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Processo nº 826/2006.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
1. Por via do acórdão nº 618/2006 foi, no que
ora releva, indeferida a pretensão formulada do arguido A., a qual foi entendida
como dedução de uma reclamação atinente à decisão proferida pelo relator em 16
de Outubro de 2006, decisão essa por intermédio da qual se não tomou
conhecimento do objecto do recurso intentado interpor de aresto lavrado pelo
Supremo Tribunal de Justiça.
Notificado do citado Acórdão nº 618/2006, o
indicado arguido fez juntar aos autos requerimento «de aclaração», requerimento
esse sobre o qual incidiu o Acórdão nº 687/2006, que desatendeu a solicitação
ali deduzida.
Vem agora o mesmo arguido apresentar
requerimento no qual, após se intentar efectuar a «historicidade» da questão –
utilizando-se grande parte das asserções constantes dos «relatos» das decisões
tomadas neste Tribunal –, disse: –
“(…)
NULIDADE DO ACÓRDÃO
Salvo o devido respeito pelo acórdão exarado pelo Colégio de
Meritíssimos Conselheiros desse Venerando Tribunal, entende o recorrente haver
no acórdão cuja nulidade ora se arg[ú]i contradições entre os fundamentos e a
decisão e omissão de pronúncia.
Vejamos:
1- Quanto ao recurso admitido pelo Conselheiro Relator do Supremo
Tribunal de Justiça, por despacho de 28 de Setembro de 2006, tão só na
parte em que põe em causa a decisão do acórdão de 25 de Janeiro de 2006.
a) Nesta parte, solicitava-se a sindicância da interpretação pelo [ ] Supremo
Tribunal de Justiça da norma do artº 412 nº 2 do CPP, no sentido de ver
obstáculo a que primeiro se possa arguir a nulidade de um acórdão proferido num
tribunal superior, antes de o impugnar pela via do recurso.
b) Ou, como melhor sintetizou o Ilustre Relator do acórdão ora em apreço, isto,
pese invocar manifesta ininteligibilidade quanto ao teor do pedido de
verificação de harmonia constitucional feito recorrente, quando escreveu
‘pensando que a mesma pretenderia referir a uma interpretação de tal preceito [
] segundo a qual a arguição de nulidade de uma decisão pretendida recorrer não
acarreta a suspensão do prazo de interposição de recurso.
c) O Meritíssimo Juiz Conselheiro Relator do Tribunal Constitucional, por
decisão sumária de 16 de Outubro de 2006 entendeu não conhecer do objecto do
recurso, por no seu douto entender, não ter o recorrente suscitado atempadamente
a questão.
d) Situação que foi mantida no acórdão proferido em 17 de Novembro de 2006.
e) Isto por força de um pedido de aclaração que foi tida como reclamação pelo
Tribunal Constitucional.
f) Tal pedido de aclaração defendia nas suas alíneas c) d) e) e f), já atrás
transcritas, o ponto de vista, de que nunca poderia o recorrente intuir, que a
posição do Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa, seria a
perfilhada pelo Supremo Tribunal de Justiça, em detrimento da assumida na
decisão do Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, que admitiu o
recurso.
g) É que parece medianamente aceitável, que o Juiz do Tribunal da Relação de
Lisboa, ao admitir o recurso, tinha manifestamente a obrigação de verificar se o
mesmo era ou não tempestivo.
h) Ora, sobre este invocado ponto de vista da questão, o acórdão, cuja nulidade
se vem arguir, é omisso.
2- Fundamentação da decisão tomada quanto à invocada interpretação
inconstitucional do artº 188 nº1 do Código de Processo Penal
a) Na realidade, e mais uma vez com todo o respeito, a argumentação aí expendida
é a nosso ver contraditória, vejamos,
b) O recorrente durante o decurso do inquérito, ainda no Tribunal de Instrução
Criminal de Cascais, veio arguir que a Meritíssima Juíza desse
tribunal, havia feito interpretação inconstitucional do artº 188 nº 1
do Código de Processo Penal, na apreciação de um requerimento
apresentado e atinente às intercepções telefónicas.
c) Não tendo tido acolhimento a sua pretensão, veio atempadamente interpor
recurso e motivar o mesmo para o Tribunal da Relação de Lisboa.
d) Viu a sua pretensão ser denegada, por acórdão proferido pelo Tribunal de 2ª
instância e datado 21 de Janeiro de 2004.
e) Deste, interpôs, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e para o Tribunal
Constitucional, tendo sido ambos admitidos.
f) Do recurso interposto para o Tribunal Constitucional, veio a ser tirada
decisão sumária em 28.10.2005, já transitada em julgado.
g) Em tal decisão sumária escreveu-se a dado passo:
‘Anote-se que o não conhecimento do recurso interposto não obsta a que o
recorrente venha a repetir o acto, no caso de rejeição do recurso
interposto para o STJ, precisamente de acordo com o disposto na
parte final do referido nº 4 e o prescrito no nº 2 do art.º 75 da LTC.’
h) Ora, foi exactamente o que aconteceu, o Supremo Tribunal de Justiça por
acórdão de 25 de Janeiro de 2006 rejeitou o recurso, onde entre outras matérias,
também se versava a alegada interpretação inconstitucional do artº 188º nº 1 do
Código de Processo Penal.
i) Ora, o que se não entende é a articulação que a seguir enunciaremos e que se
afigura como efectuada no acórdão ora posto em crise.
ii – Por um lado, no ponto 2.1. da decisão sumária proferida no Tribunal
Constitucional, em 16 de Outubro de 2005, aceita-se a decisão de admissão do
recurso por despacho do Juiz Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de
Justiça – (Cfr. ‘Em face do despacho tirado em 28 de Setembro de 2006 pelo
Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça – despacho esse que não foi
objecto de impugnação – está somente em causa a pretendida apreciação da
harmonia constitucional do nº 2 do artº 414 do diploma adjectivo criminal....
iii – Por outro, e quando o arguido reclama para o Juiz Relator do Supremo
Tribunal de Justiça, da não admissão da parte do recurso que versava a
alegada interpretação inconstitucional do art.º 188 nº 1 do Código de Processo
Penal, e vê reparada a decisão no sentido de ser admitido o recurso
interposto também nessa parte, considera o Tribunal Constitucional que tal
admissão é feita por entidade a non domino. (Cfr. acórdão do Tribunal
Constitucional de 17 de Novembro de 2006).
iiii – Se o Juiz Relator do Venerando Supremo Tribunal de Justiça foi domino
para no seu despacho, tirado a 28 de Setembro de 2006, não admitir o
recurso atinente à alegada interpretação inconstitucional do art.º 188
nº 1 do Código de Processo Penal, porque razão passou a non domino
quando reparou a sua decisão, e admitiu o recurso
iiiii – Se por outro lado, aceitarmos a interpretação, que mero raciocínio
seguimos, de que o Juiz Relator do Supremo Tribunal de Justiça era
entidade non domino no que refere à admissão dessa parte do recurso,
então, em que moldes tem lugar a aplicação a decisão transitada em
julgado no acórdão 741/05 de 28 de Outubro de 2005?
3 – A decisão tomada, é nesta parte contraditória na sua argumentação para além
de deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar.
Em face do exposto vem o recorrente arguir a nulidade do acórdão proferido pelos
vícios apontados, tendo em conta ser a decisão impugnada insusceptível de
recurso, e o acórdão proferido, ter de obedecer [à]s regras que ao mesmo é
exigível no nosso ordenamento Jurídico, tudo com legais consequências.”
Ouvido sobre o vertente requerimento, o Ex.mo
Representante do Ministério Público junto deste Tribunal veio dizer: –
1 – O requerimento ora apresentado – que em larga medida se limita a descrever
detalhadamente o curso do processo ao longo das instâncias – é de difícil
inteligibilidade.
2 ‑ Na verdade, não consegue entender-se minimamente onde se situa a invocada
contradição entre os fundamentos e a decisão, bem como a ficcionada ‘omissão de
pronúncia’ por parte deste Tribunal Constitucional.
3 ‑ Limitando-se, em rigor, o reclamante a manifestar a sua discordância com o
acórdão da conferência que já se pronunciou definitivamente sobre a
inverificação dos pressupostos do recurso interposto – bem devendo saber que de
tal decisão não cabe nova impugnação, nos termos da Lei do Tribunal
Constitucional.”
Cumpre decidir.
2. É a todos os títulos evidente que, embora
rotulada de arguição de nulidade, a pretensão consubstanciada no transcrito
requerimento mais não representa do que um reeditar das «dúvidas» que o
impugnante pretendeu ver «aclaradas» no requerimento que foi objecto do Acórdão
nº 687/2006, no qual, claramente, se expôs que, no ponto 4. do aclarando Acórdão
nº 618/2006, estava suficientemente explicitado que o recurso intentado interpor
do acórdão tirado no Tribunal da Relação de Lisboa não podia ser admitido pelo
Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça.
Por outro lado, quanto ao aresto lavrado por
aquele Alto Tribunal, o mesmo não fez aplicação de qualquer normativo atinente à
intercepção das escutas telefónicas, já que se limitou, no que ao caso
interessa, a não tomar conhecimento, por intempestividade, do objecto do recurso
interposto pelo arguido A., uma vez que foi entendido, na esteira da posição
sufragada pelo Representante do Ministério Público junto do Tribunal da Relação
de Lisboa na resposta à motivação do recurso interposto por aquele arguido do
acórdão proferido nesse Tribunal de 2ª instância, que do nº 2 do artº 412º do
Código de Processo Penal não se podia retirar que, arguida uma nulidade dum
acórdão tirado na 2ª instância, isso fazia interromper o prazo de interposição
de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Em consequência do que se veio de dizer,
torna-se patente que o Acórdão nº 687/2006 não enferma de qualquer nulidade por
contradição ou por não se ter pronunciado sobre o que havia de pronunciar-se.
Não há, pois, a mínima razão para se vir, agora
«sob a capa» de arguição de nulidade, continuar a esgrimir com argumentos que já
tinham sido aduzidos no requerimento de aclaração e que foram suficientemente
objecto de posterior decisão deste Tribunal, motivo pelo qual uma tal postura
representa, objectivamente, uma actuação processual tendente a obstar ao
cumprimento do julgado pelo Acórdão nº 618/2006 e à consequência «baixa» do
processo ao Alto Tribunal a quo.
Neste contexto, nos termos do nº 8 do artº 84º
da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, determina-se a extracção de traslado,
constituído por certidão de fls. 2929 até ao vertente aresto, inclusive, e a
imediata remessa dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça, a fim de aí
prosseguirem os seus termos.
Custas pelo impugnante, fixando-se a taxa de
justiça em vinte unidades de conta.
Lisboa, 15 de Janeiro de 2007
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício