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Processo n.º 688/2005
Plenário
Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional:
1. No dia 16 de Agosto de 2005 deu entrada no Tribunal Judicial de Santarém a
lista dos candidatos à Assembleia de Freguesia de Tremez, município de Santarém,
nas eleições a realizar no próximo dia 9 de Outubro, apresentada pelo grupo de
cidadãos eleitores MIFT – Movimento Independente da Freguesia de Tremez.
Em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 25º da Lei Eleitoral dos Órgãos
das Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto,
foram afixadas, no mesmo dia, as listas de candidatos.
A 19 de Agosto de 2005, a fls. 39, e apenas para o que agora interessa, foi
proferido despacho do seguinte teor:
“Na lista apresentada pelo MIFT à Assembleia de Freguesia de Tremês constata-se
que as declarações de candidatura juntas a folhas 118, 121, 124, 127, 130, 133,
136, 139, 144, 145, 148, 151, 154, 157 e 160 não contêm a indicação de
concordância com o mandatário indicado na lista como prescreve o artigo 23º, n.º
3, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais. Atendendo ao facto de o
primeiro candidato desta lista ser o referido mandatário, deve considerar-se
suprida quanto a ele a apontada omissão, omissão que porém subsiste quanto aos
restantes candidatos, razão pela qual se ordena que o mandatário desta lista
seja notificado para em três dias suprir tais irregularidades”.
Por despacho de 23 de Agosto, foi rejeitada a lista apresentada pelo MIFT (a
fls. 186), porque “expirou o prazo concedido e não se mostra suprido o vício
apontado, ou seja, não resulta que os candidatos deste movimento, com excepção
do primeiro candidato, tenham dado a sua concordância ao mandatário da lista.
Por isso, ao abrigo do disposto no artigo 27º, n.º 1, da Lei Eleitoral dos
Órgãos das Autarquias Locais, rejeita-se a lista (...)”.
A 24 de Agosto, a fls. 211, o mandatário respectivo veio requerer a junção de
“documentos em falta respeitantes à concordância dos membros da lista do MIFT –
Movimento Independente Freguesia de Tremez candidata à Assembleia de Freguesia
de Tremez”.
Por despacho de 24 de Agosto, de fls. 235, o requerimento foi indeferido, por
intempestividade, já que terminava a 22 de Agosto o prazo de 3 dias concedido
para suprimento do vício apontado.
No dia seguinte, o mandatário, Carlos Manuel Palmeiro Carvalho, invocando a
qualidade de “candidato e primeiro proponente” do MIFT, veio reclamar, “nos
termos do n.º 1 do artigo 29º da Lei Orgânica n.º 1/2001 (...) contra a decisão
que rejeitou a candidatura do MIFT”.
Em primeiro lugar, invocou a existência de justo impedimento; em segundo lugar,
sustentou que se deve considerar que os candidatos em causa “declararam no
processo a aceitação do mandatário de lista” porque “14 dos 15 elementos que
compõem a lista, são igualmente proponentes da mesma”, tendo, “na declaração de
propositura do MIFT, (...)” declarado “propor a lista, indicando o mandatário da
mesma”.
Por despacho de 1 de Setembro, de fls. 271, foi indeferida a reclamação, nestes
termos:
“Em face do disposto nos artigos 229º e 231º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais e da natureza do processo eleitoral entende-se de duvidosa
aplicação o regime do justo impedimento previsto 146º do Código de Processo
Civil. Refira-se, no entanto, que resulta do disposto no n.º 2 do referido
artigo 146º que o justo impedimento deve ser alegado simultaneamente com o
requerimento para a prática do acto fora do prazo legal. Ora no caso o
requerente não invocou esse regime quando se apresentou fora de prazo a praticar
o acto de suprimento de irregularidades para que fora notificado (cfr. fls. 211
e 227).
Por essa razão nunca poderia proceder a sua alegação de justo impedimento que
neste momento não é tempestiva.
Quanto ao restante fundamento da reclamação verifica-se que o requerente foi
notificado nos termos do despacho de fls. 46 para no prazo de três dias suprir
irregularidade consistente na falta nas declarações de candidatura da indicação
de concordância com o mandatário indicado na lista em conformidade com o
disposto no artigo 23º, n.º 3 da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais.
Tal como refere o reclamante verifica-se que essa concordância resulta porém
expressa nas declarações de apresentação de candidatura também subscritas pelos
candidatos à excepção do que se refere à candidatura efectiva indicada em
segundo lugar, Maria Emília Serrão Massena Santos.
Relativamente a esta mantinha pertinência o cumprimento do despacho citado e
efectivamente verifica-se que não o foi em tempo útil.
Compulsado o disposto nos artigos 26º, 27º e 29º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais não se vislumbra que nesta fase de reclamação possa dar-se
relevância ao suprimento de irregularidades tardiamente efectuado.
Nestes termos decide-se rejeitar a reclamação apresentada”.
No dia 1 de Setembro, pelas 15h30m, foi publicada a relação das listas
admitidas, nos termos do n.º 5 do artigo 29º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais (cfr. fls. 274).
2. A 5 de Setembro, deu entrada no Tribunal Constitucional, primeiro por
telecópia (cfr. fls. 288) e depois por via postal (cfr. fls. 293), recurso do
despacho de 1 de Setembro, de fls. 271, que indeferiu a reclamação, com as
seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES:
I – O recorrente padeceu de doença incapacitante nos dias 20 a 23 de Agosto o
que não lhe permitiu cumprir o prazo para a entrega do suprimento dos vícios da
lista do MIFT;
II – Alegou justo impedimento que foi rejeitado de forma ilegal, pois o CPC é
aplicável ao Processo Eleitoral, e não existe qualquer disposição que obrigue à
alegação do justo impedimento simultaneamente à prática do acto;
III – Deveria o Justo Impedimento ter sido deferido, aceitando-se a prática do
acto fora de prazo e consequentemente ter sido aceite a lista, o que se requer
neste momento, em substituição ao Douto Despacho Recorrido;
IV – 14 dos 15 elementos que compõem a lista aceitaram o mandatário, o que seria
de conhecimento oficioso;
V – Tendo sido reconhecido tal facto no Douto Despacho recorrido deveria o Juiz
do Tribunal a quo ter aceite a lista com exclusão da candidata não proponente,
reajustando os demais;
VI – Por aplicação analógica do disposto no n.º 2 do artigo 27º da LEOAL, o que,
em alternativa se requer, sendo o Despacho Recorrido substituído nesta parte,
aceitando-se a lista do MIFT, devidamente reajustada com a exclusão da aludida
candidata”.
O recurso foi admitido por despacho de 8 de Setembro, de fls. 305.
3. O recurso foi interposto por quem tem legitimidade e de uma “decisão final
relativa à apresentação de candidaturas”, ou seja, da decisão que indeferiu a
reclamação contra a rejeição da lista apresentada pelo MIFT (artigos 29º, n.º 1,
31º, n.º 1 e 32º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais).
Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 31º da Lei Eleitoral, o prazo para a
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de “quarenta e oito
horas a contar da afixação das listas a que se refere o n.º 5 do artigo 29º”.
Verifica-se, assim, que o presente recurso é intempestivo.
Com efeito, contrariamente a outros prazos fixados na mesma lei, o prazo de
interposição de recurso é fixado em horas – 48 horas, como se viu –,
contando-se, não em dias, mas hora a hora.
Não tem aqui naturalmente aplicação a regra constante da alínea d) do artigo
279º do Código Civil, desde logo por não existir qualquer dúvida que legitime a
aplicação de tal regime (cfr. corpo do artigo) e, além disso, pela celeridade
com que o processo eleitoral tem de decorrer.
Sendo dia 3 de Setembro sábado, estando portanto o tribunal encerrado, o termo
do prazo transferiu-se para a hora legal de abertura da respectiva secretaria no
dia 5 de Setembro (artigos 231º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias
Locais e 144º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicados a um prazo de
horas). Ora, conforme nela está registado, a telecópia foi enviada às 16h40m, ou
seja, depois de terminado o prazo de interposição de recurso.
Isto mesmo já teve o Tribunal Constitucional, aliás, a oportunidade de afirmar
por várias vezes, como se pode verificar, por exemplo, nos seus acórdãos n.ºs
689/97, 693/97, 698/97, 701/97, 1/98 ou 6/98 e na jurisprudência nele indicada
(publicados no Diário da República, II série, respectivamente, de 9, 12, 14 e 15
de Janeiro de 1997 e 9 e 10 de Fevereiro de 1998), nº 510/01 (Diário da
República, II série, de 19 de Dezembro de 2001), e, recentemente, no acórdão n.º
439/05, ainda inédito.
4. A terminar, acrescenta-se que não pode ser considerada a data em que foi
efectuado o registo postal do exemplar do requerimento de interposição de
recurso enviado pelo correio. Como se escreveu, por exemplo, no acórdão citado
nº 510/01, “a natureza específica destes recursos, diversas vezes apontadas pelo
Tribunal Constitucional, que tem assinalado tratar-se de ‘actos urgentes cuja
decisão não admite quaisquer delongas, uma vez que o seu processamento
implicaria, com toda a probabilidade, a perturbação do processamento dos
actos eleitorais, todos estes sujeitos a prazos improrrogáveis’ (Acórdão n.º
585/89, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 14º vol., p. 549), eventualmente
aliada à circunstância de o prazo ser fixado em horas, torna inaplicável ao
contencioso de apresentação de candidaturas o regime previsto na” actual alínea
b) do n.º 2 do artigo 150º do Código de Processo Civil, que considera o acto a
praticar em tribunal como tendo sido realizado no dia do registo postal.
Nestes termos, decide-se não conhecer do recurso, por intempestividade.
Lisboa, 16 de Setembro de 2005
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Maria Helena Brito
Paulo Mota Pinto
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Maria Fernanda Palma
Mário José de Araújo Torres
Vítor Gomes
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício