ao da realização da busca e que validou a detenção do arguido
recorrente e lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva expressamente
com base nas quantidades de produtos estupefacientes apreendidos quando o
arguido lhe foi presente para interrogatório, acompanhado do auto de noticia -
no qual é relatada a detenção do arguido e subsequente busca domiciliária... - e
auto de apreensão da droga...
Concluindo, pelos motivos retro apontados, falece razão ao recorrente (…)”.
2.
É deste acórdão que vem interposto o presente recurso.
2.1.
No Tribunal Constitucional concluiu o recorrente a sua alegação do seguinte
modo:
“ 1. Na Motivação do recurso oportunamente apresentado pelo recorrente no
Colendo Tribunal da Relação de Évora, foram suscitadas outras questões de
Inconstitucionalidade na sua Conclusão 22., pelo que, na ausência de resposta no
douto aresto recorrido, o recorrente arguiu a nulidade do douto aresto por
omissão de pronúncia, nos termos dos artºs 379º nº 1 al. c) e 425º nº 4 do
Código de Processo Penal.
2. Embora no requerimento de interposição do presente recurso, não venha a mesma
tratada, o arguido aguardava uma tomada de posição do Tribunal a quo sobre o
assunto, o que não aconteceu até ao presente. Porém,
3. O arguido não só pretende ver tratada a questão como, pela forma como a
questão vem sumariada nas conclusões 5 a 11 e 21 da Motivação oportunamente
apresentada, parece-nos de vital importância o conhecimento pelo Tribunal da
questão, na economia do presente recurso.
4. Nestes termos, cremos ser necessário o reenvio dos presentes autos para o
Colendo Tribunal da Relação de Évora, a fim de que o requerimento do ora
recorrente tenha a devida decisão.
5. A interpretação da expressão “imediatamente” comunicada e apreciada (no
âmbito do nº 5 do art. 174º do Código Processo Penal, em conjugação com o seu nº
4 al. a) e 177º nº5 1 e 2 do Código Processo Penal), deve ser entendida à luz
dos artºs 32º nº 8 e 24º nº 1 e 2 da CRP com o sentido de que é excessivo um
prazo superior a 24 horas seguintes à pratica do acto processual (busca) em
horário de expediente dos serviços do Tribunal e do OPC, atendendo à
simplicidade da comunicação exigida.
6. E por isso, entendemos a interpretação dada pelo tribunal a quo aos artºs
174º nº 4 al. a) e nº 5 e artº 177º nº 2 do Código Processo Penal, com o sentido
de que a comunicação imediata de busca domiciliária realizada (ao abrigo das
citadas normas), se basta com a apresentação dos arguidos e de tal expediente,
não no dia útil seguinte à detenção mas no segundo desses dias, constituindo uma
comunicação imediata tal como a lei a configura, inquina de
inconstitucionalidade aquelas normas, por violação do disposto nos artº s 32º
nºs 8 e 34º nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa. Por outro lado,
7. Reconhecendo-se que com a dita norma (artºs 174º nº 4 al. a) e nº 5 e artº
177º nº 2 do Código Processo Penal)- “(...) visa o legislador assegurar um
controlo efectivo da legalidade da diligência (e da legalidade das provas assim
obtidas), de modo a garantir que a mesma — enquanto intromissão na vida privada
de alguém — se revelava necessária e proporcionada aos fins visados (...)“.
8. Reconhece-se a violação que constitui, aos direito constitucionais
consagrados nos artºs 32º nos 8 e 34º nºs 1 e 2 da Constituição da República
Portuguesa, a não necessidade de apreciação de uma busca — nos termos em que foi
feita — em ordem à sua validação (bastando-se tão só com a sua comunicação). Na
verdade,
9. Entendemos que as normas supra apenas não serão violadas quando vistas com o
sentido de que a busca realizada deverá ser expressamente apreciada e validada
pelo Juiz de Instrução, debruçando-se este concretamente, sobre a validade do
meio de obtenção de prova; ou seja, por ser formal e substancialmente diferente,
o Juiz de Instrução deve apreciar a regularidade de realização de uma busca e
assim validá-la, não o fazendo com a mera actividade de validar a detenção ou de
sopesar, para fins completamente diferentes (para fixação de uma medida de
coacção), o resultado indiciário deste meio de obtenção de prova.
10. Consideramos pois, que a interpretação dada pelo tribunal a quo aos artºs
174º nº4 al. a) e nº 5 e artº 177º nº 2 do Código Processo Penal, com o sentido
de que para efeitos de apreciação e validação (nos termos do nº 5 já citado) de
busca domiciliária realizada (ao abrigo das citadas normas), basta e é
suficiente (encontrando-se o Meritíssimo JJC a realizar essa operação de
apreciação e validação da busca), que este valide as detenções dos arguidos e
aprecie os indícios existentes nos autos em ordem à fixação de uma medida de
coacção, sem expressa e/ou inequivocamente declarar que valida a busca
realizada, inquina de inconstitucionalidade aquelas normas, por violação do
disposto nos artº s 32º nºs 8 e 34º nºs 1 e 2 da Constituição da República
Portuguesa.”
2.2.
Por seu turno, o representante do Ministério Público formulou as seguintes
conclusões:
1º
“Não constitui restrição desproporcionada à tutela constitucional do domicílio o
entendimento segundo o qual é tempestiva a comunicação ao juiz da realização de
uma busca domiciliária dentro do prazo de 48 horas, procedendo-se à apresentação
conjunta do expediente que a corporiza e do próprio arguido detido.
2º
Não viola qualquer princípio constitucional o entendimento segundo o qual é
passível de interpretação o despacho judicial subsequente a tal comunicação,
tendo-se a busca domiciliária por validada quando o juízo de validação, embora
não expresso, constitua antecedente lógico indispensável, implícito no acto que
considerou inquestionavelmente válida a aquisição processual dos meios
probatórios facultados por tal diligência.”
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
3.
São duas as questões de constitucionalidade que o recorrente coloca à apreciação
deste Tribunal:
- a primeira, consiste em saber se traduz restrição inadmissível do direito à
privacidade do domicílio a circunstância de a realização e os resultados de
determinada busca apenas serem comunicados ao juiz de instrução conjuntamente
com a apresentação dos arguidos detidos, dentro do prazo legal de 48 horas.
- a segunda, relaciona-se com a circunstância de a validação da busca, pelo juiz
de instrução, não ter decorrido de uma decisão expressa, antes resultou do
despacho do juiz que julgou genericamente válidos os elementos probatórios
obtidos através da referida busca.
Quanto à questão prévia levantada pelo ora recorrente nas conclusões da sua
alegação de recurso – conclusões 1 a 4 –, já o Tribunal se pronunciou no Acórdão
n.º 269/2007, pelo que nada há, agora, a decidir quanto a ela.
4.
As normas impugnadas do Código de Processo Penal têm a seguinte redacção:
Artigo 174º
(Pressupostos)
1.
Quando houver indícios de que alguém oculta na sua pessoa quaisquer
objectos relacionados com um crime ou que possam servir de prova, é ordenada
revista.
2.
Quando houver indícios de que os objectos referidos no número
anterior, ou o arguido ou outra pessoa que deva ser detida, se encontram em
lugar reservado ou não livremente acessível ao público, é ordenada busca.
3.
As revistas e buscas são autorizadas ou ordenadas por despacho, pela
entidade judiciária competente, devendo esta, sempre que possível, presidir à
diligência.
4.
Ressalvam-se das exigências contidas no número anterior as revistas e
as buscas efectuadas por órgão de polícia criminal nos casos:
a)
De terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada,
quando haja fundados indícios da prática de iminente crime que ponha em risco a
vida ou a integridade física de qualquer pessoa;
b)
Em que os visados consintam, desde que o consentimento prestado
fique, por qualquer forma, documentado; ou,
c)
Aquando da detenção em flagrante por crime a que corresponda pena de
prisão.
5.
Nos casos referidos na alínea a) do número anterior, a realização da
diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de
instrução e por este apreciada em ordem à sua validação”.
Artigo 177º
(Busca domiciliária)
1. A busca em casa
habitada ou numa sua dependência fechada só pode ser ordenada ou autorizada pelo
juiz, efectuada entre as sete e as vinte e uma horas, sob pena de nulidade.
2. Nos casos referidos no
artigo 174º n.º 4 alíneas a) e b), as buscas domiciliárias podem também ser
ordenadas por órgão de polícia criminal. É correspondentemente aplicável o
disposto no artigo 174º n.º 5.
(…)
4.1.
Vigora, no processo penal, o princípio da liberdade de prova (no sentido de que
todos os meios de prova são admissíveis para o apuramento da verdade material);
a verdade material obtida há-de, no entanto, corresponder a uma verdade
processualmente válida, adquirida através de meios não proibidos pela lei ou
pela Constituição, designadamente os que o n.º 8 do citado artigo 32º
expressamente afasta: tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da
pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou
nas telecomunicações. A este propósito, escreveu-se no Acórdão n.º 578/98
(publicado no DR, II Série, de 26 de Fevereiro de 1999), “(…) no processo penal,
vigora o princípio da liberdade de prova, no sentido de que, em regra, todos os
meios de prova são igualmente aptos e admissíveis para o apuramento da verdade
material (…). Existe um dever ético e jurídico de procurar a verdade material.
Mas também existe um outro dever ético e jurídico que leva a excluir a
possibilidade de empregar certos meios na investigação criminal (…).”
4.2.
O direito à não intromissão abusiva no domicílio, conforme já ponderou o
Tribunal, (Acórdão n.º 67/97 publicado nos AcTC, 36º vol., pág. 247), deve ser
“dimensionado e moldado a partir da observância do respeito pela dignidade da
pessoa humana, na sua vertente de intimidade da vida privada”, uma vez que o
domicílio bem pode ser considerado como uma projecção da própria pessoa.
Todavia, a tal direito não corresponde um sistema de inviolabilidade absoluta do
domicílio que, aliás, se mostra claramente afastado pela Constituição – artigo
34º n.º 2.
O Tribunal já reconheceu que “não existe norma constitucional de que possa
retirar-se a completa imunidade de um espaço a buscas judiciais: basta, para o
efeito, atentar no disposto no artigo 32º n.º 8 da Constituição, que proíbe a
abusiva intromissão na vida privada e no domicílio, o que obviamente significa
que existem intromissões constitucionalmente permitidas. Entre estas situam-se,
sem dúvida, as buscas judiciais que tenham lugar nos casos e segundo as formas
previstas na lei, que a Constituição admite quando se trata da entrada no
domicílio dos cidadãos (cfr. artigo 34º n.º 2 da Constituição)” – Acórdão n.º
364/06 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
4.3.
O Código de Processo Penal estabeleceu a regra de que a realização de busca
domiciliária deve ser precedida de autorização judicial (artigo 177º n.º 1),
embora admita (artigo 174º n.º 4, ex vi, artigo 177º n.º 2), que em certos casos
essa busca possa ser “ordenada pelo Ministério Público ou efectuada por órgãos
de polícia criminal”, sem necessidade de autorização judicial prévia, quando a
realização urgente da diligência se revelar imperiosa, em virtude de
“terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja
fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida
ou a integridade física de qualquer pessoa”. Mas nestes casos, efectuada a
busca, a sua realização deve ser imediatamente comunicada ao juiz de instrução
para que este a aprecie em ordem a uma validação posterior (artigos 177º n.º 2 e
174º n.º 5, do mesmo Código).
No Acórdão n.º 7/87 (Diário da República, I Série, de 9 de Fevereiro de 1987) o
Tribunal considerou que, mesmo sem autorização da autoridade judiciária, as
buscas domiciliárias levadas a cabo no âmbito da investigação de criminalidade
violenta ou organizada não violariam a Constituição, desde que ocorra perigo
iminente da prática de um crime com grave risco para a vida ou para a
integridade física, pois “o direito à inviolabilidade do domicílio (…) deve[r]
compatibilizar-se com o direito à vida e à integridade pessoal, consignados
respectivamente nos artigos 24º e 25º da lei fundamental (…)”.
5.
Importa, porém, determinar se as normas impugnadas permitem exercer, com a
necessária suficiência, o controlo judicial a que a Constituição submete a
realização da busca domiciliária.
5.1.
A Constituição não impõe qualquer prazo para que a realização da busca seja
comunicada ao juiz; o prazo previsto no Código representa a forma criada pelo
legislador ordinário, no âmbito do poder de livre conformação que lhe é proposto
pela Constituição, para concretizar uma exigência mais genérica de carácter
constitucional a favor do efectivo controlo judicial exercido nestes casos.
Mas bem se compreende que a ausência da estatuição constitucional não queira
significar desinteresse do legislador constitucional quanto à concretização da
garantia, antes representa a oneração do legislador ordinário com o encargo de
encontrar uma solução que satisfaça com suficiência a já mencionada exigência.
Há, pois, que aceitar que nos casos, necessariamente excepcionais, em que a
autorização judicial da busca domiciliária ocorre a posteriori, o controlo
judicial deva ser exercido imediatamente, como diz a lei (n.º 5 do artigo 174º
do Código de Processo Penal).
Mas, ao legislador constitucional interessa que o controlo judicial seja apto a
condicionar a eficácia da diligência, aferindo, não apenas da oportunidade da
actuação policial e do cumprimento dos demais requisitos legais, mas
condicionando a operatividade da prova recolhida; o controlo judicial deve ser,
enfim, decisivo quanto ao valor probatório dos elementos recolhidos na busca.
No citado Acórdão n.º 192/2001, em recurso de decisão que, após reconhecer
verificar-se uma nulidade por falta de apreciação/validação imediata das buscas
(no caso, não domiciliárias), ser sanável a referida nulidade, decidindo que ao
abrigo do artigo 122° do Código de Processo Penal deveria “agora ser praticado o
acto omitido”, o Tribunal Constitucional não julgou inconstitucionais as normas
conjugadas dos artigos 251° 174° n.º 5 e 122° do Código de Processo Penal,
interpretadas no sentido de permitir a sanação da nulidade, por falta de
validação imediata da busca efectuada, com a validação a posteriori da mesma
busca. O Tribunal considerou que “a sanação a posteriori da nulidade não se
configura com uma solução arbitrária e desrazoável, ou seja, como um meio legal
restritivo desproporcionado ou excessivo em relação aos fins prosseguidos”.
Reconhecendo que “até à validação da busca e podendo, entretanto, prosseguir a
investigação com base nos resultados dessa diligência, existe um momento de
incerteza sobre a verificação dos pressupostos legais da mesma diligência, com o
aparente risco de vir a ser proferida uma decisão de não validação quando
aqueles resultados já proporcionaram a obtenção de outras provas”, entendeu-se,
porém, que “mesmo neste caso – de hipotética não validação – o regime
estabelecido no artigo 122º do Código de Processo Penal assegura que os actos
subsequentes sejam declarados inválidos se dependerem do acto que não obtém a
necessária validação”, e sendo certo que a outra hipótese – a da validação em
acto ulterior – “nunca porá em causa as garantias defesa do arguido”.
Mas, verdadeiramente, importa partir da constatação de que a busca constitui uma
diligência destinada a recolher prova num determinado processo, ligada a um
objectivo concreto: a individualização do arguido. Não pode, por isso, ter-se
por desproporcionada, injustificada ou violadora das disposições constitucionais
a interpretação que considera que a comunicação a posteriori da busca possa ser
efectuada com a apresentação do detido, dentro das 48 horas seguintes à
diligência, da qual resultou a própria prisão do arguido, assim possibilitando
ao juiz a verificação da globalidade dos indícios determinantes quer da
necessidade da busca, como da detenção do arguido, o que é bastante para
acautelar as garantias de defesa deste último.
Há-de, pois, concluir-se que a comunicação da efectivação da busca dentro do
prazo de 48 horas não afecta o controlo judicial a posteriori que se teve por
constitucionalmente devido, sendo certo que, como se referiu no Acórdão n.°
192/2001, o risco de se terem entretanto recolhido provas só possíveis por causa
de uma busca que venha a ser considerada inválida, é satisfatoriamente afastado
graças ao regime do artigo 122° do Código de Processo Penal, que estende a
invalidade da busca aos actos dela dependentes.
Improcede a primeira questão invocada.
6.
Questiona, ainda, o recorrente a interpretação da norma resultante dos artigos
174º n.º 4 alínea a) e 117º n.º 2 do Código de Processo Penal no sentido de que
para efeito de apreciação e validação da busca domiciliária realizada, é
suficiente a validação, pelo juiz, das detenções efectuadas e a apreciação dos
indícios existentes nos autos, sem expressamente declarar que valida a busca
domiciliária efectuada.
6.1.
Disse-se no acórdão da Relação ora recorrido (fls. 125) “ que a apresentação
desse expediente ao juiz de instrução (que o manuseia, com ele contacta
materialmente e aprecia), juntamente com os arguidos detidos para 1º
interrogatório judicial, vale como comunicação da busca (comunicar não é mais do
que levar ao conhecimento de…), pois o juiz de instrução – com tal formalidade e
com o interrogatório dos arguidos – tomou necessariamente conhecimento da busca,
circunstâncias em que foi realizada e dos elementos de prova recolhidos na
mesma, como se demonstra pelo interrogatório efectuado (que incidiu sobre os
elementos de prova recolhidos na casa onde foi efectuada a busca) e da
necessária referência a tais elementos, designadamente ao cadáver da vítima
encontrado na busca (…), explicitando-se, um pouco mais à frente que “o juiz de
instrução, fundamentando a sua decisão nessas provas, não só tomou conhecimento
da busca e dos elementos de prova nela recolhidos, como a ponderou,
implicitamente, válida, aceitando e valorando as provas nela recolhidas para
validar a detenção dos arguidos e manter os mesmos em prisão preventiva.”
6.2.
Já se viu que, de acordo com a alínea a) do n.º 4 e n.º 5 do artigo 174º do
Código de Processo Penal, é essencial que o julgador formule um juízo sobre a
legalidade da diligência efectuada.
Ora, o que decorre do despacho judicial em causa é que o juiz teve como válidos
os elementos probatórios resultantes da dita busca, neles se fundamentando para
validar a detenção do arguido. Assim interpretada, a norma não ofende a
Constituição: o que a Constituição pretende assegurar é a exigência de um
controlo jurisdicional na realização das buscas domiciliárias, com um
determinado fim: o de acautelar as garantias de defesa do arguido. Ora, esse
controlo, quando exercido a posteriori por motivos constitucionalmente
justificados, é cabalmente cumprido se o juiz, a despeito de fórmulas
sacramentais, verifica efectivamente a legalidade dessa busca, 'aceitando e
valorando as provas nela recolhidas para validar a detenção dos arguidos e
manter os mesmos em prisão preventiva”.
Concluindo: face às circunstâncias do caso, é de considerar que o juiz apreciou
e validou a busca efectuada, assim exercendo o controlo que a Constituição
determina; não ofende nenhum preceito constitucional a norma impugnada.
Improcede, também, nesta parte, e por estes motivos, a segunda questão de
inconstitucionalidade suscitada pelo recorrente.
7.
Em face do exposto, decide negar-se provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 8 de Maio de 2007
Carlos Pamplona de Oliveira
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Maria João Antunes (com declaração de
voto)
Rui Manuel Moura Ramos
Declaração de voto
Votei a não inconstitucionalidade da norma resultante dos artigos 174º, nº 4,
alínea a) e 177º, nº 2, do Código de Processo Penal no sentido de que para
efeito de apreciação e validação da busca domiciliária realizada é suficiente a
validação, pelo juiz, das detenções efectuadas e a apreciação dos indícios
existentes nos autos, sem expressamente declarar que valida a busca domiciliária
efectuada, sem prejuízo de ulterior reponderação da questão de saber se esta
norma viola ou não o disposto no artigo 34º, nº 2, da Constituição da República
Portuguesa.
Ou seja, se a interpretação daquelas disposições legais, no sentido de a
apreciação pelo juiz de instrução, em ordem à validação da busca domiciliária,
se bastar com a aceitação e valoração das provas nela recolhidas para validar a
detenção dos arguidos e manter os mesmos em prisão preventiva, respeita ou não a
exigência constitucional de reserva de juiz: ao juiz cabe ordenar e autorizar a
entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade, bem como apreciar, em
ordem à sua validação, as buscas domiciliárias que, excepcionalmente – para a
salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos –,
sejam ordenadas pelo Ministério Público ou efectuadas por órgão de polícia
criminal.
Concretamente, trata-se de saber se este controlo exercido a posteriori, por
motivos constitucionalmente justificados, com a finalidade, entre outras, de
“acautelar as garantias de defesa do arguido” (artigo 32º, nº 1, da
Constituição), como é destacado no ponto 6.2. deste acórdão, exige ou não uma
“pronúncia judicial autónoma e expressa” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº
278/07), reportada ao momento em que foi efectuada a diligência, no sentido de
que se justificava tal meio de obtenção da prova (artigo 174º, nº 2, do Código
de Processo Penal) e de que se tratava de caso em que é legalmente admissível
não haver ordem ou autorização judicial prévia (artigo 177º, nº 2, do Código de
Processo Penal). No fundo, trata-se de saber se a “função de tutela que é
própria da Richtervorbehalt” se cumpre, quando o juiz, ele próprio, não
subjectiviza a fundamentação e a diligência ocorrida (Costa Andrade, “Formas
ocultas de investigação”, texto que serviu de base à intervenção no Colóquio
Luso-Alemão “Que futuro para o direito processual penal”, Escola de Direito da
Universidade do Minho, Março de 2007).
Maria João Antunes