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Processo n.º 923/05
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam em conferência na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presente autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é
recorrente A., iniciou-se no 1º Juízo Criminal da Comarca de Matosinhos um
processo de reforma de autos sendo aí proferida a seguinte decisão:
“Iniciaram-se os presentes autos de reforma do processo que correu termos neste
juízo sob o nº 1982/96.0 TBMTS por comunicação da senhora escrivã a relatar o
extravio dos mesmos.
Foram notificados os diversos intervenientes nos autos originais e ora
extraviados e procedeu-se à prevista conferência.
Do mesmo passo foram solicitadas, depois de ouvidas as partes, as diversas
cópias das peças processuais produzidas na diversas instâncias.
Cumpre, pois, decidir.
O Tribunal é absolutamente competente.
O processo não enferma de nulidades que o invalidem de todo.
Não se surpreendem quaisquer excepções ou questões prévias/incidentais que
cumpra conhecer ex officio.
A prova produzida tem unicamente a veste documental, sendo que da mesma já os
diversos intervenientes foram notificados, não tendo arguido qualquer nulidade
ou dela reclamado.
Assim, considerando a natureza de tal prova, designadamente no que se refere ao
valor probatório da mesma, há que considerar que os autos supra referidos devem
ser havidos como reformados de acordo com o teor das diversas decisões cujas
cópias foram entretanto juntas aos autos.
Decisão:
Pelo exposto, declaram-se os autos supra-referidos como reformados, nos precisos
termos que são retratados pelas cópias das decisões proferidas”.
2. Inconformado com esta decisão, o ora reclamante interpôs recurso para o
Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 15 de Dezembro de 2004,
rejeitou o recurso com fundamento na sua manifesta improcedência.
3. Novamente inconformado o ora reclamante veio aos autos – já depois de
indeferido um pedido de aclaração – para interpor recurso desta decisão para o
Supremo Tribunal de Justiça. A terminar a motivação de recurso que então
apresentou formulou as seguintes conclusões:
“1. O recurso interposto da sentença proferida não deveria ter sido rejeitado
por manifesta improcedência.
2. Já que razão assistia ao recorrente quando pretendia ver declarada a nulidade
da sentença proferida em primeira instância.
Efectivamente,
3. Esta não observa o disposto no artigo 1077º do C.P.Civil, uma vez que não
fixara, com precisão, o estado em que se encontrava o processo, os termos
reconstituídos e os termos a reformar.
4. E, por isso, o douto acórdão de que ora se recorre não deveria ter rejeitado
o recurso, por um lado,
5. E, por outro, conhecendo do respectivo mérito, deveria ter declarado nula a
sentença.
6. Ao assim não decidir, fez incorrecta interpretação do disposto no art. 420º,
nº 1, do C.P.Penal e
7. Permitiu que a clara violação do disposto no art. 1077º do C.P. Civil, não
fosse sancionada com a respectiva declaração de nulidade”.
4. Por parte do Relator do processo no Tribunal da Relação do Porto foi
proferida decisão, em 12 de Abril de 2005, a rejeitar o recurso para o Supremo
Tribunal de Justiça.
5. Inconformado com esta decisão o recorrente reclamou dela para o Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, reclamação que fundamentou, em síntese, nos
seguintes termos:
“Não existindo regra específica sobre o recurso no caso de processo de reforma
dos autos, no Código de Processo Penal, e socorrendo-nos do Código de Processo
Civil (art. 463º, nº 3, al. a)) relativamente aos processos especiais (como é o
presente caso) teremos como certo que a decisão é recorrível e que não andou bem
o despacho de que se reclama. Tanto mais que,
Mesmo que se tenha que admitir que no processo penal tem aplicabilidade a regra
geral correlativa com a gravidade da pena, temos também por certo que o acórdão
recorrido foi proferido em recurso pela Relação em processo, por crime a que,
abstractamente seria aplicável pena de 3 a 10 anos (art. 164º, nº 1, C.Penal).
É a gravidade abstracta do crime aferida legalmente pela pena aplicável e não a
sua concreta gravidade, aferida judicialmente, pela pena aplicada que determina
a recorribilidade ou irrecorribilidade, para o S.T.J., dos acórdãos proferidos
em recurso pelas Relações […]”
6. Por parte do Ex.mo Conselheiro Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
foi então proferida a seguinte decisão:
“Quando o processo foi reformado, encontrava-se já em fase final de execução da
pena. É a fase em que está, não perturbando a reforma, a situação processual
pré-existente. O ciclo processual está completo.
Têm-se como manifesta a inadmissibilidade do recurso, não havendo sequer, agora,
que considerar as razões invocadas pelo reclamante – no que respeita à
ponderação do binómio, pena aplicada/pena aplicável”.
7. Na sequência desta decisão o reclamante veio aos autos arguir a sua
“irregularidade” por falta de fundamentação. Foi, então, proferida a seguinte
decisão:
“[...] Os autos de reforma são um processo independente daquele outro que se
pretende reformar, com uma tramitação própria a que alude o artigo 102º do CPP e
os artigos 1074º e ss. do CPC, ou seja, inicia-se com a entrega de um
requerimento e onde a final é proferida sentença nos termos do artigo 1077º do
CPC.
Logo, não pode para efeitos de admissibilidade do recurso atender-se ao processo
crime que lhe está subjacente, dado a autonomia deste face à reforma dos autos.
E como nestes autos de reforma já se encontra assegurado o duplo grau de
jurisdição seria inaceitável admitir-se um triplo grau, não exigido pelo artigo
32º, nº 1 da Constituição, que se contenta com a segunda instância, e mesmo esta
somente na disponibilidade do arguido para recorrer de sentenças condenatórias e
de quaisquer actos judiciais que tenham como efeito a privação ou a restrição da
liberdade ou o atentado a quaisquer outros direitos fundamentais, como tem
acentuado a jurisprudência constitucional.
Acrescente-se ainda que a lei não prevê especialmente o recurso para o STJ neste
caso, em conformidade com o disposto no artigo 433 do CPP.
Face ao exposto, que se traduz numa mais completa fundamentação do despacho de
fls. 47, entendemos ficarem esclarecidas as questões suscitadas pelo arguente.
Nesta linha, fica o mesmo isento de custas”.
8. Veio, então, o recorrente, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70º da
LTC, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, através de um requerimento
com o seguinte teor:
“[...], não se conformando com o douto despacho proferido e convenientemente
aclarado e que indeferiu a reclamação por si apresentada,
Vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, o que faz nos seguintes
termos :
1. O presente recurso é interposto ao abrigo do disposto no artg. 70°., n°. 1,
al. b) da Lei nº. 28/82, de 15 de Setembro; e
2. Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade das normas ínsitas no
artgº. 102°. do C.P.P. e artgsº. 1074°., 1075°., 1076°. e 1077°. do C. P. Civil,
na interpretação acolhida na decisão recorrida, isto é, considerando que,
3. ... “Os autos de reforma são um processo independente daquele outro que se
pretende reformar, com uma tramitação própria a que alude o artgº 102º do C.P.P.
e os artgsº. 1074°. e segs. do C.P.C., ou seja, inicia-se com a entrega de um
requerimento e onde a final é proferida sentença nos termos do artgº. 1077°, do
C.P.C.
“...
...”Logo, não pode para efeitos de admissibilidade de recurso atender-se ao
processo crime que lhe está subjacente, dado a autonomia deste face à reforma
dos autos”...
Na verdade,
4. Entendemos que, porque o acórdão recorrido foi proferido em recurso pela
Relação, em processo especial de reforma de autos de processo por crime a que,
abstractamente, seria aplicável pena de prisão de 3 a 10 anos (artgº. 164°., no.
1 do C. Penal,
Não se pode dissociar ou autonomizar integralmente esse processo de autos,
daqueloutro que lhe está subjacente. E
5. Reflexo de tal é até a inserção de norma específica de reforma de autos no
ordenamento adjectivo penal.
6. Se ocorresse a tal autonomia ou dissociação, nem era preciso ter inserido tal
norma no C.P.P ..
7. Os princípios informadores e formadores do processo penal estão interligados
e fazem incidir os seus reflexos no processo especial de reforma de autos de
processo penal.
Assim,
8. Deverá caber recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão proferido
pelo Tribunal da Relação que negue provimento a recurso interposto de decisão
proferida em processo de reforma de autos e que julgou estes reformados.
9. E desde que a pena aplicável ao crime, abstractamente, seja de limite
superior a oito anos de prisão, tudo como manda o disposto no artgº. 400°., nº.
1, al. f) do C.P.P., já que é a gravidade abstracta do crime, aferido legalmente
pela 'pena aplicável' e não a sua concreta gravidade aferida judicialmente pela
'pena aplicada', que determina a recorribilidade ou irrecorribilidade para o
S.T.J. dos acórdãos proferidos em. :recurso pelas Relações.
(De outro modo, a recorribilidade das decisões da Relação, proferida sem recurso
de processo penal ou de reforma de autos de processo penal ficaria, de certa
maneira, entregue ao seu próprio alvedrio, na certeza de que os seus acórdãos
seriam irrecorríveis quando se tratasse de penas de prisão não superiores a
cinco anos e mesmo, se confirmativos de decisão de 1ª Instância, pena de prisão
até oito anos)
10. Afigura-se-nos, pois, que o recurso tem que ser admitido, devendo,
consequentemente, ser atendida a reclamação apresentada.
11. Tais normas, com a interpretação que foram aplicadas. são violadoras do
disposto no artgº. 32°., n°. 1 da Constituição da República Portuguesa.
12. A questão da inconstitucionalidade não foi suscitada anteriormente porquanto
nem sequer se sabia - por não terem sido indicadas - as normas em que a decisão
se sustentava.
Ora,
Os Tribunais não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição
ou os princípios nela consignados – artgº. 204°. da C.R.P.
9. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao
abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro,
na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão
sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na
parte relevante, o seu teor:
“[...] Importa, antes de mais, decidir se pode conhecer-se do objecto do
recurso, uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal
Constitucional (cfr. art. 76º, n.º 3, da LTC).
10.1. Pode, desde logo, questionar-se se, no requerimento de interposição do
recurso, vem formulada pelo recorrente, com a clareza exigida por este Tribunal,
a exacta questão de constitucionalidade normativa que o mesmo pretende ver
apreciada. Com efeito, refere o recorrente que pretende ver apreciada a
inconstitucionalidade “das normas ínsitas nos artigos 102º do CPP e artigos
1074º, 1075º, 1076º e 1077º do C.P. Civil, na interpretação acolhida na decisão
recorrida”, citando depois passagens desta decisão, que supra transcrevemos, de
onde alegadamente decorreria qual é essa interpretação. Do requerimento,
igualmente transcrito supra, não resulta, porém, com suficiente clareza, nem é
qual a exacta interpretação normativa que o recorrente pretende ver apreciada,
nem, sobretudo, qual(is) o(s) preceito(s) de que ela se extrai – sendo, contudo,
indubitável que não poderão ser todos os artigos aí referidos, uma vez que a
maior parte dos mesmos (se não todos) nada têm a ver com a questão da
admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de uma decisão
proferida pelo Tribunal da Relação em autos de reforma do processo.
No entanto, ainda que se considere que o recorrente não identificou, com
precisão, no requerimento de interposição do recurso, a norma cuja
inconstitucionalidade pretende ver apreciada, nem assim haverá, no caso
concreto, que formular um convite para o aperfeiçoamento daquele requerimento. É
que um tal convite não deixaria de configurar um acto inútil, cuja prática está
vedada pelo artigo 137º do Código de Processo Civil, uma vez que, por outra
razão, que já de seguida se explicitará, sempre será de não admitir o presente
recurso.
10.2. Na verdade, como refere expressamente o artigo 72º, n.º 2, da LTC, o
recurso previsto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70º, “só pode ser interposto
pela parte que haja suscitado a questão de constitucionalidade [...] de modo
processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em
termos de este estar obrigado a dela conhecer”. Ora, no caso dos autos, é
patente que o recorrente nunca confrontou o Supremo Tribunal de Justiça, antes
da prolação da decisão recorrida, com a questão da inconstitucionalidade de
qualquer norma de que pudesse decorrer a inadmissibilidade do recurso que
pretendeu interpor para o Supremo Tribunal de Justiça, o que, de acordo com a
regra antes enunciada, conduz, só por si, a que se não possa admitir o recurso
que pretendeu interpor para este Tribunal Constitucional.
Alega, porém, o recorrente, que, no caso dos autos, não teria de cumprir aquele
ónus de suscitação prévia da questão de constitucionalidade, “porquanto nem
sequer sabia – por não terem sido indicadas – as normas em que a decisão se
sustentava”.
Mas, como se verá sumariamente, não lhe assiste qualquer razão.
De facto, como o Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, o
recorrente só não estará obrigado a suscitar a questão de inconstitucionalidade
normativa que pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional antes de
proferida a decisão recorrida quando essa decisão - ou, melhor dito, a
interpretação da norma em que a mesma se baseia - seja de todo em todo insólita
ou imprevisível. Ora, manifestamente, não é isso que acontece nos presentes
autos. E, desde logo, pela razão óbvia de que a decisão recorrida se limitou a
confirmar uma anterior decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto no
mesmo sentido – i.e., no sentido da inadmissibilidade do recurso para aquele
Supremo Tribunal de uma decisão proferida em recurso pelo Tribunal da Relação em
autos de reforma do processo. Ora, em face das circunstâncias do caso concreto,
sendo evidente que nada de insólito ou imprevisível existe na decisão recorrida,
a ponto de não ser razoável exigir que o recorrente devesse antecipá-la, há que
concluir que este, tendo tido oportunidade processual para suscitar, na
reclamação que apresentou perante o Supremo Tribunal de Justiça, os argumentos
de inconstitucionalidade que considerasse pertinentes, poderia e deveria tê-lo
feito se pretendia acautelar a possibilidade de ver a questão apreciada, em
recurso, pelo Tribunal Constitucional. Não o tendo feito, não lhe está aberta a
via de recurso para este Tribunal.
10.3. Assim sendo, apenas resta concluir, em face do exposto, que não é possível
conhecer do objecto do recurso, por evidente falta dos seus pressupostos de
admissibilidade, ficando deste modo precludida a possibilidade de indagação de
um eventual carácter manifestamente infundado da questão de constitucionalidade
que vem colocada pelo recorrente”.
10. É desta decisão que vem interposta, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, n.º
3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência, que o reclamante fundamenta
nos seguintes termos:
“I. A decisão sumária proferida entendeu não ser possível conhecer do objecto do
recurso, por evidente falta dos seus pressupostos de admissibilidade ficando,
até e assim precludida a possibilidade de indagação de um eventual carácter
manifestamente infundado da questão de constitucionalidade colocada.
Fundamenta-se tal decisão na circunstância de o recorrente não ter cumprido o
ónus imposto no nº. 2 do artgº. 72°., da L.C.T. já que nunca confrontou o
Supremo Tribunal de Justiça, antes da prolação da decisão recorrida, com a
questão da inconstitucinalidade de qualquer norma de que pudesse decorrer a
inadmissibilidade do recurso que pretendeu interpor para o Supremo Tribunal de
Justiça.
II. Ora, o que o recorrente entende que fere os princípios e normas
constitucionais, são normas – artgº. 102°. do C.P.P. e artgº. 1074°., 1075°.,
1076°. e 1077°. do C.P.Civil, na interpretação acolhida - que apenas e tão só
foram indicadas e com aquela interpretação e com aquele sentido na decisão
recorrida.
Nunca antes tais normas haviam sido invocadas ou referidas sequer. E, por isso,
nunca, até ali, poderiam ser arguidas de inconstitucionais.
III. Embora se compreenda e se respeite a decisão sumária proferida, certo é que
nos permitimos, respeitosamente, da mesma discordar.
Efectivamente, entendemos que não valerão aqui as razões aduzidas no item 10.2
da decisão sumária já que o que aqui está em jogo é, efectivamente, “decisão que
seja de todo em todo insólita ou imprevisível”. A primeira vez, em todo o
percurso processual, que o julgador utiliza aquelas normas e com aquele sentido
é na decisão recorrida. Ora, obviamente, antes, se nunca foram utilizadas,
nunca, em sentido algum, poderiam ser arguidas de inconstitucionais. Não é a
decisão que se vem arguir de inconstitucional ou as sucessivas decisões
desfavoráveis. O que acreditamos ser inconstitucional por atentatório do
disposto no artgº. 32°. da C.R.P., foi a utilização daquelas normas e com aquele
sentido. E como só o foram naquele momento, naquele acto, naquela decisão,
jamais a questão da inconstitucionalidade poderia ou deveria ter sido suscitada
antes. [...]”
11. Notificados os recorridos, disse o Ministério Público:
“1. A presente reclamação carece obviamente de fundamento.
2. Na verdade, o reclamante não suscitou durante o processo – dispondo
inquestionavelmente de oportunidade processual – a questão de
inconstitucionalidade que integra o objecto do recurso para este Tribunal
Constitucional.”
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
III – Fundamentação
12. Na decisão sumária reclamada concluiu-se no sentido da impossibilidade de
conhecer do objecto do recurso, por não ter o recorrente suscitado, de modo
processualmente adequado e perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida,
como exige o n.º 2 do art. 72º da Lei do Tribunal Constitucional, qualquer
questão de constitucionalidade normativa susceptível de integrar o recurso que
pretendeu interpor. Considerou-se, ainda, que, no caso concreto, não poderia
aceitar-se que se estivesse perante uma daquelas situações em que a
interpretação dada pela decisão recorrida a um determinado preceito legal fosse
de tal forma insólita ou imprevisível de modo a não ser exigível ao recorrente
que a antecipasse, dispensando-o do ónus de suscitar a questão de
inconstitucionalidade antes da prolação daquela decisão.
É esta última conclusão que o ora reclamante agora pretende contestar.
Manifestamente, porém, sem qualquer razão. Na verdade, como já se demonstrou na
decisão sumária reclamada, em termos que não são minimamente abalados pela
presente reclamação, pelo que agora se reiteram, nada de insólito ou de
imprevisível existe na decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça em
autos de reclamação apresentados ao abrigo do disposto no artigo 688º do CPC -
que, recorde-se, se limitou a confirmar a anterior decisão do Tribunal da
Relação do Porto no sentido da inadmissibilidade do recurso que o ora reclamante
pretendeu interpor para aquele Supremo Tribunal.
Agora apenas se acrescenta, porque o reclamante insiste nesse ponto, que mesmo o
facto de um determinado preceito ser, pela primeira vez, expressamente invocado
por uma decisão judicial, não torna, só por si, essa invocação insólita ou
imprevisível. Assim não acontece, como é evidente, quando os preceitos que são
invocados pela decisão em causa, ainda que pela primeira vez, disponham
precisamente sobre a situação - substantiva ou processual - que a mesma é
chamada a resolver.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do
recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa 8 de Fevereiro de 2006
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício