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Processo n.º 282/05
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial de Setúbal, a arguida A.,
ora reclamante, requereu, na abertura da audiência que teve lugar no dia 31 de
Março de 2005, que fosse suspensa a “instância até à realização do referendo
sobre a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 10
semanas, anunciado no programa do actual governo”. O requerimento foi
indeferido. Inconformada, com o assim decidido, a ora reclamante recorreu para o
Tribunal da Relação de Évora, sustentando que o recurso era de subida imediata e
tinha efeito suspensivo do processo. Sobre este último requerimento foi
proferido o seguinte despacho: “Conforme resulta do disposto no art. 414°, n.º 1
do C.P.P., interposto recurso e junta a motivação ou expirado o prazo para o
efeito só então o juiz profere despacho e só nesta altura fixa o seu efeito e o
regime de subida. Assim sendo, aguardem os autos pela junção da motivação do
recurso ora interposto pela arguida [...]”
2. A ora reclamante, além de suscitar a nulidade do despacho proferido, veio,
então, recorrer para o Tribunal Constitucional, suscitando a questão da
inconstitucionalidade da interpretação do disposto no n.º 1 do art. 414° do
Código de Processo Penal, nos seguintes termos:
“[...] tal decisão apenas se poderá justificar numa interpretação do disposto no
n.º 1 do art. 414° citado no douto despacho que claramente faz também enfermar
tal norma de absoluta inconstitucionalidade por violação do direito ao recurso
consagrado no art. 32°, n.º 1 DA C.R.P.
Com efeito, sendo certo que os recorrentes em processo penal têm o direito de
motivar os recursos interpostos em acta no prazo de 15 dias contados da data da
respectiva interposição e que há casos, como este, em que o recurso perderia
totalmente o seu efeito útil com o irreparável prejuízo que daí adviria para a
defesa, caso não fosse possível conferir-lhe imediatamente, no momento da
interposição os efeitos e o regime de subida necessários a assegurar a utilidade
do recurso e a defesa dos direitos e interesses do arguido recorrente, certo é
também que a norma em questão deve ser interpretada no sentido de que, quando
tal for requerido, permitir a fixação do efeito e do regime de subida
pretendidos.
A recorrente foi colhida totalmente de surpresa com tal interpretação, ou
melhor, com tal hipotética interpretação, da norma em causa, razão porque desde
já pretende interpor recurso da decisão que relega a fixação do efeito do
recurso e o seu regime de subida para momento posterior à apresentação da
motivação, recurso que se dirige ao Tribunal Constitucional, que é interposto
com base na jurisprudência deste último, de admitir os recursos quando a parte
recorrente não contar com a interpretação que faz enfermar a norma em causa de
inconstitucionalidade e que tem por objecto a apreciação da constitucionalidade
da norma do n.º 1 do art. 414° do C.P.P., face ao disposto no art. 32°, n.º 1 da
C.R.P, quando interpretada no sentido que antes se indicou, de impedir os Srs.
Juizes de fixar o efeito suspensivo e a subida imediata de recursos interpostos
em acta durante um julgamento com prejuízo da continuação do mesmo antes de ser
junta a respectiva motivação, e não obstante a fixação de tal efeito e regime
ter sido expressa e autonomamente pedida no requerimento de interposição de
recurso.
Nos termos do art. 78°, n.º 1 e n.º 4 da Lei N.º 28/82 de 15 de Novembro deve
ser fixada subida imediata e efeito suspensivo para este recurso para o Tribunal
Constitucional, nos próprios autos.
Sem prescindir, e caso por absurdo esta audiência efectivamente houvesse de
prosseguir, requer que seja admitida a recorrente a apresentar a sua motivação
de recurso logo após decisão sobre a reclamação por nulidade do douto despacho
antecedente e sobre a admissão do recurso para o Tribunal Constitucional, agora
também interposto.”
3. Foi, de seguida, proferido despacho, julgando improcedente a alegação de
nulidade, por não se vislumbrar que o despacho enferme de qualquer nulidade
prevista no artigo 119º do Código de Processo Penal e por se considerar não
haver falta de fundamentação, dado que, “conforme resulta claramente do disposto
no art. 414°, n.º 1 do C.P.P., o tribunal só se pronuncia sobre o efeito e o
regime de subida após admitir o recurso. Entendeu pois o tribunal face à clareza
deste artigo que não se imponham grandes considerações para se decidir o
requerido pela arguida.” Simultaneamente, foi a ora reclamante convidada para
aperfeiçoar o requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, indicando
as alíneas em que fundamenta o recurso.
4. Tendo a ora reclamante vindo afirmar que “o recurso era interposto ao abrigo
da alínea b).do n.º 1 do art. 70° da dita Lei do Tribunal Constitucional”, foi
proferido o seguinte despacho:
“Interposto recurso para o Tribunal Constitucional cumpre, desde logo ao
tribunal apreciar se a decisão proferida de que se pretende interpor recurso
admite este recurso directamente para o Tribunal Constitucional.
Em nosso entender e conforme resulta do disposto no art. 70°, n.º 2 da Lei do
Tribunal Constitucional, no caso em apreço não estão ainda esgotadas as
possibilidades de recurso ordinário.
Assim sendo entendo que o recurso não é admissível.
No entanto sempre se dirá que é feita referência a vária jurisprudência do
Tribunal Constitucional que admite o recurso quando o recorrente é surpreendido
por uma decisão com a qual não podia contar. Desde logo o Ilustre Mandatário não
refere uma única decisão nesse sentido que tenha apreciado a questão com
referência ao disposto no art. 414 ° C.P.P.
É evidente que os interessados não podem sofrer limitações nos seus direitos e o
interesse público na descoberta da justiça material e no julgamentos de
eventuais actos susceptíveis de consubstanciar factos ilícitos não pode ser
conseguida a qualquer custo, nomeadamente pondo em causa os direitos
fundamentais de quem se senta no banco dos réus. Todavia o art. 414°, n.º 1 do
C.P.P. é muito claro e a interpretação que o tribunal faz do mesmo não põe em
causa os direitos de defesa da arguida, nem o direito ao recurso consagrados na
Constituição da República Portuguesa e entendemos que a arguida não podia ficar
surpreendida com tal interpretação, e deveria razoavelmente contar com a mesma.
Uma vez que o recurso não foi admitido condeno a arguida [...] em 400,00 €uros
pela não admissão do recurso nos termos do art. 84° do C.C.J .
Notifique-se”
5. Sempre inconformada, a ora reclamante interpôs recurso do despacho que julgou
improcedente a nulidade e ditou para a acta a reclamação, “para a conferência do
Tribunal Constitucional, a que se refere o n.º 3 do art. 78° - A da dita Lei do
Tribunal Constitucional”, nos termos do art. 77°”, do despacho que não admitiu
recurso para este Tribunal. Foi, então, proferido despacho considerando que tal
reclamação deveria ser entregue na secretaria, e dada a palavra ao mandatário da
ora reclamante para que este motivasse o recurso relativamente à suspensão da
instância. O mandatário da ora reclamante motivou este recurso e, aproveitando
estar no uso da palavra, interpôs recurso do despacho que não admitiu a
reclamação para o Tribunal Constitucional, por esta não ter sido apresentada na
secretaria, questionando a constitucionalidade do artigo 688º, n.º 2 do Código
de Processo Civil. Os recursos foram admitidos, para subirem a final, “nos
próprios autos e com efeito meramente devolutivo”.
Tendo prosseguido a audiência, veio a ora reclamante afirmar, quanto à retenção
dos recursos, pretender apresentar reclamação para o Presidente do Tribunal da
Relação interpor novo recurso para o Tribunal Constitucional, desta vez para
apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 408º do Código de Processo
Penal. A apreciação de tais requerimentos foi, entretanto, dado o adiantado da
hora, deferido para a próxima audiência.
6. Foi posteriormente apresentada na secretaria a seguinte reclamação:
“[...] Vem esta reclamação deduzida contra o douto despacho da Mma. Senhora
Juíza que não admitiu um Recurso interposto pela Reclamante para esse Colendo
Tribunal, sendo apresentada nos termos dos artigos 76° n° 4 e 77° da Lei 28/82
e, em conformidade com o previsto no n° 1 da última norma citada, dirigida à
Conferência a que se refere o n° 3 do artigo 78°-A dessa mesma Lei.
O Recurso para o Tribunal Constitucional contra cuja não admissão se reclama tem
por objecto a douta decisão da Mma. Juíza do Tribunal de Setúbal que relegou
para momento posterior a apresentação [p]ela Recorrente da sua motivação de
recurso a decisão sobre pedido, feito pela mesma recorrente, expressa e
autonomamente no requerimento de interposição de recurso ditado para a acta de
julgamento, de fixação imediata e com prejuízo da continuação desse julgamento
de efeito suspensivo e de subida imediata a um recurso interposto pela ora
Reclamante para o Tribunal da Relação de Évora.
Ora, ao contrário do que afirma a Mma. Juíza no douto despacho em causa,
desconhece a recorrente qual o recurso ordinário que possa caber de tal decisão,
mesmo considerando que para os efeitos em causa do artigo 70 n.º 2 da LTC, se
equipara os recursos ordinários a reclamações para o presidente do Tribunal
Superior, uma vez que não estarmos perante qualquer caso de não admissão ou
retenção de recurso mas, simplesmente, perante uma situação em que a Mma Juíza,
sem proferir despacho a não admitir ou a reter o recurso, se limitou a relegar
para momento posterior o conhecimento e decisão sobre uma questão autónoma
(ainda que conexa) que lhe foi directamente colocada.
Por outro lado, e ao contrário do que também se diz no douto despacho agora sob
reclamação, se é certo que a norma do artigo 414° n.º 1 do Código de Processo
Penal tem uma redacção clara, certo é também que a mesma não permite, de acordo
com as regras de interpretação vigentes no nosso ordenamento jurídico, retirar
dela as conclusões ou entendimentos em que se funda o douto despacho que se
pretende recorrer.
Na verdade, o que a Mma. Juíza fez foi interpretar tal norma a contrario sensu,
esquecendo que apenas poderia ter tirado dela o sentido que directamente dela
resulta.
O que a norma diz é que o juiz é obrigado a fixar efeito e regime de subida em
caso de admissão do recurso e que é obrigado a proferir despacho de admissão ou
rejeição depois do recurso ser interposto e depois de ser junta a motivação
respectiva.
Ora, a lei não permite a interpretação contrária, ou de pernas para o ar, que é
feita no douto despacho em causa de que só depois de admitido o recurso é que o
juiz pode ou deve fixar o respectivo efeito e respectivo regime de subida.
E é isso mesmo e não o contrário que neste momento está em causa.
A ora reclamante, começou por requerer que a Mma. Juíza determinasse a suspensão
da instância até estar decidido o anunciado referendo sobre o aborto e caso a
resposta fosse positiva, até à entrada em vigor de eventual nova lei.
Tal requerimento foi objecto de despacho de indeferimento.
Desse despacho foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Évora, para
o qual foi pedida a atribuição de efeito suspensivo decorrente da própria
interposição e a subida imediata com prejuízo da continuação do julgamento.
Esta bem de ver que, tal pedido só fazia sentido para assegurar à recorrente os
efeitos que pretendia obter com o pedido de suspensão da instância, pelo que
evidente é também que o efeito suspensivo teria que significar a suspensão
imediata do julgamento e que tal teria que decorrer da própria interposição de
recurso. E, por isso, foi isto que foi expressa e autonomamente pedido no dito
requerimento de interposição de recurso.
Assim tendo sido, obvio parece também à recorrente não lhe ser exigível que
contasse com uma interpretação extensiva, à contrário sensu, da norma cuja
inconstitucionalidade se pretende ver declarada, razão por que não lhe era
exigível que previamente, nesse requerimento de interposição de recurso para o
Tribunal da Relação, tivesse suscitado a questão da inconstitucionalidade da
norma que veio a ser aplicada pelo Tribunal a quo.
[...]”
7. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se
pronunciou nos seguintes termos:
“Para além de a questão de constitucionalidade ser manifestamente infundada –
não se vislumbrando minimamente em que termos poderá afrontar o direito ao
recurso a interpretação normativa que considera só dever ser proferido despacho
de admissão do recurso penal quando o recorrente tiver cumprido o ónus de o
motivar, atento o regime de cumulação dos actos de interposição e motivação que
vigore no âmbito do processo penal – não se verificam efectivamente os
pressupostos do recurso de fiscalização concreta interposto: para além de o
recorrente não ter suscitado, podendo perfeitamente tê-lo feito, qualquer
questão de inconstitucionalidade antes da prolação da decisão recorrida, não se
mostram esgotados, quanto a esta, os recursos ordinários possíveis, já que a
hipótese dos autos se não reconduz seguramente a qualquer das situações de
irrecorribilidade da decisão de 1ª instância, tipificadas nos artºs 399º e 400º
do CPP.”
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
8. A presente reclamação vem interposta da decisão da M.ma Juíza do Tribunal
Judicial de Setúbal, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional de
uma sua anterior decisão, a qual, escudando-se no preceituado no artigo 414º,
n.º 1, do Código de Processo Penal, relegou para depois da apresentação da
motivação do recurso que a arguida interpusera para o Tribunal da Relação de
Évora - da anterior decisão que indeferiu o pedido de suspensão da instância - a
fixação do efeito e do momento de subida do mesmo. Para não admitir o recurso
para o Tribunal Constitucional, que fora interposto ao abrigo da alínea b), do
n.º 1, do artigo 70º, da LTC, a decisão reclamada utilizou, em síntese, dois
fundamentos – (a) a decisão de que se pretendeu recorrer para o Tribunal
Constitucional admitia ainda recurso ordinário; e (b) a recorrente não suscitou,
antes de proferida a decisão recorrida, a questão de constitucionalidade que
pretende ver apreciada.
O recurso teria, nas palavras da recorrente, “por objecto a apreciação da
constitucionalidade da norma do n.º 1 do art. 414° do C.P.P., face ao disposto
no art. 32°, n.º 1 da C.R.P, quando interpretada no sentido que antes se
indicou, de impedir os Srs. Juizes de fixar o efeito suspensivo e a subida
imediata de recursos interpostos em acta durante um julgamento com prejuízo da
continuação do mesmo antes de ser junta a respectiva motivação, e não obstante a
fixação de tal efeito e regime ter sido expressa e autonomamente pedida no
requerimento de interposição de recurso.”
Vejamos.
8.1. Conforme se dispõe no artigo 70º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, “os recursos
previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de decisões que
não admitam recurso ordinário”. Vale isto por dizer que do despacho que,
apoiando-se no artigo 414º, n.º 1, do Código de Processo Penal, relegou para
momento posterior a decisão sobre o efeito e regime de subida do recurso que
havia sido interposto para o Tribunal da Relação de Évora, só era imediatamente
admissível recurso para o Tribunal Constitucional se a mesma não admitisse
recurso ordinário. Ora, como bem se concluiu na decisão recorrida, o despacho de
que foi interposto o recurso para o Tribunal Constitucional era efectivamente
susceptível de recurso ordinário e, como tal, insusceptível de recurso imediato
para este Tribunal. Com efeito, não sendo a situação enquadrável em nenhuma das
hipóteses previstas no artigo 400º do Código de Processo Penal - nem, aliás, a
recorrente alguma vez alega que o seja -, a admissibilidade do recurso resulta
do artigo 399º do mesmo diploma, que preceitua precisamente que “é permitido
recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não
estiver prevista na lei”.
Ora, admitindo a decisão recurso ordinário, não era efectivamente possível
recorrer da mesma para o Tribunal Constitucional com fundamento na alínea b), do
n.º 1, do artigo 70º da LTC.
8.2. Por outro lado, como bem evidencia a decisão recorrida, a recorrente também
não suscitou, antes da mesma ter sido proferida, a questão da
inconstitucionalidade do artigo 414º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sendo
certo que, ao contrário do que alega, a interpretação normativa daquele preceito
por que optou a decisão recorrida não pode considerar-se decisão surpresa. E,
desde logo, pela razão evidente de que - ao contrário do que afirma a recorrente
- ela não é nem “extensiva” nem “a contrario” nem “de pernas para o ar”,
correspondendo exactamente ao teor literal do preceito.
Assim sendo, não podendo considerar-se surpresa a interpretação normativa
aplicada na decisão recorrida, é manifesta a falta de um dos pressupostos de
admissibilidade do recurso, a saber – ter a recorrente suscitado, modo
processualmente adequado, uma questão de constitucionalidade normativa perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a
dela conhecer, pelo que, também por este motivo, o recurso para este Tribunal
não era admissível.
8.3. Pelo exposto, improcedem os argumentos aduzidos na reclamação, nada mais
restando do que confirmar a decisão reclamada de não admissão do recurso.
9. Acresce, aliás, que uma outra razão sempre conduziria à impossibilidade de
conhecer do objecto do recurso. É que, ainda na sessão de julgamento em que foi
proferida a decisão e interposto o recurso, cuja não admissão está agora em
causa, a recorrente acabou por ditar para acta a motivação do recurso para o
Tribunal da Relação de Évora, tendo a M.ma Juíza acabado por decidir do efeito e
do regime de subida do mesmo. Assim, tornou-se supervenientemente inútil o
julgamento da questão de constitucionalidade colocada pela recorrente, não tendo
já a decisão que o Tribunal Constitucional viesse a produzir qualquer efeito
útil neste processo.
Ora, conforme este Tribunal tem repetidamente afirmado (cfr., entre outros, os
Acórdãos n.ºs 337/94, 498/96 e 3/2000 – publicados, respectivamente, no Diário
da República, II Série, de 4 de Novembro de 1994, de 22 de Julho de 1996 e de 8
de Março de 2000 -, e os Acórdãos n.ºs 283/97, 556/98, 490/99 - disponíveis na
página Internet do Tribunal, no endereço
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/, o recurso de
constitucionalidade desempenha uma função instrumental. Isso significa, como se
afirmou no Acórdão n.º 498/96, já citado, “que o interesse no conhecimento de
tal recurso há-de depender da repercussão da respectiva decisão na decisão final
a proferir na causa. Não visando os recursos dirimir questões meramente teóricas
ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de constitucionalidade
sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica sem qualquer
interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse representa uma
condição da admissibilidade do próprio recurso”. Por seu turno, no acórdão n.º
556/98, também já citado, afirmou-se que “o recurso de constitucionalidade é um
recurso instrumental, só fazendo sentido dele conhecer quando a decisão que o
resolve se pode projectar com utilidade sobre a causa”, concluindo-se assim “que
dele se não deva conhecer quando se não verifique qualquer efeito útil do mesmo
sobre ela”. Ora, no presente caso, nenhuma efeito útil teria a decisão da
questão de inconstitucionalidade, apresentada que foi a motivação, admitido que
foi o recurso e fixado que foi o seu efeito.
Também por esta razão, se não poderia conhecer do objecto do recurso.
10. Tudo o que vai dito preclude que o Tribunal se pronuncie sobre a questão –
suscitada pelo Ministério Público - do carácter manifestamente infundado do
recurso.
III. Decisão.
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação, confirmando-se a
decisão reclamada de não admissão do recurso para este Tribunal.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 19 de Abril de 2005
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício