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Proc. nº 67/97 Cons. Messias Bento
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. A. reclama do despacho do Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, de 31 de Maio de 1996 (confirmado, em conferência, pelo acórdão de 19 de Setembro de 1996), que lhe não admitiu o recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, do acórdão daquele mesmo Supremo
(de 9 de Maio de 1996), para apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 433º (conjugado com o artigo 410º, nºs 2 e 3), do Código de Processo Penal.
O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal sublinhou que a questão de constitucionalidade daquela norma, que o acórdão recorrido aplicou, foi suscitada durante o processo. Pronunciou-se, porém, no sentido de que se deve indeferir a reclamação. E isso, porque 'o recurso se deverá qualificar como 'manifestamente infundado', nos termos e para os efeitos previstos no artigo 76º, nº 2, parte final, da Lei nº 28/82'. É que - ponderou
-, se está 'perante corrente jurisprudencial uniforme e reiterada, embora não unânime, sobre a questão jurídico-constitucional suscitada pelo recorrente de forma vaga e inconclusiva e sem adiantar quaisquer razões ou argumentos que não hajam sido já amplamente ponderados'.
2. Corridos os vistos cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. A reclamação será de deferir, se o recurso interposto for de admitir.
Ora, vindo o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, deve ele ser admitido, se o recorrente suscitou a inconstitucionalidade da norma do artigo 433º
(conjugado com o artigo 410º, nºs 2 e 3) do Código de Processo Penal, durante o processo, e se tal norma foi aplicada pelo acórdão recorrido.
No caso, nas suas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente suscitou expressamente a inconstitucionalidade daquela norma.
Disse ele, de facto, que, visando o recurso para o Supremo 'exclusivamente o reexame da matéria de direito', tal 'gera a manifesta inconstitucionalidade daquele citado preceito do Código de Processo Penal (o artigo 433º, conjugado com o artigo 410º, nºs 2 e 3, ambos do CPP)'.
Para o efeito ora considerado - o da suscitaçao da questão de constitucionalidade - é, obviamente, irrelevante que o recorrente, em vez de dizer que tal norma deve ser julgada inconstitucional, tenha dito que
'deve ser declarada a inconstitucionalidade do artigo 433º do CPP'.
É esta uma incorrecção de linguagem que, para além de ser corrente, não afecta a substância das coisas.
Também não restam dúvidas de que a norma em causa foi aplicada, pois o Supremo Tribunal de Justiça conheceu do recurso, negando-lhe provimento no que concerne à matéria penal.
Verificam-se, assim, os pressupostos do recurso interposto, por isso que o mesmo deva ser admitido.
4. À admissão do recurso não obsta o facto de existir uma 'corrente jurisprudencial uniforme e reiterada, embora não unânime, sobre a questão jurídico-constitucional suscitada pelo recorrente [...] sem adiantar quaisquer razões ou argumentos que não hajam sido amplamente ponderados'.
É certo que os requerimentos de interposição de recurso devem ser indeferidos, 'quando forem manifestamente infundados' (cf. artigo 76º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
Simplesmente, a existência de uma 'corrente jurisprudencial uniforme e reiterada, embora não unânime, sobre a questão jurídico-constitucional suscitada' não obriga a qualificar o recurso como
'manifestamente infundado'. Desde logo - e sem curar, agora, de saber se o facto de o recurso ser 'manifestamente infundado', fora do caso em que o juiz recorrido o tenha rejeitado com esse fundamento, pode determinar o indeferimento de uma reclamação de um despacho de rejeição do recurso -, porque não existe unanimidade quanto à solução a dar à questão de constitucionalidade.
O recurso será, isso sim, uma questão simples para os efeitos do disposto no artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional. Sê-lo-á, muito principalmente, porque o recorrente suscitou a questão de constitucionalidade 'sem adiantar quaisquer razões ou argumentos que não hajam sido já amplamente ponderados'.
III. Decisão:
Pelos fundamentos expostos, defere-se a presente reclamação, a fim de ser admitido o recurso interposto para este Tribunal.
Lisboa, 9 de Abril de 1997 Messias Bento Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa