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Processo n.º 618/05
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal reclama para a
conferência, nos termos do artigo 78°-A n.° 3 da Lei n.° 28/82 de 15 de
Novembro (LTC) dizendo:
1. É evidente e inquestionável que – por lapso manifesto do recorrente – o
requerimento de interposição de recurso, de fls. 37, foi endereçado à Relação,
quando podia e devia ser interposto antes o recurso de constitucionalidade,
previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70° da Lei n.º 28/82.
2. Sucede, porém, que – em consequência da ulterior tramitação dos autos
perante a Relação de Évora:
-o próprio Ministério Público, entidade recorrente, por ocasião do visto exarado
nos autos nos termos do artigo 416° do Código de Processo Penal, veio requerer
que se 'convertesse' o dito requerimento, dirigido à Relação de Évora, em
requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional;
- tal posição foi sufragada pela Relação, assim suprindo o vício cometido
e 'convolando' do recurso ordinário erroneamente interposto, para o que seria
adequado – o recurso de constitucionalidade, previsto na alínea a) do n.º 1 do
artigo 70° da Lei n.º 28/82, reportado à recusa de aplicação, com fundamento em
inconstitucionalidade orgânica, da norma constante da base XVIII anexa do
Decreto-Lei n.º 297/97 , de 24 de Outubro.
3. Ora, neste concreto circunstancialismo processual, mostrando-se suprido
o erro inicialmente cometido pela entidade recorrente e 'convertido' – por
iniciativa desta – o recurso erroneamente interposto no que se mostra adequado,
afigura-se, salvo melhor opinião, que nada obstará, a que do mesmo se possa
tomar conhecimento neste Tribunal: note-se que não está em causa a possibilidade
de o Tribunal da Relação alterar oficiosamente um recurso interposto pelo
Ministério Público, mas a circunstância de ter sido a própria entidade
recorrente que alterou o requerimento de interposição, suprindo o lapso ou erro
cometido na 1ª instância - não se aderindo, nesta óptica, à solução consagrada,
em caso análogo no douto acórdão n.º 393/05, da 33 Secção.
A decisão reclamada é do seguinte teor:
No Tribunal Judicial da Comarca de Montemor-o-Novo foi proferido despacho a
mandar arquivar o processo resultante da participação pela prática da
contravenção prevista no n.º 1 da base XVIII anexa ao Decreto-Lei n.º 294/97 de
24 de Outubro (falta de pagamento de taxa de portagem) contra A.. O tribunal
considerou 'organicamente inconstitucional' a dita norma constante da base XVIII
anexa ao Decreto-Lei n.º 294/97 de 24 de Outubro.
Notificado da decisão, o magistrado Ministério Público naquele tribunal dirigiu
ao juiz o requerimento de fls. 31 a interpor recurso 'para o Tribunal da Relação
de Évora', que foi assim admitido não obstante haverem sido acrescentadas
algumas considerações sobre uma pretensa incompetência da aludida Relação para
conhecer desse recurso.
Todavia, o certo é que por acórdão proferido em 14 de Junho de 2005 a Relação de
Évora se achou incompetente, 'em razão da matéria', para julgar o recurso que
entendeu 'ser da competência do Tribunal Constitucional', ordenando a remessa
dos autos a este Tribunal.
O Tribunal Constitucional não está vinculado à decisão que admitiu o recurso, e
a verdade é que não poderá conhecer dele. Aliás, não foi interposto qualquer
recurso para o Tribunal Constitucional, pois a circunstância de se não situar na
ordem jurisdicional dos tribunais judiciais impede que a oportunidade para o
conhecimento dos recursos, em sede de fiscalização concreta, decorra de regras
de competência concorrencial vigentes para os tribunais comuns. Com efeito, o
recurso de fiscalização concreta, em qualquer das suas espécies, demanda a
verificação de um conjunto de requisitos entre os quais se conta a preexistência
de um pedido formulado especificamente para esse fim, por quem tenha
legitimidade para o formular.
Ora, não se verificando qualquer indício de que o recorrente pretendia interpor
recurso para o Tribunal Constitucional, não pode este Tribunal conhecer do seu
objecto.
Nestes termos, decide-se não conhecer do recurso ao abrigo do n.º 1 do artigo
78º-A da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro.
2. Cumpre decidir.
O Tribunal Constitucional tem mantido o entendimento de que a interposição do
recurso de fiscalização concreta previsto na alínea a) do n. 1 do artigo 70º da
LTC, exige a formulação de um pedido expresso para esse efeito, por quem tenha
legitimidade para recorrer (veja-se, a título de exemplo, o Acórdão 393/2005 in
www.tribunalconstitucional.pt).
Diz o senhor Procurador-Geral Adjunto, na reclamação em análise, que
'mostrando-se suprido o erro inicialmente cometido pela entidade recorrente e
'convertido' – por iniciativa desta – o recurso erroneamente interposto no que
se mostra adequado [...] '. Todavia, o Tribunal reafirma a sua tese que, aliás,
radica no entendimento de que é no respectivo requerimento de interposição que
se fixa o tipo e o âmbito do recurso. É que, não tendo havido erro na sua
interposição (na verdade, não há qualquer indício de que o recorrente pretendia
interpor recurso para o Tribunal Constitucional) devem julgar-se fixados aqueles
elementos que, no caso concreto, impedem que o Tribunal conheça do objecto do
recurso.
3. Termos em que se indefere a reclamação, confirmando-se a decisão de não
conhecimento do recurso.
Lisboa, 14 de Outubro de 2005
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria Helena Brito
Rui Manuel Moura Ramos